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Transferências federais por emendas parlamentares aos municípios: implicações para o financiamento do SUS

Authors:
André Schimidt da Silva
André Schimidt da Silva
André Schimidt da Silva
Tatiana Wargas de Faria Baptista
Tatiana Wargas de Faria Baptista
Tatiana Wargas de Faria Baptista

Abstract

O artigo tem como objetivo analisar as transferências por emendas parlamentares do Ministério da Saúde aos municípios para o financiamento de ações e serviços públicos de saúde, de 2015 a 2021. Foi realizado estudo descritivo e exploratório com dados secundários, abrangendo a totalidade de municípios brasileiros. Os recursos provenientes de emendas apresentaram aumento, em especial a partir de 2018, indicando a expansão de sua relevância para o financiamento do SUS. No período de 2016 a 2021, mais de 80% foram alocados aos municípios, representando 9,5% dos repasses federais, com 91,2% de natureza de custeio. As transferências por emendas diferem dos repasses regulares por possuir maior instabilidade e variação per capita entre os montantes captados pelos municípios, e por destinar a maior parte dos recursos ao Nordeste e à atenção primária, em detrimento do Sudeste e da média e alta complexidade. Configura-se uma modalidade diferenciada de alocação de recursos no SUS que produz novas distorções e assimetrias, com implicações para as relações intergovernamentais e entre os poderes executivo e legislativo, ampliando o risco de descontinuidade de ações e serviços e impondo desafios para as gestões municipais.
Abstract e present article analyzes the trans-
fers from parliamentary amendments by the Mi-
nistry of Health to municipalities to nance public
health actions and services from 2015 to 2021. A
descriptive and exploratory study was carried
out with secondary data, including all Brazilian
cities. Resources from amendments showed an
increase, particularly from 2018 onwards, indica-
ting the expansion of their relevance for nancing
SUS. From 2016 to 2021, over 80% was allocated
to municipalities, representing 9.5% of all federal
transfers, with 91.2% for operational expenses.
Transfers from amendments dier from regular
transfers due to greater instability and per capita
variation among the amounts collected by mu-
nicipalities and due to the fact that they allocate
most resources to the Northeast and primary care
to the detriment of the Southeast and medium
and high complexity care. ese transfers repre-
sent a dierentiated modality of resource alloca-
tion in SUS that produces new distortions and
asymmetries, with implications for intergovern-
mental relations, as well as between the executive
and legislative powers, increasing the risk of the
discontinuity of actions and services and impo-
sing challenges for the municipal management.
Key words Healthcare Funding, Allocation of
Healthcare Resources, Financial Resources in He-
alth, Public Expenditures on Health
Resumo O artigo tem como objetivo analisar
as transferências por emendas parlamentares do
Ministério da Saúde aos municípios para o nan-
ciamento de ações e serviços públicos de saúde,
de 2015 a 2021. Foi realizado estudo descritivo e
exploratório com dados secundários, abrangendo
a totalidade de municípios brasileiros. Os recur-
sos provenientes de emendas apresentaram au-
mento, em especial a partir de 2018, indicando a
expansão de sua relevância para o nanciamento
do SUS. No período de 2016 a 2021, mais de 80%
foram alocados aos municípios, representando
9,5% dos repasses federais, com 91,2% de natu-
reza de custeio. As transferências por emendas
diferem dos repasses regulares por possuir maior
instabilidade e variação per capita entre os mon-
tantes captados pelos municípios, e por destinar a
maior parte dos recursos ao Nordeste e à atenção
primária, em detrimento do Sudeste e da média e
alta complexidade. Congura-se uma modalida-
de diferenciada de alocação de recursos no SUS
que produz novas distorções e assimetrias, com
implicações para as relações intergovernamentais
e entre os poderes executivo e legislativo, amplian-
do o risco de descontinuidade de ações e serviços e
impondo desaos para as gestões municipais.
Palavras-chave Financiamento da Assistência
à Saúde, Alocação de Recursos para a Atenção
à Saúde, Recursos Financeiros em Saúde, Gastos
Públicos com Saúde
1
Transferências federais por emendas parlamentares
aos municípios: implicações para o nanciamento do SUS
Federal transfers to municipalities through parliamentary
amendments: implications for SUS funding
1 Escola Nacional de Saúde
Pública Sergio Arouca,
Fundação Oswaldo Cruz
(Fiocruz). R. Leopoldo
Bulhões 1480,
Manguinhos. 21041-210
Rio de Janeiro RJ Brasil.
andre.schimidt@ocruz.br
2 Instituto Fernandes
Figueira, Fiocruz. Rio de
Janeiro RJ Brasil.
3 Instituto de Pesquisa
Econômica Aplicada.
Brasília DF Brasil.
ARTIGO TEMÁTICO
Cien Saude Colet 2024; 29:e03152024
DOI: 10.1590/1413-81232024297.03152024
Ciência & Saúde Coletiva
cienciaesaudecoletiva.com.br
ISSN 1413-8123. v.29, n.7
André Schimidt da Silva (https://orcid.org/0000-0002-7064-5731) 1
Luciana Dias de Lima (https://orcid.org/0000-0002-0640-8387) 1
Tatiana Wargas de Faria Baptista (https://orcid.org/0000-0002-3445-2027) 2
Fabiola Sulpino Vieira (https://orcid.org/0000-0001-7377-7302) 3
Carla Lourenço Tavares de Andrade (https://orcid.org/0000-0003-3232-0917) 1
2
Silva AS et al.
Introdução
Os sistemas de partilha scal possibilitam ade-
quar a disponibilidade de recursos às responsabi-
lidades de gestão de políticas públicas entre entes
federados de diferentes ou iguais níveis de gover-
no1. No Brasil, a repartição de receitas tributárias
da União com os demais entes da federação tem
papel central, destacando-se as transferências do
Ministério da Saúde (MS) aos municípios2.
Instituídos a partir da segunda metade dos
anos 1990, os repasses federais para nanciamen-
to do Sistema Único de Saúde (SUS) são impor-
tantes instrumentos de indução da implantação
de programas e coordenação de políticas nacio-
nais prioriárias3, representando fonte regular e
signicativa de receitas para a maioria dos muni-
cípios brasileiros4. Também denominados como
transferências condicionadas, os repasses fede-
rais do SUS obedecem a diferentes critérios de
alocação denidos em portarias do MS5.
Estudos indicam que, até 2019, repasses do
Piso de Atenção Básica Fixo (PAB-Fixo) per-
mitiram redistribuir recursos para regiões mais
carentes, e compensar, ainda que de modo in-
satisfatório, desigualdades nas condições de -
nanciamento em saúde6. Também estimularam
a adoção de novos serviços e protocolos assis-
tenciais, e a reorientação do modelo de atenção
primária à saúde (APS)5.
Contudo, ao longo da última década, uma
série de mudanças repercutiram na alocação de
recursos federais, com inexões e retrocessos
para o nanciamento do SUS. A promulgação
da Emenda Constitucional (EC) 95/2016 insti-
tuiu um novo regime scal no país, impondo o
congelamento das despesas primárias do governo
federal (“teto de gastos”), a princípio, por duas
décadas, em um cenário de fortalecimento da
agenda neoliberal e implantação de políticas de
austeridade
7
. Na saúde, o teto de gastos determi-
nou o congelamento, em termos reais, da aplica-
ção mínima federal a partir de 2018, no patamar
do ano anterior, com a desvinculação do gasto das
receitas arrecadadas pela União, culminando com
diminuição dos recursos disponíveis para o SUS
8
.
No contexto da agenda de austeridade scal,
realizaram-se reformas controversas no nan-
ciamento federal da saúde9. Em 2017, a redução
dos blocos de transferências do MS aos dois gru-
pos de despesas (custeio e investimento)10 gerou
questionamentos quanto à manutenção da capa-
cidade de coordenação federal frente aos ganhos
de uma possível maior autonomia dos entes sub-
nacionais. Em 2019, foi instituído o Programa
Previne Brasil, que estabeleceu um novo modelo
de nanciamento da APS. Entre outras mudan-
ças, o Programa extinguiu o repasse do PAB-xo,
única transferência intergovernamental em saú-
de com base populacional, incorporando outros
critérios de alocação de recursos que afetam a
organização deste nível de atenção11,12.
As restrições para o crescimento das despe-
sas com as políticas sociais adicionaram uma
nova camada de complexidade ao nanciamen-
to federal do SUS que, desde 2014, observava a
impositividade de execução de emendas parla-
mentares (EP) individuais – propostas por cada
parlamentar, no limite de 25 emendas por depu-
tado e senador13. Inicialmente, por força da lei de
diretrizes orçamentárias daquele ano e, nos anos
subsequentes, pela aprovação da EC 86/201514,
que estabeleceu a execução obrigatória dessas
emendas em até 1,2% da receita corrente líquida
(RCL) realizada no exercício anterior, devendo a
metade deste percentual ser destinada às ações e
serviços públicos de saúde (ASPS). Tal mudança
congurou o denominado “orçamento impositi-
vo” ao executivo federal, cujas despesas devem
ser contabilizadas no cálculo da aplicação míni-
ma constitucional em saúde15.
Nos anos seguintes, a execução de EP assu-
miu maior protagonismo no orçamento fede-
ral do SUS16. Em 2019, nova alteração no texto
constitucional tornou as emendas de bancadas
estaduais, denidas conjuntamente entre os
parlamentares de cada um dos 26 estados e do
Distrito Federal (DF), de execução obrigatória17.
Além disso, as emendas de relator ampliaram
sua participação no orçamento do MS13,16. Tais
emendas são propostas pelos parlamentares res-
ponsáveis pelo parecer nal sobre o projeto de lei
orçamentária e pelos relatores setoriais das dez
áreas temáticas que compõem o orçamento fede-
ral18,19. As emendas de relator tiveram presença
frequente na mídia, popularizando a expressão
orçamento secreto, por causa da falta de trans-
parência na alocação desses recursos pelos parla-
mentares20. Por m, em 2023, o limite de execu-
ção de emendas individuais foi ampliado para 2%
da RCL, mantendo-se a alocação de metade desse
valor às ASPS21.
Como consequência dessas medidas, na vi-
gência do teto de gastos, foi possível observar o
aumento expressivo das EP nas despesas federais,
sobretudo as que se destinam às transferências
para custeio de ASPS, alcançando ampla abran-
gência dos municípios contemplados13. Esses
repasses são denidos como incrementos tempo-
rários ao custeio dos serviços de APS e de média
3
Ciência & Saúde Coletiva, 29(7):1-12, 2024
e alta complexidade (MAC)22, sendo objeto de
portarias e cartilhas anuais do MS, que denem
orientações aos gestores do SUS e parlamentares.
Para Vieira16, o aumento de recursos de EP para
a saúde, desde que se tornaram de execução obri-
gatória e com maior protagonismo das emendas
de relator, tem contribuído para a redução da
participação de ações com despesas de progra-
mação própria do MS.
Nesse contexto, questiona-se sobre como se
distribuem as EP alocadas aos municípios e suas
implicações para o nanciamento do SUS. Como
ressaltam diversos autores, análises sobre as des-
pesas públicas possibilitam identicar as priori-
dades na alocação de recursos, avaliar os sentidos
e as repercussões de mecanismos de nancia-
mento de políticas e contribuir para práticas de
controle social do orçamento23,24.
Com vistas a contribuir com esses processos,
o artigo tem como objetivo analisar as transfe-
rências por EP do Ministério da Saúde aos muni-
cípios para o nanciamento de ASPS, no período
de 2015 a 2021.
Metodologia
Trata-se de estudo descritivo e exploratório
apoiado em dados secundários de acesso públi-
co e irrestrito provenientes do Sistema de Infor-
mações sobre Orçamento Público Federal (SIGA
Brasil, “acesso especialista”, https://www12.se-
nado.leg.br/orcamento/sigabrasil) e do sítio ele-
trônico do Fundo Nacional de Saúde (FNS, ht-
tps://portalfns.saude.gov.br/). A coleta de dados
ocorreu em três períodos. Até o ano de 2020, as
consultas aos sistemas de informação ocorreram
em maio (SIGA Brasil) e agosto (FNS) de 2021.
Para o ano de 2021, os dados foram extraídos em
março de 2022.
Adicionalmente, foram utilizadas as estima-
tivas populacionais do Instituto Brasileiro de
Geograa e Estatística (IBGE) enviadas ao Tribu-
nal de Contas da União (TCU) para o cálculo de
valores per capita, e os números-índices relativos
aos meses de dezembro do Índice Nacional de
Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), disponi-
bilizados pelo IBGE, para a correção dos valores
em reais de 2021.
Do SIGA Brasil foram extraídas as variáveis:
despesas liquidadas pelo MS com ASPS – totais
e por EP, por modalidade de aplicação e grupo
de natureza de despesa; e despesas liquidadas
para transferência aos municípios por município
identicado e áreas de alocação (APS e MAC).
Cabe ressaltar algumas especicidades desta
base: 1) no ano de 2015 apenas as emendas in-
dividuais são identicadas; 2) nos anos de 2016,
2017 e 2020, apenas parte dos municípios bene-
ciados foi identicada, correspondendo, respec-
tivamente, a 60,8%, 94,1% e 99,0% dos valores
empenhados e; 3) para o período de 2015 a 2018,
foi necessário realizar cálculo de estimativas para
identicação da área de alocação de parte das
emendas16.
Do FNS foram obtidas as variáveis relativas
aos valores líquidos transferidos aos municípios
por áreas de alocação. Os valores líquidos ree-
tem os recursos que foram colocados à disposi-
ção dos entes municipais pelo MS para o nan-
ciamento das ASPS. No caso do SIGA Brasil, a
escolha pelas despesas liquidadas, deveu-se ao
fato de esses dados já considerarem como reali-
zadas, sob a perspectiva federal, as ações cujos
recursos foram empenhados, reetindo melhor a
modalidade de distribuição dos valores e reper-
cussões para as gestões municipais do SUS, focos
principais deste estudo. Todos os valores foram
corrigidos para reais de 2021.
Os dados relativos às transferências abrange-
ram 5.568 municípios e Fernando de Noronha,
distrito do estado de Pernambuco. O DF foi ex-
cluído por constar na rubrica de transferência
aos estados. Os dados foram agregados ao nível
nacional, por região e unidade da federação (UF)
para o cálculo de indicadores. Estes foram or-
ganizados em planilhas eletrônicas e analisados
com o uso do soware estatístico SAS (versão
9.4). Os mapas foram elaborados com o progra-
ma TabWin do DATASUS (versão 4.1.5).
Como para 2015 só foi possível identicar os
valores de EP individuais, este ano foi considera-
do somente na análise da série histórica denida
para o estudo. Os seguintes indicadores, com res-
pectivos métodos de cálculo, foram obtidos para
o período de 2016-2021:
- EPTM = proporção das EP transferidas aos
municípios para ASPS = somatório das despesas
de EP transferidas aos municípios para ASPS de
todos os anos dividido pelo somatório das des-
pesas de EP para ASPS do MS de todos os anos
multiplicado por 100.
- EPTM-C = proporção das EP de custeio
transferidas aos municípios = somatório das
despesas de EP transferidas aos municípios para
custeio de ASPS de todos os anos dividido pelo
somatório das despesas de EP para ASPS do MS
de todos os anos multiplicado por 100.
- EP/T = proporção das EP transferidas aos
municípios em relação ao total de transferências
4
Silva AS et al.
SUS = somatório das despesas de EP transferidas
aos municípios para ASPS de todos os anos di-
vidido pelo somatório das transferências do MS
aos municípios de todos os anos multiplicado
por 100.
- EP/T-APS = proporção das EP transferidas
aos municípios para APS em relação ao total de
transferências SUS para APS = somatório das
despesas de EP transferidas aos municípios para
APS de todos os anos dividido pelo somatório
das transferências do MS aos municípios para
APS de todos os anos multiplicado por 100.
- EP/T-MAC = proporção das EP transferidas
aos municípios para MAC em relação ao total de
transferências SUS para MAC = somatório das
despesas de EP transferidas aos municípios para
APS de todos os anos dividido pelo somatório
das transferências do MS aos municípios para
APS de todos os anos multiplicado por 100.
- EPTM-pc = EP transferidas aos municí-
pios per capita = somatório das despesas de EP
transferidas aos municípios para ASPS de todos
os anos dividido pelo somatório das estimativas
populacionais de todos os anos.
- TReg-pc = Transferências regulares do MS
aos municípios per capita = somatório das despe-
sas de transferências regulares do MS aos muni-
cípios de todos os anos dividido pelo somatório
das estimativas populacionais de todos os anos.
- EPTM-pc (cv) = Coeciente de variação das
EP transferidas aos municípios per capita = des-
vio padrão dividido pela média das EP transferi-
das aos municípios per capita de todos os anos da
série multiplicado por 100.
- TReg-pc (cv) = Coeciente de variação das
Transferências regulares do MS aos municípios
per capita = desvio padrão dividido pela média
das EP transferidas aos municípios per capita de
todos os anos da série multiplicado por 100.
- MRP-pc = Maior redução percentual nos
valores per capita entre dois anos subsequentes.
O cálculo dos coecientes de variação foi re-
alizado para caracterizar a dispersão dos valores
das transferências per capita entre os municípios
da mesma UF em termos relativos às respecti-
vas médias estaduais25. Neste caso, menores co-
ecientes de variação indicam uma distribuição
mais homogênea.
Considera-se neste trabalho sob a nomencla-
tura de transferências regulares os valores líqui-
dos dos repasses do MS subtraídas as despesas li-
quidadas vinculadas a EP para ASPS transferidas
aos municípios no mesmo período.
Resultados
No período de 2015 e 2017 verica-se estagnação
dos gastos federais liquidados com ASPS, com
discreto aumento de 2018 a 2019. Entre 2020 e
2021, no contexto da pandemia de COVID-19,
observa-se uma elevação mais signicativa das
despesas, quando foram autorizados créditos ex-
traordinários ao orçamento federal para enfren-
tamento da emergência sanitária (Tabela 1).
As transferências de recursos aos municípios
foram responsáveis por mais da metade dos gas-
tos do MS (51,2%) em 2018, com tendência de
ampliação gradual da sua participação nos dois
anos seguintes. Em 2021, os repasses aos municí-
pios apresentaram um volume de despesas 7,6%
mais elevado que em 2019. Contudo, a expansão
das aplicações diretas na ação orçamentária vin-
culada à COVID-19 retraiu substancialmente a
participação das transferências no último ano da
série histórica.
As EP apresentaram tendência de aumento,
em especial a partir de 2018, indicando a expan-
são de sua relevância para o nanciamento do
SUS. Como as despesas com a COVID-19 altera-
ram o padrão de gasto em 2020, os anos de 2019 e
2021 são importantes referências para a compre-
ensão da participação das EP. Os dados da Tabela
1 expressam que as emendas representaram 9,3%,
em 2019, e 7,7%, em 2021, das despesas federais
com ASPS. Em relação aos recursos transferidos
aos municípios, observa-se que 14,8%, em 2019,
e 14,5%, em 2021, foram alocados a partir das in-
dicações de deputados federais e senadores.
No período de 2016 a 2021, 82,5% dos re-
cursos provenientes de EP em âmbito nacional
(EPTM) foram alocados aos entes municipais
(Tabela 2), sendo a modalidade preferencial de
aplicação pelos parlamentares em todos os es-
tados brasileiros. Entre as regiões, a participa-
ção das emendas destinadas aos municípios em
relação ao total de repasses por EP variou entre
74% na região Norte e 86% no Nordeste. Em
relação aos estados, apenas dois apresentaram
proporções inferiores a 60% – Roraima (53,4) e
Amapá (57,6%). No outro extremo, encontram-
-se os estados com percentuais acima de 90% –
Amazonas (96,4%), Maranhão (96,1%), Paraíba
(92,5%), Minas Gerais (92,2%), Alagoas (91,1%)
e Pernambuco (90,7%).
Além da preferência pelo direcionamento
de recursos de EP aos municípios, destaca-se a
destinação para o custeio como natureza de des-
pesa (EPTM-C). Entre 2016 e 2021, 91,2% dos
recursos transferidos aos municípios em âmbito
5
Ciência & Saúde Coletiva, 29(7):1-12, 2024
nacional foram para este m. Percentuais abaixo
de 80% apenas foram identicados nos estados
de Espírito Santo (70,6%), Goiás (78,1%) e Ro-
raima (79,6%).
A participação das EP em relação ao total de
transferências aos municípios no SUS (EP/T) é
um indicador relevante para compreender a
magnitude das emendas e sua importância para
as gestões municipais. Nos dados acumulados
para o período, observa-se que as emendas foram
responsáveis por 9,5% dos repasses aos municí-
pios, superando este percentual nas regiões Norte
(14,6%) e Nordeste (12,7%). Participações supe-
riores a 20% são identicadas apenas em estados
da região Norte – Amapá (34,2%), Acre (25,9%),
Roraima (22,7%) e Amazonas (20,2%).
Quando os dados são desagregados por nível
de atenção, verica-se maior peso das EP em re-
lação ao total de transferências do MS destinadas
à APS em todos os estados (EP/T-APS), alcan-
çando 17% em âmbito nacional. Neste recorte, as
variações do peso das emendas são ainda mais
acentuadas. No âmbito das regiões, a partici-
pação das EP no nanciamento federal da APS
supera 20% no Norte (21,4%) e no Nordeste
(20,9%). Os estados do Amapá (41,7%), Roraima
(36,2%) e Acre (35%) apresentaram as maiores
participações.
Quanto à participação do nanciamento por
emendas em relação ao total das transferências
para MAC (EP/T-MAC), as regiões apresenta-
ram proporções menores, destacando-se o Norte,
com 9,2%, e o Centro-Oeste, com 8%. Por outro
lado, a região Sul apresentou o patamar mais bai-
xo de participação, 3,1%, com os estados de Para-
ná e Rio Grande do Sul abaixo deste percentual.
No que se refere aos valores per capita trans-
feridos aos municípios por EP (EPTM-pc) no pe-
ríodo de 2016 a 2021, o Nordeste também apre-
senta os números mais elevados, diferentemente
das transferências regulares (TReg-pc), nas quais
o Centro-Oeste se encontra no patamar mais
alto. A região Norte apresenta o menor valor per
capita das transferências regulares (TReg-pc),
mas é a segunda região com os maiores valores
per capita no que se refere às EP (EPTM-pc).
A variação dos valores per capita entre os
municípios de cada UF e agregados por região
e em âmbito nacional foi superior em todos os
casos para os recursos transferidos por EP em
relação aos repasses regulares, indicando maior
assimetria entre os valores captados por EP pe-
las gestões municipais. Enquanto o coeciente
de variação dos valores per capita de emendas foi
de 72,6% no Sudeste e 69,3% no país, o mesmo
indicador foi de 45,2% na mesma região e 40,6%
Tabela 1. Despesas do Ministério da Saúde com Ações e Serviços Públicos de Saúde (ASPS), 2015-2021.
Variáveis/indicadores 2015 2016 2017 2018 2019 2020 2021
Despesas com ações e serviços públicos de saúde (ASPS)
Em R$ milhões*
Transf. aos municípios 61.135 60.200 60.714 65.692 69.328 90.670 74.563
Transf. aos estados 22.767 21.893 22.460 22.763 23.653 32.169 25.115
Aplicações diretas 39.419 41.143 39.428 37.189 36.940 39.371 58.498
Outras despesas 3.809 3.893 3.899 2.732 1.882 3.997 3.397
Despesas ASPS (total) 127.130 127.129 126.501 128.376 131.804 166.208 161.573
Em %
Transf. aos municípios/Despesas ASPS 48,1 47,4 48,0 51,2 52,6 54,6 46,1
Transf. aos estados/Despesas ASPS 17,9 17,2 17,8 17,7 17,9 19,4 15,5
Aplicações diretas/Despesas ASPS 31,0 32,4 31,2 29,0 28,0 23,7 36,2
Outras despesas/Despesas ASPS 3,0 3,1 3,1 2,1 1,4 2,4 2,1
Despesas ASPS (total) 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0
Despesas com ações e serviços públicos de saúde por emendas parlamentares
Em R$ milhões*
Despesas por EP 7 5.805 5.388 8.473 12.310 10.754 12.472
Transf. aos municípios por EP 3 3.872 3.755 7.374 10.239 6.802 10.797
Em %
Desp EP/Desp ASPS (total) 0,0 4,6 4,3 6,6 9,3 6,5 7,7
Transf. mun por EP/Transf. aos munic 0,0 6,4 6,2 11,2 14,8 7,5 14,5
*Valores corrigidos para preços de 2021 pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA).
Fonte: SIGA Brasil.
6
Silva AS et al.
nacionalmente para as transferências regulares.
Apenas no Ceará a variação dos valores per capi-
ta foi maior para as transferências regulares, sen-
do o único caso em que a alocação de recursos
por EP foi mais homogênea entre os municípios.
O Gráco 1 compara a distribuição de recur-
sos por EP com as transferências regulares do
SUS, evidenciando modalidades diferentes de
partilha entre os entes subnacionais. Destaca-se
que enquanto a participação da região Sudes-
te é preponderante nas transferências regulares
(39,3%), o Nordeste é a região que capta mais
recursos de emendas, 41,9%. Em valores absolu-
tos, observa-se o predomínio de repasses para a
MAC nas transferências regulares e da APS no
contexto das EP.
Tabela 2. Transferências federais de emendas parlamentares aos municípios para o nanciamento de ações e serviços
públicos de saúde. Brasil, 2016 a 2021.
Brasil/
Região/UF
% R$ de 2021 Coeciente de
variação (%)
EPTM EPTM-C EP/T EP/T-APS EP/T-MAC EPTM-pc TReg-pc EPTM-pc TReg-pc
Brasil 82,5 91,2 9,5 17,0 6,0 32,45 310,61 69,3 40,6
Norte 74,0 89,4 14,6 21,4 9,2 42,09 245,30 70,1 33,2
AC 60,2 89,6 25,9 35,0 9,0 63,33 181,26 30,6 18,3
AM 96,4 95,2 20,2 21,9 13,1 47,97 188,93 64,1 45,6
AP 57,6 87,6 34,2 41,7 28,9 87,12 167,64 46,4 19,7
PA 72,9 88,4 8,7 13,7 7,4 25,39 266,38 76,4 37,0
RO 81,6 81,7 12,8 18,8 12,5 38,63 263,73 57,1 27,8
RR 53,4 79,6 22,7 36,2 11,3 75,10 256,20 55,5 14,3
TO 74,7 90,6 18,2 26,7 9,6 73,66 330,33 41,6 22,5
Nordeste 86,0 94,2 12,7 20,9 7,1 49,15 338,60 56,1 34,4
AL 91,1 96,2 16,6 29,4 8,3 81,86 409,97 36,3 34,6
BA 80,8 92,5 9,7 17,3 4,3 32,43 301,62 47,7 37,0
CE 78,0 96,7 10,8 19,3 5,9 45,67 376,78 42,7 43,8
MA 96,1 98,4 18,5 24,2 16,5 73,64 325,24 51,2 27,6
PB 92,5 91,5 12,9 20,4 9,1 64,81 437,32 41,1 29,1
PE 90,7 90,8 10,3 15,7 6,8 31,67 275,64 56,3 28,9
PI 84,3 95,7 16,6 30,2 3,7 90,46 453,94 28,1 24,3
RN 87,7 80,6 9,9 16,0 5,2 37,00 337,78 56,9 31,9
SE 71,1 95,3 15,7 26,7 4,4 54,70 292,61 41,9 20,1
Sudeste 81,6 89,5 6,9 12,0 5,6 21,75 294,84 72,6 45,2
ES 62,5 70,6 7,2 12,3 4,9 15,88 204,76 61,2 38,5
MG 92,2 89,5 6,9 11,9 5,5 29,53 397,16 67,3 42,7
RJ 86,6 93,5 9,2 15,9 7,7 33,34 328,90 62,2 51,6
SP 72,2 87,7 5,6 10,1 4,5 14,32 242,63 75,1 39,4
Sul 82,0 91,9 7,3 16,5 3,1 25,16 320,37 64,2 44,5
PR 86,9 93,6 7,7 18,2 2,6 25,87 309,77 60,4 46,7
RS 73,7 85,2 6,0 14,6 2,8 19,91 309,36 65,4 43,4
SC 85,3 96,2 8,4 16,4 4,5 32,37 354,91 57,0 38,4
Centro-Oeste
83,2 82,4 8,7 12,8 8,0 34,69 363,21 64,9 37,7
GO 89,1 78,1 7,0 10,8 5,7 28,21 372,12 67,5 38,0
MS 75,8 86,1 7,7 13,0 6,3 31,97 382,73 51,8 40,4
MT 81,2 85,5 13,2 15,9 15,6 49,96 329,55 53,1 29,7
Valores corrigidos para preços de 2021 pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Legenda: EPTM = proporção das EP
transferidas aos municípios para ASPS. EPTM-C = proporção das EP de custeio transferidas aos municípios. EP/T = proporção das EP
transferidas aos municípios em relação ao total de transferências SUS. EP/T-APS = proporção das EP transferidas aos municípios para APS
em relação ao total de transferências SUS para APS. EP/T-MAC = proporção das EP transferidas aos municípios para MAC em relação ao
total de transferências SUS para MAC. EPTM-pc = EP transferidas aos municípios per capita. TReg-pc = Transferências regulares do MS aos
municípios per capita. EPTM-pc (cv) = Coeciente de variação das EP transferidas aos municípios per capita. TReg-pc (cv) = Coeciente de
variação das Transferências regulares do MS aos municípios per capita.
Fontes: SIGA Brasil e Fundo Nacional de Saúde.
7
Ciência & Saúde Coletiva, 29(7):1-12, 2024
No âmbito do nanciamento da APS, o Nor-
deste apresenta as maiores proporções nas duas
modalidades de alocação, contudo, no que se re-
fere às EP, a região responde por quase metade
dos recursos (47%). Em relação aos recursos fede-
rais para MAC, a região Sudeste apresenta as mais
altas participações nas duas modalidades, ambas
superiores a 40%. Nos três recortes apresentados,
as regiões Norte e Nordeste apresentam maiores
participações na partilha de recursos por EP.
Embora as EP apresentem crescimento e cer-
ta regularidade no âmbito das despesas do MS,
a distribuição de recursos entre os municípios é
marcada por maior instabilidade e descontinui-
dade do que os demais repasses federais no SUS.
A Figura 1 apresenta a redução proporcional de
recursos entre um ano e outro em âmbito muni-
cipal a partir da maior variação negativa entre os
valores repassados em anos subsequentes. Quan-
to maiores as reduções de recursos anuais, mais
escura é a tonalidade apresentada nos mapas.
Enquanto entre as transferências regulares
(Figura 1A) observa-se maior concentração de
municípios com menores quedas nos repasses e
um padrão mais homogêneo, no âmbito das EP
(Figura 1B) predominam reduções superiores a
50%, resultando no mapa com tonalidades mais
escuras e diversidade entre os padrões apresenta-
dos pelos municípios.
Discussão
O período abordado neste estudo rearma o des-
taque das transferências de recursos aos municí-
pios na condução da política de saúde no Brasil,
marcada pelo processo de descentralização de
ASPS26. É no contexto das transferências federais
que as EP ganham maior relevo no nanciamen-
to do SUS, sendo também a principal modalida-
de de aplicação desses recursos. A retração da
participação das transferências aos municípios
nas despesas do Ministério da Saúde em 2021
não contradiz essa direção, sendo atribuída à
aquisição de vacinas contra a COVID-1927. A re-
levância da participação das emendas se mantém
Gráco 1. Transferências federais aos municípios para o nanciamento de ações e serviços públicos de saúde
segundo região. Brasil, 2016 a 2021.
Valores corrigidos para preços de 2021 pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA).
Fontes: SIGA Brasil e Fundo Nacional de Saúde.
39,3
28,5 31,9
22,5
45,1 42,1
31,3
41,9 38,6
47,4
26,3 31,3
14,6 11,2 13,6 13,3 15,7 8,3
7,4 11,5 9,7 12,2 4,9
7,5
7,4 6,8 6,2 4,7 8,0 10,8
0%
10%
20%
30%
40%
50%
60%
70%
80%
90%
100%
Transfencias
regulares
(R$ 425,2 bilhões)
Emendas
parlamentares
(R$ 40,2 bilhões)
Transfencias
regulares
(R$ 151,1 bilhões)
Emendas
parlamentares
(R$ 25,7 bilhões)
Transfencias
regulares
(R$ 213,8 bilhões)
Emendas
parlamentares
(R$ 12,8 bilhões)
Geral APS MAC
Sudeste Nordeste Sul Norte Centro Oeste
100%
90%
80%
70%
60%
50%
40%
30%
20%
10%
0%
Transferências
regulares
(R$425,2 bilhões)
Emendas
parlamentares
(R$40,2 bilhões)
Transferências
regulares
(R$151,1 bilhões)
Transferências
regulares
(R$213,8 bilhões)
Emendas
parlamentares
(R$25,7 bilhões)
Emendas
parlamentares
(R$12,8 bilhões)
Geral APS MAC
Sudeste Nordeste Sul Norte Centro-Oeste
7,4 6,8 6,2 4,7 8,0 10,8
7,4 11,5 9,7 12,2 4,9
7,5
14,6 11,2 13,6 13,3 15,7 8,3
31,3
41,9 38,6
47,4
26,3 31,3
39,3
28,5 31,9
22,5
45,1 42,1
8
Silva AS et al.
Figura 1. Maiores variações percentuais negativas entre os valores per capita transferidos aos municípios para
ações e serviços públicos de saúde (ASPS) em dois anos subsequentes no período 2016-2021.
Legenda: MRP-pc = Maior redução percentual nos valores per capita entre dois anos subsequentes.
Fontes: SIGA Brasil e Fundo Nacional de Saúde.
1A. Transferências regulares 1B. Emendas parlamentares
MRP-pc
-75%
>-75%
>-50%-25%
>-25%0
>0
no período subsequente ao estudo. Em relação ao
ano de 2022, Funcia e Benevides28,29 identicam a
expansão, tanto nos montantes destinados às EP,
quanto no percentual em relação ao gasto total
com ASPS pelo governo federal, que passou de
7,8%, em 2021, para 9,9% no ano seguinte.
O estudo evidenciou a participação crescente
e com distribuição diferenciada das EP frente aos
repasses regulares do MS. Enquanto nas transfe-
rências regulares predominam os recursos desti-
nados à MAC, nas transferências por EP a APS
se destaca. Por sua vez, na comparação entre mu-
nicípios, os valores per capita de EP apresentam
maior variação, indicando maiores discrepân-
cias dos recursos alocados em relação às demais
transferências. Destaca-se ainda o expressivo
predomínio das EP destinadas ao custeio de
ASPS. Quanto à distribuição, as regiões Nordeste
e Norte são as que apresentam os maiores valo-
res per capita e maior peso em relação ao total de
transferências. Entretanto, a maior instabilidade
dos repasses por EP merece destaque, pois os re-
cursos alocados aos municípios variam de forma
expressiva entre um ano e outro, não sendo tam-
bém um repasse que contemple as mesmas admi-
nistrações locais em todos os anos.
O maior peso dos recursos de EP no Norte e
Nordeste sugere maior dependência desta fonte
dos municípios localizados nessas regiões. Este
quadro é preocupante quando se observam os
resultados do estudo conduzido por Piola et al.30,
que evidenciou menores patamares de gasto pú-
blico em saúde nos municípios do Norte e Nor-
deste, de 2004 a 2017. Destaca-se ainda o caso da
região Norte, que apresenta as menores despesas
federais regionalizadas em saúde em praticamen-
te todo o período abordado pelos autores. Se em
alguma medida, as EP representam fontes adicio-
nais de recursos para essas regiões, isto ocorre de
maneira instável, sem uma contribuição real para
a sustentabilidade do nanciamento do SUS.
A ampla abrangência de municípios contem-
plados por EP é um aspecto destacado por Vieira
e Lima6, que observaram que 92,1% dos muni-
cípios receberam emendas na modalidade de
incremento de piso da atenção básica em 2019,
correspondendo a praticamente todo o território
nacional e se congurando como uma impor-
tante estratégia de captação de recursos para as
gestões municipais. Quanto ao valor per capita,
Piola e Vieira13 identicaram alocação de recur-
sos federais ao SUS por EP como inversamente
proporcional ao tamanho do município.
Congura-se, portanto, uma modalidade de
alocação de recursos amplamente difundida entre
os municípios. Na base desta dinâmica está a re-
9
Ciência & Saúde Coletiva, 29(7):1-12, 2024
tomada da prerrogativa de proposição de emen-
das ao orçamento da União pelos parlamentares,
a partir da Constituição Federal de 1988. Naquele
contexto de redemocratização do país, visava-se
assegurar maior participação do poder legislativo
no processo decisório e alocação de recursos fe-
derais para o nanciamento de políticas públicas.
Em tese, apostava-se que os deputados poderiam
conferir maior proximidade da realidade dos es-
tados que representam e, assim, contribuir para o
enfrentamento de iniquidades31.
No contexto internacional, a participação de
emendas parlamentares no nanciamento de po-
líticas públicas se expressa no debate sobre a ori-
gem e o direcionamento desses recursos. Críticas
são feitas ao caráter distributivo das emendas32
que concentram benefícios em localidades espe-
cícas, por meio de impostos gerais que envol-
vem a contribuição de todos no nanciamento de
seus custos, gerando mais impactos individuais
do que coletivos33. Por outro lado, abordagens
como a de Tromborg e Schwindt-Bayer34 identi-
cam as necessidades sociais das localidades como
elemento de destaque para a destinação de recur-
sos pelos congressistas.
No Brasil, o debate sobre o tema também não
encontra consenso. Parte dos estudos realizados
nos anos 2000 enfatizaram as EP como “moeda
de troca”, estratégia eleitoral e instrumento para
atendimento de interesses individuais e privados,
que contribuíam para a iniquidade na alocação de
recursos
35
. Outros trabalhos apontaram para um
processo orçamentário organizado com domi-
nância do poder executivo e uma negociação em
bases partidárias com acordos de longo prazo
36
.
Uma visão positiva também é encontrada quanto
aos reexos nas políticas públicas. Para Souza
37
, as
emendas ao orçamento são incentivos para par-
lamentares aumentarem a captação de recursos
federais para seus estados frente à deciência do
federalismo brasileiro em promover a equaliza-
ção scal entre os entes subnacionais. Almeida
38
segue na mesma direção ao desenhar um modelo
teórico, no qual associa as EP aos ganhos de bem-
-estar da população, mas salienta a necessidade
de testes empíricos para um entendimento mais
amplo acerca da participação do legislativo na
questão orçamentária. Contudo, com o advento
do orçamento impositivo, são necessárias análises
políticas mais profundas, que investiguem as mu-
danças na dinâmica das relações entre os poderes
executivo e legislativo, bem como suas consequ-
ências p
ara o nanciamento de políticas públicas.
Nesse sentido, os achados deste estudo aju-
dam a reacender o debate sobre as EP. O predo-
mínio dos repasses para a APS, mais do que a in-
dução do fortalecimento deste nível de atenção,
aponta para uma busca de maior capilaridade dos
parlamentares junto às suas bases eleitorais. Se as
transferências regulares para MAC são predomi-
nantemente destinadas para os municípios com
maior oferta desses serviços, a APS é difundida
em todo o país, e segue orientações denidas no
âmbito de políticas especícas do MS. Dessa for-
ma, a preferência dos parlamentares em direcio-
nar recursos para a APS parece representar uma
estratégia para alcançar municípios que não dis-
põem de serviços de média e alta complexidade e
não necessariamente um olhar para necessidades
e prioridades em saúde.
Entre as regras para os repasses de incre-
mento temporário, há o limite para captação pe-
los municípios do total de recursos obtidos por
transferências regulares em anos anteriores22, ou
seja, é possível dobrar o montante recebido por
meio de repasses do MS. Entretanto, ainda que
no processo de execução de EP estejam contem-
plados alguns parâmetros estabelecidos pelo exe-
cutivo federal, são nas negociações entre parla-
mentares e prefeituras que o destino dos recursos
é denido.
Neste cenário, destacam-se implicações para
as relações intergovernamentais no âmbito do
SUS. As transferências de recursos federais se
consolidaram historicamente como importante
mecanismo de coordenação da política de saúde
entre diferentes níveis de governo, combinan-
do critérios epidemiológicos, demográcos e
de oferta de ASPS para a alocação de recursos9.
Atualmente, as EP fragilizam esse mecanismo em
prol de critérios eminentemente políticos para
direcionamento dos repasses39.
Mesmo anteriormente à obrigatoriedade
de destinar metade dos recursos das emendas
individuais para a saúde, Baptista et al.40 já des-
tacavam o grande interesse pela destinação de
emendas para o setor. Segundo as autoras, isso
se deve tanto à magnitude do orçamento do MS,
quanto à natureza de suas ações que apresentam
maior visibilidade e são facilmente destinadas
a localidades, unidades e projetos especícos,
públicos ou privados. A destinação de recursos
de emendas aos municípios em detrimento dos
estados ou de ações diretas do governo federal,
parece reforçar essa lógica e uma tentativa dos
parlamentares de alocarem recursos a partir do
seu desempenho eleitoral.
Dado o volume e a instabilidade de captação
de recursos, o predomínio das EP de custeio im-
põe grandes riscos para a manutenção de ASPS
10
Silva AS et al.
pelos municípios. Conforme Piola e Vieira13, os
recursos de EP que eram predominantemente di-
recionados à construção e ampliação de unidades
de saúde ou à aquisição de equipamentos, passam
a ter, a partir de 2016, o custeio como natureza
de despesa principal, com aumento da participa-
ção desse grupo no contexto do teto de gastos.
Em um cenário como este, a redução de recur-
sos pode acarretar descontinuidade ou retração
na oferta de serviços. Neste quadro, as ASPS que
deveriam contar com fontes de recursos regula-
res para sua manutenção, passam a depender de
negociações políticas entre representantes dos
poderes executivo e legislativo. Amplia-se, assim,
o desao das gestões municipais de planejamento
do seu gasto e de desenvolvimento de estratégias
contínuas para manutenção do patamar de re-
cursos recebidos por EP.
O volume de recursos no orçamento, o nú-
mero de parlamentares por unidade da federa-
ção, a preferência pela destinação das emendas
para municípios, e os critérios já estabelecidos
para os demais repasses do MS são aspectos que
repercutem nos diferentes pesos de recursos de
EP em relação ao total de transferências federais
do SUS. Como casos extremos, tem-se o Amapá,
em que as emendas representam mais de 30% das
transferências SUS, e São Paulo em que as emen-
das representaram apenas pouco mais de 5%.
Mais do que uma alocação mais equitativa, os
maiores valores per capita de EP para os municí-
pios das regiões Norte e Nordeste reetem nosso
sistema político. Cintra et al.41 refutam a ideia
de que 513 deputados federais representariam o
povo brasileiro e 81 senadores estariam em defe-
sa de seus estados, sob o argumento de não exis-
tir deputados eleitos em circunscrição nacional,
motivo pelo qual estes parlamentares também
se veriam como representantes de seus estados.
A divisão das cadeiras entre as unidades federa-
das tampouco reetiria uma “proporcionalidade
perfeita” com os portes populacionais. A deni-
ção de um mínimo de oito e um máximo de 70
deputados, bem como o número comum de oito
senadores, manteria um caráter desproporcional
entre população e representação.
No que se refere ao PAB-Fixo, vigente na po-
lítica de saúde até 2019, Vieira e Lima6 identica-
ram que as EP distorceram a alocação equitativa
desses repasses, ao destinar proporções muito su-
periores de recursos a um grupo de municípios
com menor porte populacional e não contemplar
todos os municípios com maior vulnerabilidade
socioeconômica. Tal análise é reforçada por es-
tudo do IPEA39 que destaca que os repasses para
custeio da APS por EP aumentam a desigualdade
no nanciamento do SUS para os municípios e
alerta para o risco de ampliação das iniquidades
em saúde.
Além disso, a ampla variação dos valores
recebidos evidencia a produção de novas dis-
torções e assimetrias na alocação de recursos
no SUS. Esse aspecto é muito relevante dado o
contexto em que esta pesquisa se insere, de seve-
ra restrição orçamentária ao MS. Tal cenário se
mantém na atualidade, pois mesmo que o teto de
gastos tenha sido revogado de forma denitiva
com a implantação do novo arcabouço scal em
202321,42, o nanciamento da saúde ainda sofre
restrições. Em uma federação como a brasileira,
marcada por importantes iniquidades, há expec-
tativa de que os recursos federais sejam sucien-
tes e adequados para equalização de capacidades
desiguais de nanciamento de políticas públicas
entre os entes subnacionais. Acende-se, portanto,
um alerta para que outros estudos investiguem a
relação entre a alocação de recursos por EP e as
necessidades de saúde da população.
Por m, destaca-se que este estudo tem algu-
mas limitações inerentes à fonte de informação
utilizada, como apontado anteriormente. A falta
de transparência na alocação de recursos por EP,
especialmente das emendas de relator, impos-
sibilitou a identicação de todos os municípios
beneciados com esses recursos, especialmente
em 2016. Ainda assim, o ano de 2016 foi incluído
no cálculo dos indicadores, tendo em vista que
se trata do primeiro ano da entrada em vigor da
alteração da Constituição Federal de 1988 para
instituir obrigatoriedade de execução de EP in-
dividuais. Como resultado, observou-se um salto
na execução orçamentária das emendas como
um todo – de 31,7% em 2015 para 80,6% em
201616. Nos anos mais recentes da série analisada,
identicaram-se os beneciários para a quase to-
talidade dos recursos alocados.
Apesar dessas limitações, a fonte de informa-
ção utilizada é a melhor disponível e os dados ob-
tidos são sucientes para a análise empreendida,
sustentando as conclusões deste trabalho. Cabe
ressaltar a necessidade da garantia da manuten-
ção e aprimoramento dos sistemas de informação
sobre o orçamento público no Brasil para realiza-
ção de pesquisas sobre o tema. O artigo reforça a
importância das EP como fonte de recursos para
o custeio do SUS no âmbito municipal e sua am-
pla difusão no território nacional, por meio de
repasses instáveis do MS, com grandes variações
de municípios beneciados entre os anos e pre-
domínio da destinação para a APS.
11
Ciência & Saúde Coletiva, 29(7):1-12, 2024
Colaboradores
AS Silva: concepção e delineamento do estudo;
levantamento, análise e interpretação dos dados;
elaboração de ilustrações; e redação. LD Lima
e TWF Baptista: concepção e delineamento do
estudo; análise e interpretação dos dados; e re-
dação. FS Vieira: levantamento, análise e inter-
pretação dos dados; e redação. CLT Andrade: le-
vantamento, análise e interpretação dos dados; e
elaboração de ilustrações. Todos os autores con-
tribuíram com a revisão nal do artigo.
Agradecimentos
AS Silva foi bolsista CAPES-Print. LD Lima é
bolsista de produtividade em pesquisa do CNPq
e Cientista do Nosso Estado da FAPERJ, e conta
com o apoio dessas agências para o desenvolvi-
mento de estudos sobre o tema.
Financiamento
Este estudo foi nanciado pelo Conselho Nacio-
nal de Desenvolvimento Cientíco e Tecnológico
(CNPq), processo n° 309295/2021-1; pela Funda-
ção Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa
do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ), proces-
so n° SEI E-26/201.123/2021; e pela Fundação
Oswaldo Cruz (Fiocruz) - Programa de Políticas
Públicas, Modelos de Atenção e Gestão do Sis-
tema e Serviços de Saúde (PMA), processo n°
25380.101539/2019- 05.
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Artigo apresentado em 05/04/2023
Aprovado em 01/02/2024
Versão nal apresentada em 26/02/2024
Editores-chefes: Maria Cecília de Souza Minayo, Romeu
Gomes, Antônio Augusto Moura da Silva
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OBJETIVO: Analisar as implicações das emendas parlamentares (EP) para o modelo de alocação equitativa de recursos do Piso da Atenção Básica Fixo (PAB-Fixo) aos municípios no período de 2015 a 2019. MÉTODOS: Realizou-se um estudo descritivo e exploratório da alocação de recursos federais para o PAB-Fixo e para incremento ao PAB por emenda parlamentar. Os municípios foram classificados em quatro grupos, segundo graus de vulnerabilidade socioeconômica definidos pelo Ministério da Saúde para destinação de recursos do PAB-Fixo. Os repasses do ministério por emenda parlamentar foram identificados, analisando-se as proporções de municípios beneficiados em cada grupo por recursos alocados do PAB-Fixo e do incremento ao piso por EP. RESULTADOS: Verificou-se redução dos recursos alocados ao PAB-Fixo (de R$ 6,04 bilhões para R$ 5,51 bilhões, -8,8%) e aumento do incremento ao PAB por emenda parlamentar (de R$ 95,06 milhões para R$ 5,58 bilhões, 5.767%) entre 2015 e 2019. A participação dos municípios por grupo dos que foram favorecidos por EP foi semelhante à dos municípios do PAB-Fixo. Na proporção de recursos por emendas, os municípios do grupo I (mais vulneráveis) tiveram maior participação e os do grupo IV, menor participação, se comparada à alocação do PAB-Fixo. A distribuição de recursos por emenda parlamentar não contemplou todos os municípios, mesmo aqueles mais vulneráveis, pertencentes aos grupos I e II. Houve grande desigualdade de recursos per capita segundo os grupos de municípios. CONCLUSÃO: As emendas parlamentares distorceram o modelo de alocação equitativa de recursos proposto pelo Ministério da Saúde para o PAB-Fixo, ao destinar recursos em proporção muito maior para os municípios do grupo I e muito menor para os do grupo IV, o que está em desacordo com esse modelo, além disso essa distribuição por emendas não beneficia a todos os municípios, nem mesmo aos mais vulneráveis.
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A alocação de recursos federais por meio de emendas parlamentares (EPs) ao Sistema Único de Saúde (SUS) vem crescendo desde a aprovação do orçamento impositivo e tem contribuído para a redução da parcela de recursos destinados às ações e serviços públicos de saúde (ASPS) por programação própria do Ministério da Saúde (MS). Além disso, deficits de transparência na execução orçamentário-financeira desses recursos têm dificultado a contabilização das despesas por áreas de atuação do SUS. Assim, o objetivo deste texto é propor um método para a estimação das despesas em ASPS por EPs do MS, com cada município favorecido, segundo áreas de alocação dos recursos, relativas ao período de 2015 a 2020. Trata-se de uma contribuição para estudos futuros sobre o financiamento e o gasto público em saúde no Brasil. Para tanto, a investigação metodológica se pautou em uma análise exploratória de relatórios de execução orçamentário-financeira do MS, do período de 2015 a 2020. Foram utilizadas três fontes de informação: i) o Siga Brasil, sistema de informação sobre o orçamento da União, de acesso público, mantido pelo Senado Federal; ii) uma planilha eletrônica disponibilizada pelo Fundo Nacional de Saúde (FNS), obtida a partir de solicitação de acesso à informação, contendo dados de execução por EP; e iii) o Painel FNS Emendas Parlamentares, que disponibiliza dados de execução de EP pelo MS via internet. Os procedimentos para a identificação das despesas por EP no Siga Brasil foram detalhados. O resultado da análise do relatório de cada uma dessas três fontes foi de que, segundo os critérios de acessibilidade, clareza metodológica, cobertura e consistência, o Siga Brasil é a fonte mais adequada para a obtenção de informações sobre as despesas por EP do MS com cada município favorecido. Procedimentos para a estimação da despesa em atenção básica e média e alta complexidade do período de 2015 a 2018 foram propostos, obtendo-se, ao fim, a despesa por EP do MS com cada município, segundo essas e outras áreas de alocação de recursos, para todo o período investigado (2015 a 2020). Conclui-se que o método proposto é factível e reprodutível, mas que problemas no registro das despesas pela administração pública federal afetam a transparência e a qualidade da informação, especialmente para os anos de 2015 e 2016. Palavras-chave: gastos em saúde; orçamentos; alocação de recursos para a atenção à saúde; governo federal; Sistema Único de Saúde.
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Resumo Em 2019, o governo brasileiro lançou uma nova política para a Atenção Primária à Saúde (APS) no Sistema Único de Saúde (SUS). Chamada de “Previne Brasil”, a política modificou o financiamento da APS para municípios. No lugar de habitantes e de equipes de Estratégia Saúde da Família (ESF), as transferências intergovernamentais passaram a ser calculadas a partir do número de pessoas cadastradas em serviços de APS e de resultados alcançados sobre um grupo selecionado de indicadores. As mudanças terão um conjunto de impactos para o SUS e para a saúde da população que precisaram ser identificados e monitorados. Neste artigo, discute-se os possíveis efeitos da nova política a partir de uma breve análise de contexto sobre tendências globais de financiamento de sistemas de saúde e de remuneração por serviços de saúde, bem como dos avanços, desafios e ameaças à APS e ao SUS. Com base na análise realizada, entende-se que a nova política parece ter objetivo restritivo, que deve limitar a universalidade, aumentar as distorções no financiamento e induzir a focalização de ações da APS no SUS, contribuindo para a reversão de conquistas históricas na redução das desigualdades na saúde no Brasil.
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O objetivo deste texto é analisar a alocação de recursos por meio de emendas parlamentares (EPs) no orçamento federal para o financiamento de despesas com ações e serviços públicos de saúde (ASPS) no período de 2015 a 2018. Realizou-se um estudo exploratório e descritivo da execução orçamentário-financeira do Ministério da Saúde (MS), tendo como foco os recursos que foram alocados a programas de saúde para o atendimento a beneficiários específicos (instituições públicas e privadas). Os dados foram obtidos do sistema SIGA Brasil, de acesso público, mantido pelo Senado Federal. Alguns indicadores foram calculados para apoiar a análise. Os resultados mostram que o MS empenhou um volume de despesas maior do que determina a regra do orçamento impositivo, e também despesas associadas a outras EPs, não obrigatórias, igualmente em valor muito elevado. Em 2018, por exemplo, o orçamento impositivo foi de R$ 4,4 bilhões, e as despesas empenhadas associadas a EPs totalizaram R$ 8,8 bilhões. Identificaram-se, além disso, a ampliação da alocação de recursos para custeio do Sistema Único de Saúde (SUS) por meio de EPs e o deficit de transparência na execução orçamentário-financeira dos recursos alocados ao incremento do Piso da Atenção Básica (PAB) e do Teto de Média e Alta Complexidade (Teto MAC). Houve aumento da destinação de recursos para o incremento do PAB e do Teto MAC no período analisado. Essas transferências passaram de R$ 240,1 milhões em 2014 para R$ 6,6 bilhões em 2018, em valores constantes, apresentando aumento de 2.650% no período. Ainda em 2018, os recursos alocados pelos parlamentares para aumento temporário do PAB e do Teto MAC corresponderam a 74,9% do total de despesas associadas a EPs (R$ 8,8 bilhões). Foram também constatadas desigualdades na alocação de recursos para custeio dos serviços, tanto do Teto MAC quanto do PAB – neste último caso, sem observância dos critérios alocativos vigentes. Conclui-se, por fim, que a alocação de recursos para custeio do SUS por meio de EPs pode estar gerando mais desigualdades na oferta de serviços de saúde no sistema, algo que precisa ser investigado detalhadamente em estudos futuros. Palavras-chave: Sistema Único de Saúde; alocação de recursos para a atenção à saúde; orçamentos; serviços de saúde; equidade na alocação de recursos; emendas parlamentares.
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Com base nos princípios de universalidade e igualdade e na diretriz da integralidade, o Sistema Único de Saúde (SUS) se constituiu como rede regionalizada e hierarquizada que reconhece a interdependência entre municípios e entre níveis de governo para garantir a oferta dos serviços. A União e os estados compartilham com os municípios as responsabilidades quanto à garantia do direito constitucional de acesso aos bens e serviços de saúde no país, ampliando a exigência de cooperação e coordenação das ações entre os três níveis de governo. Em um esforço de responder a essas questões, as relações intergovernamentais sofreram progressivas transformações desde a criação do sistema. Recentemente, em um contexto de redução do gasto social federal, ampliou-se a demanda por menor regulamentação da União, com adoção de alterações na forma de repasses dos recursos federais. Sob a luz da trajetória institucional das últimas três décadas, bem como da literatura sobre descentralização em saúde e sobre federalismo e políticas sociais, este Texto para Discussão se dedica a analisar a mudança ocorrida em 2017 sobre a forma como são feitos os repasses federais no SUS. Tendo em vista esses aportes, o estudo sublinha que os resultados da descentralização podem ser negativos para a eficiência na gestão e a equidade no acesso aos serviços de saúde. Enfatiza-se, ainda, a relevância dos arranjos e mecanismos de coordenação para a melhoria do resultado da política de saúde e da efetividade na gestão dos sistemas. Analisando o quadro de agravamento do financiamento do SUS, com a provável redução da participação da União na alocação de recursos em saúde, em virtude do congelamento de sua aplicação mínima pela Emenda Constitucional no 95, destaca-se o risco de transferência de maiores responsabilidades para estados e municípios, já premidos pelo subfinanciamento no setor. Como consequência da medida, pode-se enfrentar redução da capacidade de coordenação do sistema, perda de efetividade, aumento de competição e da fragmentação, além de crescimento da desigualdade de acesso aos bens e serviços de saúde no país.
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A discussao sobre o orcamento impositivo decorre da discricionariedade do Poder Executivo na alocacao de parte do orcamento. O ingresso desse tema na agenda decisoria evidencia a ocorrencia de uma janela de oportunidade, com um problema, uma solucao e um ambiente politico favoravel. A janela de oportunidade foi aberta pela mudanca das Presidencias das duas casas legislativas com predominância do PMDB no Congresso Nacional. O objetivo desse artigo e sistematizar informacoes que possam subsidiar a discussao sobre o tema. Para tanto, sao abordadas algumas das caracteristicas do atual modelo orcamentario e as possiveis implicacoes decorrentes da adocao do orcamento impositivo bem como serao propostos alguns aperfeicoamentos. A conclusao assinala que o aperfeicoamento de outros mecanismos institucionais ja existentes permitiria a correcao das falhas do orcamento tradicional de modo mais eficaz do que a adocao do orcamento impositivo.
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Antes da elaboração da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) 2023, as emendas parlamentares (EPs) do relator-geral, popularizadas como “orçamento secreto” da União, já eram objeto de polêmica, principalmente, em razão da falta de transparência. Em virtude das críticas, aventou-se a possibilidade de convertê-las em termos de execução orçamentária de autorizativas para impositivas, assim como ocorreu com as emendas individual e de bancada. Esse debate ainda permanece em curso no Congresso atualmente. Nesta nota técnica, demonstra-se que o fato de se tornar uma despesa impositiva não implicaria consequências substanciais em termos de execução orçamentária às EPs do relator-geral. Para tanto, analisamos o comportamento orçamentário das EPs que se converteram em impositivas (individuais e de bancada), enfocando os períodos anterior e posterior a essa conversão. Evidencia-se que imposição não é sinônimo de obrigação: mesmo após a mudança legal, a execução financeira dessas emendas não alcançou a plenitude do montante autorizado; de fato, ficaram muito aquém deste. Além da introdução, o trabalho apresenta, na segunda seção, uma breve exposição das principais peculiaridades das EPs vigentes (a saber, individual, de bancada, de comissão permanente e do relator-geral). Na terceira seção, analisam-se, além das dotações, as execuções orçamentárias e financeiras das EPs individual e de bancada, identificando a dinâmica dos pagamentos, inclusive, a do “passivo flutuante” (restos a pagar – RAPs). Na quarta seção – considerações finais –, ofertam-se, além das conclusões da nota técnica, os principais pontos da investigação.
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Este trabalho aborda aspectos institucional-constitucionais do sistema federal brasileiro com vistas a tratar do problema da equalização regional. O foco de análise desta investigação será a articulação entre as atribuições fiscais constitucionais (incluindo a repartição das competências tributárias e as principais transferências correlatas) e a tarefa de equalização regional no Brasil, a partir de uma perspectiva de estudo institucional comparado envolvendo Estados Unidos, Alemanha e Brasil.Palavras-chave: federalismo fiscal, Constituição, equalização
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Legislative responsiveness to constituent demands is integral to the concept of representation. Yet, research on district‐focused legislative behavior and priorities, such as allocating resources to districts, has largely ignored constituent demand as an explanatory variable. In this article, we propose a demand‐based theory of district‐targeted legislative resource allocation. The theoretical model suggests that district demand for legislative resources is determined by the district’s relative deprivation of such resources and that legislators have an electoral incentive to respond to district demand due to the credit‐claiming opportunities associated with doing so. These possibilities are tested with region‐wide mass and elite survey data from Latin America, and the results suggest that constituent demand is not only a normatively but also an empirically important predictor of district‐focused legislative behavior.
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The objectives of this paper are twofold. First, we investigate whether politicians use resources from the federal budget to maintain and expand their political capital. Second, we examine whether such strategy is rewarded by voters. Do they vote for politicians who assist their municipalities through federal expenditures? We use data from legislative elections in Brazil, a country that does not use a single member district system to form its Chamber of Deputies. We use a regression discontinuity approach by exploring the results of close elections for the Chamber of Deputies. Our findings indicate that politicians tend to favor municipalities that were important to their elections and that voters support candidates who have brought resources to their localities.