ArticlePDF Available

Cidade Matarazzo e suas transformações na paisagem urbana local da cidade de São Paulo/SP-Brasil: um estudo descritivo

Authors:

Abstract and Figures

Muitos projetos imobiliários geram conflitos entre a população local e o capital imobiliário. O Projeto Cidade Matarazzo na região central da cidade de São Paulo/SP-Brasil contava com intervenções arquitetônicas, como a construção de um boulevard e um espaço de convivência aberto a todos na área do antigo Hospital Matarazzo. Também previa a criação de uma passagem subterrânea para veículos em um trecho da Rua São Carlos do Pinhal, ação inviabilizada por um processo judicial movido por duas associações de moradores de bairro. Assim, o presente artigo objetiva descrever o empreendimento Cidade Matarazzo e o conflituoso projeto da construção da mencionada passagem subterrânea para veículos. Trata-se de um estudo descritivo de abordagem qualitativa, baseada em revisão bibliográfica, análise documental e estudo de caso. Os resultados permitem preencher uma lacuna na literatura e foram expressos em três subitens que abarcam as descrições do histórico de ocupação da área de implementação do empreendimento, das etapas de aprovação do projeto e dos detalhes do empreendimento e da construção do túnel na Rua São Carlos do Pinhal. Os resultados apresentados poderão subsidiar futuros trabalhos acadêmicos que foquem no entendimento do conflito mencionado, bem como que se dediquem ao melhor entendimento de conflitos sociais e ambientais que envolvem diferentes agentes de produção do espaço urbano. PALAVRAS-CHAVE: Participação Popular. Conflito. NIMBY.
Content may be subject to copyright.
Periódico Técnico e Científico
Cidades Verdes
ISSN eletrônico 2317-8604, volume 11, número 29, 2023
141
Cidade Matarazzo e suas transformações na paisagem urbana local da
cidade de São Paulo/SP-Brasil: um estudo descritivo
Cidade Matarazzo and its transformations in the local urban landscape of the city of São
Paulo/SP-Brazil: a descriptive study
Cidade Matarazzo y sus transformaciones en el paisaje urbano local de la ciudad de São
Paulo/SP-Brasil: un estudio descriptivo
Helmo Franklin Alves de Freitas
Mestre, UNINOVE, Brasil.
Helmo.freitas@uni9.edu.br
Cristiano Capellani Quaresma
Professor Doutor, UNINOVE, Brasil.
quaresmacc@uni9.pro.br
Periódico Técnico e Científico
Cidades Verdes
ISSN eletrônico 2317-8604, volume 11, número 29, 2023
142
RESUMO
Muitos projetos imobiliários geram conflitos entre a população local e o capital imobiliário. O Projeto Cidade
Matarazzo na região central da cidade de São Paulo/SP-Brasil contava com intervenções arquitetônicas, como a
construção de um boulevard e um espaço de convivência aberto a todos na área do antigo Hospital Matarazzo.
Também previa a criação de uma passagem subterrânea para veículos em um trecho da Rua São Carlos do Pinhal,
ação inviabilizada por um processo judicial movido por duas associações de moradores de bairro. Assim, o presente
artigo objetiva descrever o empreendimento Cidade Matarazzo e o conflituoso projeto da construção da mencionada
passagem subterrânea para veículos. Trata-se de um estudo descritivo de abordagem qualitativa, baseada em revisão
bibliográfica, análise documental e estudo de caso. Os resultados permitem preencher uma lacuna na literatura e
foram expressos em três subitens que abarcam as descrições do histórico de ocupação da área de implementação do
empreendimento, das etapas de aprovação do projeto e dos detalhes do empreendimento e da construção do túnel
na Rua São Carlos do Pinhal. Os resultados apresentados poderão subsidiar futuros trabalhos acadêmicos que foquem
no entendimento do conflito mencionado, bem como que se dediquem ao melhor entendimento de conflitos sociais
e ambientais que envolvem diferentes agentes de produção do espaço urbano.
PALAVRAS-CHAVE: Participação Popular. Conflito. NIMBY.
ABSTRACT
Many real estate projects generate conflicts between the local population and the real estate capital. The Cidade
Matarazzo Project in the central region of the city of São Paulo/SP-Brazil had architectural interventions, such as the
construction of a boulevard and a living space open to all in the area of the former Matarazzo Hospital. It also provided
for the creation of an underground passage for vehicles on a stretch of São Carlos do Pinhal street, an action made
unfeasible by a lawsuit filed by two neighborhood residents' associations. Thus, this article aims to describe the Cidade
Matarazzo project and the conflicting project for the construction of the aforementioned underpass for vehicles. This
is a descriptive study with a qualitative approach, based on literature review, document analysis and case study. The
results allow filling a gap in the literature and were expressed in three sub-items that cover the descriptions of the
occupation history of the project implementation area, the project approval stages and the details of the project and
the construction of the tunnel on Rua São Carlos do pine forest. The presented results may subsidize future academic
works that focus on understanding the mentioned conflict, as well as dedicating to better understanding social and
environmental conflicts that involve different agents of urban space production.
KEYWORDS: Popular Participation. Confict. NIMBY.
RESUMEN
Muchos proyectos inmobiliarios generan conflictos entre la población local y el capital inmobiliario. El Proyecto Cidade
Matarazzo en la región central de la ciudad de São Paulo/SP-Brasil tuvo intervenciones arquitectónicas, como la
construcción de un boulevard y un espacio de vida abierto a todos en el área del antiguo Hospital Matarazzo. También
preveía la creación de un paso subterráneo para vehículos en un tramo de la Rua São Carlos do Pinhal, acción inviable
por una demanda presentada por dos juntas de vecinos del barrio. Por lo tanto, este artículo tiene como objetivo
describir el proyecto Cidade Matarazzo y el proyecto en conflicto para la construcción del paso inferior para vehículos
antes mencionado. Se trata de un estudio descriptivo con enfoque cualitativo, basado en revisión de literatura, análisis
de documentos y estudio de caso. Los resultados permiten llenar un vacío en la literatura y se expresaron en tres
subítems que cubren las descripciones de la historia de ocupación del área de implementación del proyecto, las etapas
de aprobación del proyecto y los detalles del proyecto y la construcción del túnel en Rua São Carlos do pinar. Los
resultados presentados pueden subsidiar futuros trabajos académicos que se enfoquen en la comprensión del conflicto
mencionado, así como que se dediquen a una mejor comprensión de los conflictos sociales y ambientales que
involucran diferentes agentes de producción del espacio urbano.
PALABRAS-CLAVE: Participación Popular. Conflicto. NIMBY.
Periódico Técnico e Científico
Cidades Verdes
ISSN eletrônico 2317-8604, volume 11, número 29, 2023
143
1 INTRODUÇÃO
Diversos empreendimentos imobiliários, em especial os de alto padrão, disputam o
uso do solo com os cidadãos e moradores do seu entorno, causando conflitos entre estes e o
empreendedor, seja do poder público ou da iniciativa privada.
Grande parte destes conflitos tem sido denominada pela literatura acadêmica como
efeito NIMBY, acrônimo em inglês para “not in my backyard” ou, em português, “não no meu
quintal”. Este fenômeno se manifesta de maneira contínua quando uma dada comunidade é
escolhida para receber uma determinada instalação que seja considerada perigosa ou que possa
gerar algum custo para os residentes (HERMANSSON, 2006).
Liu et al. (2018) apontam que a oposição ao uso da terra se dá em razão de fatores
como medo de riscos ambientais, de saúde e segurança, declínio da qualidade de vida e até
mesmo de danos à imagem e ao status estético da comunidade.
Analisando-se a literatura existente, percebe-se que os estudos m atribuído dois
sentidos antagônicos ao fenômeno NIMBY. Um primeiro grupo de trabalhos interpreta o
fenômeno NIMBY como uma síndrome, algo majoritariamente ruim ou contrário ao
planejamento urbano (Devine-Wright, 2013). Tal grupo entende que este fenômeno se trata de
ações prejudiciais por parte da população local e, que por estarem pautadas em interesses
egoístas, acabam por prejudicar o desenvolvimento urbano e os interesses coletivos (Gillroy,
1991; Kraft e Clary, 1991; Rabe, 1994 e Boholm, 2004).
Tais autores destacam que o fenômeno NIMBY se trata de oposição pela oposição, sem
embasamento técnico e que, embora manifestando-se externamente por meio do discurso da
proteção ambiental e da salvaguarda dos interesses da coletividade, na realidade, se baseia em
motivos egoístas e contrários ao desenvolvimento urbano e à modernização nacional.
Para Liu et al. (2018), ainda que os cidadãos possam ter uma boa consciência a respeito
de sua vizinhança e preocupações legítimas a respeito do impacto que determinada obra ou
empreendimento trará ao seu bairro, em muitas situações, a oposição não passa de mero
ativismo sociopolítico, cujos motivos não são legítimos.
Contudo, parte da literatura existente tem feito uma leitura positiva do fenômeno
NIMBY, relacionando-o à uma manifestação legítima e inerente ao processo democrático que,
pela participação popular, busca proteger os interesses coletivos contra os interesses dos
capitais que lucram com a produção e reprodução do espaço urbano.
Nesta direção, Mcclymont e O´hare (2008), Boholm (2004), Kingsnorth (2004) e Gibson
(2005) entendem o fenômeno NIMBY como ferramenta de expressão democrática, a qual
destaca a importância da inserção dos cidadãos nas ações de planejamento e de transformação
do espaço urbano na escala local.
Mcclymont e O´hare (2008) ressaltam a importância da participação popular na
tomada de decisões e na governança local, pois, estas pessoas estarão não apenas exercendo
seus direitos democráticos como também assumem uma responsabilidade cívica. Ainda
segundo o mesmo autor, “pessoas unidas em busca de um objetivo comum, até mesmo a
oposição de um desenvolvimento necessário, não devem necessariamente serem rejeitadas tão
sistematicamente como costumam ser”.
Diante das duas visões antagônicas a respeito das ações de oposição da população
local diante de um empreendimento que venha a causar algum tipo de impacto local, Gibson
Periódico Técnico e Científico
Cidades Verdes
ISSN eletrônico 2317-8604, volume 11, número 29, 2023
144
(2005) aponta que os conflitos entre os grupos locais e os idealizadores de projetos controversos
e que possam causar alterações nas características de uso e ocupação do solo, não são tão
simples de serem analisados, tendo em vista a dificuldade de se analisar os reais interesses dos
argumentos de qualquer uma das partes envolvidas.
Neste sentido, cada caso em que há uma situação de conflito gerada por uma reação
opositora por parte da população local diante de implantação de dado empreendimento
imobiliário precisa ser analisado de modo individualizado e com profundidade, para que se
possa verificar seu real conteúdo, bem como para que se possa caracterizá-lo como uma reação
pejorativa e egoísta, ou como um legítimo posicionamento democrático que se opõe a
empreendimentos que possam causar algum risco ou prejuízo à comunidade local.
Em tal contexto, insere-se o objeto de estudo do presente trabalho, a saber, o projeto
intitulado como Cidade Matarazzo, que se trata de um empreendimento imobiliário que ocupa
uma área de quase de 30 mil m², localizada nas proximidades da Av. Paulista, cidade de São
Paulo/SP-Brasil.
O Grupo Allard propôs a implantação do empreendimento denominado Cidade
Matarazzo, que abrigará o hotel-palácio Rosewwod São Paulo, um centro cultural, uma fashion
megastore com mais de 70 marcas exclusivas no Brasil, 34 pontos de gastronomia, entre outras
ações (CIDADE MATARAZZO, 2021).
Além das intervenções mencionadas, o projeto também previa a criação de um túnel
em um trecho da Rua São Carlos do Pinhal, entre a Alameda Rio Claro e a Rua Itapeva, e que
prometia uma integração entre esse ambiente e as pessoas que transitam na região, inclusive
da Av. Paulista, bem como previa a construção de um pequeno Oásis e um espaço de convivência
aberto a todos.
Tal obra gerou dúvidas nos moradores locais e do entorno, os quais passaram a
questionar a falta de audiências públicas para discussão do projeto, bem como a apontar falta
de transparência por parte do empreendedor e da municipalidade.
Diante dos impactos que o projeto traria à região, a população local buscou maiores
informações a respeito do empreendimento junto ao Ministério Público (MP), à Companhia de
Engenharia de Tráfego (CET) e a outros órgãos públicos.
Com o impasse gerado, em 09 de dezembro de 2019, a AMACON (Associação de
moradores do bairro da Consolação e adjacências) e AMORBELA (Associação união de
moradores do bairro da Bela Vista & Bixiga) moveram uma ação civil pública em face da
Municipalidade de São Paulo a fim de embargarem a obra, o que foi atendido pela justiça
paulista concedendo liminar para a sua paralisação.
Dentre os argumentos apontados pelas referidas associações destacam-se: a) ausência
de chamamento público para a apresentação e discussão do projeto, por parte da
municipalidade, fazendo com que a tomada de decisões se restringisse exclusivamente aos
empreendedores e à municipalidade, sem que a sociedade civil fosse devidamente ouvida; b) a
construção do túnel mencionado seria prejudicial aos moradores e à cidade como um todo, uma
vez que impactaria o trânsito de forma negativa; c) a falta de respeito aos ditames legais por
parte da administração pública no que concerne à aprovação do projeto do túnel, fato que veio
a favorecer os interesses do empreendedor privado em detrimento dos interesses dos
moradores locais.
Por outro lado, a municipalidade nos autos do processo judicial que tratava do caso
Periódico Técnico e Científico
Cidades Verdes
ISSN eletrônico 2317-8604, volume 11, número 29, 2023
145
em questão, declarou que o projeto Cidade Matarazzo, também conhecido como “Boulevard da
Diversidade” obedeceu a todos os objetivos, diretrizes e estratégias da ordenação da paisagem
do município de São Paulo e que todas as etapas foram, portanto, cumpridas com total
publicidade, tudo conforme as exigências legais.
Do ponto de vista judicial, o processo foi extinto sem o julgamento do mérito, uma vez
que o Empreendedor desistiu de continuar com a ação, abrindo mão, portanto, da construção
do túnel. Uma vez que houve essa desistência e que não ocorreu uma decisão de mérito, o
judiciário não deliberou a respeito do tema, deixando de apreciar se de fato a questão trazida
ao seu conhecimento comportava razão aos moradores ou não.
Ao realizar-se busca por artigos acadêmicos que analisassem o empreendimento
Cidade Matarazzo nas bases Scielo, Web of Science e Google Scholar, verificou-se que, apesar
da relevância do projeto, estudos inerentes ao mesmo são praticamente inexistentes. Os poucos
trabalhos encontrados, no entanto, não permitem uma descrição detalhada e baseada em
devida análise documental e levantamento bibliográfico, tal como proposta pelo presente
artigo.
A falta de uma descrição coerente das ações e mudanças propostas pelo projeto
dificulta o entendimento da questão e impossibilita a elaboração de outros estudos que possam
contribuir para com a compreensão do conflito mencionado, bem como para o esclarecimento
dos reais interesses em jogo.
Assim, visando contribuir nesta direção, o presente artigo objetiva descrever o
empreendimento Cidade Matarazzo e o projeto da construção da passagem subterrânea para
veículos, que se constituiu no objeto do conflito entre o empreendedor imobiliário e as
associações de bairro AMACON e AMORBELA.
Deste modo, espera-se que os resultados da descrição ora apresentada permitam
subsidiar futuros trabalhos acadêmicos que foquem no entendimento do conflito mencionado,
com vias a esclarecer se este refletiu interesses individualistas e contrários ao desenvolvimento
urbano, ou, por outro lado, se tratou-se de manifestação legítima do exercício democrático de
produção do espaço urbano pela comunidade local.
2 METODOLOGIA
2.1 Caracterização e delineamento da pesquisa
Com relação a seu objetivo, a metodologia adotada no presente trabalho pode ser
classificada como descritiva, tendo em vista que, de acordo com Triviños (2008) e Gil (2015),
trabalhos descritivos são aqueles que buscam descrever os fatos e fenômenos de determinada
realidade.
Em relação à abordagem, o presente estudo pode ser classificado como qualitativo,
tratando-se daquele em que a experiência pessoal, a intuição e o ceticismo atuam de maneira
conjunta, com vias a auxiliar no aperfeiçoamento das teorias (STAKE, 2016).
Em relação aos procedimentos utilizados, adotou-se o Estudo de Caso (Bauer e Gaskell,
2017; Severino, 2017; Yin, 2015), apoiado nos instrumentos técnicos de revisão de literatura e
análise documental. De acordo com Yin (2005, p.17), estudo de caso trata-se de uma
investigação empírica e profunda a respeito de determinado fenômeno contemporâneo, a ser
Periódico Técnico e Científico
Cidades Verdes
ISSN eletrônico 2317-8604, volume 11, número 29, 2023
146
analisado em seu contexto real e onde os limites entre o fenômeno e o contexto não o
claramente observados.
Neste sentido, adotou-se o projeto Cidade Matarazzo como estudo de caso da presente
dissertação, mais especificamente o projeto de construção do túnel em um trecho da Rua São
Carlos do Pinhal, conforme mencionado na introdução do presente artigo.
2.2 Área de Estudo
O objeto de estudo trata-se do empreendimento Cidade Matarazzo, localizado em uma
área de quase de 30 mil m², localizada nas proximidades da Av. Paulista, e limitada por quatro
vias, a saber, Rua São Carlos do Pinhal, Alameda Rio Claro, Rua Itapeva e Rua Pamplona bairro
da Bela Vista subprefeitura - Região Central da Cidade de São Paulo/SP-Brasil, conforme
figura 1.
Figura 1 Mapa de localização Cidade Matarazzo São Paulo/SP - Brasil
Fonte: os autores, 2022
O mapa ilustrado pela figura 1 visa demonstrar a localização da quadra objeto de
estudo do presente trabalho, que se encontra destacada na legenda com linha tracejada de cor
verde, entre as vias urbanas mencionadas. A sequência de mapas abaixo do mapa principal tem
Periódico Técnico e Científico
Cidades Verdes
ISSN eletrônico 2317-8604, volume 11, número 29, 2023
147
por objetivo situar o leitor em relação à localização da área de estudo nos territórios federal,
estadual e municipal. Na elaboração do mapa buscou-se destacar em cor vermelha apenas as
principais vias que fazem divisa com o empreendimento, bem como a avenida Paulista, tendo
em vista a sua importância econômica história e atual.
A área de instalação do projeto trata-se do terreno do antigo Hospital e Maternidade
Umberto I, anteriormente denominado Hospital Matarazzo, o qual foi construído pela “Societá
Italiana de Beneficenza in San Paolo”, contando com investimento do empresário Francisco
Matarazzo (Francesco Antonio Maria Matarazzo) e que foi inaugurado no ano de 1904. As
demais edificações do complexo foram construídas nos anos seguintes até meados da década
de 70. Nas décadas seguintes, houve um processo de decadência, concomitante à desativação
das indústrias Matarazzo, culminando no fechamento oficial do complexo no ano de 1993
(HETEM, 2020).
O imóvel foi vendido no mês de julho de 2011 “para uma Sociedade de Propósito
Específico, formada pelos Grupos Allard e WWI, por R$ 117 milhões” (PREVI, 2011). O Grupo
Allard, de acordo com Hetem (2020), pertence à Alexandre Allard, cidadão francês, nascido nos
Estados Unidos. De acordo com a referida autora, o mencionado Grupo, que possui atividades
em diferentes ramos, tais como, moda, mídia, arte, e setores imobiliário e hoteleiro, teve intensa
atuação na compra e reforma de edificações antigas e hotéis na cidade de Paris/França, à
exemplo do Le Royal Moceau e do Hotel Particulier de Pourlatès, os quais passaram a contar
com infraestrutura e serviços luxuosos.
2.3 Procedimento de coleta de dados
Para atingir o objetivo mencionado no item Introdução, a saber “descrever o
empreendimento Cidade Matarazzo e o projeto da construção da passagem subterrânea para
veículos, que se constituiu no objeto do conflito entre o empreendedor imobiliário e as
associações de bairro AMACON e AMORBELA”, realizou-se levantamento bibliográfico e análise
documental.
A análise documental se baseou no Processo Judicial nº 1068553-59.2019.8.26.0053,
mais especificamente o documento Plano de Trabalho Referencial (PTR). Além disso, a análise
documental também se baseou na Resolução SC 29/86, de 30 de julho de 1986, do Conselho de
Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado de São Paulo,
publicado no DOE 01/08/86.
3 RESULTADOS
3.1 Cidade Matarazzo: Histórico de Ocupação
A área de instalação do projeto trata-se do terreno do antigo Hospital e Maternidade
Umberto I, anteriormente denominado Hospital Matarazzo, o qual foi construído pela “Societá
Italiana de Beneficenza in San Paolo”, contando com investimento do empresário Francisco
Matarazzo (Francesco Antonio Maria Matarazzo) e que foi inaugurado no ano de 1904. As
demais edificações do complexo foram construídas nos anos seguintes até meados da década
de 70. Nas décadas seguintes, houve um processo de decadência, concomitante à desativação
Periódico Técnico e Científico
Cidades Verdes
ISSN eletrônico 2317-8604, volume 11, número 29, 2023
148
das indústrias Matarazzo, culminando no fechamento oficial do complexo no ano de 1993
(HETEM, 2020).
Ainda de acordo com Hetem (2020), desde 1985 verificou-se possibilidades de
demolição, sob as justificativas de tratar-se de local de relevada importância, sendo disputado
pelos empreendedores imobiliários.
Contudo, o Hospital foi tombado pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico,
Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado de São Paulo (CONDEPHAAT) em 1986. Os
argumentos para o tombamento foram: a) por tratar-se de um remanescente altamente
representativo das instituições organizadas pelos imigrantes italianos fixados na cidade de São
Paulo; b) por ter exercido papel de destaque no atendimento médico-hospitalar da população
trabalhadora da cidade; c) por sua qualidade de atendimento, especialmente a maternidade; d)
por seu destaque na formação profissional na ciência médica e no seu pioneirismo em algumas
atividades hospitalares na cidade de São Paulo; e) tendo em vista seu conjunto arquitetônico
harmonioso e que remonta às origens italianas do hospital; f) por seu valor ambiental, tendo em
vista ser o único espaço de dimensões significativas no entorno da Avenida Paulista, que não
passou por processo de verticalização (CONDEPHAAT, 1986).
A área ocupada pelo complexo hospitalar era composta por: 1) Núcleo original do
Hospital Humberto I, construído em 1904; 2) Casa de Saúde Francisco Matarazzo (1915); 3)
Capela (1922); 4) Casa de Saúde Ermelino Matarazzo (1925); 5) Cozinha, Lavanderia e Refeitório
(1929); 6) Residência das Irmãs, Ambulatórios e Enfermarias (anterior a 1930); 7) Clínica
Pediátrica Amélia de Camilis (1935); 8) Pavilhão Vitório Emanuelle III (1937); 9) Maternidade
Condessa Filomena Matarazzo (1943); 10) Ampliação do prédio Hospitalar (1974);
Lanchonete/Lojas; 12) Estacionamento (CONDEPHAAT, 1986).
Em 1975, o Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e
Ambiental da Cidade de São Paulo (CONPRESP) qualificou o conjunto arquitetônico do antigo
Hospital Umberto I como Zona Especial de Preservação Cultural, bem como definiu diretrizes
detalhadas em relação ao que ser preservado, especialmente no que diz respeito ao Hospital e
a Capela (HETEM, 2020).
Nos anos 70, as indústrias Matarazzo enfrentaram uma crise, que as fazem reduzir a
destinação de recursos de assistência ao Hospital, que passa a contar com doações de outros
beneméritos, bem como do governo por meio do Instituto Nacional de Assistência Médica da
Previdência Social -INAMPS (CONCEIÇÃO, 2019).
O hospital passou por uma crise financeira no ano de 1986, a qual levou ao fechamento
de suas portas até o ano de 1988, quando retornou às suas atividades com o nome de Fundação
Hospital Ítalo Brasileiro Umberto I. Neste período, a família Matarazzo move um processo
judicial contra a instituição devido à execução de uma hipoteca feita por esta em favor do grupo
Matarazzo (CONCEIÇÃO, 2019).
Após o seu fechamento definitivo no ano de 1993, por conta do processo de decadência,
o imóvel foi adquirido no ano de 1996 pela Caixa de Previdência dos Funcionários do Banco do
Brasil (Previ), a qual tinha planos de vendê-lo com vias à construção de um hotel de luxo e de
um shopping center. Entretanto, os elevados custos da reforma, somados com as limitações de
alterações impostas pelo tombamento, bem como com a ação civil por parte dos moradores do
bairro Bela Vista que se colocaram contrários à realização da obra, o imóvel permaneceu
abandonado e sujeito a invasões e saques (CREMESP, 2009).
O imóvel foi vendido no mês de julho de 2011 “para uma Sociedade de Propósito
Específico, formada pelos Grupos Allard e WWI, por R$ 117 milhões” (PREVI, 2011). O Grupo
Allard, de acordo com Hetem (2020), pertence à Alexandre Allard, cidadão francês, nascido nos
Estados Unidos. De acordo com a referida autora, o mencionado Grupo, que possui atividades
em diferentes ramos, tais como, moda, mídia, arte, e setores imobiliário e hoteleiro, teve intensa
atuação na compra e reforma de edificações antigas e hotéis na cidade de Paris/França, à
Periódico Técnico e Científico
Cidades Verdes
ISSN eletrônico 2317-8604, volume 11, número 29, 2023
149
exemplo do Le Royal Moceau e do Hotel Particulier de Pourlatès, os quais passaram a contar
com infraestrutura e serviços luxuosos.
3.2 Cidade Matarazzo: etapas de aprovação do projeto
O Grupo Allard propôs a implantação do empreendimento denominado Cidade
Matarazzo, que “além de abrigar o hotel-palácio Rosewwod São Paulo, trará um centro cultural
de primeiro mundo, uma fashion megastore com mais de 70 marcas exclusivas no Brasil, 34
pontos de gastronomia, e mais” (CIDADE MATARAZZO, 2021).
Além das intervenções mencionadas, o projeto também previa a criação de um túnel
em um trecho da Rua São Carlos do Pinhal, entre a Alameda Rio Claro e a Rua Itapeva, e que
prometia uma integração entre esse ambiente e as pessoas que transitam na região, inclusive
da Av. Paulista, bem como previa a construção de um pequeno Oásis e um espaço de convivência
aberto a todos.
O projeto Cidade Matarazzo começou a ser realizado através de acordo de cooperação
entre a Associação São Paulo Capital da Diversidade e a Prefeitura de São Paulo, com
investimento exclusivamente privado. Para viabilização do projeto Cidade Matarazzo, em 2016,
foi apresentada à municipalidade a análise urbanística do Boulevard e do túnel na Rua São Carlos
do Pinhal contendo a avaliação do impacto de vizinhança ao condomínio do edifício Miami
Center quando da construção do referido Boulevard e do túnel.
O túnel, inicialmente, estava projetado com três faixas de tráfego com um acesso
exclusivo ao Edifício Brazilian Financial Center localizado no cruzamento da rua Itapeva com a
rua São Carlos do Pinhal, desembocando no tabuleiro do viaduto sobre a Avenida 9 de Julho.
A princípio, a Companhia de Engenharia de Tráfego (CET), por meio do processo
administrativo PMSP SMT 2016-0.250.576-0 e parecer técnico de análise urbanística, foi
contrária à construção do túnel, uma vez que não garantiria compatibilidade entre os
movimentos necessários na intersecção da Rua São Carlos do Pinhal com a Rua Itapeva, pois, as
vias seriam estranguladas em função das saídas do túnel proposto.
Ante a impossibilidade da construção do túnel nos moldes inicialmente propostos, a CET
fez uma série de questionamentos de caráter técnico com pontos a serem observados, de forma
que, em fevereiro de 2019, novo pedido administrativo a respeito do projeto foi apresentado à
Comissão de Proteção à Paisagem Urbana (CPPU), órgão da Prefeitura composto por
representantes do poder público e membros da sociedade civil, responsável, dentre outras
coisas, pela análise de elementos inseridos na paisagem urbana.
Esse novo projeto foi aprovado e passou a ser denominado de “requalificação urbana”
de trecho da Rua São Carlos do Pinhal, Alameda das Flores e Alameda Rio Claro, cujo parecer
deste órgão deliberava por unanimidade pelo deferimento do projeto de requalificação urbana,
sugerindo, porém, algumas diretrizes para detalhamento e implantação do projeto, como por
exemplo: estudar soluções para os trechos de calçada situados junto aos acessos e saídas do
túnel, bem como adotar padrões e critérios relativos à técnicas construtivas e materiais para
construção ou reparo dos pavimentos das calçadas, dentre outros.
O deferimento do processo de requalificação urbana foi publicado no Diário Oficial da
Cidade de São Paulo em 1º de março de 2019, sendo que, após este ato, a subprefeitura da
publicou o edital de chamamento público com vias à: (a) tornar pública a celebração das
propostas de parceria da Municipalidade de São Paulo com o empreendedor do projeto; (b)
buscar o melhor projeto para formalização do acordo de cooperação entre a Cidade de São Paulo
e a Associação São Paulo Capital da Diversidade (responsável pelo projeto Cidade Matarazzo);
(c) possibilitar a participação do referido chamamento público pelas organizações da sociedade
civil; (d) verificar a capacidade financeira do financiador do projeto.
Desta forma, o acordo de cooperação entre o poder público municipal e o
empreendimento foi firmado possibilitando, portanto, a construção do túnel, onde a Associação
Periódico Técnico e Científico
Cidades Verdes
ISSN eletrônico 2317-8604, volume 11, número 29, 2023
150
São Paulo Capital da Diversidade (SPCD), idealizadora do empreendimento, apresentou projeto
técnico pormenorizado intitulado “Plano de Trabalho Referencial (PTR) Acordo de
Cooperação” no qual explicita todos os passos do projeto.
3.3 O projeto Cidade Matarazzo e a Construção do Túnel
Segundo o PTR, um novo espaço público seria construído com aproximadamente 9.850
dedicados à convivência, entretenimento, lazer, cultura e inclusão social junto à Avenida
Paulista. Segundo os idealizadores, o projeto promoveria a diversidade e a integração social,
cujo espaço público ficaria aberto 24 horas por dia.
Ainda de acordo com o PTR, para viabilização da requalificação do espaço público, seria
necessária a passagem em desnível na Rua São Carlos do Pinhal, entre a Rua Pamplona e a Rua
Itapeva, pois, segundo esse documento, isso possibilitaria “Um nível de acesso exclusivo para o
automóvel, com melhor desempenho da fruição carroçável a partir da eliminação dos semáforos
atualmente existentes”.
O documento ainda destaca que a referida passagem subterrânea seria fundamental ao
oferecimento de um espaço dedicado ao pedestre. Tal espaço contaria com “renovação
completa do piso, das áreas ajardinadas e arborizadas”. Além disso, contaria também com
“novos espaços de lazer, convivência, entretenimento e arte”. Contaria também com “novos
mobiliários urbanos, intensificação da arborização no espaço público com árvores nativas,
dentre outros revestimentos arbustivos e rasteiros, nova iluminação pública, quiosques
dedicados a um mercado de orgânicos, banheiros públicos, e um novo sistema de drenagem
urbana”.
A figura 2 visa ilustrar a disposição, em planta, do projeto de requalificação do espaço
urbano inerente ao empreendimento Cidade Matarazzo.
Figura 2. Boulevard da Diversidade: Requalificação do Espaço Urbano.
Fonte: Plano de trabalho referencial Acordo de Cooperação (2019).
De acordo com a figura 2, pode-se perceber à direita o projeto Cidade Matarazzo,
limitado pelas ruas o Carlos do Pinhal, Pamplona, Itupeva e Alameda Rio Claro. Pode-se
perceber a presença do túnel na rua São Carlos do Pinhal e o projeto do Boulevard da
Diversidade sobre esta via. Percebe-se também que o túnel permitiria a eliminação superficial
da Rua São Carlos do Pinhal entre o mencionado empreendimento, o BFC (Brasilian Financial
Periódico Técnico e Científico
Cidades Verdes
ISSN eletrônico 2317-8604, volume 11, número 29, 2023
151
Center) e a Avenida Paulista. O BFC Paulista trata-se do antigo prédio do Banco Real bastante
conhecido dos paulistanos em função das decorações natalinas aos finais de ano. O BFC,
localizado ao lado da estação do metrô Trianon-Masp, é classificado como edifício Buildings
Triple A sendo considerado um dos melhores edifícios da Cidade e sede de grandes empresas
do segmento bancário e financeiro (Casarões e Edifícios, 2021).
Com a construção do túnel e a criação do Boulevard, a passagem interligando o prédio
ao boulevard seria possível de ser realizada a pé, integrando o empreendimento à Av. Paulista,
uma das metas do empreendedor. A execução da passagem em desnível tinha por objetivo
requalificar o fluxo viário e a mobilidade carroçável na Rua São Carlos do Pinhal eliminando
cruzamentos e semaforização
Segundo os empreendedores, o projeto levava em consideração todas as normas de
segurança e manutenção, sendo que o novo pavimento foi projetado para suportar o tráfego de
caminhões com sistema de drenagem urbana e com adequado tratamento de compactação do
solo.
A figura 3 ilustra um recorte transversal à Rua São Carlos do Pinhal, possibilitando a
visualização da passagem subterrânea e do Boulevard da Diversidade que seria construído acima
deste.
Figura 3. Boulevard da Diversidade e passagem do Túnel em corte transversal.
Fonte: Plano de trabalho referencial Acordo de Cooperação (2019).
O PTR ainda detalhava outras características a respeito do empreendimento, a saber: a)
Iluminação pública por meio de luminárias e postes e balizadores; b) Amplo mobiliário urbano
contendo bancos, mesas, cadeiras, quiosques e carrinhos para mercado de orgânicos; c) A
instalação de pontos de acesso gratuito à internet via Wi-Fi no boulevard público, de forma a
propiciar inclusão digital dos cidadãos presentes no Boulevard; d) A retirada das árvores
comprometidas, sob orientação técnica de SVMA Secretaria Municipal do Verde e Meio
Ambiente e SMSUB Secretaria Municipal das Subprefeituras, com a respectiva compensação
arbórea bem como com a previsão de plantação arbóreo adicional, levando-se em consideração
as espécies mais adequadas aos espaços públicos; e) Projeto de drenagem urbana nos subleitos
do Boulevard, calçadão e via carroçável (Alameda Rio Claro), de forma a viabilizar um sistema
de retardo de águas pluviais; f) Enterramento da fiação elétrica e de redes de telecomunicações
em toda o Boulevard; g) Criação de mercado de orgânicos no espaço público de forma a propiciar
Periódico Técnico e Científico
Cidades Verdes
ISSN eletrônico 2317-8604, volume 11, número 29, 2023
152
a inclusão social através da geração de empregos para venda dos produtos bem como para a
produção orgânica daqueles que produzem em fazendas de orgânicos ou hortas urbanas.
O acordo de cooperação firmado entre os atores envolvidos previa recursos
exclusivamente privados onde a municipalidade não entraria com nenhum recurso financeiro,
cuja execução do projeto seria realizada em 3 etapas, a saber: 1) Construção do túnel na Rua
São Carlos do Pinhal, sem custos para o Município de São Paulo; 2) Construção do Boulevard
público e do Mercado de Orgânicos ao longo da Alameda Rio Claro e na superfície do túnel da
Rua São Carlos do Pinhal, entre a Alameda das Flores e Alameda Rio Claro (Parque das Flores);
3) Projeto de manutenção e conservação do Boulevard público bem como a manutenção dos
pontos de acesso à internet. Previsão de operação do Mercado de Orgânicos e realização de
atividades culturais e educacionais.
Segundo os idealizadores do Projeto Cidade Matarazzo e do Boulevard da Diversidade,
o projeto atendia ao interesse público pela administração municipal, com vistas à transformação
do espaço urbano bem como dos hábitos das pessoas que transitam na região de forma a
promover valores de cidadania, tais como, inclusão social, cultura e educação, proteção ao meio
ambiente e sustentabilidade.
O projeto arquitetônico do Boulevard da Diversidade foi realizado pelo escritório de
arquitetura Levinsky Arquitetos Estratégia Urbana que propôs em seu projeto a requalificação
urbana e melhoramento viário da Alameda das Flores, Alameda Rio Claro, trecho da Rua São
Carlos do Pinhal e trecho da Rua Itapeva.
No que se diz respeito a Etapa 1, a saber, a construção do túnel na Rua São Carlos do
Pinhal, o empreendedor visava propiciar um tráfego de veículos mais fluído e dedicar uma área
para pedestres.
Ao final da execução do referido túnel e após a assinatura do Termo de Aceitação pela
municipalidade o túnel seria efetivamente entregue à Cidade de São Paulo cessando as
responsabilidades do empreendedor relativas à manutenção e guarda do viário municipal,
cabendo tais responsabilidades ao município de São Paulo.
A figura 4 ilustra os elementos citados na Etapa 2, a saber, a construção do Boulevard
público (figura 4-a) e do Mercado de Orgânicos (figura 4-b) ao longo da Alameda Rio Claro e na
superfície do túnel da Rua São Carlos do Pinhal, entre a Alameda das Flores e Alameda Rio Claro
(Parque das Flores).
Figura 4. Vista superior representativa do Boulevard da Diversidade.
Fonte: Plano de trabalho referencial Acordo de Cooperação (2019).
A figura 4-a ilustra o aspecto visual pretendido com a implementação do projeto de
construção do Túnel e do Boulevard da Diversidade. Nela, pode-se perceber a existência de
mobiliário urbano permitindo maior fruição das pessoas, bem como a integração do espaço ao
verde, por meio do projeto paisagístico. Percebe-se também como ficaria a entrada do Túnel da
Rua São Carlos do Pinhal.
Periódico Técnico e Científico
Cidades Verdes
ISSN eletrônico 2317-8604, volume 11, número 29, 2023
153
A figura 4-b ilustra um recorte transversal à Alameda das Flores, entre os edifícios Eluma
e BFC. Sobre a referida Alameda, pode-se perceber o espaço destinado ao Mercado Orgânico.
No que diz respeito ao Boulevard em si, os aspectos técnicos levados em consideração
quando de sua concepção foram: circulação de veículos de segurança, como ambulâncias,
viaturas policiais e de corpo de bombeiros, caminhões de manutenção urbana e de
concessionárias de serviços públicos.
No tocante à Etapa 3, o projeto previa obrigações do empreendedor relativas à
manutenção e conservação do total do Boulevard, tais como limpeza, jardinagem, infraestrutura
e mobiliário em geral. De igual maneira, previa-se a contratação de organizações da sociedade
civil sem fins lucrativos a fim de realizarem atividades de proteção ao meio ambiente e de
promoção da sustentabilidade.
Também havia a previsão de implantação de 30 a 60 quiosques de produtos de
diferentes tipos, preferencialmente orgânicos e de diferentes produtores. Além da venda de
produtos orgânicos, o Mercado Orgânico, por sua vez, por meio de parcerias e contratações,
promoveria a integração de projetos sociais envolvendo pessoas em situação de
vulnerabilidade, produtores locais e de agricultura familiar.
Além disso, aponta-se que o projeto previa a possibilidade de feiras de artesanato de forma a
ressaltar o caráter cultural de artesãos brasileiros, bem como a promoção de atividades
socioculturais gratuitas, como oficinas, cursos, exposições, de maneira a possibilitar à população
que frequenta o local experiências e reflexões a partir da perspectiva da diversidade da cidade.
Quanto ao público-alvo, o projeto Cidade Matarazzo pretendia atingir toda a população
que habita ou transita na região. A entrada do Boulevard ficaria na Av. Paulista por ser uma das
vias mais importantes da Cidade de São Paulo, centro financeiro e com grande número de
instituições culturais, com amplas áreas comerciais e principal via acolhedora de eventos de
grande porte da cidade.
De acordo com os idealizadores, “o Boulevard da Diversidade vem justamente criar esse espaço
de vida na região da Paulista, trazendo uma área de bem-estar e lazer, com mais natureza e
cultura, promovendo encontros de diferentes gerações, públicos e comunidades que por ali
transitam” (PTR, 2019).
De acordo com o empreendedor, o Boulevard serviria dentre outras coisas, de
verdadeira oportunidade para que o cidadão pudesse vivenciar a diversidade em vários aspectos
(cultural, social, etário, geracional, geográfico etc.). O PTR expõe que a gratuidade das atividades
evitaria a discriminação de qualquer espécie aos cidadãos de menor poder aquisitivo,
promovendo, desta forma, a igualdade na cidade.
Além de todas as atividades de entretenimento, como cultura, lazer e gastronomia, o espaço
também traria oportunidade de caráter educativo oferecendo experiências de práticas
sustentáveis no espaço urbano, como utilização de materiais sustentáveis, sistema de
iluminação pública em LED (Light-Emiting Diode), drenagem urbana com captação das águas das
chuvas etc. de maneira a informar aos frequentadores do local a respeito de tais práticas de
forma a promover a reflexão sobre responsabilidade ambiental, social e urbana.
Para o empreendedor, o projeto Cidade Matarazzo era plenamente justificável uma vez
que trazia consigo a integração entre espaços públicos e privados, com acessibilidade e
integração social e cultural, o que traria melhoria para as vias públicas locais, facilitando o
trânsito de veículos e de pedestres, bem como atrairia novos visitantes à área.
4 CONCLUSÕES
O presente artigo descreve o empreendimento Cidade Matarazzo e o projeto da
construção da passagem subterrânea para veículos na Rua São Carlos do Pinhal na região da Av.
Paulista, cidade de São Paulo/SP-Brasil.
Periódico Técnico e Científico
Cidades Verdes
ISSN eletrônico 2317-8604, volume 11, número 29, 2023
154
Trata-se de um empreendimento de alto padrão, constituído pela construção de um
hotel de luxo, um centro cultural, um complexo de lojas com mais de setenta marcas exclusivas
no Brasil, e trinta e quatro pontos de gastronomia. Além disso, o projeto também previa a
construção do referido túnel em um trecho da Rua São Carlos do Pinhal, entre a Alameda Rio
Claro e a Rua Itapeva, e que prometia, em sua superfície, uma integração entre esse ambiente
e as pessoas que transitam na região da Av. Paulista. Previa-se também a construção de um
Boulevard, dedicado ao pedestre e que contaria com novos mobiliários urbanos e projeto
paisagístico, além da implantação de um mercado de orgânicos, de instalação de iluminação
pública, banheiros públicos e sistemas de drenagem urbana.
Entretanto, o projeto do túnel conflituou com os interesses da população local, gerando
um processo judicial movido por duas associações de bairro (AMORBELA e AMACON), no ano
de 2019. A judicialização resultou na desistência do empreendedor na construção da referida
passagem subterrânea.
Tendo em vista que houve a desistência por parte do empreendedor e que não ocorreu
uma decisão de mérito, o judiciário não deliberou a respeito do tema, deixando de apreciar se
de fato a questão trazida ao seu conhecimento comportava razão aos moradores ou não.
Neste sentido, considerando a literatura existente sobre o fenômeno NIMBY, o presente
trabalho destaca a importância de futuros estudos que busquem entender o conflito
mencionado, com vias a esclarecer se este refletiu interesses individualistas e contrários ao
desenvolvimento urbano, ou, por outro lado, se tratou-se de manifestação legítima do exercício
democrático de produção do espaço urbano pela comunidade local.
Contudo, conforme discutido, ao realizar-se busca por artigos acadêmicos que
analisassem o empreendimento Cidade Matarazzo nas bases Scielo, Web of Science e Google
Scholar, verificou-se que, apesar da relevância do projeto, estudos inerentes ao mesmo são
praticamente inexistentes. Os poucos trabalhos encontrados, no entanto, não permitem uma
descrição detalhada e baseada em devida análise documental e levantamento bibliográfico, tal
como proposta pelo presente artigo.
Os resultados apresentados neste trabalho permitem contribuir para o preenchimento
desta lacuna, baseando-se em dados provenientes de revisão de literatura, bem como de análise
documental.
Os resultados foram expressos em três subitens que abarcam as descrições do histórico
de ocupação da área de implementação do empreendimento, das etapas de aprovação do
projeto e dos detalhes do empreendimento e da construção do túnel na Rua São Carlos do
Pinhal.
Deste modo, espera-se que os resultados da descrição ora apresentada permitam
subsidiar futuros trabalhos acadêmicos que foquem no entendimento do conflito mencionado.
Indica-se que, para futuros estudos, sejam incorporados dados de observação de campo
aos resultados ora apresentados.
5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BOHOLM, Åsa. Editorial: what are the new perspectives on siting controversy? Journal of Risk Research, v. 7, n. 2,
p. 99-100, mar. 2004. Disponível em: https://doi.org/10.1080/1366987042000158677.
CASARÕES E EDIFÍCIOS. 2021. Disponível em: 01 de outubro de 2022.
CIDADE MATARAZZO. 2021. Disponível em: <https://cidadematarazzo.com.br/menu/>. Acesso em: 28 de setembro
de 2022.
Periódico Técnico e Científico
Cidades Verdes
ISSN eletrônico 2317-8604, volume 11, número 29, 2023
155
CONCEIÇÃO, T. T. D. da, Hospital Matarazzo: Um Patrimônio em Transformação. In: IX Seminário Nacional do Centro
de Memória, Unicamp - Campinas, 2019.
CONDEPHAAT. Resolução SC 29/86, 30 de julho de 2000. Secretaria de Cultura. 1986. Acesso em 20 de setembro de
2022.
CREMESP. Informativos do CREMESP. Edição 256 de 01 de fevereiro de 2009. Acessado em 20 de setembro de 2022.
HETEM, Natália; ZEIN, Ruth Verde. Cidade Matarazzo: feito por quem. Seminario Internacional de Investigación en
Urbanismo, jun. 2020. Disponível em: https://doi.org/10.5821/siiu.9722.
DVOŘÁK, Tomáš. The use of local direct democracy in the Czech Republic: how NIMBY disputes drive protest
behaviour. Local Government Studies, v. 44, n. 3, p. 329-349, fev. 2018. Disponível
em: https://doi.org/10.1080/03003930.2018.1433661.
GIBSON, Timothy A. NIMBY and the Civic Good. City & Community, v. 4, n. 4, p. 381-401, dez. 2005. Disponível
em: https://doi.org/10.1111/j.1540-6040.2005.00144.x.
GIL, Antonio Carlos; VERGARA, Sylvia Constant. Tipo de pesquisa. Universidade Federal de Pelotas. Rio Grande do
Sul, 2015.
GILLROY, John Martin. “Moral Considerations and Public Policy Choices: Individual Autonomy and the Nimby
Problem.” Public Affairs Quarterly, vol. 5, no. 4, 1991, pp. 31932. JSTOR, http://www.jstor.org/stable/40435785.
HERMANSSON, Hélène. The Ethics of NIMBY Conflicts. Ethical Theory and Moral Practice, v. 10, n. 1, p. 23-34,
1 nov. 2006. Disponível em: https://doi.org/10.1007/s10677-006-9038-2.
KINGSNORTH, P. Nimbys are the true democratic heroes. The New Statesman, 20040503.
http://newstatesman.com/20045030018.
KRAFT, Michael E.; CLARY, Bruce B. Citizen Participation and the Nimby Syndrome: Public Response to Radioactive
Waste Disposal. The Western Political Quarterly, v. 44, n. 2, p. 299, jun. 1991. Disponível
em: https://doi.org/10.2307/448780.
LIU, Zhilin; LIAO, Lu; MEI, Ciqi. Not-in-my-backyard but let’s talk: Explaining public opposition to facility siting in
urban China. Land Use Policy, v. 77, p. 471-478, set. 2018. Disponível
em: https://doi.org/10.1016/j.landusepol.2018.06.006.
MCCLYMONT, Katie; O'HARE, Paul. “We're not NIMBYs!” Contrasting local protest groups with idealised conceptions
of sustainable communities. Local Environment, v. 13, n. 4, p. 321-335, jun. 2008. Disponível
em: https://doi.org/10.1080/13549830701803273.
POL, Enric. A gestão ambiental, novo desafio para a psicologia do desenvolvimento sustentável. Estudos de
Psicologia (Natal), v. 8, n. 2, p. 235-243, ago. 2003. Disponível em: https://doi.org/10.1590/s1413-
294x2003000200005.
PREVI. Bons negócios. Revista Previ, 2011. Disponível em: <https://www.previ.com.br/revista/edicao/indice-
detalhes 2C9FBF8D76DEBB330176F452D0FB6663-00.htm>. Acesso em: 28, setembro de 2022.
RABE, Barry George. Beyond nimby: Hazardous waste siting in Canada and the United States. Washington, D.C:
Brookings Institution, 1994. 199 p. ISBN 0815773080.
RIBEIRO, Hilton Manoel Dias; BITTENCOURT, Jamille Limeira. Democracia, crescimento e o fator civismo. Revista
Brasileira de Políticas Públicas, v. 12, n. 1, 2 maio 2022. Disponível em: https://doi.org/10.5102/rbpp.v12i1.7571.
ResearchGate has not been able to resolve any citations for this publication.
Article
Full-text available
This work aims to evaluate the relationship between democracy and economic growth, incorporating the factor “civism” in the analysis. Based on two models, one of ordered logistic regression and the other of panel data, we seek to identify whether the “level of civism” increases the likelihood of individuals being of the “democratic” type; in the cut-out for countries, if the “level of civism”, associated with the representative variable of democracy, are linked to economic growth. The results reveal, for the selection of individuals, that political participation, political interest and interest in community issues are positively associated with the measure of democracy. The results for the country cut indicate that: (i) the variable “democracy” alone has no significant association with the gross domestic product per capita; (i) when the measure of democracy is associated with the “level of civism”, these prove to be positively associated with the economic variable (GDP per capita). The importance of informal institutions for the effectiveness of political institutions is not new in the literature and empirical analyzes can collaborate with theoretical discussions. Thus, the results suggest that the factor “civism” may constitute an important value for the debate on the relationship between democracy and economic growth.
Article
Full-text available
Policy scholars dedicated to efficient urban and industrial planning have long tried to understand the “NIMBY syndrome” in order to overcome local resistance to controversial land uses. However, environmental policy scholars have begun to rethink the NIMBY syndrome, arguing that the concept is authority-centered and reduces land-use disputes to a moral struggle between rational/civic-minded planners and irrational/self-interested opponents. After describing a struggle over locating homeless services in Seattle, this paper extends this larger critique to disputes over human service facilities and argues that the NIMBY syndrome framework fails to capture the political and ethical complexities of locating human services. A conclusion examines how critical sociologists can still critique imbalances of political–economic power in the planning process without deploying the NIMBY syndrome nomenclature.
Article
Full-text available
Todo projeto industrial, desenvolvimento urbano ou oferta de serviço implica modificações em seu entorno, um impacto ambiental que pode afetar mais do que o local físico. Essas mudanças podem ser gestionadas positivamente, para minimizar seu impacto, ou podem ser ignoradas, deixando que o meio alterado (físico e social) siga seu curso, normalmente em um processo de degradação cada vez mais acelerado. A forma atual de entender a gestão ambiental remete ao conjunto de ações preventivas e paliativas para minimizar os efeitos ambientais da atividade humana. A gestão ambiental é antes de tudo gestão do comportamento humano, tanto dentro como fora das organizações. A pergunta que devemos nos fazer é se a Psicologia Ambiental tem suficiente bagagem - ou se está disposta a desenvolvê-la - para fazer frente ao desafio e assumir a responsabilidade de estar presente na gestão ambiental. Este artigo revisa algumas novas propostas nesse campo.
Article
Over the past 15 years there has been an increase in the use of local direct democracy in the Czech Republic. The analysis shows that the primary cause has been the regulation of development projects. Using transaction costs economics (TCE) approach it is shown how the regulation related to the siting of development projects leads to a not-in-my-backyard (NIMBY) response resulting in political activism that uses institutions of local direct democracy. Drawing from the TCE perspective, in this article it is argued that the key sources of this political mobilisation have been the existence of contractual hazards related to development projects and an inability to form credible commitments between developers and communities. The article highlights a previously neglected explanation for the increased use of direct democracy because sources outside the political system often go unnoticed and contributes to the research on NIMBY disputes and on the expansion of direct democracy.
Um Patrimônio em Transformação
  • T T D Conceição
  • Hospital Da
  • Matarazzo
CONCEIÇÃO, T. T. D. da, Hospital Matarazzo: Um Patrimônio em Transformação. In: IX Seminário Nacional do Centro de Memória, Unicamp -Campinas, 2019.
SC 29/86, 30 de julho de 2000. Secretaria de Cultura. 1986. Acesso em 20 de setembro de 2022
  • Condephaat
  • Resolução
CONDEPHAAT. Resolução SC 29/86, 30 de julho de 2000. Secretaria de Cultura. 1986. Acesso em 20 de setembro de 2022.
Informativos do CREMESP. Edição 256 de 01 de fevereiro de
CREMESP. Informativos do CREMESP. Edição 256 de 01 de fevereiro de 2009. Acessado em 20 de setembro de 2022.
Moral Considerations and Public Policy Choices: Individual Autonomy and the Nimby Problem
  • John Gillroy
  • Martin
GILLROY, John Martin. "Moral Considerations and Public Policy Choices: Individual Autonomy and the Nimby Problem." Public Affairs Quarterly, vol. 5, no. 4, 1991, pp. 319-32. JSTOR, http://www.jstor.org/stable/40435785.
The Ethics of NIMBY Conflicts. Ethical Theory and Moral Practice
  • Hélène Hermansson
HERMANSSON, Hélène. The Ethics of NIMBY Conflicts. Ethical Theory and Moral Practice, v. 10, n. 1, p. 23-34, 1 nov. 2006. Disponível em: https://doi.org/10.1007/s10677-006-9038-2.