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Diretrizes de Políticas Públicas para o Ensino Superior 2022

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Abstract

A necessidade de formulação de uma política pública clara, consistente e de longo prazo para o ensino superior brasileiro, considerada como política de Estado e não de governo, tem levado o Semesp a criar Grupos de Trabalho integrados por acadêmicos e especialistas nacionais e internacionais com trajetórias relevantes na educação, para contribuir com sugestões para o estabelecimento de novas diretrizes capazes de fomentar a realização de mudanças estruturais no sistema de ensino superior do país. As primeiras sugestões foram apresentadas em 2017, com a primeira versão do documento Diretrizes de Política Pública para o Ensino Superior Brasileiro, elaborado por um grupo de renomados acadêmicos e especialistas , que teve uma versão ampliada em 2018. Esta versão do documento Diretrizes de Política Pública para o Ensino Superior Brasileiro é a terceira lançada pelo Semesp. Seus conteúdos e propostas foram formulados no início de 2022, por um Grupo de Trabalho integrado pelos conceituados acadêmicos e especialistas Simon Schwarztman (Instituto de Estudos de Política Econômica - Casa das Garças - Rio de Janeiro), Cristina Albuquerque (Universidade de Coimbra), Paulo Meyer Nascimento (IPEA), José Antonio Mendes (FHO), Sérgio Fiuza de Mello Mendes Filho (CESUPA), João Otávio Bastos Junqueira (UNIFEOB), Paulo Nogas (PUCPR), Mario Neto Borges (UFSJ), Cristina Elsner de Faria (Embaixada da Austrália), Maria Alice Carraturi (Conselho Estadual de Educação-SP), Guiomar Namo de Melo (Conselho Estadual de Educação-SP), Cleunice Rehem (BRASILTEC), João Paulo Echeverria (Covac Advogados), José Roberto Covac (Semesp), Rodrigo Capelato (Semesp) e Fábio Reis (Semesp), muitos dos quais já haviam contribuído para a elaboração das versões anteriores. O trabalho realizado a convite do Semesp atualiza os conteúdos anteriores e apresenta uma série de propostas objetivas em sete áreas fundamentais para o sistema de ensino superior (governança, regulação, avaliação, financiamento, educação profissional, formação de professores e ciência e internacionalização), por meio de abordagens de curto, médio e longo prazo. O objetivo do documento é sugerir e influenciar a formulação de políticas públicas que garantam ao ensino superior brasileiro maior eficácia e eficiência, reflitam melhor as diversas necessidades de aprendizagem dos alunos, ampliem a capacidade de desenvolver massa crítica de classe mundial em todas as áreas acadêmicas, financiem o ensino superior de forma sustentável e equitativa para assegurar uma participação mais ampla e com maior equidade de acesso, e estimulem as instituições a cooperar e colaborar para benefício mútuo, permitindo com isso transformar o Brasil em uma nação plenamente desenvolvida, em 20 anos, a partir dos pilares da educação, da ciência e da internacionalização.
Diretrizes
de Política Pública
para o Ensino
Superior Brasileiro
2022
2022
ÍNDICE
01. Apresentação ........................................................................................................... 4
02. Introdução .................................................................................................................. 6
03. Governança ............................................................................................................... 6
04. Regulação .................................................................................................................10
05. Avaliação ...................................................................................................................14
06. Financiamento ..................................................................................................... 18
07. Educação Profissional e Tecnológica ............................................... 25
08. Formação de Professores ............................................................................30
09. Ciência e Internacionalização .................................................................36
Diretrizes
de Política Pública
para o Ensino
Superior Brasileiro
2022
4
Diretrizes de Política
Pública para o Ensino
Superior Brasileiro 2022
01.APRESENTAÇÃO
A necessidade de formulação de uma política pública consistente e de longo
prazo para o ensino superior brasileiro, considerada como política de Estado
e não de governo, tem levado o Semesp a criar Grupos de Trabalho, para fazer
sugestões de novas diretrizes capazes de fomentar a realização de mudanças
estruturais no sistema de ensino superior do país.
As primeiras sugestões foram apresentadas em 2017, com o lançamento da
publicação Diretrizes de Política Pública para o Ensino Superior Brasileiro. O
documento foi elaborado por um grupo de renomados acadêmicos e espe-
cialistas1, e teve uma versão ampliada em 2018.
A versão de 2018 serviu como fonte de discussão em diversos encontros de
educação nacionais e internacionais, entre os quais o 2º Congresso de Políticas
Públicas para o Ensino Superior, realizado em março de 2018, no CRUB, em Bra-
sília, com a participação de associações representativas do setor, como ABIEE,
ABRUC, ACAFE, ANEC, ANUP, COMUNG.
Seu conteúdo foi apresentado no fórum de debates que antecedeu a abertura
da III Conferência Regional de Educação Superior organizada pela IESALC-U-
NESCO, em junho de 2018, em Córdoba, na Argentina, cujo programa teve a
participação do Semesp. E também foi encaminhado como uma contribuição
do Semesp por ocasião da participação da sua presidente, Lúcia Teixeira, que
representou o Brasil e fez proposições na 3ª Conferência Mundial sobre Ensino
Superior, organizada pela UNESCO em maio de 2022, em Barcelona, na Espanha.
1Claudio Rama (consultor); Simon Schwartzman (Instituto de Estudos de Política Econômica - Casa das Garças - Rio de Janeiro); Liz Reisberg (Boston College); João Otávio Bastos Jun-
queira (UNIFEOB); Sérgio Fiúza de Mello Mendes (CESUPA); Ana Maria Costa de Sousa (consultora); Rodrigo Capelato (Semesp); Fábio Reis (Semesp) e Carlos, Battesti (Convergência), cujo
trabalho foi complementado por um grupo de colaboradores consultados sobre temas específicos de sua especialidade, do qual fizeram parte José Roberto Covac (Semesp); Renée
Zicman (FAUBAI - Associação Brasileira de Educação Internacional); Jose Lourenço Jr. (Furukawa Brasil); Jeferson Vinhas Ferreira (UNICESUMAR); José Moran (USP); Samuel Pessoa (IBRE/
FGV); Maria Cristina dos Santos Filho (Unisal); Maria Aparecida Felix do Amaral (consultora); Marcio Sanchez (EASP/FGV); Rui Curi (Unicsul); Guilh erme Mar back (UFB A); Vidal M artins
(PUCPR); Felipe Flausino de Oliveira (UNIS) e Paulo Fossatti (Unilassale); bem como pela contribuição de organizações nacionais e internacionais, como a ABED e o Departa-
mento de Educação e Treinamento do Governo da Austrália.
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Esta é a terceira versão do documento lançado pelo Semesp. Seus conteú-
dos e propostas foram formulados, no início de 2022, pelos conceituados aca-
dêmicos e especialistas Simon Schwartzman (Instituto de Estudos de Política
Econômica - Casa das Garças - Rio de Janeiro), Cristina Albuquerque (Univer-
sidade de Coimbra), Paulo Meyer Nascimento (IPEA), José Antonio Mendes
(FHO), Sérgio Fiuza de Mello Mendes (CESUPA), João Otávio Bastos Junqueira
(UNIFEOB), Paulo Sergio Macuchen Nogas (PUCPR), Mario Neto Borges (UFSJ),
Cristina Elsner de Faria (Embaixada da Austrália), Maria Alice Carraturi (Con-
selho Estadual de Educação-SP), Guiomar Namo de Melo (Conselho Estadual
de Educação-SP), Cleunice Rehem (BRASILTEC), João Paulo Echeverria (Covac
Advogados), José Roberto Covac (Semesp), Rodrigo Capelato (Semesp), Fábio
Reis (Semesp) e Carlos Battesti (Convergência), convidados pela presidente
Lúcia Teixeira, muitos dos quais já haviam contribuído para a elaboração das
versões anteriores.
O objetivo do documento é sugerir e influenciar a formulação de políticas pú-
blicas que garantam ao ensino superior brasileiro maior eficácia e eficiência,
permitindo com isso transformar o Brasil em uma nação plenamente desen-
volvida em 20 anos, a partir dos pilares da educação, da ciência e da interna-
cionalização.
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02. INTRODUÇÃO
O trabalho realizado pelos especialistas a convite do Semesp atualiza com uma
série de propostas objetivas os tópicos já formulados nas versões anteriores
do documento em sete áreas fundamentais para o sistema de ensino supe-
rior: governança, regulação, avaliação, financiamento, educação profissional,
formação de professores e ciência e internacionalização.
As propostas estão apresentadas por meio de abordagens que buscam com-
binar a necessidade de expansão da educação superior de qualidade com a
grande diferenciação institucional característica do sistema de ensino superior
brasileiro.
O Semesp considera que a política pública a ser estabelecida para o ensino
superior brasileiro deve representar um marco sistêmico de diretrizes de Es-
tado, elaborado com a participação efetiva das instituições representativas da
sociedade e que reflita o consenso entre o setor público e setor privado. Cabe
à política pública apresentar propostas para os principais desafios do sistema
de ensino superior, para que o Estado possa assumir uma agenda que indique
a organização do sistema, o contexto em que estão inseridas as propostas e
suas tendências, bem como as mudanças que serão realizadas, expressando
uma visão de futuro, como a aqui apresentada.
03. GOVERNANÇA
Contextualização:
A palavra governança refere-se ao sistema pelo qual as instituições são admi-
nistradas para que cumpram seus objetivos. Ela inclui as regras formais que
definem os diferentes níveis de autoridade e responsabilidade dentro da ins-
tituição, assim como os mecanismos de alocação de recursos e controle, mas
também o processo pelo qual os objetivos da instituição são efetivamente
buscados e atingidos.
O ensino superior no Brasil é proporcionado por inúmeras instituições públicas
e privadas, com status de universidades, centros universitários e faculdades, e
graus diferentes de autonomia. Esse conjunto variado de instituições desen-
volve atividades de pesquisa, ensino de pós-graduação e graduação, formação
técnica e profissional, em diferentes graus.
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Todas essas instituições são coordenadas e supervisionadas pelo governo –
federal ou estadual –, que exerce um papel regulador por meio de um sistema
de normas legais, regulamentos, recursos financeiros e mecanismos de ava-
liação e acompanhamento, além de regras de credenciamento, autorização e
reconhecimento. Os objetivos de política pública para o setor incluem formar
recursos humanos de qualidade, estimular a pesquisa e a inovação, prover ser-
viços de apoio e extensão à comunidade local, e garantir a liberdade de ensino
e pesquisa e a equidade de acesso à educação superior.
A tendência do governo de tratar de forma homogênea as diferentes realida-
des dessa grande variedade de instituições resulta em um sistema de normas
administrativas extremamente complexo e burocrático, no qual a formalidade
do seu cumprimento prevalece sobre o atendimento aos objetivos do ensino
superior para o país, e que deixa de contemplar a variedade de características
das IES nos seus processos de financiamento, avaliação e acreditação.
Propostas:
1. Prossionalismo
A governança nas instituições de ensino superior públicas e privadas deve
privilegiar o profissionalismo, por meio de um modelo no qual a gestão seja
ocupada preferencialmente por pessoas que tenham perfil de liderança, capa-
cidade de gestão de organizações e visão estratégica, e que propicie:
• Transparência no planejamento, execução e controle de seus recursos
e atividades;
• Prestação de contas que transmita com clareza a gestores, docentes,
estudantes e sociedade os resultados gerados para garantir a susten-
tabilidade da IES;
• Responsabilidade econômica, social e ambiental
O modelo proposto deverá ser baseado em organogramas mais horizontais e
estimular uma governança com estilo empreendedor, a exemplo de sistemas
adotados por instituições de países como EUA, Inglaterra, Dinamarca, Finlândia
e Austrália, e que permita às IES públicas e privadas:
• Ampliar suas fontes de receita;
• Intensificar a cooperação com o setor privado;
• Expandir seus serviços e negócios com os diversos setores da sociedade.
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Estilo empreendedor não significa a privatização da IES pública ou a mercan-
tilização do ensino superior privado, mas sim um instrumento para ampliar a
relevância e a cooperação das IES com a sociedade, em especial com os seto-
res produtivos.
Para tanto, é recomendável que as instituições mantenham um conselho de
administração ou consultivo com a participação de pessoas que ocupem fun-
ções representativas na sociedade, e que possam colaborar de forma efetiva
com as macroestratégias do seu planejamento institucional.
Para o setor público, é necessário dotar as instituições de um formato legal
diferenciado do serviço público, com patrimônio próprio, regras próprias de
administração de recursos e de contratação e demissão de pessoal acadêmico
e administrativo.
No setor privado, as instituições que recebem subsídios e benefícios públicos
nas diversas modalidades de renúncia fiscal, crédito educativo e crédito edu-
cativo para os alunos devem ter sua autonomia acadêmica e financeira combi-
nada com regras estritas de transparência no uso dos recursos.
2. Autonomia
A autonomia acadêmica, administrativa, financeira e patrimonial das universi-
dades, assegurada pela Constituição Federal, na prática não se exerce devido,
por um lado, às limitações impostas às instituições públicas pelas regras do
serviço público referentes a suas atividades, por outro, às normas e regulamen-
tos que restringem a atuação das IES privadas. Essas limitações vão além da ga-
rantia de boas práticas e incidem indevidamente sobre questões curriculares,
criação de cursos e outras.
Em relação à autonomia, propõe-se que a governança:
• Redefina a relação das IES públicas e privadas com o Estado;
• Permita às instituições reformular suas estratégias de gestão de seus
recursos humanos e infraestrutura para se tornarem competitivas e
eficientes;
• Envolva compromissos institucionais com resultados, cumprimento
de metas e prestação de contas.
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3. Responsabilidade e transparência
As instituições que recebem recursos públicos, inclusive na forma de isenção
de impostos e financiamento estudantil, devem ter a responsabilidade de
cumprir os objetivos para as quais foram criadas ou são financiadas. Para tanto,
propõe-se:
• Manutenção por essas instituições de um sistema de informações so-
bre o uso de recursos e resultados que permita que seu desempenho
seja acompanhado pelos responsáveis pela sua governança;
• Substituição do atual sistema de avaliação por outro que considere os
diferentes objetivos das instituições e inclua indicadores de qualidade,
funcionando como uma prestação de contas para a própria institui-
ção, para a comunidade em que atua e para a sociedade, conforme
proposto no capítulo Avaliação destas Diretrizes (pág. 14).
4. Pluralidade de governança, supervisão e avaliação
No atual sistema, o governo federal é responsável pela manutenção das ins-
tituições federais e pela supervisão de todo o setor privado, deixando para os
governos estaduais a supervisão das instituições estaduais e municipais. Há
um problema insolúvel de gigantismo, pela incapacidade do governo federal
em administrar os milhares de instituições que estão sob sua alçada.
A proposta é evoluir para um sistema plural de governança e avaliação, como
ocorre em outros países de dimensão continental. Nesse novo sistema, as IES
poderão:
• Definir seus regimes internos de governança e desenvolver seus cur-
sos como considerarem mais adequado, com flexibilidade para aten-
der a padrões espelhados em standards internacionais para fins de
competitividade, tendências tecnológicas e abordagens interculturais;
• Manter sistemas independentes de avaliação externa e credencia-
mento profissional dos estudantes, que reconheçam e abram espaço
para o dinamismo do mercado de trabalho e das profissões.
5. Mais ênfase nos estudantes e menos nas instituições
O foco principal de uma política pública para o ensino superior deve estar
nos estudantes, e não nas instituições. Estudantes carentes demandam apoio
financeiro e estudantes de alto desempenho necessitam de apoio e estímulo,
assim como as áreas de estudo e pesquisa prioritárias. Ao mesmo tempo, ban-
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cos de dados e recursos de computação permitem às agências do governo
acompanhar e apoiar diretamente os estudantes, fazendo com que busquem
as instituições de sua preferência e direcionando para as mesmas os recursos
necessários.
Ainda que não substitua totalmente a necessidade de apoiar as instituições di-
retamente, propõe-se que este tipo de apoio e estimulo possa funcionar com
um mecanismo adicional pelo qual as instituições se adaptem para atender
melhor os diferentes tipos de estudantes que os recebem prioritariamente.
6. Processo de transição
A nova política pública para o ensino superior deverá promover uma revisão e
simplificação do emaranhado legal e infralegal que hoje caracteriza a legisla-
ção brasileira de ensino superior, bem como das estruturas burocrático-admi-
nistrativas existentes no Ministério da Educação, dando ênfase aos fins, e não
aos meios.
A proposta não é substituir abruptamente o atual sistema por um novo, mas
instituir um processo de transição que coloque o sistema de governança da
educação brasileira a par com os sistemas dos países desenvolvidos, nos quais
já vigora o entendimento da importância da boa governança.
Esse processo de transição requer uma liderança do MEC que tenha:
• Legitimidade para receber apoio do ensino superior público e privado,
e de outros segmentos cujos interesses são afetados pelo setor, como
o de ciência e tecnologia e o empresarial;
• Clareza nos objetivos de médio e longo prazo;
• Apoio e capacidade de diálogo com outros setores do governo, para
obter as modificações legais e dos sistemas de financiamento que se
façam necessários.
04. REGULAÇÃO
Contextualização:
O setor da educação no Brasil, como em diversos países do mundo, se situa no
plano constitucional como uma obrigação do Estado e, para além do caráter
público que essa circunstância impõe, atrai a iniciativa privada como um vetor
de viabilização das demandas sociais relacionadas ao ensino em todos os níveis.
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Uma nova política pública para o ensino superior deve levar em conta que a
Constituição Federal diz que o ensino é livre a iniciativa privada”, e que estão
gravados no texto constitucional alguns princípios que garantem:
• Liberdade econômica na oferta de ensino superior;
• Coexistência de instituições públicas e privadas;
• Igualdade de condições de acesso à educação e de qualidade do en-
sino;
• Pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas.
Considerando que, na prática, se verifica algo muito diferente, é necessário
que na nova política para o ensino superior a atividade regulatória não seja
burocrática e exagerada, como a estabelecida atualmente pelo Ministério da
Educação (MEC), ou suas Secretarias e órgãos vinculados, INEP, CAPES e CNE,
e funcione apenas na definição de marcos gerais para a atividade regulada,
respeitando os princípios da Constituição Federal e assegurando, também:
• Normas aplicáveis aos diferentes tipos de instituição, com a observân-
cia da sua missão, organização acadêmica e regionalidade, garantindo
a autonomia universitária correspondente;
• Estímulo à criação de um sistema de acreditação independente;
• Regulação especial para projetos inovadores;
• Simplificação dos processos autorizativos de reconhecimento de cur-
sos, assim como de credenciamento e recredenciamento de institui-
ções;
• Unificação do conceito de modalidade de ensino presencial e a dis-
tância;
• Redefinição de metas para a atuação do próprio agente, que não deve
ser mero executor de tarefas;
• Representação paritária nos espaços democráticos que tratam da
questão regulatória.
Propostas:
1. Liberdade econômica e aprovação tácita
Diferentemente de outros setores regulados, as instituições de ensino superior
aguardam sem prazo definido a aprovação de pedidos de autorização, licen-
ciamento e credenciamento (ou recredenciamento) protocolados junto ao
MEC. A situação desrespeita a liberdade econômica presente na Constituição
Federal, nos termos do art. 209, e disciplinada pela Lei n. 13.874/19, pela qual
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as solicitações feitas pela iniciativa privada serão tacitamente aprovadas quan-
do forem superados os prazos limites estabelecidos pelos órgãos regulatórios
correspondentes, como ocorre com os demais setores econômicos.
Nesse sentido, propõe-se que:
• O MEC deverá exercer a sua função reguladora com respeito a prazos
nos termos da legislação, com a definição do prazo de 1 (um) ano para
a conclusão dos processos autorizativos, após o qual será conferida a
aprovação tácita às solicitações promovidas pelas instituições de ensi-
no superior, ainda que nos limites dos critérios avaliativos.
2. Representação paritária em colegiados
Embora represente 77,5% das matriculas na educação superior do país, a repre-
sentatividade do setor privado de ensino superior não é considerada de forma
adequada nos Conselhos, órgãos colegiados e demais espaços democráticos
que tratam das questões regulatórias, cuja composição deveria ser preenchida
por representantes de todos os setores envolvidos, como ocorre naturalmente
com os demais órgãos regulatórios de outros setores.
Desse modo, propõe-se que:
• As entidades representativas do segmento privado da educação supe-
rior terão assento obrigatório, de forma paritária, na composição desses
organismos.
3. Avaliação virtual
Com relação aos processos de avaliação, é fundamental considerar que, diante dos
avanços tecnológicos atuais, a avaliação in loco não pode mais ser o referencial
exclusivo para a regulação, nos termos da Lei do Sinaes (Lei n. 10.861/2004).
Nesse sentido, propõe-se que:
• Os processos avaliativos também serão concebidos de forma virtual,
na medida em que podem oferecer ao órgão regulador os mesmos
critérios e rigores com a utilização de ferramentas tecnológicas para
aferição espacial e documental das instituições;
• Os relatórios de autoavaliação serão considerados referências para a
regulação e para o consequente ato autorizativo, conforme proposto
no capítulo Avaliação destas Diretrizes (pág. 14).
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4. Autonomia para remanejamento de vagas de cursos tecno-
lógicos dentro do mesmo eixo
O número de alunos em cursos superiores de tecnologia no Brasil, apesar do
crescimento observado desde 2017, ainda representa pouco mais de 15% das
matrículas no ensino superior. Para atingir a meta do PNE de 33% de taxa de
escolarização líquida até 2024, o Brasil precisará contar com as graduações tec-
nológicas, além dos tradicionais bacharelados de maior duração.
Considerando que as graduações em cursos superiores de tecnologia têm
uma dinâmica muito diferente dos bacharelados, com demandas sazonais que
se esgotam muito mais rapidamente, o que desestimula a oferta desses cursos
pelas instituições; que essa situação acaba onerando a Seres e o INEP para cada
novo curso solicitado ou aberto, propõe-se:
• Autonomia para as IES poderem remanejar vagas de cursos tecnoló-
gicos dentro do mesmo eixo, sem a exigência atual de autorização,
como forma de estimular a oferta de graduações tecnológicas.
. Unicação de modalidades de ensino
Embora o art. 80 da LDB e sua regulamentação tenham criado a divisão entre
as modalidades de ensino presencial e a distância (EAD), ao longo do tempo,
com o desenvolvimento do ambiente regulatório, tanto o ensino presencial
quanto o ensino a distância passaram a interagir de maneira constante, seja
com a exigência de percentuais mínimos de presencialidade no EAD, seja com
a possibilidade de fracionamento do ensino presencial com disciplinas a dis-
tância.
Considerando que já existem diversas formulações normativas no sentido de
estabelecer limites de presencialidade na modalidade EAD, bem como limites
de atividades remotas e a distância nos cursos presenciais; que prevalece no
mercado a oferta de diversos modelos de ensino (híbrido, semipresencial ou
flex); e que já está consolidado que os diplomas de uma e outra modalidade
não guardam qualquer distinção, propõe-se:
• Unificação das modalidades, contemplando apenas ensino superior,
e permitindo que cada IES defina o modelo de curso que vai oferecer,
nos limites regulatórios de cada curso.
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05. AVALIAÇÃO
Contextualização:
A Lei 10.861/2004 implantou o Sistema Nacional de Avaliação da Educação
Superior (Sinaes), atribuindo à Comissão Nacional de Avaliação da Educação
Superior (Conaes) a competência para estabelecer diretrizes, critérios e estraté-
gias para o processo de avaliação das IES. No tocante à avaliação da qualidade
da pós-graduação e da pesquisa, os instrumentos de avaliação propostos pela
CAPES estabelecem os referenciais de qualidade.
A expectativa de uma implantação virtuosa do Sinaes, no entanto, não se
confirmou. A centralidade do processo avaliativo atribuída ao Exame Nacional
de Desempenho dos Estudantes (Enade) gerou distorções inadequadas. O
Conceito Preliminar de Curso (CPC) e o Índice Geral de Cursos (IGC), instituídos
em 2008, reproduziram os problemas de falta de padrões de referência de de-
sempenho do Enade e dizem pouco sobre a qualidade de um curso, apontan-
do somente sua posição relativa em relação aos demais.
O Brasil abriga diferenças entre suas unidades federativas e, para se promover
a indução à qualidade em ambientes desiguais, é necessário que se busque
o aperfeiçoamento e a correção de distorções dos processos avaliativos por
meio da revisão do Enade, do CPC e do IGC, que se revelam insuficientes e
inapropriados para expressar todas as dimensões da avaliação dispostas na lei
que instituiu o Sinaes em realidades locais tão diversificadas.
O Semesp considera necessária a implantação de uma nova política pública
para a avaliação do ensino superior que, ao contrário da atual, de modelo úni-
co, contemple o ensino público e o privado em relação a suas individualidades,
diferenças e autonomia, com o reconhecimento e a valorização dos seguintes
aspectos fundamentais das IES:
• Adoção de diferentes formas de governança;
• Valorização da sua Missão, refletida em suas ações, identidade, voca-
ção e diversidade de cursos de graduação e pós-graduação;
• Compromisso com a comunidade e sua responsabilidade socioam-
biental;
• Criação de cursos focados em novas metodologias e direcionados
para as áreas do conhecimento emergentes;
• Atenção dispensada à sua comunidade interna, expressa por meio de
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seu processo de autoavaliação, retratada pelos resultados de pesqui-
sas internas e visando a melhoria contínua;
• Incentivo à autoavaliação participativa, com envolvimento de comis-
sões externas, mediante acordos de cooperação, inclusive internacio-
nais;
• Apropriação pela comunidade interna dos resultados do processo de
autoavaliação, e não somente pelo MEC/INEP;
• Articulação para projetos de cooperação: como a IES interage, com-
partilha informações e presta atendimento a outras instituições.
Propostas:
1. Novo modelo de instrumento de autoavaliação
O modelo proposto já está em implantação pelo Semesp, na forma de um
projeto-piloto que envolve a cooperação e a participação de 11 instituições de
ensino superior brasileiras que representam a diversidade do sistema em ter-
mos de porte, organização acadêmica e localização geográfica. O projeto, que
conta com um grupo multidisciplinar formado por 32 dirigentes e especialis-
tas em avaliação institucional das IES participantes, constitui uma ferramenta
de avaliação que tem como referência e segue os instrumentos estabeleci-
dos pelo INEP, mas busca uma profundidade maior na avaliação, com base em
instrumentos de autoavaliação desenvolvidos recentemente em países como
Chile e Colômbia, e contempla a efetivação de um sistema de acreditação in-
dependente.
O novo modelo visa transformar a autoavaliação em um instrumento nortea-
dor para o aperfeiçoamento da gestão de cada instituição, garantindo o cum-
primento de sua missão, com base na sua vocação, na qualidade dos serviços
realizados, no incentivo à melhoria e à inovação, primeiramente para os seus
alunos, e depois em relação aos benefícios que presta para toda a sociedade, e
na forma como a IES se apropria do processo de autoavaliação para seu auto-
desenvolvimento e para o seu ganho de maturidade.
O modelo de avaliação proposto considera as seguintes áreas:
• Desenvolvimento Institucional
• Governança (Gestão e Recursos)
• Atuação Acadêmica / Políticas Acadêmicas
• Sustentabilidade
• Meta-avaliação
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2. Organização de um Sistema de Acreditação Independente
O sistema proposto tem como referência uma avaliação padronizada por um
organismo independente da burocracia do Estado, que comprove que a insti-
tuição atende a requisitos previamente definidos e que tem competência para
realizar o seu papel de modo eficaz e seguro. Esse reconhecimento considera
a relevância da acreditação, apontada por estudiosos do tema, com base em
aspectos como:
• A tendência global a desenvolver mecanismos de garantia da qualida-
de de IES e cursos via acreditação, em resposta à tentativa dos gover-
nos de interferirem nas universidades;
• A complexidade e multidimensionalidade do conceito de qualidade;
• O diferencial para a sobrevivência de uma instituição diante da neces-
sidade de oferecer respostas mais rápidas e eficazes para atender as
expectativas do mercado e do seu público;
• A possibilidade de contribuir para ordenar o setor educacional e redu-
zir os problemas de controle de qualidade ocasionados pela expansão
desordenada, e potencialmente caótica, do número de instituições,
programas, professores e alunos.
• O fato de que a acreditação não classifica;
• A necessidade de apresentação de evidências ao longo do processo.
O sistema será composto por agências especializadas, num conjunto que re-
fletirá a pluralidade das vocações das instituições e abrigará diferentes cursos,
instalados em distintas regiões do país. O modelo prevê um processo de acre-
ditação abrangente, que não seja controlado pelo Estado e não tenha o cará-
ter homogeneizador dos processos avaliativos atuais, baseados em critérios e
instrumentos que oferecem pouca margem à inovação e à diferenciação de
projetos acadêmicos.
Sua adoção estará menos a serviço da burocracia estatal e mais dos reais interesses da
sociedade, possibilitando que o sistema de educação superior brasileiro tire partido da
sua maior riqueza – a diversidade de características, especificidades e potencialidades
de cada instituição, princípios constantes da Lei do Sinaes –, permitindo-lhe certificar
a qualidade do projeto-piloto atualmente em implantação e conferindo-lhe a devida
validação e o legítimo reconhecimento por meio das seguintes vantagens:
• Fortalecimento das IES pelo conhecimento de suas potencialidades,
para que promovam e consolidem uma cultura de qualidade;
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• Reconhecimento público e transparência em relação à melhoria da
qualidade do sistema de ensino;
• Benefício a estudantes e IES, principalmente no que diz respeito à mo-
bilidade acadêmica e à inserção no processo de internacionalização;
• Utilização, no processo de acreditação, de indicadores criados no con-
texto da realidade brasileira e adequados aos modelos de IES, suas
finalidades e respectivas missões.
A estrutura organizacional será horizontal e funcionará como um mecanismo
de integração das agências nacionais de acreditação e avaliação independen-
te do Estado, com a proposta de se tornar, diante do processo de globalização,
um veículo de integração entre os países, constituindo estratégia para disse-
minar respostas conjuntas e coordenadas acerca dos desafios da educação
superior.
3. Cesta de novos Indicadores de apoio à Avaliação e à Regulação
A proposta envolve a substituição dos atuais indicadores de qualidade por um
conjunto de indicadores multidimensional, mais abrangente que o do Sinaes
atual, tendo como referência o U-Multirank2, e que seja baseado em informa-
ções extraíveis de registros administrativos atualmente existentes no Brasil,
como o Enem (Exame Nacional do Ensino Médio), o CES (Censo da Educação
Superior), o GeoCapes (Sistema de Informações Georreferenciadas da Capes),
os registros de patentes do INPI (Instituto Nacional da Propriedade Industrial)
e a DIRPF (Declaração de Ajuste Anual do Imposto sobre a Renda da Pessoa
Física).
A composição da cesta de indicadores aponta os seguintes caminhos:
• Análise da inserção dos egressos no mundo do trabalho, a partir das
Declarações de Ajuste do IRPF, sem riscos para o sigilo fiscal;
• Porcentagem de egressos que deram continuidade a seus estudos em
programas de pós-graduação stricto sensu, a partir de dados do Geo-
Capes;
• Análise da eficiência do curso, por meio dos fluxos de conclusão e de
conclusão no tempo certo para cada turma de ingressantes, com base
em indicadores do CES;
• Utilização, também, de outros indicadores facilmente calculáveis, ain-
da que não sejam oriundos de registros administrativos, como é o caso
dos indicadores bibliométricos, de ampla aceitação internacional.
2 https://www.umultirank.org
18
06. FINANCIAMENTO
Contextualização:
A abordagem de uma política pública de financiamento estudantil para o en-
sino superior não pode deixar de considerar a diferença existente entre a na-
tureza dos bens produzidos pelas instituições de ensino superior, que abrange
dois tipos – privado e público –, independentemente da origem pública ou
privada da IES.
O bem privado representa um benefício individual em que o egresso do ensi-
no superior usufrui da formação adquirida e inicia uma atividade econômica
remunerada. Já o bem público possui impacto social ao beneficiar a sociedade
em geral. Uma nova substância ou uma nova tecnologia, por exemplo, criadas
a partir de pesquisas acadêmicas, trazem benefícios para toda a sociedade.
O financiamento público para o ensino superior se justifica, tanto para as ati-
vidades de pesquisa acadêmica e aplicada, que têm natureza pública, quanto
para as atividades de formação, de natureza privada, que também represen-
tam uma parcela expressiva dos serviços oferecidos pelas universidades pú-
blicas. Mas, na medida em que o ensino superior público brasileiro não ofe-
rece vagas para todos os concluintes do ensino médio, essas atividades são
ofertadas principalmente pelas IES privadas. Atualmente, o setor educacional
privado já responde por 77,5% das matrículas na graduação, 84% em cursos de
especialização e 31% na pós-graduação stricto sensu.
Mesmo assim, o índice de acesso à educação superior no país se mantém mui-
to abaixo do que seria desejável. De acordo com pesquisa divulgada pelo Insti-
tuto Semesp, em 2020 o Brasil contava com uma taxa de escolarização líquida
no ensino superior de apenas 17,8 %, sendo que a meta do Plano Nacional de
Educação é de 33% até o ano de 2024.
O Fies, financiamento estudantil do governo federal que teve seu ápice entre
os anos de 2010 e 2014, mostrou-se um modelo ineficiente e hoje possui cer-
ca de 1,3 milhão de estudantes inadimplentes, totalizando uma dívida de R$
6,7 bilhões. Ao final de 2021, o Governo Federal decidiu renegociar dívidas e
anistiar contratos antigos, indicando a insustentabilidade do modelo de finan-
ciamento estudantil em vigência hoje no país.
O Programa Universidade para Todos (Prouni), por sua vez, que desde que foi
criado, em 2005, beneficiou milhares de estudantes de classes sociais menos
favorecidas, conforme dados do Censo da Educação Superior de 2020 acolheu
19
apenas 4% dos alunos ingressantes naquele ano, demonstrando a necessida-
de da sua ampliação.
Diante desse quadro, a política pública de financiamento estudantil proposta
pelo Semesp envolve duas vertentes especificas e não excludentes.
A primeira, tomando como casos de sucesso modelos adotados por outros
países, como Austrália (1989), Nova Zelândia (1991) e Inglaterra (1997), e que
foram implementados de forma semelhante também na Coreia do Sul, Hun-
gria e Japão, propõe um novo caminho, mais sustentável, e que cumpre o pa-
pel de inclusão social.
A proposta envolve a implantação de uma nova política pública que permita
a expansão do acesso ao ensino superior no Brasil por meio de um sistema
de financiamento com pagamentos vinculados à renda do aluno, permitindo
equacionar a necessidade de expansão do acesso ao ensino superior com as
restrições do orçamento público para fazer frente a essa despesa.
A introdução desse sistema é, em geral, acompanhada por um remodelamen-
to no sistema de gestão do ensino superior, com a introdução também de
mecanismos de garantia de qualidade das IES públicas e privadas que serão
elegíveis a oferecer esse financiamento estudantil, com base no mérito dos
estudantes e não na sua capacidade de pagamento no curto prazo.
A segunda proposta torna essencial um olhar estratégico para o Prouni, diante
da necessidade de ampliação do programa, que é considerado um dos mais
exitosos em seu propósito de permitir acesso ao ensino superior privado a
jovens que não teriam essa oportunidade.
Vale ressaltar que as propostas deste capítulo não têm a pretensão de discutir
o financiamento das universidades públicas, atendo-se à questão do financia-
mento estudantil como um todo.
Propostas:
1. Criação de um Sistema Nacional de Financiamento Estudantil (SNFE)
Tendo por base o reconhecimento de que a educação superior é cen-
tral para o desenvolvimento econômico do país e para a quebra de ci-
clos intergeracionais de desigualdade, propõe-se a criação de um Sis-
tema Nacional de Financiamento Estudantil (SNFE) com pagamentos
vinculados à renda futura. Ao mesmo tempo em que a proposta concilia
20
proteção social com sustentabilidade fiscal em políticas públicas de assistên-
cia estudantil, ela também viabiliza a ampliação da oferta de financiamento
estudantil, conforme detalhado na imagem reproduzida no item a seguir.
1.1. Funcionamento do Sistema de Financiamento
Fonte: Adaptado de Nascimento (2021)3
Observação: setas maciças referem-se a fluxos financeiros, enquanto as setas tracejadas remetem a fluxos de informações
ou de serviços.
1.2. Operação do Sistema de Financiamento
Estudantes com matrícula válida em cursos elegíveis podem solicitar financia-
mento em uma ou mais das modalidades previstas pelo SNFE.
Seriam elegíveis cursos de graduação e cursos de pós-graduação, em qualquer
modalidade de oferta, desde que oficialmente reconhecidos pelo MEC, bem
como cursos técnicos, concomitantes ou subsequentes ao ensino médio, ca-
dastrados no Catálogo Nacional de Cursos Técnicos (CNCT), conforme propos-
to no capítulo Educação Profissional destas Diretrizes (pág. 25).
O financiamento pode ser contratado junto a qualquer agente financeiro
(banco, cooperativa de crédito, empresa simples de crédito, etc.) público ou
privado, em uma das seguintes modalidades:
3 NASCIMENTO, Paulo Meyer. O estudante de hoje financiado pelo profissional do amanhã: Proposta de um sistema nacional de financiamento estudantil com pagamentos
vinculados à renda futura - funcionamento e fonte de recursos. Brasília: Ipea, dez. 2021 (Texto para Discussão no prelo). Disponível em: https://bit.ly/3oNHxJe. Acesso em:
15 dez. 2021.
21
• Debt (empréstimos com amortizações condicionadas à renda - ECR):
desembolsos compõem saldo devedor, sobre os quais incidem os ju-
ros contratados. Não há prazo preestabelecido de amortização.
• Equity (investimento via income share agreements - ISA): pressupõe
uma “sociedade temporária” entre financiador e beneficiário do finan-
ciamento, o qual deverá direcionar um percentual pré-definido de sua
renda ao financiador, durante um período preestabelecido de anos no
futuro, a título de remuneração pelo investimento em sua formação.
No Brasil, algumas startups vêm oferecendo ISAs, desde 2020, em um
nicho específico: cursos de qualificação profissional em programação.
O usufruto fica a cargo da pessoa que tomou o financiamento ou pode ser de-
limitado pela linha específica de financiamento, podendo financiar mensalida-
des, intercâmbios (study abroad), participação em congressos, equipamentos,
gastos e bens pessoais, projetos de carreira, dentre outros itens, nos limites
porventura colocados pela lei e/ou por instrumentos regulatórios.
A fase de reembolso é o grande diferencial em relação a modelos tradicionais
de financiamento: em vez de prestações determinadas por mecanismos como
a Tabela Price ou o Sistema de Amortização Constante (SAC), estipula-se um
percentual da renda para amortizar o saldo devedor (no caso do ECR) ou para
remunerar o investidor (no caso do ISA).
O Sistema Nacional de Financiamento Estudantil, ora proposto, se vale da for-
ma de operacionalização comum a todas as atuais aplicações da espécie tribu-
tária denominada no Brasil como contribuição: a lei disciplina o fato gerador, a
base de cálculo e as formas de liquidação do tributo; a Receita Federal do Brasil
(RFB) recolhe os pagamentos; uma entidade estatal ou paraestatal (denomi-
nado órgão regulador/ gestor) recebe da RFB o volume arrecadado e lhe dá
destino, nos limites da lei.
A despeito de girar em torno de uma contribuição, o SNFE não aumenta a car-
ga tributária: o tributo é apenas a forma de operacionalizá-lo, viabilizando que
sejam recolhidos, na fonte, pagamentos vinculados à renda futura. A finalidade
da nova contribuição não é aumentar a receita do Estado, mas, sim, colocar
sob a alçada da RFB o recolhimento dos pagamentos dos ECRs e dos ISAs,
sem prejuízo à sua missão institucional de exercer a administração tributária
e aduaneira.
O órgão regulador/gestor exerce dois conjuntos de atribuições complemen-
tares. A primeira atribuição é de gestão, encarregando-se de dar destinação à
22
arrecadação do tributo, nos limites da lei. No caso, essa destinação é distribuir
os valores arrecadados de acordo com o que cabe a cada agente financeiro.
A segunda atribuição remete à regulação, tendo como base a lei e definindo,
por instrumentos apropriados, as possibilidades e os limites para os contratos
de ECR e de ISA.
1.3. Modelos de Financiamento (Funding)
Coexistem no SNFE financiamento público e privado. O mecanismo de opera-
ção, em torno de uma contribuição e com um órgão regulador/gestor atuan-
do como intermediário entre os agentes financeiros e a RFB, vitamina o finan-
ciamento privado. Afinal, com pagamentos na fonte recolhidos pela RFB:
• Cria-se um sistema em que não-pagamento é quase que exclusiva-
mente resultado de perene incapacidade financeira de quem detém
a dívida. O outro componente usual dessa parte do risco (o não pa-
gamento por ato deliberado de quem detém a dívida) praticamen-
te desaparece, pois, ou decorre de migração definitiva para país sem
acordo de prevenção à evasão fiscal com o Brasil, ou implica ocultação
total da renda por prazo muito longo (no limite, toda a vida pós-usu-
fruto do financiamento);
• Reduz-se a incerteza. Embora os pagamentos sejam condicionados à
renda futura e, por conseguinte, não seja possível precisar de antemão
como se dará o fluxo de pagamentos de cada pessoa física, é possível
modelar o reembolso esperado por perfil de estudante;
• Barateia-se a gestão do financiamento, tendo em vista que toda a co-
brança passa a ser feita pela RFB.
O SNFE tende a impactar rapidamente os desenhos de programas como
o Fies, que veria concluída a reformulação que lhe foi iniciada pela Lei n°
13.530/2017. Além disso, seriam dispensáveis anistias como a concedida a
devedores em 2021, visto que o tipo de financiamento tratado aqui traz im-
plícito em seu desenho refinanciamento automático da dívida pendente.
Inadimplência
Com relação à questão da inadimplência, seja com funding público, seja com
funding privado, financiamentos com pagamentos vinculados à renda futura
esvaziam de conteúdo jurídico a figura da inadimplência. No ISA, não-paga-
mento é parte do risco do investimento. No ECR, como o prazo de amortiza-
ção é flexível e o cálculo de cada prestação pressupõe a existência de renda
23
aferível, não há inadimplência, ainda que haja perdas com quem acaba não
conseguindo zerar seu saldo devedor.
Simulações feitas para o IPEA em 20214, a partir de dados do Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatística (IBGE), mostram que mesmo em cenários macroeco-
nômicos adversos as perdas por não pagamento em um eventual programa
governamental de ECR tenderiam a ser muito menores que as perdas obser-
vadas com o Fies. Ainda que a renda futura de cada pessoa permaneça incerta,
o envolvimento do sistema público de escrituração fiscal no recolhimento dos
pagamentos na fonte reduz essa incerteza e protege quem se financia das
intempéries da vida, ao garantir que só haverá pagamento se a pessoa vier a
ter renda compatível, e na velocidade que as flutuações da sua renda ao longo
da vida lhe permitirem.
Não é credito consignado
Cabe destacar, também, que o financiamento com pagamentos vinculados
à renda futura não pode ser confundido com credito consignado. Esse é um
equívoco comum, mas esse tipo de financiamento e o crédito consignado são
muito diferentes, já que os pagamentos de ECRs e ISAs são atrelados à renda
futura, e não à renda contemporânea.
1.4. Mudanças na Legislação
Por que criar um tributo
Sem o envolvimento do sistema público de escrituração fiscal no recolhi-
mento dos pagamentos, os programas governamentais de crédito educativo
da Austrália, da Nova Zelândia e da Inglaterra não teriam se tornado os ben-
chmarks que são atualmente para muitos países. Para que sistemas desse tipo
funcionem, são necessárias informações acuradas e atualizadas sobre matrícu-
las e renda, e o recolhimento dos pagamentos deve ser o mais automatizado
possível e vinculado às fontes correntes de rendimento, razão pela qual devem
envolver os mecanismos mais eficientes de recolhimento de tributos.
Essa saída é mais complicada no ordenamento jurídico brasileiro, dada a mis-
são institucional da RFB. Todavia, o modo de operacionalização das contribui-
ções (que formalmente são tributos) viabiliza o mesmo resultado – recolher os
pagamentos via sistemas públicos de escrituração fiscal digital e deixar a cargo
de um órgão gestor (nem a RFB, nem o Tesouro Nacional) o gerenciamento do
sistema.
4 NASCIMENTO, Paulo Meyer. Empréstimos com amortizações condicionadas à renda: Cenários de financiamento de estudantes de ensino superior no Brasil. Brasília: Ipea, abr.
2021b (Te xto para Discussão n° 2.648). Disponível em: https://bit.ly/3GMoy84. Acesso em: 21 maio 2021.
24
Revisão do Marco Legal
Com inspiração no modelo australiano, a Lei n° 13.530/2017 buscou prever
pagamentos vinculados à renda futura no âmbito do Fies. Até hoje, contudo,
a ideia não saiu do papel, evidenciando que a ausência de previsão legal para
inserir no sistema público de escrituração fiscal o recolhimento dos pagamen-
tos vinculados à renda é um grande impeditivo para o êxito desse sistema de
financiamento vinculado à renda.
Assim sendo, a implementação do SNFE, como proposto, demandaria emen-
da à Constituição, leis ordinárias e a construção de todo um novo manancial
regulatório. Porém, nenhum órgão público novo precisaria ser criado, poden-
do, por exemplo, o Banco Central do Brasil (Bacen) ser o órgão regulador e o
Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) ser o órgão gestor
do SNFE.
2. Ampliação do Programa Universidade para Todos (Prouni)
O Programa Universidade para Todos (Prouni), instituído pela Lei nº. 11.096/05,
e regulamentada pela IN SRF nº. 1.394/13, permitiu acesso a milhões de jovens
brasileiros por meio de vagas disponibilizadas nas instituições de ensino su-
perior privadas, em troca da isenção dos tributos PIS, COFINS, CSLL e IRPJ. As
IES passaram a oferecer 10% das suas vagas gratuitamente para estudantes
carentes em troca de isenções que representam em média 5% da receita bruta
(instituições com fins lucrativos).
Conforme as estimativas do investimento público direto em educação por
estudante, publicado no site do INEP/MEC, o valor anual por estudante na
educação superior em 2018 era de R$ 26.056,00. Atualizando esse valor com
base no Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), em março de
2022 os investimentos públicos por estudante no nível superior eram de R$
32.264,00 por ano.
Anualmente, cerca de 433 mil alunos estão matriculados no ensino superior por
meio do Prouni integral e 133 mil pelo Prouni parcial. Considerando o investimento
anual por estudante no nível superior em instituições públicas, para manter esses
alunos do Prouni o Estado teria que despender R$ 193 bilhões por ano a mais, en-
quanto a renúncia fiscal dos tributos PIS, COFINS, CSLL e IRPJ não chega a 2,5 bilhões.
Nesse sentido, propõe-se a ampliação do Programa Universidade para Todos
(Prouni) em troca da isenção de uma série de tributos incidentes sobre a folha
de pagamentos – INSS, SESC, SEBRAE, INCRA, Seguro de Acidente de Trabalho,
25
Salário Educação e PIS (apenas no caso das instituições sem fins lucrativos) –,
que representam em média 11% da receita bruta das instituições com fins lu-
crativos, e que seriam substituídos por mais 11% das vagas no ensino superior
privado destinadas aos estudantes mais carentes.
A renúncia fiscal estimada será de R$ 5,6 bilhões por ano (já excetuando a
imunidade das entidades filantrópicas) e poderá representar a manutenção e
o ingresso anualmente de mais 580 mil novos alunos em quatro anos que não
conseguem vagas por meio das universidades públicas gratuitas ou dos pro-
gramas sociais de acesso ao ensino superior privado. O Prouni atual permitiu
o ingresso de 133 mil novos alunos em 2020, considerando bolsas integrais e
parciais.
Com a ampliação, a proposta inclui também a necessidade de revisão dos cri-
térios socioeconômicos de seleção do programa. Considerando que, segundo
dados do 4° trimestre de 2021 da PNAD/IBGE, 21,1% dos estudantes matricula-
dos estão na faixa entre 1,5 e 3 salários mínimos de renda per capita e, portan-
to, não são elegíveis ao Prouni integral, sem essa revisão a ampliação das vagas
pode não surtir os resultados pretendidos.
07. EDUCAÇÃO PROFISSIONAL E
TECNOLÓGICA
Contextualização:
Em diversos países a educação profissional e tecnológica (EPT) de jovens e
adultos desempenha um papel fundamental para o crescimento produtivo de
suas economias, configurando-se como patamar básico para a melhoria do
capital humano e para a inclusão econômica da população, oferecendo acesso
qualificado ao mercado de trabalho e a níveis superiores de educação e renda.
Com a disseminação de cursos em formatos de certificações intermediárias, a
modalidade tem revelado potencial para ampliar seu alcance, ao oportunizar
processos de atualização tecnológica cada vez mais demandados, também,
por trabalhadores ativos em busca de recolocação profissional ou de cresci-
mento na carreira.
No Brasil vivemos uma situação sem precedentes, em que cerca de 23,7% dos
quase 50 milhões de jovens brasileiros até 29 anos nem estudam, nem traba-
lham. Apenas cerca de 9% desses jovens estão matriculados em cursos técni-
26
cos ou profissionalizantes, enquanto que a média de países da OCDE é de 68%.
Esta realidade impacta a economia e a qualidade de vida das famílias, impli-
cando perda de produtividade e de capital humano, além de sobrecarregar os
programas governamentais de assistência.
De acordo com análise de mercado divulgada pela Confederação Nacional
da Industria (CNI) em 2021, 78% das empresas afirmam ter dificuldades para
encontrar profissionais qualificados em nível técnico e procuram capacitar os
trabalhadores dentro da própria empresa. Até 2023, 10,5 milhões de trabalha-
dores brasileiros precisarão ser capacitados para exercer ocupações na área
industrial, em especial operadores e técnicos.
Em que pese a urgência da preparação desses jovens e trabalhadores por for-
mação e requalificação profissional, a educação profissional e tecnológica mui-
tas vezes é considerada uma etapa que precede a graduação, quando deveria
ser vista como um fim em si mesma, capaz de qualificar e capacitar para o
mercado de trabalho e para a vida.
A EPT é uma modalidade de oferta educacional que viabiliza a certificação
profissional e a atualização tecnológica das diversas carreiras profissionais,
oferecendo alternativas para as profissões do futuro e para as novas demandas
de competências profissionais decorrentes da transformação tecnológica nas
diversas profissões. Alinhadas às demandas do setor produtivo, essas forma-
ções aproximam a sala de aula do mundo do trabalho, contribuindo para a
redução da evasão estudantil, o aumento da empregabilidade dos egressos e
o aperfeiçoamento e modernização da qualificação da força de trabalho.
Propostas:
1. Modernização do marco legal
A inclusão da educação profissional e tecnológica na nova política pública
para o ensino superior brasileiro deverá contemplar a modernização do marco
legal, com o estabelecimento de uma trajetória articulada entre a educação
técnica e profissional e a educação superior, que não seja considerada uma
etapa intermediária, mas uma estrutura integrante de um sistema que cami-
nha paralelamente ao ensino básico e ao ensino superior, permitindo formar
um expressivo contingente de trabalhadores com as habilidades exigidas pela
economia moderna e oferecendo-lhes uma formação prática de alta qualida-
de, associada com o conhecimento especializado voltado para carreiras aca-
dêmicas.
27
O modelo permite a mobilidade entre essas duas estruturas, e os estudantes
podem optar por diversas trajetórias para o desenvolvimento de sua carrei-
ra, oferecendo duas possibilidades: qualificação no ambiente de trabalho, por
meio de estágios, programas de trainees ou simulações, ou qualificação em
ambientes educacionais, seja em programas de formação presenciais ou por
meio de cursos on-line.
Para tanto, propõe-se:
• Criação do sistema dual flexível de formação escola-empresa, ancora-
do em um programa de trajetórias formativas articuladas, favorecendo
o processo de atualização tecnológica dos cursos EPT e aproximando
as experiências de sala de aula da realidade do mundo do trabalho;
• Formatação de currículos estruturados em itinerários formativos, por
eixos e setores produtivos, com saídas intermediárias e verticalização
crescente, permitindo maior mobilidade dos estudantes entre forma-
ções profissionalizantes e acadêmicas;
• Definição de critérios multidimensionais de avaliação da qualidade,
incluindo processos de autoavaliação institucional, que venham a ser
utilizados para elegibilidade de instituições para o financiamento pú-
blico e privado, bem como base do processo de acreditação e creden-
ciamento;
• Desburocratização da regulação e avaliação a cargo dos sistemas es-
taduais de educação, contemplando a institucionalização de agências
acreditadoras e certificadoras responsáveis pela aprovação e avaliação
de cursos de EPT;
• Institucionalização de mecanismos de financiamento estudantil,
por financiamentos públicos vinculados à renda ou no modelo de
acordo de compartilhamento de renda junto à iniciativa privada.
2. Articulação governamental
Para viabilização dessa política será importante que todos os cursos ofereci-
dos pelo sistema proposto estejam organizados em uma plataforma na qual
os estudantes poderão conhecer as ofertas das diversas instituições provedo-
ras, comparar informações como unidades de competências abrangidas pelo
curso, mensalidades e valores, duração, avaliação de satisfação, dentre outras
informações.
Igualmente fundamental será a identificação no Brasil de um organismo ou
28
colegiado específico para atuar como responsável por estabelecer padrões
nacionais para implantação de uma matriz de competências organizada por
níveis de capacitação, pelo credenciamento das instituições provedoras da
modalidade, bem como pela definição das competências requeridas para a
certificação em cada um dos níveis da matriz e dos segmentos econômicos
atendidos.
Nesse sentido, propõe-se:
• Implantação de uma Plataforma Nacional Digital, coordenada pelo
MEC e MTE, reunindo as ofertas autorizadas de cursos de EPT por mu-
nicípio, bem como informações sobre os itinerários formativos, as ins-
tituições e cursos certificados, fazendo sinergia com os Arranjos Pro-
dutivo Locais (APL) a exemplo de práticas bem-sucedidas implantadas
em países como Austrália, Nova Zelândia e Colômbia;
• Criação de um identificador único do estudante, vinculado ao CPF,
para qualquer curso de educação profissional e tecnológica, facilitan-
do o aproveitamento de estudos anteriores;
• Identificação de um órgão ou colegiado com a função de articulação
de uma estratégia interministerial, inclusive para realizar fase de transi-
ção do modelo atual do catálogo nacional para um modelo com mais
autonomia de cada região ou APL;
• Integração estratégica de pastas ministeriais – como as da Educação,
Economia e Trabalho, Desenvolvimento Regional, Cidadania e Ciência
e Tecnologia – para orientar o desenho de um plano nacional de fo-
mento à EPT.
3. Valorização das carreiras prossionalizantes e tecnológicas
A nova política deverá incluir a implantação de programas de aprendizagem
continuada, envolvendo alunos do ensino médio e do ensino superior, profis-
sionais adultos em busca de aprimoramento nas suas competências e habili-
dades técnicas, e trabalhadores desempregados ou em fase de requalificação
para retorno ao mercado de trabalho, com:
• Implantação de certificações intermediárias, a exemplo de práticas
adotadas internacionalmente na Austrália, Canadá e diversos países
europeus, orientadas para a atualização tecnológica e requalificação
de profissionais de todos os níveis formativos;
• Revisão dos padrões mínimos de formação e experiência de profes-
sores de EPT, incluindo a obrigatoriedade de experiência de trabalho
29
prévia em área correlata à área de ensino e a demanda por atualiza-
ções profissionais periódicas;
• Desenvolvimento de campanhas junto aos empregadores, jovens e tra-
balhadores em geral, visando a quebra da cultura de discriminação da EPT.
4. Financiamento público para EPT
Ao repensar os mecanismos de financiamento estudantil, conforme proposto
no capítulo Financiamento destas Diretrizes (pág. 18), é necessário também
atentar para as questões do financiamento público para a educação profissio-
nal e tecnológica.
Embora há mais de uma década seja permitido legalmente o financiamento da
EPT pelo Fies, não houve um único ano em que tenham sido dedicados contratos
de financiamento do programa a estudantes de cursos técnicos, nem tampouco
de cursos de qualificação profissional. Ficam de fora também financiamentos à
manutenção dos estudantes, e as linhas que existiam no Creduc (predecessor do
Fies) com essa finalidade sequer são permitidas pela legislação do atual programa.
Nesse sentido, propõe-se:
• Estender o financiamento público para a EPT, assim como para manu-
tenção estudantil, eliminando as restrições fiscais que permeiam a po-
lítica de assistência estudantil no Brasil, para ampliar a oferta de vagas
e facilitar o acesso de estudantes a cursos que aumentem as chances
de empregabilidade do trabalhador brasileiro;
• Permitir a solicitação de financiamento a estudantes com matrícula
válida em cursos concomitantes ou subsequentes ao ensino médio,
desde que oficialmente autorizados pelo respectivo Sistema de En-
sino, constantes no Catálogo Nacional de Cursos Técnicos (CNCT) e
cadastrados no Sistema Nacional de Informações da Educação Profis-
sional e Tecnológica (SISTEC).
5. Engajamento do setor produtivo
O setor produtivo deverá contribuir tecnicamente para organizar a oferta de
capacitações em uma matriz de competências nacional, mantendo atualizado
o fluxo de informações sobre as necessidades específicas de seus segmentos
econômicos e sobre novas técnicas e tecnologias indispensáveis para os pro-
gramas de capacitação. Como resultado desse arranjo, os certificados emitidos
serão reconhecidos nacionalmente por sua qualidade técnica, permitindo que
os estudantes formados sejam facilmente absorvidos pelo mercado de traba-
30
lho de todas as regiões do país, por meio de:
• Articulação com representantes do setor produtivo para colaborar
permanentemente com a comissão interministerial, visando mapear
tendências tecnológicas setoriais e competências demandadas por
empregadores;
• Criação de um comitê misto deliberativo que contribua no processo
de sistematização de unidades de competências, desenvolvendo pa-
drões comuns aos itinerários formativos que têm por base os padrões
ocupacionais do setor produtivo:
COMITÊ MISTO
Educadores
Públicos e Privados
Federal e Estadual
Setores Produtivos
Representação por
Setores Econômicos
Setores Produtivos
Desen. Econômico Estadual
Arranjos Produtivos Locais
• Disponibilização de vagas de aprendizes para estudantes de EPT, vi-
sando garantir por meio do estudo, geração de trabalho e renda a co-
locação dos jovens que nem estudam, nem trabalham e de adultos
em busca de recolocação profissional.
08. FORMAÇÃO DE PROFESSORES
Contextualização:
Sem a melhoria na formação de professores, não haverá melhoria nem equi-
dade na educação do país. Por essa razão, a nova política pública para a edu-
cação superior precisa contemplar a óbvia inter-relação da educação superior
com a educação básica, mesmo que não organizada, aproximando ambas por
meio de diálogos mais promissores e promovendo uma revisão profunda de
aspectos essenciais da formação de professores em todos os níveis de ensino,
e especificamente no ensino superior, sobretudo nos cursos de licenciaturas
e magistério.
Os cursos de licenciatura devem propiciar aos futuros professores uma forma-
ção docente que lhes ofereça a oportunidade de refazer o percurso de apren-
dizagem que eventualmente não foi satisfatoriamente realizado na educação
31
básica, para transformá-los em bons professores e para que possam contribuir
para a melhoria da qualidade da educação básica. Nesse sentido, é importante
que a nova política possa promover também a construção da profissionalida-
de docente, introduzindo na formação os elementos necessários para atuar
na aprendizagem ativa e em todas as metodologias inovadoras do contexto
do ensino superior contemporâneo como uma diretriz orientadora da ação
educativa.
Nas últimas décadas, a maioria dos países promoveu reformas em seus currícu-
los e na organização e gestão pedagógica das escolas básicas, com o objetivo
de alinhar os conteúdos e processos escolares às competências que serão in-
dispensáveis para o convívio social, o trabalho e a participação cidadã no sécu-
lo 21. Nesses países, em seguida às reformas curriculares, a tarefa empreendida
foi criar o referencial de formação que se articulasse à política educacional. E,
em alguns deles, a investidura levou à criação de uma organização específica
para cuidar do desenvolvimento profissional dos docentes desde a formação
inicial, antes da entrada no curso superior.
A resposta do Brasil a essas reformas ocorreu em duas políticas estruturantes:
a BNCC (Base Nacional Comum Curricular) de educação infantil e do ensino
fundamental, que foi aprovada em 2017, e a BNCC do novo ensino médio,
aprovada em 2018. Nesse mesmo ano, o Ministério da Educação (MEC) en-
viou ao Conselho Nacional de Educação (CNE) uma proposta de Base Nacional
de Formação de professores que originou, em 2019, as Diretrizes Curriculares
Nacionais (DCN) para Formação de Professores em nível superior, que incluem
uma matriz de competências a serem desenvolvidas pelos professores nas di-
ferentes licenciaturas. As DCN trazem princípios baseados em evidências que
estão presentes na literatura internacional e, pela primeira vez, um marco re-
gulatório para o ensino superior foi acompanhado de um quadro coerente e
abrangente de competências para docentes dos diferentes níveis e modalida-
des da educação básica.
Os países com bons resultados educacionais possuem uma base comum de
conhecimentos necessários para a docência. E há fartas evidências internacio-
nais de que, entre os aspectos sobre os quais se pode atuar, a qualidade do
trabalho do professor é o fator que tem mais peso para determinar o desem-
penho dos alunos, sobretudo dos mais pobres.
Sendo assim, o sucesso de uma política pública estruturante que vise melhorar
a qualidade da educação básica com equidade depende, em grande parte, do
engajamento, da colaboração e da competência profissional dos professores,
32
e deve ser obtida por meio de um olhar sistêmico para fatores que devem
estar presentes em todas as formações para professores da educação básica,
do ensino superior e da educação profissional, como as propostas aqui apre-
sentadas.
Propostas:
1. Fatores de qualidade na formação inicial
Segundo a literatura internacional, há consenso sobre alguns fatores-cha-
ve que resultam em formação profissional docente de qualidade. São eles:
• Conhecimento sobre como alunos aprendem em diferentes contex-
tos educacionais e socioculturais;
• Saberes específicos das áreas do conhecimento e dos objetivos de
aprendizagem, o que comumente está relacionado ao currículo vi-
gente na educação básica, no nosso caso na BNCC;
• Conhecimento pedagógico do conteúdo e das estratégias de ensino
para aprendizagens eficazes;
• Foco na prática: currículo da formação inicial com estudos e pesquisas
sobre práticas pedagógicas eficientes;
• Estágio curricular estruturado, articulado com as redes de escolas bá-
sicas desde o início do curso, e que ele ocorra de fato;
• Coerência entre o que se aprende na IES e o que se aplica na escola,
entre o currículo do ensino superior e o currículo da educação básica
e o compromisso com a melhoria da educação e da equidade educa-
cional;
• Conhecimento e uso de tecnologias no ensino e na aprendizagem.
A qualidade do professor da educação básica depende de vários outros insu-
mos: carreira valorizada, boas condições de trabalho na escola, salário condi-
zente, oportunidades de desenvolvimento profissional, entre outros. Mas a for-
mação inicial em nível superior é a base sobre a qual a iniciação, a progressão
na carreira e o desenvolvimento profissional devem ser ancorados.
2. Formação dos docentes da educação superior
Basicamente, a atenção da política pública deve estar voltada para os seguin-
tes aspectos dessa formação:
• Formação permanente. As instituições de ensino superior devem
propor e valorizar a permanente atualização do seu corpo docente.
33
Inovações e metodologias nem sempre são acessíveis aos docentes,
portanto, é preciso que a carreira docente esteja em contínua evolu-
ção, com o objetivo de preparar professores reflexivos e autores do
seu desenvolvimento profissional.
• Formação de formadores (docentes de licenciaturas e pedago-
gia). A docência é uma das carreiras nas quais a homologia de proces-
sos está presente em todo o curso. O professor do presente (docente
do curso) prepara o professor do futuro (aluno) para exercer o mesmo
papel exercido por ele, fazendo com que as condições de formação
na carreira docente tenham forte determinação sobre as condições de
exercício. Como exemplo, vale citar o Mofet Institute, de Israel, organi-
zação voltada para formação de professores de cursos de preparação
de professores, que foi criada com base no entendimento de que essa
é uma formação diferenciada que precisa de constante atualização
(https://mofet-web.macam.ac.il/international/mofet-institute).
• Formação e uso de metodologias inovadoras. Em vez de cursos em
que predominem exposições e explicações descritivas, é necessário
desenvolver novas formas de relação do aluno com o conhecimento,
nas quais os alunos desenvolvem a resolução de problemas ou apli-
cam o conhecimento vinculado com a vida prática, contribuindo para
a formação de um indivíduo atuante na sociedade, com reflexão crí-
tica e capacidade para entender o seu tempo e resolver problemas
reais.
• Licenciaturas interdisciplinares. O excesso de fragmentação do co-
nhecimento leva à fragmentação da formação de professores. Com
uma BNCC organizada por áreas e não por disciplinas no ensino mé-
dio, será possível estimular a inovação de licenciaturas interdisciplina-
res e o desenvolvimento de metodologias que facilitem a transdisci-
plinaridade na formação dos futuros professores.
• Formação do gestor escolar. É preciso investir mais tempo e
diferenciar os cursos para gestores escolares da Pedagogia. É sabido
que, para melhores resultados de aprendizagem, a gestão escolar tem
muita influência. Dessa forma, será preciso focar não só na adminis-
tração escolar, mas na resolução de conflitos, na gestão de pessoas,
na facilitação de trabalhos para o desenvolvimento do currículo, e na
liderança estratégica.
3. Formação de professores para educação prossional
A construção da formação docente exige uma dimensão continuada, organi-
34
zada para permitir que os professores adquiriam os seus saberes de uma forma
pedagogicamente adequada e se tornem protagonistas do seu desenvolvi-
mento profissional, com a adoção das seguintes práticas:
• Formar pedagogicamente os professores da educação profissional.
O conhecimento técnico e a experiência profissional do docente da
educação profissional são de extrema relevância. Essas habilidades
precisam ser acompanhadas de conhecimento e prática pedagógica
adequados à docência de cursos técnicos e profissionalizantes.
• Propiciar estágio e prática pedagógica. Durante a formação, é preciso
que o docente tenha contato com a realidade escolar por meio de
estágios em escolas técnicas e de estudos nas práticas e metodologias
diferenciadas para aprendizagens mais efetivas.
• Planejar e avaliar. A prática pedagógica envolve a gestão da
aprendizagem, e para isso é necessário que o docente compreenda
e seja capaz de planejar e avaliar aprendizagens dentro da área profis-
sional.
Adicionalmente à formação e prática pedagógica, é de extrema relevância
que os professores/instrutores de EPT tenham um perfil profissional aderente
à área na qual ministram aulas. Diversos países já adotam incentivos políticos
que induzam o professor de EPT a engajar-se em processos de desenvolvimen-
to profissional, a exemplo do ocorrido na Austrália, Reino Unido e Alemanha.
Neste sentido, diversas iniciativas podem ser consideradas e fomentadas:
• Participação em programas de formação voltados para a atualização
tecnológica, a exemplo de cursos, workshops e conferências profissio-
nais;
• Envolvimento em associações profissionais ou redes profissionais;
• Atuação em projetos de pesquisa voltados para o atendimento de de-
mandas do setor produtivo e do mercado;
• Experiência própria no mercado de trabalho, atuando como consultor
ou profissional contratado por empresas do ramo para o qual minis-
tram formações.
4. Financiamento especial para a formação de professores
O Brasil é um dos raros países em que a formação inicial de professores se dá
em períodos noturnos e sem o compromisso efetivo do estágio em escolas.
Nos países europeus, além de a formação ser realizada em período integral
(parte do tempo na universidade e parte na escola, com orientação e mento-
35
ria), os estudantes só chegam à sala de aula com mestrado. Mesmo em países
da América Latina, a formação se dá em período integral, com vínculo efetivo
com o campo de atuação (escolas) desde o início do curso. Em outros países,
como EUA, Índia e Arábia Saudita, a formação de professores se dá em nível de
pós-graduação.
Evidentemente, trata-se de uma formação cara. Mas além dessa diferença, no
Brasil os estudantes que buscam a formação de professores são notoriamente
oriundos de classes desprivilegiadas social e culturalmente, e são os que têm
o pior desempenho nos exames nacionais (como o ENEM), o que perpetua o
ciclo de educação de baixa qualidade.
A formação de excelência que o Brasil necessita, além da infraestrutura adequada,
precisa de formadores competentes e estudantes que possam se dedicar aos estu-
dos e ao estágio, par que possam ser transformados em docentes de alta performan-
ce. Considerando que a melhoria da educação é um dever do Estado e uma obri-
gação civil de todos, para mudar de fato a educação do país será preciso adotar um
financiamento público para a formação inicial de professores, que pode estar em:
• Bolsa docência. Para tornar obrigatório o estágio (parte na escola e
parte na universidade, com orientação em ambos os momentos) é
preciso que o estudante possa contar com uma bolsa de estudos que
lhe permita estudar e estagiar sem trabalhar, e desse modo se dedicar
a uma boa formação docente.
• Atração de jovens para a docência. O que mais afasta o jovem da
docência é a falta de reconhecimento social, mais até do que o salário.
A sociedade brasileira precisa valorizar a profissão que forma as outras
profissões, e isso significa tornar os cursos de qualidade e atraentes, e
a profissão valorizada socialmente, promovendo uma transformação
que outros países fizerem em menos de uma década.
• Financiamento para IES privadas que formam professores com
qualidade. Usando como modelo o Prouni, propõe-se a adoção de
um programa específico para cursos bem avaliados e de qualidade na
formação inicial docente. O subsídio deverá ser suficiente para que o
futuro professor, desde o primeiro ano, possa comparecer de modo
planejado à escola ou às escolas com as quais sua instituição tenha
vínculo e frequentar as aulas. É preciso também que cubra os recursos
para a escola ou as escolas com as quais o curso mantém parcerias,
além de garantir a gratificação para os professores de educação básica
que trabalhem como mentores.
36
09. CIÊNCIA E INTERNACIONALIZAÇÃO
Contextualização:
Desde a recuperação do Japão e da Alemanha, os dois países cuja infraestru-
tura e economia estavam completamente destruídas após a Segunda Guerra
Mundial e hoje são potências econômicas globais, ficou evidenciado que a for-
ça das nações se baseia em dois pilares: o nível educacional de sua população
e o avanço da sua ciência, tecnologia e inovação (CT&I).
Embora também sejam importantes para a geração de riqueza das nações o
tamanho da população, a diversidade da sua economia e a disponibilidade de
recursos naturais, é preciso ressaltar que esses fatores, por si só, não são sufi-
cientes. A história demonstra que diversos países que dispunham de alguns
desses fatores de geração de riqueza só tiveram seu desenvolvimento alavan-
cado pelo nível de avanços nos pilares educação e CT&I, e que essa conquista
foi resultado de escolhas políticas sistemáticas, consistentes e de longo prazo.
Países que são hoje referências globais, como Alemanha, Austrália e Coreia do
Sul, identificaram na ciência e na necessidade de estímulos efetivos no âmbito
das trocas científicas internacionais os fatores críticos para fornecer novas fon-
tes de crescimento produtivo, gerar e manter empregos com alta remuneração
e sustentar ondas de desenvolvimento econômico consistente e persistente.
O Brasil reúne diversos dos fatores acima mencionados, e ainda con-
ta – por um período que está se encerrando – com a vantagem do bônus
demográfico. A maior massa da população se encontra na faixa etária de
25 a 60 anos, período de trabalho e produção de riqueza. O fato de ain-
da não sermos um país desenvolvido, no entanto, deve-se a não ter sido
dada, ao longo dos anos, a devida prioridade às políticas de ciência, tecno-
logia e inovação, bem como de internacionalização da educação superior.
Marco legal da CT&I
Os pequenos avanços do Brasil nesses campos se devem a algumas iniciativas
esporádicas, como a ENCTI e os INCTs na ciência, e o Ciência sem Fronteiras
e o Print/CAPES na internacionalização do ensino superior. Estes programas
viabilizaram a materialização de parcerias entre universidades brasileiras e es-
trangeiras, etapa fundamental para a consolidação de uma massa crítica entre
pesquisadores brasileiros, reduzindo a defasagem científica e tecnológica que
separa o país das nações mais desenvolvidas e projetando a CT&I produzida no
Brasil no cenário internacional.
37
O Brasil dispõe de um Sistema Nacional de CT&I razoavelmente estabelecido,
que conta com agências federais (CNPq, FINEP, CAPES, EMBRAPII) e estaduais
(Fundações de Amparo à Pesquisa), além de uma crescente rede de universi-
dades federais e estaduais, e de centros de pesquisa (a exemplo da Fiocruz,
Embrapa e Senai). Esse conjunto de atores que compõem o ecossistema de
CT&I brasileiro reúne um enorme potencial capaz de impulsionar avanços no
conhecimento científico, tanto visando a melhoria nos padrões de vida da po-
pulação, quanto também tornando as empresas nacionais mais inovadoras e
produtivas.
Some-se a isso o fato de que, pouco tempo atrás, foi aprovado um marco legal específico
para CT&I, a saber: a Emenda Constitucional 85/2015, a Lei Federal 13.243/2016 e o De-
creto Presidencial 8.293/2018. Contudo, este marco legal ainda não está totalmente com-
preendido, cabendo discussão para sua efetiva implementação por meio de incentivos
políticos e parcerias privadas, para que os resultados dos inúmeros avanços da ciência bra-
sileira se reflitam efetivamente nos indicadores tecnológicos e de inovação nas empresas.
Ademais, o Brasil ainda não dispõe de uma política pública de Estado, consis-
tente e de longo prazo, para a internacionalização no âmbito do ensino su-
perior e da educação profissional e tecnológica. Ainda carecermos de uma
política que seja efetivamente valorizada, facilitada e incentivada por meio da
inserção de uma dimensão internacional e intercultural em cursos, disciplinas
e projetos pedagógicos, bem como da viabilização de bolsas e programas de
financiamento sustentáveis e duradouros, que considerem as mais variadas
modalidades e perfis de IES.
Urge a formulação de diretrizes nacionais para a internacionalização do ensi-
no superior e para a CT&I, bem como uma efetiva prioridade nos projetos de
políticas públicas e nos recursos de investimento alocados para estas áreas
estratégicas. É preciso repensar uma estrutura organizacional capaz de fazer
convergir os fatores de desenvolvimento econômico com os atores do setor
educacional e de CT&I, orientando os investimentos e a retomada de decisões
de programas de longo prazo, ancorados em missões de desenvolvimento so-
cial, econômico e produtivo. Assim como abrindo a possibilidade de as IES
brasileiras dedicarem-se a projetos de redes de cooperação internacional com
importantes instituições do mundo, que sejam mais intensos e efetivos e en-
volvam o apoio de embaixadas e consultados, e de entidades e organismos
que atuam nas áreas da educação internacional.
Neste sentido, os objetivos de desenvolvimento sustentável (ODS) das Nações
Unidas podem ser utilizados como referenciais estratégicos para orientar os es-
38
forços de convergência política, seja na identificação de temáticas prioritárias
para investimentos públicos, nas escolhas de tecnologias sustentáveis para pro-
gramas de CT&I e de internacionalização, ou ainda na articulação dos esforços
políticos de educação superior e profissional, e geração de renda e emprego.
Propostas:
1. Consolidação do Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia e Ino-
vação (SNCT&I)
Para consolidar o SNCT&I e prover maior cooperação e interação entre os entes públi-
cos, entre os setores público e privado e entre as empresas, a nova política pública deve
atribuir especial atenção ao papel central das instituições de ensino superior e de educa-
ção profissional e tecnológica na consolidação da capacidade crítica e científica em um
amplo contingente populacional, para sua inserção econômica em trabalhos mais bem
remunerados e aderentes ao futuro das profissões, conforme as seguintes propostas:
• Articulação horizontal das políticas de CT&I com as políticas para o
ensino superior e a educação profissional e tecnológica, bem como
as políticas industriais e macroeconômicas. Entende-se que o Centro
de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE) pode ocupar uma posição de
destaque na coordenação dos atores educacionais e de CT&I envolvi-
dos, bem como na produção de diretrizes para a internacionalização
da ciência brasileira, da ciência básica à aplicada.
• Fortalecimento de redes de centros de pesquisa para aproximar as
universidades de empresas e transformar a pesquisa científica em
aplicações tecnológicas, agregando valor ao conhecimento científico
e aumentando a competitividade e inovação de empresas de diversos
setores econômicos, a exemplo de benchmarks globais como a rede
Fraunhofer na Alemanha, o CSIRO na Austrália, a TNO na Holanda, o
RISE na Suécia e a Catapult no Reino Unido. No Brasil, diversas redes
atuam neste sentido, como a Fiocruz, a Embrapa e os Institutos Se-
nai de Inovação (ISIs), cada qual para distintos setores econômicos, e
também a EMBRAPII, que provê incentivos para centros de pesquisa
credenciados.
• Redefinição dos mecanismos para atuação eficiente e efetiva das Fun-
dações Estaduais de Amparo à Pesquisa (FAPs). Os entes estaduais, por
meio de suas Fundações, ocupam uma posição estratégica no SNCT&I
como responsáveis por viabilizar a implementação de políticas públi-
39
cas de CT&I e de internacionalização do ensino superior no âmbito
regional. Para tanto, suas atividades devem ser desenvolvidas em arti-
culação com as agências federais, incluindo a execução de programas
de internacionalização.
• Organização do ecossistema brasileiro de produção de CT&I, mapean-
do instituições de acordo com seu nível de atuação e posicionamento
tecnológico (da pesquisa básica à aplicada, obedecendo aos níveis de
TRL adotados internacionalmente) e sua fonte de recursos (público ou
privado). A proposta é reduzir a subjetividade na avaliação de projetos
de pesquisa e desenhar mecanismos de incentivo político adequados
à realidade de cada instituição.
2. Revisão da Estratégia Nacional de Ciência, Tecnologia e Ino-
vação (ENCTI), com ênfase para a internacionalização e polí-
ticas de longo prazo
O Brasil conta atualmente com duas edições da ENCTI, a primeira de 2011-
2015 e a segunda de 2016-2022. Em ambos os casos, as estratégias adotadas
foram de médio prazo, em especial pensando as características dos setores
de educação superior e CT&I. Todavia, experiências internacionais revelam que
apenas abordagens estratégicas de longo prazo, articuladas nacionalmente e
internacionalmente, podem garantir um sistema nacional de CT&I forte, capaz
de impulsionar a economia do país, a produtividade das empresas e a melho-
ria da qualidade de vida da população, por meio de políticas especificas:
• Atualização da ENCTI, introduzindo uma abordagem transversal de in-
ternacionalização para as políticas de CT&I – nominando-a ENCTII (+
internacionalização) – e ancorando suas proposições em programas
de longo prazo, idealmente para 2023-2033.
• Dinamização do Conselho Nacional de CT&I, por meio da moderni-
zação e simplificação das metodologias de acompanhamento e su-
pervisão das políticas de CT&I. Paralelamente, também é importante
fortalecer mecanismos para adoção de controles por resultados, men-
surando as entregas alcançadas por projetos de pesquisa com finan-
ciamento público e os impactos dos programas implementados por
entes federais e estaduais.
• Adoção de programas articulados para ciência, tecnologia e inova-
ção, ensino superior e internacionalização, priorizando incentivos
políticos para projetos estruturantes, multidisciplinares e de longo
40
prazo, com potencial de aplicabilidade para a melhoria de qualida-
de de vida da população, a sustentabilidade, a competitividade e
a inovação empresarial, o desenvolvimento de tecnologias por-
tadoras de futuro e a comercialização da CT&I produzida no país.
3. Fortalecimento dos orçamentos públicos para CT&I e inter-
nacionalização do ensino superior e da educação prossio-
nal e tecnológica
Em 2020, o Brasil ocupava a 13ª posição no ranking global de produção de pu-
blicações científicas, mas contribuía com apenas 3,2% da produção mundial
de ciência. No quesito de tecnologia e inovação, o Brasil ocupa a 57ª posição
no Global Innovation Index (GII) e investe em torno de 1% do PIB em CT&I.
Para fazer frente a esse quadro, propõe-se:
• Recuperação e ampliação dos investimentos nacionais em CT&I, ten-
do como meta atingir o piso de 2% do PIB em até 10 anos, entre in-
vestimentos compartilhados públicos e privados. É fundamental re-
compor e ampliar os orçamentos das agências públicas de fomento,
atentando-se para novos indicadores de incentivo à produção de CT&I
no país, e garantir a execução do FNDCT conforme a previsão legal.
• Modernização e expansão da infraestrutura de CT&I, em especial junto
a centros de pesquisa, universidades e institutos de EPT, de modo a
viabilizar a execução de projetos inovadores com o governo, a socie-
dade e em parceria com o setor privado.
4. Denição de indicadores nacionais de produção de CT&I
É consenso internacional que a ciência, básica ou aplicada, se configura como
um bem público. Políticas nacionais e estaduais de investimento em CT&I e
internacionalização do ensino superior e da pesquisa constituem mecanismos
eficientes para criar ou agregar valor à produção científica, modelar mercados,
bem como dinamizar o ecossistema empreendedor de países como Alemanha,
Austrália, Suécia e Reino Unido, referências globais na produção de CT&I.
Nesse sentido, urge a definição de indicadores nacionais para a produção de
CT&I e de processos de internacionalização do ensino superior, visando asse-
gurar que o investimento em pesquisas cientificas esteja focado em estudos
41
de alto impacto e qualidade, a serem utilizados por entes do governo federal e
estaduais, de modo a mensurar os resultados alcançados em projetos financia-
dos e avaliar o impacto das políticas públicas implementadas.
Tais indicadores deverão envolver: número de publicações e seu impacto de
citação; a mobilidade e a internacionalização de docentes e discentes; o quan-
titativo de projetos em redes, inclusive com parceiros internacionais e do meio
empresarial; a empregabilidade de egressos no mercado de trabalho, em es-
pecifico em atividades de P&D; o número de start up qualificadas e de spin
offs criadas; ou ainda o quantitativo de registros de patentes e propriedade
intelectual submetidos, entre outros.
Diretrizes
de Política Pública
para o Ensino
Superior Brasileiro
2022
Semesp
Produção
Rodrigo Capelato
Fábio Reis
Coordenação Geral
Convergência Comunicação Estratégica
Coordenação Editorial
Ana Paula Rodrigues Morais
Projeto Gráfico e Diagramação
Diretoria Semesp
Lúcia Maria Teixeira
Presidente
iago Rodrigues Pêgas
1º Vice-Presidente
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2º Vice-Presidente
Hermes Ferreira Figueiredo In Memoriam
(1938-2021)
3º Vice-Presidente
Ruy Guérios
1º Diretor-Secretário
Paulo Pires Vila Verde
2º Diretor-Secretário
Cecília B. Pires Tavares De Anderlini
1ª Diretora-Financeira
Raul Gustavo Porto Gennari
2º Diretor-Financeiro
João Otávio Bastos Junqueira
Diretor De Relações Institucionais
Elmara Lúcia De Oliveira Bonini
Diretora De Segmento Universidade
Zely Fernanda De Toledo Pennacchi Machado
Diretora de Segmento Centro Universitário
Marcos Vinicius Busoli Cascino
Diretor de Segmento Centro Universitário
Tânia Cristina Bassani Cecílio
Diretora De Segmento Faculdade
Roberto Afonso Valério Neto
Diretor De Segmento Faculdade
Giácomo Pasetto Logatti
Membro Efetivo Do Conselho Fiscal
Joel Garcia De Oliveira
Membro Efetivo Do Conselho Fiscal
David José Hortenzi Vilela Braga
Membro Efetivo Do Conselho Fiscal
Marcos Antonio De Lima
Membro Suplente Do Conselho Fiscal
Frei iago Alexandre Hayakawa
Membro Suplente Do Conselho Fiscal
Paulo Antonio Gomes Cardim
Membro Nato Do Conselho Da Presidência
Rodrigo Capelato
Diretor Executivo
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