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Brasil nos tempos do Bolsonarismo: populismo e democracia antiliBeral

Authors:

Abstract

Brazil in the times of Bolsonarism: populism and iliberal democracy This article examines the extent to which the actions and reactions of the Bolsonaro movement and government approximate the characteristics of populism. To do this, we first identified these events in news articles and videos with speeches and speeches by Jair Bolsonaro. Then, we investigate the characteristics of populism in the movement that brought Bolsonaro to power and in his government. We argue that efficient political communication with ideological foundations allowed the maintenance of an important mobilized and active base. We find that the Bolsonaro government can be characterized as a right-wing "new populism" or "neopopulism", combining neoliberal populism with a more overtly authoritarian bias.
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Política / Revista de Ciencia Política
Vol. 59, Nº 2, 2021 / pp. 79-120
ISSN 0719-5338 versión en línea
ISSN 0716-1077 versión impresa
Brasil nos tempos do Bolsonarismo: populismo e
democracia antiliBeral
Jeerson Ferreira do Nascimento1
jfnasc@gmail.com
Universidade Federal de São Carlos – UFSCar, Brasil
Maria do Socorro Sousa Braga2
msbraga2009@gmail.com
Universidade Federal de São Carlos - UFSCar
Este artigo verica em que medida as ações e reações do movimento e do
governo Bolsonaro se aproximam das características do populismo. Para isso,
primeiro identicamos esses eventos em matérias jornalísticas e vídeos com
discursos e pronunciamentos de Jair Bolsonaro. Em seguida, averiguamos as
características do populismo no movimento que leva Bolsonaro ao poder
e no seu governo. Argumentamos que a comunicação política eciente
com fundamentos ideológicos permitiu a manutenção de importante base
mobilizada e ativa. Vericamos que o governo Bolsonaro pode ser caracterizado
como um “novo populismo” ou “neopopulismo” de direita, combinando
populismo neoliberal com um viés mais abertamente autoritário.
Palavras-chave: Brasil; Governo Bolsonaro; Populismo; Negacionismo; Neoliberalismo.
Brazil in the times of Bolsonarism: populism and
iliBeral democracy
This article examines the extent to which the actions and reactions of the
Bolsonaro movement and government approximate the characteristics of
populism. To do this, we rst identied these events in news articles and
videos with speeches and speeches by Jair Bolsonaro. Then, we investigate the
characteristics of populism in the movement that brought Bolsonaro to power
and in his government. We argue that ecient political communication with
ideological foundations allowed the maintenance of an important mobilized
and active base. We nd that the Bolsonaro government can be characterized
as a right-wing “new populism” or “neopopulism”, combining neoliberal
populism with a more overtly authoritarian bias.
Keywords: Brazil; Bolsonaro Government; Populism; Denialism; Neoliberalism.
1 Doutorando em Ciência Política (PPGPol / UFSCar). Docente EBTT no IFSP - Campus
Sertãozinho. Membro do Núcleo de Estudos dos Partidos Latino-Americanos - NEPPLA
2 Doutora em Ciência Política. Coordenadora da Pós-Graduação em Ciência Política, Departamento
de Ciências Sociais, Universidade Federal de São Carlos. Coordenadora do Núcleo de Estudos dos
Partidos Políticos Latino Americanos (NEPPLA).
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Brasil nos tempos do Bolsonarismo: Populismo e democracia antiliberal
Brasil en tiempos del Bolsonarismo: populismo y
democracia antiliBeral
Este artículo examina hasta qué punto las acciones y reacciones del movimiento
y gobierno de Bolsonaro se aproximan a las características del populismo.
Para hacer esto, primero identicamos estos eventos en artículos de noticias
y videos con discursos y discursos de Jair Bolsonaro. Luego, investigamos las
características del populismo en el movimiento que lleva al poder a Bolsonaro
y en su gobierno. Argumentamos que la comunicación política eciente con
fundamentos ideológicos permitió el mantenimiento de una importante
base movilizada y activa. Encontramos que el gobierno de Bolsonaro puede
caracterizarse como un “nuevo populismo” o “neopopulismo” de derecha, que
combina el populismo neoliberal con un sesgo más abiertamente autoritario.
Palabras clave: Brasil; Gobierno de Bolsonaro; Populismo; Negacionismo;
Neoliberalismo.
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Introdução
A eleição de Jair Bolsonaro em 2018 representou signicativas mudanças na política
partidária brasileira. Por um lado, rompeu o controle eleitoral que o Partido dos
Trabalhadores (PT) e o Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) mantiveram
por seis eleições consecutivas para o cargo presidencial (Braga & Zolnerkevic, 2020)
e, por outro, evidenciou o desarranjo do sistema multipartidário parlamentar. Entre
2010 e 2018, o número efetivo de partidos na Câmara dos Deputados aumentou de
11 para 16,46 pelo índice de Laakso e Taagepera, o número de siglas que obtiveram
cadeiras passou de 22 para 30, reduzindo o tamanho médio das bancadas dos maiores
partidos, o que correspondeu a uma fragmentação partidária de 0,939 pelo Índice
de Rae (Nascimento & Beker, 2021).
Uma sequência de eventos está relacionada a esses resultados. Em 2013 iniciaram
diversas manifestações populares que caram conhecidas como as Jornadas de
Junho, marcadamente focadas na negação aos partidos e à elite política. Os protestos
começaram em São Paulo contra o aumento na tarifa do transporte pública e se
nacionalizaram porque “[...] as expectativas dos trabalhadores, dos pobres e dos
jovens aumentaram mais rapidamente que seus rendimentos”, partidos e movimentos
sociais “[...] não conseguiram canalizar as manifestações para ns progressistas” e
“[...] as frustrações da aliança neoliberal foram assumidas agressivamente pela grande
imprensa” (Saad Filho & Morais, 2018: 210-211). Assim, os protestos inseriram
personagens e grupos de extrema-direita na cena política que reforçaram a retórica
antiestablishment (Nascimento & Beker, 2021).
Em 17 março de 2014, foi instalada a Operação Lava Jato3 pelo Ministério Público
Federal para apurar esquemas de corrupção envolvendo vários políticos do
governo e da oposição. De acordo com investigações e delações premiadas, estavam
envolvidos em corrupção: membros da administração da empresa petrolífera estatal
Petrobras, políticos da maioria dos partidos brasileiros, incluindo presidentes da
República, da Câmara dos Deputados e do Senado, além governadores estaduais
e destacados empresários brasileiros. Ainda que tenha ocorrido pouco impacto nas
3 Conjunto de investigações que apurou um esquema de lavagem de dinheiro que movimentou
bilhões de reais empropinas, iniciada em Cur itiba (capital do Paraná) e com desdobramentos em São
Paulo, Rio de Janeiro e Brasília. A operação contou com70 operações em Curitiba autorizadas, entre
outros, pelo então juizSérgio Moro, e cerca 50 operações nas outras cidades. Foram cumpridos mais
de milmandados de busca e apreensão, deprisões temporárias e preventivase decondução coercitiva
e mais de 200 condenações. O nome advém do uso de um posto de combustíveis para movimentar
valores de origem ilícita, identicado na primeira fase da operação quando o doleiroAlberto Youssef
foi preso. A operação foi encerrada em fevereiro de 2021 (Nascimento & Beker, 2021). Há estudos
que relacionam o avanço da operação ao giro iliberal no país (Silva, 2020) e uma série de análises
dos impactos sobre a economia, o Judiciário, as atividades do Congresso e sobre à mídia e opinião
pública (Kerche & Feres Júnior, 2018). Além disso, conteúdos vazados e divulgados na imprensa e
em livro, conhecidos como “Vaza-Jato”, indicam uma série de violações cometidas por membros da
força-tarefa (Duarte & The Intercept, 2020).
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Brasil nos tempos do Bolsonarismo: Populismo e democracia antiliberal
atividades legislativas no Congresso Nacional e nas “condições de funcionamento
do Legislativo”, a forte presença nos meios de comunicação criou um clima político
que ativou sentimentos contrários à classe política nacional e, junto à crise política e
econômica, favoreceu o impeachment de Dilma Rousse e afetou o sistema partidário
brasileiro (Braga et al, 2018: 194).
Dois anos depois, ocorreu o impeachment de Dilma Rousse (PT), com o apoio do
vice-presidente Michel Temer (Movimento Democrático Brasileiro - MDB), da
maioria da representação parlamentar no Congresso Nacional, da classe média e de
boa parte do empresariado nacional4. Ao assumir a presidência da República ainda
em 2016, Temer reintroduziu os militares no Executivo, recriando o Gabinete de
Segurança Institucional (GSI), que passou às mãos do general Sérgio Etchegoyen.
Temer foi o primeiro presidente após a redemocratização a nomear um militar
para chear o Ministério da Defesa – o general Joaquim Silva e Luna. Além desses,
o general Carlos Alberto dos Santos Cruz foi Secretário Nacional de Segurança
Pública, o general Fraklimberg Ribeiro Freitas cheou a Fundação Nacional do
Índio – FUNAI e o general Walter Braga Netto comandou a intervenção federal
no estado do Rio de Janeiro em 2018. No entanto, cumpre lembrar que parte da
corporação já estava atuando na política institucional, elegendo representantes nos
legislativos, municipais, estaduais e no Congresso Nacional.
Na Câmara dos Deputados brasileira, organizaram a Frente Parlamentar de
Segurança Pública (a chamada bancada da bala). Jair Bolsonaro, inclusive, é um desses
representantes. Por isso, enquanto deputado concentrou a maioria de suas propostas
em benefícios para servidores militares e na área de segurança pública. Dos 171
projetos de leis apresentados, somente dois foram aprovados e tornaram-se leis (uma
foi revogada posteriormente pelo Supremo Tribunal Federal – STF). Sua trajetória
como parlamentar, foi marcada pela retórica antiestablishment e por manifestações
que expressam o saudosismo pelo período da ditadura militar, ocorrida no Brasil
entre 1964 e 1985 (Estadão Conteúdo, 2017; Franco & Odila, 2018).
Foi nesse contexto que o ex-tenente e deputado federal Jair Bolsonaro ascendeu à
presidência da República pelo pequeno Partido Social Liberal (PSL). Durante sua
campanha eleitoral, como veremos adiante, sua retórica de comunicação política
foi estrategicamente orquestrada com elementos populistas, fascistas, autoritários
e morais. Ações e atitudes durante esses quase três anos de mandato expressaram
esses valores e visão de mundo, levando estudos sobre a política brasileira a certa
controversa sobre como denir conceitualmente o movimento e o governo
bolsonarista. Neste artigo, nosso objetivo é responder a seguinte questão: é possível
identicar as principais características do populismo, elencadas por Finchelstein
4 Na ocasião, o então deputado Jair Bolsonaro, após votar favorável à deposição de Dilma Rousse,
homenageou o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, o primeiro militar reconhecido pela Justiça
Brasileira como torturador durante a ditadura militar.
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(2019), no governo de Jair Bolsonaro? A identicação do bolsonarismo5, enquanto
movimento, como expressão do populismo já encontra amparo em publicações
acadêmicas (Maitino, 2020; Pinto Neto & Cipriani, 2021) e para analisar o governo,
além do foco em Finchelstein (2019), resgatamos formulações de Eatwell e Goodwin
(2020).
Nosso argumento é o de que Bolsonaro consegue manter importante base de apoio
mobilizada e ativa devido à capacidade de se comunicar de modo eciente com
sua base em termos ideológicos, independente das causas reais dos problemas que
afetam a situação do país. Por isso, ainda que os conitos entre os poderes possam ter
origem na incapacidade de montar uma coalização segura para a governabilidade e
ainda que o agravamento da pandemia decorra, em boa parte, da inépcia de setores-
chave do governo, Bolsonaro e sua equipe de coordenação conseguem alimentar
a retórica de conspiração contra um governo que enfrentaria vícios do sistema e
consegue cumprir aquelas características centrais do populismo apontadas acima
combinadas com o neoliberalismo. Conforme é possível vericar, a resiliência e a
proatividade de sua base se explicam pelo caráter não transacional desses eleitores,
que não se orientam exclusivamente em custos e benefícios, mas no desejo de trazer
de volta à agenda um conjunto de valores e pela busca por retomar sua voz no
debate político (Eatwell & Goodwin, 2020).
Em termos metodológicos, utilizamos a análise de discurso (Fairclough, 2001;
cheux, 1990; Pinto, 2006) em declarações e entrevistas de Bolsonaro e atores
diretamente vinculados ao governo.6 Marcadamente, movimento e governo são
fases complementares do fenômeno político e, para ns analíticos, focalizamos a
conversão do movimento em governo e examinamos elementos que expressam a
atuação e a forma de comunicação do governo com sua base de apoio.
O artigo está organizado em duas seções. A primeira trata das considerações
teórico-metodológicas que sustentam a análise. A segunda está subdivida em cinco
tópicos correspondentes às características que estruturam nossa análise empírica.
Cada tópico é construído a partir de manifestações de Bolsonaro e atores políticos
relevantes vinculados ao governo. Encerramos o texto com as conclusões.
5 Bolsonarismo é um movimento de base neopentecostal e militarista que remete à noção de
populismo autoritário. Transcende a gura de Bolsonaro e preconiza uma nova maneira de integrar
as classes populares por intermédio do trabalho, negando a legitimidade dos conitos de classe e
criando uma lógica de oposição entre as pessoas/cidadãos de bem e as potenciais ameaças ao “Brasil
Unicado” (Pinto Neto & Cipriani, 2020).
6 Essa distinção entre movimento de oposição e regime/governo encontra base em Finchelstein
(2019).
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Brasil nos tempos do Bolsonarismo: Populismo e democracia antiliberal
1. Considerações teórico-metodológicas
O debate sobre o populismo na América Latina possui mais de meio século. Um dos
pioneiros, Di Tella (1973), identica que o populismo se orienta por setores de classes
não trabalhadoras – como elites políticas – que conduzem o partido para defender
propostas contrárias ao status quo; se fundamenta no apoio popular de uma massa
mobilizada, cuja comunicação com o líder é facilitada por uma ideologia ou estado
emocional baseado no entusiasmo; e não pode ser explicado apenas pelo baixo nível
educacional de países não desenvolvidos. Ianni (1973: 85) identicou o populismo
latino-americano como uma etapa da evolução das contradições entre sociedade
nacional e economia dependente, resultante das crises do capitalismo mundial e
das crises das oligarquias latino-americanas. Para Weort (2003), o populismo
expressava a crise do liberalismo e da oligarquia brasileira em que as classes populares
participariam através de movimentos sociais de composição heterogênea, submetidos
à liderança personalista e organizados sob partidos com estrutura autoritária que
pressiona pela participação no Estado sem propor a superação do sistema capitalista.
No Brasil, populismo é um conceito com elevado “[...] compartilhamento,
plasticidade e solidicação” e emprego recorrente dentro e fora da academia,
marcando a cultura política nacional (Gomes, 2001: 20). Em linhas gerais, refere-
se a uma “política de massas” vinculada à “proletarização dos trabalhadores” não
organizados politicamente como classe e combina “[...] certa conformação da
classe dirigente [...] sem condições de dirigir com segurança o Estado” e um “líder
populista” carismático que consegue “[...] mobilizar as massas e empolgar o poder”
(Gomes, 2001: 24-25).
Laclau (2005; 2013) não refuta as denições anteriores, mas apresenta uma perspectiva
na qual o populismo é uma lógica baseada em nós, o “povo”, contra eles, o “outro”.
Nessa lógica, demandas são “[...] formuladas para o sistema por alguém que foi
excluído dele” e “[...] pressupõe algum tipo de exclusão ou privação” (Laclau,
2013: 191). Na mesma linha, Moue (2020) informa uma ruptura no consenso
centrípeto vigente até a Crise de 2008, fomentando a crítica à hegemonia neoliberal
e fortalecendo movimentos antissistema de esquerda e direita que prometeram
devolver a voz ao povo. O populismo, portanto, é uma lógica política que faz
parte da democracia e a esquerda deveria reconhecer que muitas demandas dos
movimentos populistas são democráticas e fomentar a vontade coletiva (“populismo
de esquerda”) (Moue, 2020).
Em sentido diverso, Rummens (2017) defende que o populismo e a democracia
liberal reclamam a soberania popular. No entanto, cada um dene o povo, o
demos, de modo distinto: os populistas defendem a ideia de que “povo” é uma
comunidade homogênea com identidade coletiva, enquanto “povo” na democracia
liberal é uma pluralidade irredutível de cidadãos livres e iguais. Como partem
de premissas antagônicas e irreconciliáveis, o populismo pode ser um sintoma da
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crise da democracia liberal, mas não seria capaz de corrigi-la porque a ameaça ao
não reconhecer a natureza intersubjetiva da democracia, culminando na defesa da
singularidade da vontade do povo que pode ser capturada pelo partido ou pelo líder
populista. Os eleitores percebem as limitações das instituições políticas tradicionais
face ao crescimento das instituições supranacionais neoliberais e dos acordos
comerciais. Ou seja, também a tecnocracia ameaça à democracia liberal ao fazer
desaparecer o lugar do poder por retirar dos cidadãos os meios eleitorais efetivos para
se fazer representados. A alternativa seria uma estratégia concêntrica de contenção:
as forças democráticas teriam relativa liberdade para atuar na esfera informal e as
restrições seriam continuamente ampliadas conforme elas se aproximassem do
centro do poder (Rummens, 2017).
A ascensão de Bolsonaro seria um bom exemplo da imagem da captura do árbitro
e da retirada do melhor jogador adversário (Levitsky & Ziblatt, 2018). Luís Inácio
“Lula” da Silva foi retirado da corrida eleitoral de 2018 por decisões polêmicas do
então juiz Sérgio Moro. Lula liderava as pesquisas de intenção de votos e, além das
decisões em primeira instância de Moro, que mais tarde foram anuladas pelo STF,
o intervalo entre a primeira instância e o julgamento em segunda instância pela
8.° turma do Tribunal Regional Federal da 4.° Região – TRF4 foi o mais rápido
da Operação Lava Jato. Moro, ainda em 2018, foi convidado para ser Ministro da
Justiça de Bolsonaro e largou a magistratura. Ainda no período eleitoral, a estratégia
de desacreditar o sistema político foi levada a cabo: Bolsonaro questionou as urnas
eletrônicas e armou, sem provas, que deveria ter sido eleito no primeiro turno e
estigmatizou o opositor, Fernando Haddad (PT), que concorreu no lugar de Lula.
Além disso, Levitsky e Ziblatt identicam que esses políticos com retórica
antiestablishment, com apelos nacionalistas e autoritários, ao ganhar popularidade
atraem políticos tradicionais que buscam de aproveitar a onda de popularidade:
não atoa, além de apoio de importantes lideranças liadas a partidos tradicionais,
como Democratas – DEM e MDB, candidatos a governador de partidos tradicionais
colaram sua imagem a Bolsonaro. Por exemplo, o “BolsoDória” em que João Dória
(PSDB) candidato ao governo estadual de São Paulo foi associado a Bolsonaro no
segundo turno. Tais acontecimentos demonstram que os partidos, entendidos por
Levitsky e Ziblatt como guardiões do sistema democrático, falharam: se por um
lado, Bolsonaro concorreu por um partido menor, o PSL, com poucos recursos
tradicionais de campanha; por outro, políticos desses partidos tradicionais conferiram
legitimidade à campanha de Bolsonaro pela aproximação e pelo considerável processo
de estigmatização e deslegitimação do PT – sobretudo a partir dos protestos de 2013
(Carazzai & Tavares, 2017; Levitsky & Ziblatt, 2018; Miranda, 2021; Tavares, 2021).
Do ponto de vista do vínculo ideológico, ainda não há consenso sobre como
classicar o governo Bolsonaro. Uma das possibilidades é pelo conceito de populismo
autoritário de direita, de Norris e Inglehart (2019). Os autores identicaram que o
avanço do populismo liberal, pautado pelo liberalismo social e pautas progressistas,
entre os mais jovens e instruídos, provocou uma reação dos setores mais conservadores,
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Brasil nos tempos do Bolsonarismo: Populismo e democracia antiliberal
agravados pela insatisfação com o aumento dos uxos imigratórios, culminando
no fortalecimento do populismo autoritário. Para eles, o populismo é um estilo
retórico, compatível com líderes autoritários, cujas estratégias discursivas buscam
deslegitimar intelectuais, priorizam a segurança coletiva à mudança social, defende
a preservação da tradição e do modo vida e a obediência aos líderes do grupo.
Normalmente, adotam políticas públicas contrárias à ciência, baseadas em “nós”
contra “eles” visando deslegitimar as instituições políticas da democracia liberal.
Há populistas de direita e de esquerda e Bolsonaro se aproxima do populismo
autoritário de direita, que revelou Nigel Farage durante a campanha do Brexit e
que elegeu Donald Trump, nos Estados Unidos, e Viktor Orbán, na Hungria. No
entanto, o sucesso eleitoral de populistas autoritários está vinculada à tendência
de maior participação eleitoral da geração do Entreguerras do que da geração dos
millenials. Assim, não se trata de um avanço conservador ou um inuxo de valores
mais progressistas porque, graças à mudança intergeracional de valores, a educação
universitária, o crescimento da igualdade de gênero e a urbanização, está em curso
uma “revolução silenciosa” que move as sociedades ocidentais para se tornarem
“socialmente mais liberais em décadas sucessivas” (Norris & Inglehart, 2019: 122,
tradução nossa).
Outra chave é o conceito de nacional-populismo, de Eatwell e Goodwin (2020),
que designa um movimento que prioriza a cultura e os interesses da nação com a
promessa de dar voz às pessoas que se sentem negligenciadas e desprezadas pelas elites
políticas. Por essa perspectiva, apesar de desaar o mainstream do sistema político,
o movimento apresenta demandas legítimas e não se congura um movimento
necessariamente antidemocrático porque apenas a minoria dos adeptos expressa
racismo, xenofobia e o desejo de destruir as instituições políticas da democracia
representativa. A origem do movimento está associada a quatro mudanças sociais:
(1) desconança em relação aos políticos e às instituições; (2) medo da destruição
de sua comunidade, identidade histórica e modo tradicional de vida; (3) a privação
relativa (a sensação de estar cando para atrás na economia globalizada); e (4) o
desalinhamento dos partidos tradicionais.
Portanto, diferente de Norris e Inglehart (2019), não creem em movimento
passageiro, que será desmobilizado com o crescimento econômico e com a
substituição de pessoas mais idosas pelos millenials – apesar de concordarem que
pessoas com Ensino Superior tendem a ser mais liberais em questões sociais. É um
movimento de décadas que se enraizou no tecido das sociedades, composto por
eleitores que não são transacionais e buscam resgatar uma série de valores. Por isso,
os partidos do mainstream cada vez mais se assemelham ao nacional-populismo em
busca de eleitores, o que pode fazer com que “populistas leves” (políticos e partidos
do mainstream incorporam pautas) vençam algumas eleições, em vez dos populistas
típicos. Em sua edição brasileira, os autores lembram que Jair Bolsonaro é associado
a esse movimento, mas alertam que a base bolsonarista é diferente e não pode ser
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reduzida apenas ao desejo de uma liderança autoritária ou governo militar (Eatwell
& Goodwin, 2020).
Finchelstein (2019) concorda que o cerne do populismo seja essa crença em um
povo único que substitui a representação pela transferência de autoridade para o líder.
Mas, diferente de Rummens (2017), não identica no populismo o potencial para
destruir sozinho a democracia e argumenta que instituições fortes historicamente
evitaram o avanço populista, que tende a prosperar em democracias emergentes e
muito desiguais. Portanto, tratar o populismo como negativo a priori é uma forma de
não debater que o aumento da desigualdade reduz a legitimidade da representação
democrática, o que serviria a um modo interesseiro de associar democracia ao
neoliberalismo. Mas, o neoliberalismo e o populismo compõem um processo de
“desguração da democracia”. Inclusive, a partir dos anos 1980, a associação entre
nacionalismo e neoliberalismo abriu caminho para que o populismo não só se
apresentasse como alternativa, mas, por vezes, se fundisse ao neoliberalismo. Este
seria o populismo neoliberal, que é menos enfático nas questões raciais e incorpora
um nacionalismo renovado que não é tão radical nos assuntos econômicos. Apesar
dessa fusão provocar a aparência de novidade, as raízes autoritárias advêm do período
Entreguerras em que o populismo moderno se construiu a partir da incorporação
de características do fascismo (Finchelstein, 2019: 50).
Finchelstein (2019) identica que, apesar de serem conceitual e contextualmente
distintos, o populismo apresenta incorpora as seguintes características do fascismo:
recusa a verdade empírica, tratando o que incomoda como mentira ou conspiração
da mídia e/ou de opositores; estetiza a política, provocando a redução das categorias
de análise política a imagens; na oposição, agem como movimento de protesto e
mostram os limites das elites políticas; no governo, confunde votos das maiorias
eleitorais com delegação do poder total ao líder; se apresentam como antipolítica,
prosperando em situações de crise reais ou imaginadas. Além desses aspectos,
o populismo deve ser, para Finchelstein (2019), denido com base em dezesseis
características (Finchelstein, 2019: 135-136). Para este artigo consideramos as heranças
do fascismo aproveitadas pelo populismo e agrupamos nelas as características gerais
do populismo, conforme o quadro 1.
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Brasil nos tempos do Bolsonarismo: Populismo e democracia antiliberal
Quadro 1:
Características do populismo, com base em Finchelstein (2019)
Heranças do fascismo no
populismo e tópicos de
análise no artigo
As dezesseis características do populismo
Como foram agrupadas as dezesseis características do populismo nos tópicos do artigo denidos a partir das cinco heranças
do fascismo
Recusa da verdade
empírica
-
Antagonistas são inimigos
do povo
“5) A percepção dos antagonistas políticos como o
antipovo”;
“9) Identicação do movimento e dos líderes com o povo
como um todo”;
“13) Uma ideia homogeneizadora como uma entidade
única que, quando o populismo se torna regime, é depois
equiparada às suas maiorias eleitorais”;
“14) Um profundo antagonismo e até aversão ao
jornalismo independente”;
Estetização da política
“2) Uma forma extrema de religião política”;
“3) Uma visão apocalíptica da política que apresenta os
sucessos eleitorais e as transformações que esses sucessos
transitórios permitem como momentos revolucionários da
fundação ou refundação da sociedade”;
“4) Uma teologia política fundada por um líder messiânico
e carismático”;
“8) Uma ideia do líder como personicação do povo”;
“12) Autoapresentação da sua defesa da verdadeira
democracia e oposição a formas imaginárias ou reais de
ditadura e tirania”;
Confusão de maioria
eleitoral com delegação
total ao presidente e forma
autoritária de democracia,
rejeitando a ditadura
“1) Uma ligação a uma democracia antiliberal, eleitoral e
autoritária que rejeita, na prática, a ditadura”;
“6) Um fraco entendimento do Estado de Direito e da
separação dos poderes”;
“10) A armação da antipolítica, que na prática signica
superar a política dos costumes”;
“11) O ato de falar em nome do povo contra as elites
dirigentes”;
“15) Uma aversão ao pluralismo e à tolerância política”;
Nacionalismo extremo
com valorização da cultura
popular ou cultura de
celebridade
“7) Um nacionalismo radical”;
“16) A insistência na cultura popular e até, muitos casos,
no mundo do entretenimento como representação das
tradições nacionais”;
Fonte: Elaborado com base em Finchelstein (2019) e organizado conforme desenho do artigo.
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Vol. 59, N°2 (2021)
Em entrevista para o Jornal El País, publicada em 29 de junho de 2019, Federico
Finchelstein identicou Bolsonaro como “um novo populismo que combina o
neoliberalismo com o ranço fascista” marcado pelo “racismo, violência política [...]
e elogios à ditadura”. Ou seja, se não há fascismo sem ditadura e nem populismo
sem eleições, essa combinação complexa faz de Bolsonaro “um dos populistas mais
próximos ao fascismo” (Pita, 2019). Portanto, apesar de comprometido com uma
agenda neoliberal, Bolsonaro é diferente dos populistas neoliberais típicos, como
Carlos Menem (Argentina), Fernando Collor (Brasil), Abdalá Bucarám (Equador),
Alberto Fujimori (Perú) e Silvio Berlusconi (Itália) devido a uma retórica mais
carregada de elementos violentos e discriminatórios. Trata-se, portanto, de um
neopopulismo de direita de corte neoliberal e que pouco dissimula as heranças
fascistas. Por isso, nosso modelo analítico selecionou como elementos estruturantes
as reminiscências fascistas no populismo para denir os tópicos de análise, como
exposto no quadro 1 (Finchelstein, 2019: 50 e 134)7.
7 O neopopulismo de corte neoliberal não deixa de ser um movimento de massa e demanda acenos
aos trabalhadores cuja condição de classe não se traduziu em organizações políticas de classe. Na
campanha, Bolsonaro explorou a retórica de que o Estado seria usado para sustentar privilégios.
O aceno aos que se sentiam “deixados para trás” prometia “retirar o peso do Estado das costas
de quem produz”, desburocratizar e fomentar o empreendedorismo. Nesta linha, as críticas às
medidas de isolamento social acusavam o uso do Estado para tolher a liberdade de produzir. Além
da retórica, há medidas econômicas nesse sentido. Sem prejuízo dos compromissos neoliberais, o
governo Bolsonaro instituiu o Auxílio Emergencial para socorrer pessoas cuja renda foi afetada
pela pandemia. A despeito da demora do governo para a denição do auxílio e de o primeiro valor
de R$ 600 ter sido em virtude de um aumento denido pelo Congresso, o governo capitalizou
apoio entre segmentos sociais de menor renda, segundo a pesquisa do Datafolha de março de 2021.
Com o agravamento da pandemia no ano de 2021, o avanço da inação e a redução no auxílio,
a popularidade de Bolsonaro caiu. Em reação, o governou anunciou a prorrogação do Auxílio
Emergencial e a substituição do Programa Bolsa Família pelo Programa Auxílio Brasil (Medida
Provisória 1.061/2021) em novembro de 2021. O novo programa pagará um benefício 20% maior
que o Bolsa Família com um valor mínimo de R$ 400 para famílias em situação de pobreza e
extrema pobreza. Além de substituir o Bolsa Família, incorpora outros programas com fundamentos
muito distintos: como o Auxílio Esporte Escolar, Bolsa Iniciação Cientíca Júnior, o Auxílio Criança
Cidadã e o –recém-criado pelo Congresso – Auxílio Gás Social. A previsão é atender cerca de 17
milhões de família enquanto o anterior atendia 14,7 milhões. Apesar do aumento, o número de
famílias atendidas não corresponde nem a metade das 40 milhões de famílias cobertas pelo Auxílio
Emergencial. Além disso, a forma de pagar o auxílio sem mexer no Teto de Gastos –que garante
parte do orçamento ao setor nanceiro detentor de títulos da dívida pública– é a proposição de
Proposta de Emenda Constitucional que dá ao governo a possibilidade de parcelar e arrolar os
precatórios (Precatórios são dívidas da Fazenda Pública com decisão judicial denitiva com pessoas
físicas e empresas). Antes do Auxílio Emergencial, em abril de 2020, as medidas para redução dos
impactos da pandemia foram direcionadas às empresas (suspensão do pagamento do Fundo de
Garantia por Tempo de Serviço – FGTS, redução das contribuições devidas pelo Sistema S –grupo
de organizações empresariais da Indústria, do Transporte, do Comércio e outros–, a suspensão de
pagamentos de nanciamento diretos e indiretos de empresas); o Banco Central, ainda em março de
2020, liberou R$ 1,2 trilhão para o setor bancário e previa que a medida liberasse até R$ 91 bilhões
para o mercado (Brasil, 2021; Felix, 2021; Governo do Brasil, 2020; Ministério da Economia, 2020;
Schmitt, 2021).
90 Política / Revista de Ciencia Política
Brasil nos tempos do Bolsonarismo: Populismo e democracia antiliberal
Esta análise de discurso foi realizada em duas etapas. Primeiro, vericamos se as
características acima estavam presentes no governo Bolsonaro como forma de
comunicação e mobilização da sua base de apoio. Em seguida, contextualizamos
como tais características se realizam no movimento que leva Bolsonaro ao poder
e, principalmente, durante o governo, tendo como locus principal (e não único)
a atuação no combate à pandemia. Para tal empreendimento, utilizamos matérias
jornalísticas que descrevam ações do referido governo e, principalmente, vídeos que
contenham discursos e pronunciamentos de Bolsonaro.
Vericamos se as ações e comunicações do governo se enquadram nos marcos do
populismo. Outros autores analisam o bolsonarismo enquanto movimento. Maitino
(2020), com base na formulação de populismo de classes dominantes de Ernesto
Laclau, para compreender o bolsonarismo e seus elementos de coesão, identica
que o populismo bolsonarista se articula a partir de um embate moral cujas “[...]
tensões do campo econômico são apagadas, anal o trabalhador não se opõe ao
empresário, mas aos vagabundos” e tanto os trabalhadores como “[...] pequenos e
grandes empresários são explorados por um Estado corrupto” (Maitino, 2020: 16).
Deste modo, a categoria “cidadãos de bem” se opõe à esquerda, ao comunismo e
“velha política”, que ameaçam valores, promovem divisões entre povo, concebido
como homogêneo, e agem contrariamente ao Brasil. Além disso, buscou “[...]
compreender a construção ideológica do movimento que levou Jair Bolsonaro à
presidência” (Maitino, 2020: 2). Pinto Neto e Cipriani (2021) buscaram comparar
a ascensão do bolsonarismo com a ascensão do populismo autoritário que
impulsionou o thatcherismo a partir do nal dos anos 1970, baseando-se em Stuart
Hall e conferindo “a centralidade do punitivismo para a compreensão do fenômeno
[...] com a utilização de conceitos como de ‘pânico moral’, por exemplo” (Pinto
Neto & Cipriani, 2021: 43).
Não estamos negando a existência da verdade. Inclusive, elencamos como
fundamental a recusa da verdade empírica. No entanto, para o tratamento do
discurso neste artigo é necessário compreendê-lo como uma construção discursiva
que busca romper com uma realidade preexistente. O discurso político, portanto,
busca conferir um dado sentido à realidade que se encontra constantemente em
disputa e está sempre sujeito à desconstrução, como consequência dessa disputa e
de não se pautar por uma realidade preexistente (Fairclough, 2001; Pêcheux, 1990;
Pinto, 2006).
Em uma sociedade democrática os locais de enunciação dos discursos políticos são
cada vez mais numerosos. No entanto, esses discursos “[...] têm locais de enunciação
especícos, ou seja, é absolutamente legítimo quando partem de partidos
políticos, de assembleias legislativas, do governo” (Pinto, 2006: 91). Neste sentido,
Bolsonaro consolidou novas formas e locais para enunciar discursos destinados aos
seus apoiadores. Para além dos canais institucionais e ociais à disposição de um
presidente, Bolsonaro utiliza redes sociais com perl pessoal, lives e contato corpo
a corpo com seus seguidores. Essa forma de comunicação, apesar de não ser ocial,
91
Jeerson Ferreira do Nascimento-Maria do Socorro Sousa Braga
Vol. 59, N°2 (2021)
o aproxima de seus seguidores e confere dinamismo em sua busca para “[...] impor
sua verdade a muitos” (Pinto, 2006: 89). Deste modo, o dinamismo para enunciar
de modo mais direto à sua base também oferece mais proteção, dada a inerente
fragilidade e provisoriedade do discurso. Ao fazê-lo em ambiente relativamente
controlado e pensado para a reprodução viral em redes sociais e grupos de WhatsApp
e Telegram, a desconstrução feita pelos outros ocorre posterior à incorporação do
discurso pela base – não se trata mais da reação a um enunciado, mas uma reação a
sentidos já compartilhados por uma dada comunidade. Por ser diferente de outros
modos sujeitos à edição e a denição do tempo da divulgação pelos veículos de
comunicação, o caráter constantemente reativo a esses pronunciamentos reforça a
sensação de uma postura oposicionista dos meios de comunicação não alinhados e,
portanto, favorece a desqualicação a priori desses meios perante os apoiadores.
A construção do corpus –amostras de discursos analisados– começaria por ocorrências
durante a pandemia. Mas, como o corpus deve ser “[...] aberto e com possibilidades de
crescimento em resposta a questões que surgem na análise” (Fairclough, 2001: 278),
incorporamos declarações e entrevistas a partir das eleições de 2018 para enfatizar a
manutenção do padrão discursivo. Foram duas etapas: vericamos se as características
elencadas por Finchelstein (2019) estavam presentes no governo Bolsonaro e
contextualizamos como tais características se expressam durante o governo, tendo
como locus principal (e não único) o combate à pandemia. Para isso, utilizamos
matérias jornalísticas que descrevem ações do referido governo e, principalmente,
vídeos com declarações de Bolsonaro, com destaque àquelas proferidas para sua
base em lives e redes sociais e a interação diária com seus seguidores no chamado
“cercadinho”8.
Bolsonaro, apesar de não ser completamente outsider9, construiu sua campanha
apelando à renovação e fazendo críticas às elites políticas, colocando no mesmo
nível da corrupção as negociações e coordenações necessárias para a composição
8 “Cercadinho” é o apelido do local montado na frente do Palácio da Alvorada –a residência ocial
do presidente– reservado para Bolsonaro dar declarações e tirar fotos com seus seguidores (Lavieri,
2020).
9 O termo outsider não possui uma denição inequívoca e pode se referir: (1) ao candidato que
concorre sem experiência política prévia; (2) a políticos que estão às margens do establishment e
não pertencentes a partidos competitivos; e (3) a candidatos que ascendem em partidos novos com
tendência de se tornarem competitivos. Bolsonaro era um político com quase trinta anos de carreira
política (1) e, apesar de construir sua imagem comunicando sua rejeição ao mainstream e anunciando
uma “nova” política, não esteve às margens do jogo político tradicional nesse período (2). Muitos
enfatizam o parlamentar Bolsonaro de pouca relevância antes de sua marcha para a presidência, mas
ele esteve majoritariamente em partidos competitivos: entre 2003 e 2016, no atual Progressistas-PP
(que concorreu com outros rótulos: Partido Progressista Reformador-PPR, Partido Progressista
Brasileiro-PPB e Partido Progressista-PP); entre 2003-2005, no Partido Trabalhista Brasileiro-PTB;
em 2005, no Partido da Frente Liberal (atual DEM); e, entre 2016 e 2016, no Partido Social Cristão-
PSC, ligado à denominação pentecostal Assembleia de Deus (2). A sua designação como outsider pode
estar ligada ao fato de vencer as eleições sem os recursos tradicionais de campanha (3), fato que o
92 Política / Revista de Ciencia Política
Brasil nos tempos do Bolsonarismo: Populismo e democracia antiliberal
de coalizões capazes de conferir governabilidade. Em entrevista concedida para o
Jornal Folha de São Paulo, em 20 de março de 2019, o cientista político Fernando
Limongi apresentou os limites desse discurso: a corrupção não é resultado da oferta
de cargos a partidos para formação de coalizão; a corrupção pode decorrer de
outras fontes que não àquelas ligadas às negociações com partidos; e a estratégia
de fundamentar o governo em bancadas temáticas (ruralista, evangélica e da bala)
não daria governabilidade a Bolsonaro posto que os partidos organizam o processo
político, as bancadas temáticas não conseguem denir a agenda no Congresso e têm
recursos limitados para garantir a disciplina dos membros (Carvalho, 2019).
2. Por que se trata de populismo? Dimensões e vericação
empírica
I. Recusa da Verdade Empírica
Desde a identicação dos primeiros casos da Covid-19 no Brasil, o presidente
Bolsonaro minimizou a gravidade da pandemia e negou recomendações cientícas.
Antes, o Brasil ocupava a 22.° posição no Índice Global de Segurança em
Saúde de 2019 da Universidade John Hopkins, e se destacava com um 9.° lugar,
especicamente, em “[...] respostas rápidas ao alastramento de epidemias e mitigação
de suas consequências”. No entanto, segundo Instituto Lowy, da Austrália, o Brasil foi
a pior resposta à Covid-19 entre 98 países em 2020. Esse resultado se deve à ausência
de articulação federal para acionar o Sistema Único de Saúde – SUS10 e dispositivos
como o Programa Nacional de Imunização, o Programa Saúde da Família e outros,
fruto de uma aposta na “[...] imunidade de rebanho11 [...] em vez de adotar medidas
reconhecidas pela ciência para enfrentar a crise” (Agência Senado, 2021).
Nesta linha, em outubro de 2020, Bolsonaro sustentou que “[...] havia muitas pessoas
que já tiveram o vírus e nem sabia e já estavam imunizadas” (UOL, 2021d). Em
dezembro de 2020, armou: “Eu não vou tomar [vacina]. Alguns falam que eu estou
dando péssimo exemplo. Ô imbecil, ô idiota –que está dizendo que eu dou péssimo
exemplo– eu já tive o vírus, eu já tenho anticorpos” (UOL, 2020c). Após mais
levou a agir como outlier – uso intensivo das mídias digitais (Frazão, 2018; Câmara dos Deputados,
online; Braga et al, 2021).
10 O SUS do Brasil, conforme artigo 198 da Constituição de 1988, garante o atendimento integral e
gratuito a todo cidadão, através de uma rede regionalizada e hierarquizada de serviços, nanciada
pela sociedade, através de recursos oriundos da União, estados, Distrito Federal e municípios. Suas
principais diretrizes são: a descentralização, cabendo a cada esfera de governo o nanciamento e a
execução; o atendimento integral de todas as ações em saúde a todo cidadão, priorizando atividades
preventivas; e a participação da comunidade na gestão (Brasil, 1988).
11 Também conhecida como imunidade coletiva “[...] dene o momento em que a cadeia de
transmissão de uma doença dentro de um grupo populacional é interrompida por se ter atingido
um grande percentual de indivíduos já imunizados” (Rede D’or São Luiz, online).
93
Jeerson Ferreira do Nascimento-Maria do Socorro Sousa Braga
Vol. 59, N°2 (2021)
de um ano de transmissão comunitária da Covid-19, continuou a defender ideias
relacionadas à imunidade coletiva: “Todos que contraíram o vírus estão vacinados,
até de forma mais ecaz que a própria vacina porque você pegou o vírus para valer”
(Os Pingos nos Is, 2021).
Desde abril e maio de 2020, a comunidade cientíca alertava a falta de comprovação
cientíca para a ecácia da cloroquina e da hidroxicloroquina no tratamento da
Covid-19, com importantes evidências da falta de segurança do medicamento (Coll,
2020). O que foi conrmado em diversos estudos, inclusive recentes (Axfors et al,
2021). O governo Bolsonaro agiu em sentido contrário: tentou alterar a bula do
medicamento, via decreto, para associá-lo ao tratamento da Covid-19.
A queda de dois ministros da Saúde, entre abril e maio de 2020, culminou na
efetivação do general Eduardo Pazuello que liberou o uso da cloroquina e da
hidroxicloroquina para os pacientes leves da Covid-19, elevou os gastos para
produzir, comprar e distribuir o medicamento; criou uma plataforma chamada
TrateCov, que foi ao ar em janeiro de 2021 e foi retirada de funcionamento no
mesmo mês, que incentiva a adoção do chamado “tratamento precoce”; também
em janeiro de 2021, o ministro Pazuello esteve Manaus, em meio à dramática crise
decorrente da Covid-19 e da escassez de cilindros de oxigênio, incentivando o uso
do “Kit Covid”12 (Accioly, 2021; Nascimento, 2021).
Outro exemplo desse negacionismo foi a rejeição de 70 milhões de doses antecipadas
da vacina Pzer (Nascimento, 2021). As justicativas mobilizadas para se comunicar
com a base de apoio passam pela evocação de uma desconança em relação à
ecácia e a segurança da vacina, apesar da compra da vacina ter sido negada em
agosto, quando o imunizante estava na fase nal dos testes. Segundo Bolsonaro, a
empresa farmacêutica se recusava a se responsabilizar por eventuais efeitos colaterais
e, no programa Governo Agora, da TV Brasil em 17 dezembro de 2020, armou:
“Se você virar um jacaré, é problema de você, pô! Eu não vou falar outro
bicho para não pensar... para não falar besteira aqui. Se você virar Super-
Homem, se nascer barba em alguma mulher aí ou algum homem começar a
falar no, eles não têm nada a ver com isso. Ou o que é pior: mexer no sistema
imunológico das pessoas. Como é que você pode obrigar alguém a tomar
uma vacina que não se completou a terceira fase, [que] tá na experimental?”
(UOL, 2020c).13
12 O kit covid é um coquetel que inclui cloroquina ou hidroxicloroquina, ivermectina e azitromicina.
Dependendo do local, outros medicamentos podem ser incluídos. O termo tratamento precoce é
a utilização desse kit para cura em casos leves ou como prevenção, conforme algumas versões. Não
há evidências cientícas que sustentem o kit e o tratamento precoce, além da possibilidade desses
medicamentos causarem danos (Faculdade de Medicina da UFMG, 2021).
13 Os estudos da fase 03 da Pzer tinham sido concluídos em 18 de novembro de 2020 nos Estados
Unidos. Os resultados haviam sido publicados na New England Journal of Medicine uma semana antes
94 Política / Revista de Ciencia Política
Brasil nos tempos do Bolsonarismo: Populismo e democracia antiliberal
Figuras de linguagem a parte, a fala se coaduna com a retórica dos movimentos
antivacina ao estimular a crença infundada na presença de “ingredientes perigosos”
(Madeiro, 2020). A negação da verdade empírica pode ser vista nessa fala, proferida
em junho de 2021:
“Quem aqui tomou hidroxicloroquina levanta o braço, por favor
[barulhos dos espectadores]. Querem prova maior do que isso? Eu tomei
hidroxicloroquina, outros tomaram ivermectina, outros –em estado mais
grav – estão tomando –alguns poucos porque é difícil encontrar no Brasil–
a proxalutamida. Estive [...] visitando os tukanos e os ianomâmis na região
de São Gabriel da Cachoeira e perguntei, em dois momentos, se os índios
haviam sido acometidos de Covid e quase todo mundo sim. E nas duas etnias
eu perguntei quantos morreram. Responderam: “nenhum”. Tomaram o quê?
Citaram três nomes de chá de casca de árvore. “Ah! Não tem comprovação
cientíca.” E eu pergunto: a vacina tem comprovação cientíca ou está em
estado experimental ainda? Está experimental!” (UOL, 2021e).
O avanço das investigações realizada pela Comissão Parlamentar de Inquérito – CPI
da Pandemia (ou da Covid) chamam a atenção para outro elemento estratégico: o
negacionismo usado como retórica para justicar decisões controversas do governo
e manter mobilizada sua base de apoio, como as irregularidades na compra da
vacina Covaxin14 em detrimento da vacina da Pzer e a CoronaVac. Além disso, a
Agência Nacional de Vigilância Sanitária – Anvisa rejeitou o pedido de importação
da Covaxin por falta de dados cientícos, em março, e indicava uma ecácia geral
menor que a vacina da Pzer; mesmo a autorização para a compra ocorreu com
restrições a quem poderia receber as doses (Prado, 2021; Sassine, 2021).
Novamente, poder-se-ia buscar um nexo causal: negar a compra da vacina Pzer,
bem como desqualicar a CoronaVac, é uma estratégia com nalidade mais prática
que ideológica ao favorecer a compra da Covaxin. Ou a promoção de medicamento
sem comprovação como meio de disseminar uma falsa imagem de segurança para
que as pessoas voltassem às atividades econômicas.
Ora, mesmo que existam esses nexos causais, justicar as ações negando a verdade
empírica remete a um estilo retórico que tende a resultar em políticas públicas
contrárias à ciência. Esse estilo reete e legitima a posição de grupos cujas ideias
dependem da desqualicação de intelectuais, da ciência e da elite política e a
efetividade dessa retórica em situações de crise historicamente está relacionada à
ascensão dos movimentos populistas (Eatwell & Goodwin, 2020; Finchelstein, 2019;
Norris & Inglehart, 2019).
e foram protocolados na Anvisa no dia anterior ao pronunciamento (G1, 2020b; Marques, 2020).
14 Sobre as irregularidades e suspeitas, ver Sassine (2021).
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Vol. 59, N°2 (2021)
II. Antagonistas são inimigos do povo
Em setembro de 2018, o então candidato Bolsonaro, em um comício em Rio Branco,
capital do estado do Acre –região Norte do Brasil–, pega um tripé de câmera de
vídeo, simula movimentos de tiros de fuzil e diz:
“Vamos fuzilar a petralhada15 aqui do Acre. Vamos botar esses picaretas para
correr do Acre. Já que eles gostam tanto da Venezuela, essa turma tem que ir
pra lá. Só que lá não tem nem mortadela, galera. Vão ter que comer capim
mesmo” (Poder360, 2018).
Em outubro de 2018, após a vitória no primeiro e há uma semana do segundo
turno, Bolsonaro reitera: “[...] a faxina agora será muito mais ampla. Esses marginais
vermelhos serão banidos de nossa pátria [...] ‘Petralhada, vai tudo vocês para a Ponta
da Praia’” 16 (Jornalistas Livres, 2018).
O conteúdo revela a estigmatização de opositores pelo líder do movimento. A
mesma expressão voltou a ser usada no exercício do mandato. Em 2019, disse: “[...]
tenho ascendência, porque os diretores, o presidente tem mandato, porque se não
tivessem, eu cortava a cabeça mesmo. Quem quer atrapalhar o progresso vai atrapalhar
na ponta da praia, aqui não”. A frase foi proferida em relação a servidores federais
de órgãos de scalização ambiental por, supostamente, gerarem diculdades para
obtenção de licenças ambientais para construção de uma loja da Havan, propriedade
de Luciano Hang, apoiador do presidente (Matsui, 2019). Em novembro de 2020,
ao criticar o debate sobre gênero nas escolas, mandou à “ponta da praia” quem
defendesse o contrário (Brito, 2020).
É comum a ponderação de que tais expressões sejam apenas “da boca para fora”,
sem uma consequente ação violenta do governo. É justamente isso que distingue
a violência dos regimes populistas em relação aos modelos típicos do fascismo do
Entreguerras. Ou seja, no populismo, os antagonistas são tratados como inimigos do
povo, como traidores ou potenciais traidores da nação, sem serem violentamente
reprimidos (Finchelstein, 2019). Além disso, não é absurdo questionar as
consequências de tais discursos: ainda que não tenha sido comprovada a utilização
explícita dos aparelhos repressivos do Estado, quais os impactos desse tipo de discurso
na interação dos cidadãos na comunidade política?
No mínimo, é possível identicar a reprodução desse discurso. Em desle pelo
aniversário de Bolsonaro, um apoiador disse:
15 Petralhada é um termo pejorativo utilizado para designar membros do PT e seus eleitores.
16 A “[...] ‘ponta da praia’ era uma gíria usada por militares para o destino de presos políticos que
seriam mortos sob tortura na base militar da Marinha na Restinga de Marambaia [...] no Rio de
Janeiro” (Kozicki & Chueiri, 2019: 171).
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Brasil nos tempos do Bolsonarismo: Populismo e democracia antiliberal
“Vocês [da esquerda] querem derrubar o nosso presidente? Deixa eu falar
um negocinho para vocês, é rápido. Olha [mostra os outros apoiadores]. Ele
não está sozinho não, tá? Só para lembrar [mostra novamente o grupo]. Junta
o que vocês tiver de melhor e tenta” (sic) (UOL, 2021c).
Dessa fala, é importante identicar a lógica “nós contra eles”. Para o apoiador,
o presidente é deles (“nosso presidente”), os verdadeiros membros do povo, e a
esquerda é o inimigo, o agente que conturba e ameaça esses “verdadeiros membros
do povo” ao supostamente querer “derrubar” o presidente, que personica a voz e
os desejos desse “povo verdadeiro” (Finchelstein, 2019).
Outro exemplo dessa lógica do “nós contra eles” é a retórica de que a CPI da
Pandemia seja uma conspiração dos inimigos contra o líder e, consequentemente, o
povo. Em junho de 2021, Bolsonaro diz:
“Satisfação de ter ao nosso lado pessoas comprometidas realmente com o
futuro de sua pátria. Não conseguem nos atingir! Não vai ser com mentiras
ou com CPI [pausa] integrada por sete bandidos que vão nos tirar daqui.
Temos uma missão pela frente: conduzir o destino de nossa nação e zelar
pelo bem-estar e pelo progresso do nosso povo” (Record News, 2021).
A passagem é ilustrativa. Apesar de investigar e revelar irregularidades do governo
federal, como o caso da Covaxin, a CPI é colocada ao lado da mentira como meio
para atingir o governo. Os membros da CPI são, aprioristicamente, tratados como
bandidos – falácia argumentum ad hominem. As pessoas que apoiam o governo
(“nosso lado”) são tratadas como “comprometidas” com o futuro da pátria e a
missão auto atribuída ao governo e seu líder é “conduzir o destino” da nação.
Cumpre salientar a valorização de sites, blogueiros, youtubers e inuencers alinhados ao
governo em oposição à constante intimidação ao jornalismo, à mídia tradicional, aos
colunistas e articulistas e aos jornalistas não-alinhados. Os xingamentos, a elevação
do tom e os termos usados pelo presidente são exemplos. Ao menos dois eventos
destes merecem ser destacados: “mídia porca”, “patifaria da Folha de São Paulo” e
“cala boca” foram termos dirigidos aos repórteres em reação ao questionamento
sobre os interesses nas trocas no comando da Polícia Federal, em maio de 2020; e,
em junho de 2021, mais um “cala a boca”, agora, contra a jornalista Daniela Lima
e alegação de ser um alvo da imprensa, sobretudo da Rede Globo, a qual se referiu
como “canalha” e “inimiga da família brasileira” (Jornal da Gazeta, 2020; FENAJ,
2021).
As intimidações não cam no âmbito discursivo. Em 24 de fevereiro de 2021, o
jornalista João Renato Jácome trabalhou como repórter freelancer para O Estado
de São Paulo. Na ocasião, questionou Bolsonaro sobre uma decisão do Supremo
Tribunal de Justiça – STJ que derrubava a quebra de sigilo bancário do senador
Flávio Bolsonaro, lho do presidente, investigado pela apropriação de parte de
salários de servidores comissionados que atuaram no seu gabinete, quando deputado
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estadual no Rio de Janeiro. Em reação, o presidente encerrou a entrevista. Jácome, de
folga do cargo de chefe de gabinete na Secretaria de Meio Ambiente da Prefeitura
de Rio Branco, teve sua exoneração publicada no Diário Ocial do Estado do
Acre dois dias depois. Rio Branco foi a cidade do discurso sobre o “fuzilamento da
petralhada” e Tião Bocalom, do Progressistas (PP), foi o único prefeito de capital
eleito em 2020 que recebeu apoio explícito do presidente (Pessoa, 2020; Poder360,
2021).
O governo chegou a elaborar uma lista de jornalistas e inuenciadores críticos,
sugerindo uma espécie de monitoramento. Como consequência dessas práticas, a
Federação Nacional dos Jornalistas – FENAJ, com apoio de outras entidades de
classe, publicou diversas notas sobre as intimidações. Só em 2021 foram: em janeiro,
devido à ação da Procuradoria-Geral da República – PGR contra o jornalista
Guilherme Amado que denunciou uma possível ação da Agência Brasileira de
Inteligência para subsidiar a defesa de Flávio Bolsonaro no inquérito mencionado
no parágrafo anterior; em junho, em apoio a jornalista Daniela Lima atacada por Jair
Bolsonaro, conforme mencionado; em julho, em apoio a jornalista Juliana Dal Piva,
atacada pelo advogado da família Bolsonaro, Frederick Wassef, e exposta a ataques de
seguidores do presidente; em setembro de 2021, em repúdio aos ataques desferidos
por apoiadores do presidente a jornalistas (FENAJ, 2021).
Esses exemplos ilustram o motivo pelo qual Bolsonaro gura entre os 37 chefes
de Estado ou Governo considerados “predadores da imprensa” na lista elaborada
pela Organização Não-Governamental – ONG Repórter Sem Fronteiras – RSF.
Segundo a RSF (2021):
Desde que [Bolsonaro] assumiu o cargo, o trabalho da imprensa brasileira
tornou-se extremamente complexo. Sua marca registrada? Insultar,
estigmatizar e humilhar jornalistas muito críticos. Para ele, a imprensa “é
inútil” e não passa de “rumores e mentiras constantes”.Sua retórica belicosa e
grosseira é ampliada por seu círculo próximo e por uma base organizada de
apoiadores. Desde as eleições em 2018, o presidente, sua família e seu círculo
aprimoraram um sistema extremamente bem azeitado de comunicação. Nas
redes sociais, exércitos de apoiadores e robôs retransmitem e amplicam os
ataques que visam desacreditar a imprensa, apresentada como inimiga do
Estado.
O Brasil ocupa atualmente a 111.° posição no Ranking da Liberdade de Imprensa
2021 (RSF, 2021).
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III. Estetização da Política
Finchelstein (2019) se refere à estetização da política como uma das características
que o populismo absorveu do fascismo, baseada na redução da política a imagens.
O conceito tem origem em Walter Benjamim (2012), segundo o qual o fascismo
utilizava mecanismos de reprodução técnica para difundir, em larga escala, imagens a
m de docilizar a classe operária dicultando o desenvolvimento da consciência de
classe. Tais imagens objetivavam alcançar o “gozo estético” e conduzir à autoalienação
das massas (Benjamin, 2012). Em consonância com essa denição, em 01 de maio de
2020, Bolsonaro falou aos trabalhadores: “Gostaria que todos voltassem a trabalhar.
Mas, quem decide isso não sou eu, são os governadores e prefeitos [...] O Brasil é um
país maravilhoso e eu tenho certeza [tosse], com Deus acima de tudo, brevemente
voltaremos à normalidade” (Jornalismo TV Cultura, 2020).
É importante salientar que a menção aos prefeitos e governadores é uma crítica às
medidas de distanciamento social no momento em que a pandemia avançava no
Brasil, subsidiando a acusação de cerceamento de direitos por tomarem medidas de
contenção à pandemia. Em oposição, cria-se a imagem de que o presidente defende
o direito ao trabalho e a liberdade dos trabalhadores. Em discurso realizado em
janeiro de 2021 –período de agravamento com a circulação de uma nova variante–
Bolsonaro volta a falar sobre o tema:
“A política de fechar tudo e car em casa não deu certo. O povo brasileiro
é forte. O povo brasileiro não tem medo do perigo. Nós sabemos quem é que
são os vulneráveis: os mais idosos e os com comorbidade. O resto tem que
trabalhar! [...] Se eu fosse um dos muitos de vocês que fosse obrigado a car em casa,
ver a esposa com três ou quatro lhos e eu – como chefe do lar – não ter como levar
comida para casa, eu me envergonharia. Assim sendo, o apelo que eu faço a todos
do Brasil que reformule essa política e entendam [...] que o isolamento, o
lockdown, o connamento nos leva para a miséria” (UOL, 2021b, grifos nossos).
A valorização do trabalho, a exaltação de um povo forte e corajoso eram recursos
para a oposição às políticas de isolamento social e, assim, uma forma de estetização
da política se fez presente: atribuir aos governadores, aos defensores da quarentena
e todos aqueles que questionem as decisões presidenciais a responsabilidade pelos
problemas econômicos, desviando o foco da morosidade de medidas de auxílio
econômico. Isto é, mesmo em situações adversas, a comunicação pautada em
elementos ideológicos garantiu uma base el ao presidente.
Além disso, a estetização da política também funciona de outro modo:
“Os populistas pensam de maneira diferente. Todos os que se opõem a eles
são transformados em uma entidade tirânica. Nesse contexto, a democracia
e a ditadura são apenas designações para o eu e o outro. Tornam-se imagens
e deixa de ser categorias de análise política [...] Essa valorização da política
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Jeerson Ferreira do Nascimento-Maria do Socorro Sousa Braga
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como espetáculo acompanha o populismo sempre que passa de um
movimento de oposição para um regime” (Finchelstein, 2019: 19).
Na entrevista após a vitória nas eleições em 2018, a fala de Bolsonaro segue
exatamente o padrão descrito por Finchelstein (2019):
“Eu estou muito feliz porque eu mostrei que realmente [...] o período
militar não foi ditadura como a esquerda sempre pregou. Pode ver, até
mesmo a imprensa tratava Fidel Castro como ex-presidente e Figueiredo
como ditador. Não tem cabimento isso aí. Quando você fala em ditadura,
uma das características da ditadura é uma imprensa única. A própria Rede
Globo nasceu em 1965, a Revista Veja em 1968 [...] Por que tinha censura
algumas vezes? De acordo com o articulista, a palavra-chave que estava
naquela matéria era para executar um assalto a banco ou até mesmo executar
uma autoridade em cativeiro. Essa foi a censura [...] Gostaria que não tivesse
ocorrido isso. Eu gostaria que nós não tivéssemos corrido o risco de se tornar
uma ditadura em 1964. Anal de contas, você pode ver: o que o Brizola
falava em 1963? Que queria uma nova Assembleia Nacional Constituinte.
Quem seriam os constituintes? Operários, camponeses e sargentos. Sempre
usando-se as massas para atingir o seu objetivo do poder absoluto” (Band
Jornalismo, 2018).
Além de negar a produção historiográca, opõe “o eu e o outro” e seleciona ou
dissimula elementos pontuais que corroboram com a tese central de que “o eu” é
a expressão da democracia e “o outro” a representação da ditadura. Os seguidores
agem de modo similar na interpretação de que o artigo 142 da Constituição de
1988 respaldaria uma intervenção militar. Desde as manifestações de 2013, grupos
conservadores passaram a defender essa hipótese; no ápice da crise política durante
a presidência de Michel Temer com as denúncias de corrupção envolvendo o
presidente, um novo impulso a essa ideia; e, desde 2020, conforme a popularidade de
Bolsonaro cai, mais aparecem grupos defendendo uma intervenção militar, dessa vez
com Bolsonaro no comando, popularizando os dizeres: “eu autorizo [a intervenção],
presidente!” (Ferraz, 2021; Krob & Correa, 2019). O que diz o artigo?
Art. 142. As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela
Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas
com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do
Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos
poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem
(Brasil, 1988).
As passagens “autoridade suprema do Presidente da República” e “por iniciativa de
qualquer destes” são argumentos para a suposição de que a constituição dá respaldo a
uma intervenção militar e permitiria que Bolsonaro fosse a autoridade máxima. São
comuns faixas com os dizeres: “Intervenção Militar Constitucional com Bolsonaro
no Poder”. Uma série de juristas e um parecer da Câmara já esclareceram que
100 Política / Revista de Ciencia Política
Brasil nos tempos do Bolsonarismo: Populismo e democracia antiliberal
é uma consagração do poder civil a autoridade suprema do presidente sobre as
Forças Armadas; que as Forças Armadas devem se comprometer “à defesa da Pátria
e à garantia dos poderes constitucionais” e não podem ser usadas contra quaisquer
dos poderes; e o parágrafo único do artigo prevê lei complementar que dene o
procedimento que as Forças Armadas devem seguir (Agência Câmara de Notícias,
2020; Pereira & Arguelhes, 2020; Streck, 2020; Teixeira, 2020).
Pouco importa que essa proposta não tenha lastro, o fato é que se tornou uma
imagem de solução ideal para os problemas do país, legitimando a defesa do
mecanismo incompatível com o ordenamento jurídico. Deste modo, negando a
ditadura (que é do “outro”), repete-se que a solução autoritária, na verdade, é um
mecanismo constitucional. Tais exemplos, não esgotam o processo de estetização
da política, a associação do presidente com o termo “mito” exerce uma função
imagética vinculando-o às excepcionais virtudes cívicas e políticas. Para isso, as lives,
os memes e fotos que circulam nas redes sociais associam o presidente à humildade
e dignidade e estigmatizam os adversários. Essa forma de criação de uma liderança
carismática e messiânica gerou, inclusive, publicações que ressaltavam o segundo
nome do presidente Jair Messias Bolsonaro e tal construção atingiu o ápice quando
Bolsonaro foi vítima de uma facada em setembro de 2018 em Juiz de Fora. Ali, o
homem humilde, dotado de excepcionais virtudes cívicas e políticas teve consolidada
a imagem de alguém disposto a morrer pelo seu povo e desencadeou uma série de
aproximações para uma justicação divina da autoridade. Nisso, a imagem pôde
ser associada à lógica de uma “religião política”, cuja disposição de angariar votos
se converteu em difusão de crenças arraigadas e dogmáticas como um processo
de evangelização, não faltando militantes dispostos a ministrar uma catequese e
compensar a ausência de Bolsonaro nos debates eleitorais (Finchelstein, 2019).17
As reiteradas armações de que a economia vai bem proferidas, inclusive do
Ministro da Economia Paulo Guedes, agem para criar uma imagem de que as coisas
estão melhorando, ainda que os indicadores não conrmem. A constante presença
do presidente para inaugurar qualquer obra, por mais simplória que seja, mais do
que uma campanha antecipada –a agitação permanente passa a impressão de que a
campanha não tenha nunca cessado– se coaduna com a lógica da “visão apocalíptica
da política”. Por essa visão, utilizam-se “[...] os sucessos eleitorais e as transformações
que esses sucessos transitórios permitem como momentos revolucionários na
fundação ou refundação da sociedade” (Finchelstein, 2019: 135). É nessa lógica
que se enquadra a seguinte fala, em jantar nos Estados Unidos com lideranças
conservadoras:
17 Nessa linha se encaixa também a utilização do slogan “Brasil acima de tudo, Deus acima de todos” e
a constante menção ao versículo bíblico “E conhecerão a verdade, e a verdade vos libertará”.
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Vol. 59, N°2 (2021)
“O que eu sempre sonhei foi libertar o Brasil da ideologia nefasta de
esquerda. Um dos grandes inspiradores meus, está aqui a minha direita – o
professor Olavo de Carvalho [...] Em grande parte, devemos a ele a revolução que
estamos vivendo [...] O Brasil não é um terreno aberto onde nós pretendemos
construir coisas para o nosso povo. Nós temos é que desconstruir muita coisa.
Desfazer muita coisa. Para depois nós começarmos a fazer. Que eu sirva para que,
pelo menos, eu possa ser um ponto de inexão, já estou muito feliz. O nosso
Brasil caminhava para o socialismo, para o comunismo. Quis a vontade de Deus –e
entendo dessa maneira– que dois milagres aconteceram: um é a minha vida o outro é
a eleição (Bolsonaro TV, 2019).
Ora, tal modo de estetização está presente desde a promessa de “mudar tudo isso
daí”, feita na campanha, reforçando para os seguidores o caráter antissistema e
antipolítica encenado por Bolsonaro.
IV. Confusão de maioria eleitoral com delegação total ao presidente e Forma
autoritária de democracia antiliberal e rejeição a ditadura
Uma das marcas do populismo é a rejeição ao pluralismo político e o vínculo com
uma concepção de democracia antiliberal e autoritária, apesar da defesa das eleições
e da recusa a uma ditadura stricto sensu. Um exemplo disso pode ser vericado numa
parte do discurso de Bolsonaro, na abertura do encontro do G20 em novembro de
2020. O trecho refere-se à consideração do presidente sobre os protestos antirracistas
no Brasil em reação ao assassinato de João Alberto Freitas em um supermercado, a
exemplo do que ocorreu nos Estados Unidos com o Black Lives Matter:
“Foi a essência desse povo que conquistou a simpatia do mundo. Contudo,
há quem queira destruí-la e colocar em seu lugar o conflito, o ressentimento,
o ódio e a divisão entre raças. Sempre mascarados de luta pela igualdade ou
justiça social. Tudo em busca de poder! Não somos perfeitos, temos, sim,
os nossos problemas. Existem diversos interesses para que se criem tensões
entre nós. Um povo unido é um povo soberano, dividido é vulnerável.
E um povo vulnerável pode ser mais facilmente controlado e subjugado.
Nossa liberdade é inegociável. Como homem e como presidente enxergo
todos com as mesmas cores: verde e amarelo [...] Aqueles que instigam o
povo à discórdia, fabricando e promovendo conitos, atentam não somente
contra a nação, mas contra a nossa própria história” (UOL, 2020b).
Esse discurso transmite a ideia de que a mobilização provoca uma divisão que
vulnerabiliza o povo e facilita o controle e a subjugação que ameaçam “nossa
liberdade”; os protestos –nesse caso, contra o racismo estrutural– equivalem a
destruir a essência do povo brasileiro e não são vistos como a expressão legítima,
mas como ameaça uma vez que revelam a “busca pelo poder” –e não por direitos–
e “fabrica conitos” que “atentam” contra a nação e a história; o sentido de união
(“povo unido”) é sinônimo da ausência de divergência, pois Bolsonaro enxerga
102 Política / Revista de Ciencia Política
Brasil nos tempos do Bolsonarismo: Populismo e democracia antiliberal
o povo de modo homogêneo (“verde e amarelo”) a despeito das implicações do
racismo no Brasil. Tais considerações ilustram a seguinte constatação: “São deixados
menos espaços para a expressão das minorias políticas. Os direitos dessas últimas não
são eliminados, mas sua legitimidade democrática é diminuída” (Finchelstein, 2019:
138). Portanto, apenas seguidores do líder possuem legitimidade na comunidade
política, quem demanda efetivação de direitos questionados por essa comunidade
conturba e enfraquece a nação.
Em agosto de 2021, no famoso “cercadinho” – local onde conversa com apoiadores–,
Bolsonaro arma:
“É difícil governar um país dessa maneira. O único dos poderes que é vigiado
o tempo todo e cobrado sou eu. O que acontece para o lado de lá não tem
problema nenhum. Eu não quero interferir para o lado de lá –e nem vou–,
agora, tem que deixar a gente trabalhar. O preço do combustível, o preço do gás,
poderia tá metade do valor. Não tem como ir para frente. É lobby, é interferência o
tempo todo. Eu não estou reclamando, não. Mas, tudo tem um limite! Eu tenho dito:
onde eu vou estar é onde vocês estiverem. Vocês dão um norte para a gente [...] O que
está em risco aí? É o futuro de vocês e a minha vida física [...] O Brasil desperta o
interesse de vários países do mundo, é um país importantíssimo e veem aqui como um
quintal, uma grande fazenda, uma fonte de recursos naturais. E isso explora a gente
há muito tempo ainda somos um pouco colônia ainda. Agora, como mudar
isso aí? Tem que ter a consciência do povo, querer que um cara levante a
espada e resolva o problema você está enganado [alguém fala ao fundo: “Não
desiste, não, Mito”]. Não, não desisto, não!” (UOL, 2021f, grifos nossos).
O fraco entendimento da separação dos poderes, típica do Estado Democrático de
Direito, inaugura essa fala. Ao armar que o Executivo –resumido a ele na fala–
é o único dos poderes a ser vigiado. O presidente ignora que, de acordo com a
Constituição, não consta a scalização dos demais poderes no rol de atribuições do
Poder Executivo nos artigos 84 e 87 da Constituição – que denem, respectivamente,
as competências do Presidente da República e dos Ministros. Bolsonaro ignora que
é atribuição constitucional do Congresso Nacional scalizar o Poder Executivo,
conforme o artigo 49, seja na forma de sustação dos “[...] atos normativos do Poder
Executivo que exorbitem do poder regulamentar ou dos limites de delegação
legislativo” (inciso V), seja no papel de scalizar e controlar diretamente, ou por
qualquer de suas Casas, os atos do Poder Executivo, incluindo os da Administração
Direta” (inciso X). Pior, ignora, ainda, que cabe ao Poder Judiciário aplicar a lei,
julgando conitos com base na Constituição e, especicamente, o STF realizar
o controle de constitucionalidade inclusive dos atos do Executivo (Brasil, 1988).
Pode-se e deve-se discutir se há interferência excessiva de algum dos poderes, porém
o desabafo de que é o único poder “vigiado” só faz sentido como estratégia retórica
endereçada à base.
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Bolsonaro fala ainda que o preço dos combustíveis poderia ser a metade, não fosse
“lobby e interferência”. Porém, desde 2016, vigora na Petrobrás a Política de Paridade
Internacional em que o valor dos combustíveis acompanha a variação do barril
do petróleo no mercado internacional e do dólar. A Petrobrás é uma estatal cujo
presidente, nomeado pelo presidente da República, defende a política de preços,
exalta os lucros da estatal e os deputados aliados mais mobilizados, como Osmar
Terra (Movimento Democrático Brasileiro – MDB) e Alexis Fonteyne (NOVO)
atribuem a culpa da alta dos combustíveis aos governadores em função das alíquotas
do ICMS – Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (Agência Câmara
de Notícias, 2021).
De quem seria o lobby aventado pelo presidente? Dos acionistas? De outras empresas
petrolíferas? De quem seria a interferência neste caso? Do STF? Do Congresso? Ou
se refere à autonomia dos Estados como interferência? O presidente não esclarece,
apenas solta essa armação na fala em que classica o Brasil como “quase colônia”
e relata um suposto risco à vida. Destaca-se o recurso ao povo (“Vocês dão um norte
para a gente”) contra as elites dirigentes (aqueles que realizam lobby, os poderes e/ou
entes subnacionais que interferem e os interesses estrangeiros).
Outra face dessa retórica é atribuir a inação do governo federal e a negação em
coordenar os entes subnacionais a uma decisão do STF que teria, segundo Bolsonaro
e seus seguidores, impedido o governo federal de agir durante a pandemia. No
entanto, a decisão de abril de 2020 apenas reconhece a competência concorrente
dos entes subnacionais (estados, municípios e Distrito Federal) na saúde. Isto é, “[...]
as medidas adotadas pelo Governo Federal na Medida Provisória (MP) 926/2020
para o enfrentamento do novo coronavírus não afastam a competência concorrente
nem a tomada de providências normativas e administrativas pelos estados, pelo
Distrito Federal e pelos municípios” (Supremo Tribunal Federal, 2020).
Bolsonaro, em 29 de julho de 2021 em conversa com apoiadores e imprensa no
“cercadinho”, desinformou:
“Vou rebater logo mais a nota do Supremo Tribunal Federal de ontem,
dizendo que não tirou poderes meus. Isso é fake news [...] O Supremo
decidiu que as medidas restritivas impostas por governadores e prefeitos não
poderiam ser modicadas por mim. Então, o Supremo na verdade cometeu
um crime ao dizer que prefeitos e governadores, de forma indiscriminada,
poderiam suprimir todo e qualquer direito previsto no inciso V da
Constituição, inclusive o direito de ir e vir [...] Prefeito não responde por ter
prendido mulher na praia, por ter algemado pessoas em praça pública, por ter
decretado toque de recolher, por ter obrigado o cara car em casa. O cara
que não tinha nada, tinha um chuchu na geladeira, não tinha o que comer
porque uma parte considerável –quase 40 milhões de pessoas– vivia da
informalidade, trabalhava de manhã para comer de noite. Fecharam templos
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Brasil nos tempos do Bolsonarismo: Populismo e democracia antiliberal
religiosos, zeram barbaridade [...] não adiantava tomar providências porque
prefeitos e governadores tinham mais poder que eu” (Band Jornalismo, 2021).
Novamente, ignora os dispositivos constitucionais da República Federativa do
Brasil, cujo artigo 24 dene as competências concorrentes entre o governo federal e os
governos estaduais e municipais – o inciso XII inclui a defesa da saúde. Recusa da
verdade empírica ao negar o teor da decisão e insiste em minimizar a necessidade
de isolamento social no contexto pandêmico, permitindo comparar restrições
excepcionais em defesa da vida com mero e “indevido” cerceamento de liberdades
(Brasil, 1988).
A rearmação do dispositivo constitucional é chamada de “crime”, as ações
para garantir o isolamento social são avaliadas a partir de exemplos de supostas
arbitrariedades (a decisão não autorizou medidas restritivas que não estivesse no
escopo do combate à pandemia), a partir do apelo religioso (“fecharam templos”)
e, sobretudo, a partir da sensibilização para os casos de fome, agravados na pandemia
e intensicados pela demora na liberação do auxílio emergencial e redução do
valor desse auxílio em 2021. Por ser presidente eleito, Bolsonaro vende a tese que
teria competência para governar sem respeitar a autonomia dos poderes e entes
subnacionais e, quando essa possibilidade é vedada, argumenta que sofre uma
usurpação do poder conferido pela maioria eleitoral. A Constituição, portanto, é
mencionada como recurso retórico sem consideração substantiva.
V. Nacionalismo extremo com valorização da cultura popular ou da cultura de
celebridade
O discurso de abertura do encontro de G20, mencionado no item anterior, começou
assim:
“Senhoras e senhores, antes de adentrar o tema principal dessa seção, quero
fazer uma rápida defesa do caráter nacional brasileiro. Em face da tentativa
de importar, para o nosso território, tensões alheias à nossa história. O Brasil
tem uma cultura diversa, única entre as nações. Somos um povo miscigenado.
Brancos, negros e índios edicaram o corpo e o espírito de um povo rico e
maravilhoso” (UOL, 2020b).
Na passagem, há uma evocação do nacionalismo por meio do “caráter nacional
brasileiro”. O que, segundo Leite (2007), remete às formas de pensar a identidade
nacional que resultaram em ideologias conservadoras ou burguesas. Leite (2007)
identica que as conceituações do “caráter nacional brasileiro” são eivadas de
pseudocienticidade que contribuem para a manutenção do status quo, pois tentam
generalizar para toda a nação o que é peculiar de um grupo ou classe. Desse modo,
a exaltação da miscigenação que teria produzido “um povo rico e maravilhoso” não
é diferente das ideologias conservadoras que se constituíram em obstáculos para o
enfrentamento de preconceitos. Isto é, o nacionalismo extremo, neste caso, opera
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como um elemento ideológico para reclamar uma harmonia e coesão social de
uma sociedade pretensamente homogênea, em função da miscigenação, ignorando a
diversidade e a complexidade do país e negando legitimidade às minorias políticas.
Esse nacionalismo também fomenta retóricas e práticas xenofóbicas. Um dos alvos
da xenofobia bolsonarista é a China. Em março de 2020, o deputado federal Eduardo
Bolsonaro, lho do presidente, à época presidente da Comissão de Defesa e Relações
Exteriores da Câmara, repetiu um ataque comum na base bolsonarista: culpou a
China pelo agravamento da pandemia e afirmou que a liberdade seria a solução,
pois, se a China não fosse “uma ditadura”, segundo ele, não seria possível esconder
informações sobre a pandemia. Em novembro do mesmo ano, declarou apoio a
uma “aliança global” para viabilizar tecnologias 5G “sem espionagem da China”.
Abraham Weintraub, ainda Ministro da Educação em abril de 2020, publicou um
tuíte com a imagem de uma capa de gibi da Turma da Mônica com uma bandeira da
China e fez um texto imitando o personagem Cebolinha –trocando o “r” pelo “l”–
perguntando quem poderia sair geopoliticamente fortalecido da crise decorrente
da pandemia e quem seriam os aliados aqui no Brasil desse plano de dominação
mundial (Benites, 2020; G1, 2020a; Gomes & G1, 2020). Em março de 2021, Jair
Bolsonaro disse:
“É um vírus novo, ninguém sabe se nasceu em laboratório ou nasceu por
algum ser humano ingerir um animal inadequado. Mas, está aí. Os militares
sabem o que é guerra química, bacteriológica e radiológica. Será que não
estamos enfrentando uma nova guerra? Qual o país que mais cresceu seu
PIB?” (AFP Português, 2021).
Em março de 2020, foram colocadas faixas em frente à embaixada da China com
palavrões contra o presidente Xi Jinping e Yang Wanming, embaixador, com a
menção “China Vírus”. Em agosto de 2020, foram feitas ameaças de ataque terrorista
ao Consulado chinês em São Paulo. Em julho de 2021, o ex-deputado Roberto
Jeerson, apoiador de Bolsonaro, chegou a sugerir a expulsão do embaixador
chinês do Brasil. E, em 16 de setembro de 2021, um explosivo foi atirado contra
o Consulado chinês no Rio de Janeiro – ninguém cou ferido. Não é possível,
sem investigação, armar causalidade entre os discursos e os ataques. No entanto, a
contínua estigmatização contribui para disseminação de uma sinofobia (Bond, 2020;
Poder360, 2020; Rocha, 2021).
Essa retórica também foi mobilizada na disputa entre Bolsonaro e o governador
paulista João Dória (Partido da Social Democracia Brasileira – PSDB). O Instituto
Butantan, centro de pesquisa biológica e principal produtor de imunobiológicos do
país, vinculado à Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo, articulou um acordo
com a farmacêutica chinesa Sinovac para a fabricação da vacina CoronaVac no
Brasil. Dória, um possível candidato à presidência em 2022 rompido com Bolsonaro,
poderia usar o acordo e a distribuição pioneira de uma vacina contra a Covid-19
no Brasil para capitalizar politicamente. Bolsonaro reagiu de diferentes formas ao
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Brasil nos tempos do Bolsonarismo: Populismo e democracia antiliberal
longo do tempo: primeiro, desdenhado ao anunciar a compra da vacina da Oxford/
AstraZeneca: “Nós entramos naquele consórcio lá de Oxford –pelo que tudo indica
vai dar certo– e 100 milhões de unidades chegarão para nós. Não é daquele outro
país não, tá ok, pessoal? É de Oxford aí” (apud UOL, 2021a).
Depois, negou que o Ministério da Saúde compraria a CoronaVac, como em
outubro de 2020:
“Lá atrás, destinamos recursos para a Oxford –não para comprar a vacina
apenas– para participar da pesquisa e desenvolvimento e com uma cota de
quantidade de vacinas para nós. Nada será dispendido agora para comprarmos uma
vacina chinesa que –eu desconheço– mas parece que nenhum país do mundo
está interessado nela. Pode ser que tenha algum país aí. Agora, as vacinas
m que ter uma comprovação cientíca, diferente da hidroxicloroquina [...] Não
pode inalar (sic) algo numa pessoa e o malefício ser maior que um possível
benefício. Porque nós estamos perfeitamente anados com o Ministério da
Saúde trabalhando na busca de uma vacina conável. Nada mais além disso,
fora disso é tudo especulação, é um jogo político que, lamentavelmente, esse
governador parece que só sabe fazer isso. Parece que é a última cartada dele na busca
por popularidade ou de resgatar tudo aquilo que ele perdeu durante a pandemia. E,
em grande parte, as decisões tomadas pelo senhor João Dória não batiam com aquelas
que eu gostaria de tomar, caso eu não fosse tolhido pela Justiça (apud UOL, 2020a,
grifos nossos).
A fala rearma o cancelamento do documento de intenção de compra pelo Ministér io
da Saúde da vacina produzida pelo Instituto Butantan. Salta aos olhos a evidência de
que o maior obstáculo era a disputa com Dória. Mas, não faltou desqualificação ao se
referir como “uma vacina chinesa” que supõe, apesar do confesso desconhecimento,
nenhum outro país compraria. O que conrma que, apesar da possibilidade de
outras motivações, a escolha pela retórica coerente com a ideologia é um aceno
à base. Chama atenção a necessidade de justicar que a comprovação cientíca
é indispensável para a vacina, diferente da hidroxicloroquina, reforçando a recusa
da verdade empírica para promover o medicamento. A estigmatização à China é
contínua entre os adeptos, mas variável nas falas do presidente, que, em setembro de
2021, chegou a armar a importância chinesa no combate à pandemia.
Outro ponto é o recurso à cultura popular, às celebridades e ao mundo do
entretenimento como modo de evocar as tradições nacionais. Bolsonaro, antes da
suspensão de público nos estádios devido à pandemia, era um habitué em jogos
de futebol. O presidente é próximo à direção do Flamengo, o que deu origem ao
rumor de que o presidente do clube, Rodolfo Landim, estaria sendo cotado para
ser candidato à vice-presidência em 2022 e a proximidade de Bolsonaro com a
cúpula da CBF culminou no apoio do governo para que a Copa América 2021 fosse
disputada no Brasil, apesar da situação da pandemia (Gois, 2021a; 2021b).
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Além do futebol, o presidente recorre ao universo das celebridades e do
entretenimento: na Secretaria da Cultura, o presidente nomeou Regina Duarte
–atriz de lmes e de telenovelas da Rede Globo–, quando a substituiu, escolheu
Mário Frias, também ator de telenovelas e lmes, cantor e apresentador de programas
televisivos. Ambos, sem experiência em gestão e em políticas públicas, mas, tal como
o ministro de Ciência, Tecnologia e Inovações Marcos Pontes, conhecido como
Astronauta, poderiam conferir uma face pública ao cargo que poderia ser explorada
como nomeações de pessoas com expertise na área relacionada à respectiva pasta. O
presidente ainda esteve em encontros com Amado Batista – cantor, compositor e
empresário cujos débitos em multas ambientais se tornaram públicos. Participou,
ainda, de reuniões com músicos do gênero Sertanejo para discutir o m da meia-
entrada e o retorno do setor de shows e entretenimentos impactados pela pandemia.
Em 7 de setembro de 202118, em meio a manifestações de apoiadores, Bolsonaro
surgiu no Rolls-Royce da presidência dirigido pelo ex-piloto e tricampeão mundial
de Fórmula 1, Nelson Piquet (França & Vieira, 2021; IstoÉ Gente, 2021; R7, 2021).
A despeito da proximidade com alguns artistas, é comum Bolsonaro e apoiadores
criticarem o principal instrumento de fomento à Cultura no Brasil: a Lei Rouanet.
O debate sobre a lei é direcionado para desqualicar artistas críticos ao governo.
Eduardo Bolsonaro armou em dezembro de 2018 em discurso na Câmara dos
Deputados:
“E, de fato, eu venho aqui fazer um registro: dizer que a Lei Rouanet não
é de todo ruim. O espírito dela, inicial, é um bom espírito. Promover ali,
aquele artista que está em começo de carreira, pra dar um empurrãozinho
pra ele, pra ver se ele deslancha. Agora, o que nós temos visto, na cara-
de-pau, foi o governo passado de Dilma Rousse querendo literalmente
“comprar” a classe artística, que é formadora de opinião, para trazer consigo,
simpatia de seus seguidores. Eu quero ver algum beneciado milionário da
Lei Rouanet pregar contra as pautas de esquerda! [...] nós colocaremos aqui,
“sentadinhos”, bonitinhos aí esses artistas que, por baixo dos panos, iam,
através do Ministério da Cultura, através de requisitos subjetivos, abocanhar
o bolso do contribuinte brasileiro. A teta acabou!” (Folha Política, 2018).
Cumpre destacar que a lei autoriza a renúncia scal, mas não é o governo ou
ministério que escolhe o projeto onde esse recurso será investido. O projeto recebe
ou não autorização da autoridade competente (à época, o Ministério da Cultura)
para captar os recursos junto à iniciativa privada: pessoas físicas que pagam Imposto
de Renda podem destinar até 4% e as empresas que são tributadas pelo lucro real até
6% do imposto devido. Ou seja, a decisão de investir ou não é da iniciativa privada.
18 Dia da Independência do Brasil. Em 7 de setembro de 2021, apoiadores organizaram manifestações
favoráveis ao presidente Bolsonaro, principalmente em Brasília, São Paulo e Rio de Janeiro, mas com
atos em outras cidades brasileiras.
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Apesar da retórica, o governo Bolsonaro ainda não realizou alterações na referida
lei (Brasil, 1991).
A manifestação do deputado Eduardo Bolsonaro, após a eleição do pai, continuava o
clima de campanha: parte signicativa da classe artística engajada é crítica às posições
de Bolsonaro desde que ele se tornou mais popular nas redes. Em março de 2020,
na cerimônia de posse de Regina Duarte, na Secretaria da Cultura (que substitui o
extinto Ministério da Cultura), o presidente armou:
“[...] a cultura representou algo para nós que, em muitos momentos, não era
aquilo que maioria do povo queria, almejava. Ela foi cooptada pela política de modo
que ela foi usada para interesses políticos partidários [...] Depois de um ano de
governo, nós achamos –eu tenho certeza– a pessoa certa que pode valorizar,
por exemplo, a Lei Rouanet. Tão mal utilizada no passado [...] Botamos
um teto [a lei não foi alterada, refere-se ao teto usado pela Secretaria para
autorizar a captação] e ltros também. Anal de contas, ela deve atender
o artista em início de carreira ou aqueles que, depois de se iniciarem nela,
precisam do incentivo para se consolidar no mercado [...] começamos a
escrever a cultura com a chegada dessa grande mulher. Regina Duarte, nós estamos
colocando nas mãos de quem realmente entende do assunto esse desao”.
(Band Jornalismo, 2020, grifos nossos).
As manifestações artísticas engajadas são compreendidas como algo diferente do
que o povo deseja e fruto de cooptação por agentes políticos que usariam a Lei
Rouanet como mecanismo. A liberdade não é uma possibilidade para arte que seja
crítica ao líder e seu movimento. O cantor inglês Roger Waters (ex-Pink Floyd),
em 2018, foi vaiado por criticar Bolsonaro e Trump e suscitou a curiosa alegação de
que as pessoas foram ao show para ouvir música e não a posição política do artista.
Apesar de estrangeiro e do tom crítico desde o início da carreira na Banda Pink
Floyd, circulou uma onda de notícias falsas associando a motivação de Waters ao
recebimento de recurso para campanha19 (O Estado de São Paulo, 2018). Ou seja,
não se considera legítimo aquilo que contraria o movimento, daí a ênfase na arte
como mero entretenimento.
Analisadas as características do populismo presentes na experiência brasileira sob o
governo de Jair Bolsonaro passemos às conclusões.
19 O então ministro da Cultura, Sérgio Leitão, publicou que Waters recebeu R$ 90 milhões para fazer
campanha. Em ação do comitê de campanha de Bolsonaro junto ao Tribunal Superior Eleitoral
-TSE contra Fernando Haddad (PT), o Ministério, intimado, negou que houvesse dinheiro oriundo
da Lei Rouanet na turnê de Waters (O Estado de São Paulo, 2018).
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Vol. 59, N°2 (2021)
Conclusões
O objetivo deste artigo foi vericar a aproximação das ações e reações do governo
Bolsonaro às características do populismo denidas, especialmente, por Finchelstein
(2019) – que propõe uma análise histórica ampla incluindo a América Latina.
Notamos, em primeiro lugar, que as características delimitadas pelos autores
selecionados estavam presentes no governo Bolsonaro, sobretudo, como forma de
comunicação e mobilização da sua base de apoio. As características foram agrupadas
em cinco elementos que apareceram no movimento que alçou Bolsonaro à
presidência da República brasileira e, principalmente, no decorrer do seu governo,
tendo como locus principal a atuação no combate à pandemia e em outros eventos
ocorridos nesses quase três anos. Como demonstramos, a comunicação com
fundamentos ideológicos permitiu a manutenção de importante base bolsonarista
mobilizada e ativa. A comunicação também ajuda a explicar o êxito eleitoral.
Mas, há um contexto a ser considerado. Os populistas tendem a prosperar em
situações de crise real ou imaginada. A ascensão de Bolsonaro está relacionada a
uma crise multidimensional. Por um lado, a crise econômica ampliava a sensação
de privação relativa. Por outro, a crise política marcada pelo impeachment e pelo
avanço da Operação Lava Jato favoreceu a circulação de discursos com lógica
antipolítica ao intensicar a desconança em relação às instituições e aos partidos
e políticos tradicionais. Tal cenário ca mais evidente com o desalinhamento de
partidos tradicionais. Desde 2010, aumentava a fragmentação partidária. Em 2018,
o resultado eleitoral do PSDB no primeiro turno conrmou a mudança no padrão
da competição eleitoral, consolidada com a vitória de Bolsonaro, de um partido
pequeno com poucos recursos tradicionais de campanha. Acrescente-se, ainda, uma
crise de valores e o contexto de crise sanitária.
O populismo moderno incorporou traços do fascismo expondo a “fronteira porosa”
entre a direita dita moderada e a extrema-direita (Finchelstein, 2019: 174). Assim, a
despeito de equívocos e generalizações, o governo Bolsonaro ainda não instaurou
um regime fascista ou neofascista conforme evidenciam as diferenças a seguir. O
fascismo nasceu em um contexto de questionamentos aos valores liberais e ao
liberalismo econômico e seu projeto, apoiado por setores da burguesia, preconizava
um capitalismo com presença do Estado e em bases nacionais, visando uma autoritária
terceira via socioeconômica entre o capitalismo e o socialismo – diferente do projeto
ultraliberal capitaneado por Paulo Guedes. A fusão líder-seguidores-nação como
entidade única advém do fascismo, onde se realizava em uma ditadura ultraviolenta,
e passou a ser justicada em termos eleitorais no populismo, que é uma forma
autoritária e antiliberal de democracia que pode ser interrompida por limitações
constitucionais ou derrotas eleitorais. A concepção e as práticas de violência são
diferentes: a violência política é elemento fundamental em um regime fascista
objetivando a perseguição, a repressão e a eliminação dos opositores; o populismo
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Brasil nos tempos do Bolsonarismo: Populismo e democracia antiliberal
persegue, estigmatiza, reduz a legitimidade e cria um ambiente de insegurança sem
usar deliberadamente o aparato estatal para eliminar o inimigo público.
Recuperar a voz no sistema político e recolocar na agenda uma série de valores
dialoga com o apoio que Bolsonaro recebeu entre os eleitores neopentecostais e
da renovação carismática católica, bem como o engajamento de líderes religiosos.
Uma desinformação que circulou nas eleições foi a existência de um “kit gay” a ser
distribuído nas escolas. A estória mobilizou alguns temores: o debate sobre gênero
nas escolas (reduzido à “ideologia de gênero”) e a educação sexual. Em consequência,
a base bolsonarista reverberou apoio ao Movimento Escola Sem Partido, que propõe
combater a chamada doutrinação ideológica de esquerda nas escolas, que incluiria
a questão de gênero, e à aprovação da homeschooling, para as famílias educarem
seus lhos em casa. Além disso, a oposição às pautas do movimento feminista,
LGBTQIA+ e negro atacando políticas públicas relacionadas, como a Lei Maria
da Penha, a tipicação do feminicídio, a regulamentação da homofobia e a política
de cotas.
O avanço neoliberal marca uma nova forma de desenvolvimento do nacionalismo
que possibilita a ascensão de líderes populistas comprometidos com receituário
neoliberal, vinculados às origens autoritárias e mantendo promessas de velhas
soluções antidemocráticas típicas do populismo. Não é, portanto, incoerente a
parceria entre Bolsonaro e Guedes – o ministro que receberia a pasta de “porteira
fechada” (quando o ministro tem controle das nomeações de todos os cargos do
Ministério). Nem é, portanto, deslocado do fenômeno populista um discurso
nacionalista com práticas econômicas marcadas pela privatização infralegal de
riquezas nacionais e ativos de empresas estatais, como plataformas, subsidiárias, poços
de petróleo, estação de tratamento de óleo, estação de gás, terminais aquaviários,
gasodutos e oleodutos, majoritariamente para empresas estrangeiras. Nem mesmo o
desmanche da seguridade social, como Reforma da Previdência, tentativas de novas
reformas trabalhistas (como Carteira Verde e Amarela) e Reforma Administrativa,
pois o léxico da liberdade dos seguidores incorpora a lógica de que o inchaço e o
aparelhamento do Estado, bem como o “excesso” de direitos (sic), seriam obstáculos
às liberdades individuais, ao empreendedorismo e ao desenvolvimento da nação.
Trata-se do que Finchelstein chama de “novo populismo de direita” que, sob o
governo Bolsonaro, combina o receituário neoliberal com um discurso que evoca a
violência política frequentemente.
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Enviado: 28 de septiembre de 2021
Aceptado: 26 de noviembre de 2021
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From a historical, theoretical, and non-empirical perspective, this study aims to trace the emergence and delimit the characteristics of the Narodnik movement in Russia during the second half of the 19th century to understand how this movement used propaganda and the press, focusing our analysis, especially, on the figure of Alexander Herzen, who historians deem the father of Russian populism. Moreover, we investigate the relation between this movement and the political propaganda which emerged at this time via an extensive literature review. KEYWORDS: Populism; Narodnik; Russia; Propaganda; Press; History
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O objetivo deste artigo é fazer um estudo do uso das midias digitais pelos deputados estaduais brasileiros na legislatura 2019-2023. Procuraremos responder à seguinte questão: os parlamentares intensivos no uso das midias digitais em cada unidade da federação brasileira (outliers) podem também ser considerados “outsiders”, ou seja, parlamentares novatos na atividade política? Para verificar este fenômeno analisaremos o uso das duas midias digitais públicas mais utilizadas pelos deputados estaduais brasileiros no período 2019-2020, ou seja, Facebook e Instagram, verificando se este uso está associado a certas características da carreira política dos deputados. Os resultados indicam que esse fenômeno ocorre no Instagram, mas não no Facebook, ou seja, mídias sociais públicas de uso mais recente são usadas com mais intensidade por parlamentares “outsiders”.
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Substantial COVID-19 research investment has been allocated to randomized clinical trials (RCTs) on hydroxychloroquine/chloroquine, which currently face recruitment challenges or early discontinuation. We aim to estimate the effects of hydroxychloroquine and chloroquine on survival in COVID-19 from all currently available RCT evidence, published and unpublished. We present a rapid meta-analysis of ongoing, completed, or discontinued RCTs on hydroxychloroquine or chloroquine treatment for any COVID-19 patients (protocol: https:// osf.io/QESV4/). We systematically identified unpublished RCTs (ClinicalTrials.gov, WHO International Clinical Trials Registry Platform, Cochrane COVID-registry up to June 11, 2020), and published RCTs (PubMed, medRxiv and bioRxiv up to October 16, 2020). All-cause mortality has been extracted (publications/preprints) or requested from investigators and combined in random-effects meta-analyses, calculating odds ratios (ORs) with 95% confidence intervals (CIs), separately for hydroxychloroquine and chloroquine. Prespecified subgroup analyses include patient setting, diagnostic confirmation, control type, and publication status. Sixty-three trials were potentially eligible. We included 14 unpublished trials (1308 patients) and 14 publications/preprints (9011 patients). Results for hydroxychloroquine are dominated by RECOVERY and WHO SOLIDARITY, two highly pragmatic trials, which employed relatively high doses and included 4716 and 1853 patients, respectively (67% of the total sample size). The combined OR on all-cause mortality for hydroxychloroquine is 1.11 (95% CI: 1.02, 1.20; I² = 0%; 26 trials; 10,012 patients) and for chloroquine 1.77 (95%CI: 0.15, 21.13, I² = 0%; 4 trials; 307 patients). We identified no subgroup effects. We found that treatment with hydroxychloroquine is associated with increased mortality in COVID-19 patients, and there is no benefit of chloroquine. Findings have unclear generalizability to outpatients, children, pregnant women, and people with comorbidities.
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O texto procura recuperar os escritos de Stuart Hall do final da década de 70 e início da década de 80 para comparar a ascensão do populismo autoritário encampado pelo thatcherismo com a condição brasileira atual, o que é feito a partir da chave do bolsonarismo popular. O elemento que atravessa ambas as descrições e é tomado como foco, dentre os vários possíveis, é o papel do punitivismo como mecanismo de engate discursivo e subjetivo. A singularidade das análises de conjuntura de Hall foi o pensamento bottom-up, entendendo o populismo autoritário não apenas como uma conspiração de elites ou processo macroeconômico, mas também como uma aliança inusitada com a população pobre por meio de valores conservadores (família, nação, ordem), fenômeno que-considerados os diversos trabalhos etnográficos e analíticos em torno ao bolsonarismo-parece se repetir no Brasil. A partir disso, compara-se as modulações distintas entre o caso britânico e brasileiros nas suas conexões com a cultura punitiva que os atravessa. Palavras-chave: Stuart Hall; Populismo Autoritário; Punitivismo; Bolsonarismo Popular. The text seeks to recover Stuart Hall's writings from the end of the 70s and beginning of the 80s to compare the rise of authoritarian populism represented from Thatcherism with the current Brazilian condition, which is done since the notion of popular bolsonarism. The element that crosses both descriptions and is taken as a focus, among the many possible ones, is the role of punitivism as a discursive and subjective coupling mechanism. The singularity of Hall's conjuncture analysis was bottom-up thinking, understanding authoritarian populism not only as a conspiracy of elites or a macroeconomic process, but also as an unusual alliance with poor population through conservative values (family, nation, order), a phenomenon that-considering the various ethnographic and analytical works around Bolsonarism-seems to be repeated in Brazil. From this, we compare the distinct modulations between British and Brazilian cases in their connection with the punitive culture that crosses them. Keywords: Stuart Hall; Authoritarian Populism; Punitivism; Popular bolsonarism.
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Em 2018, o Brasil realizou seu oitavo pleito presidencial pós-redemocratização, acumulando evidências empíricas cruciais para a análise das características dos processos eleitorais que podem ser responsáveis por mudanças substanciais na distribuição do poder entre os partidos políticos. A partir de base conceitual alicerçada em literatura internacional sobre eleições críticas, este artigo visa criar uma classificação para as eleições brasileiras. Como subsídio principal para essa classificação, é analisado simultaneamente, no tempo e no espaço, por meio da análise fatorial, o desempenho eleitoral dos primeiros colocados nas eleições presidenciais desde 1989 até 2018 em primeiro turno na escala das microrregiões brasileiras, buscando identificar as regiões de apoio duradouro e os períodos de estabilidade e mudança nos padrões de votação. Como resultado, as eleições presidenciais são classificadas em três tipos: mantidas, desviantes e convertidas (críticas).
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Resumo O que resta depois do emprego de uma arma nuclear? Terra e vidas arrasadas. Esta é a pergunta a que nos propomos responder neste trabalho, nos concentrando no período pós 31 de agosto de 2016 até o presente. Partimos da premissa de que houve um golpe parlamentar e constitucional em 2016, com a utilização de fórmulas constitucionais, que não encontrou no Supremo Tribunal Federal interpretação majoritária que as tenha refutado. O impeachment foi a fórmula utilizada; no entanto, não houve situação típica que configurasse crime de responsabilidade para afastar a presidente. As evidências que configuraram o crime de responsabilidade foram frágeis tanto quanto as circunstâncias da política. A primeira parte do artigo trata do processo de impeachment propriamente dito, a nosso ver destituído dos fundamentos formais e materiais para sua justificação e aplicação, e a segunda parte trata das suas consequências, isto é, das suas sequelas para o constitucionalismo e a democracia.
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Law and lawyers tend to be seen as either preferential victims of or key counterforces to rising illiberalism. Brazil offers a good testbed for these claims. Brazilian democracy has deteriorated considerably, as epitomized by the election of Jair Bolsonaro in 2018. Yet, since 2014, law and lawyers have become ever more central to Brazil's field of state power. As the anti‐corruption initiative Car Wash (Lava Jato) gained momentum, Brazilian judges and prosecutors were celebrated, locally and globally, as champions of transparency, accountability, and ‘the rule of law’. Following a closer look at Car Wash, this article questions such idealization of law and lawyers. Drawing on research on press interviews and statements by Car Wash legal officers, I find that, throughout the case, they produced a ‘political grammar’ that is closer to illiberalism than many would predict. Based on recent developments in the sociology of fields, I argue that the production of these grammars yields societal effects that deserve scholarly and civic attention.
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O presente artigo foi construído a partir de um conjunto de seis aulas sobre análise de discurso. Objetiva abordar a questão da análise de maneira ampla, pontuando os principais conceitos e noções que este campo de trabalho pressupõe. O propósito é oferecer um instrumental, ainda que introdutório, para que estudantes e profissionais interessados no tema possam ler analiticamente o discurso político que se apresenta nas discussões do dia-a-dia, no campo tradicional da política e na mídia. Abstract The present article was elaborated from a set of six lessons on speech analysis. It aims to approach the question of the analysis in a wide way, showing the main concepts and knowledge that this field of work estimates. The intention is to offer a device, an introductory, so that students and professionals interested in the subject can read the politician speech analytical who presents in the discussions of day-by-day, in the traditional field of politics and in the media.
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Indice tematico elaborado por el centro de documentación y información de la Cámara de diputados
Mandetta revela "gabinete paralelo" e tentativa de mudar bula da cloroquina
  • D Accioly
Accioly, D. (28 de maio de 2021). Mandetta revela "gabinete paralelo" e tentativa de mudar bula da cloroquina. Senado Notícias. https://www12.senado.leg.br/noticias/ materias/2021/05/28/mandetta-revela-gabinete-paralelo-e-tentativa-de-mudar-bulada-cloroquina. Acesso em 15 set. 2021.