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MÃES DE SUAS DECISÕES: O PAPEL DO CIBERFEMINISMO NO EMPODERAMENTO DA MULHER E NA REIVINDICAÇÃO DE DIREITOS RELATIVOS AO PARTO A PARTIR DO ACESSO À INFORMAÇÃO * MOTHERS OF THEIR DECISIONS: THE ROLE OF CIBERFEMINISM IN WOMEN'S EMPOWERMENT AND IN CLAIMING OF RIGHTS RELATED TO CHILDBIRTH FROM THE ACCESS TO INFORMATION

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Abstract

RESUMO O feminismo provocou inúmeras mudanças sociais, políticas e culturais na sociedade mundial e possui, atualmente, como uma de suas pautas de reivindicação, as questões relativas à proteção dos direitos e da autonomia da mulher durante o parto. O Brasil possui alta incidência de violência obstétrica e de violação de direitos relativos à questão do parto, além da omissão de informações sobre os procedimentos médicos, o que leva a uma total anulação do controle de escolha por parte da gestante. Essa deficiência está sendo suprida, dentre outros fatores, a partir da atuação das redes ciberfeministas, com a utilização de sites, redes sociais e blogs na Internet. Nesse contexto, o artigo questiona: qual é a importância do ciberfeminismo para o empoderamento da mulher em relação a questões do parto e os reflexos sociais e jurídicos desse empoderamento? Para isso, foram utilizados a abordagem dedutiva, o procedimento funcionalista e as técnicas de pesquisa bibliográfica e observação sistemática participativa e não-participativa. Chegou-se a conclusão que, além * Artigo recebido em: 24/11/2016. Artigo aceito em: 20/12/2016. Fomento: Fundo de incentivo a Pesquisa (FIPE/CCSH/UFSM)-ano de 2016. Artigo desenvolvido no âmbito do projeto de pesquisa: Ativismo digital e as novas mídias: desafios e oportunidades da cidadania global desenvolvido junto ao CEPEDI
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ISSN 1980-8860
RVMD, Brasília, V. 10.2, nº 2, p. 378-405, Jul-Dez, 2016
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MÃES DE SUAS DECISÕES: O PAPEL DO CIBERFEMINISMO NO
EMPODERAMENTO DA MULHER E NA REIVINDICAÇÃO DE DIREITOS
RELATIVOS AO PARTO A PARTIR DO ACESSO À INFORMAÇÃO*
MOTHERS OF THEIR DECISIONS: THE ROLE OF CIBERFEMINISM IN
WOMEN’S EMPOWERMENT AND IN CLAIMING OF RIGHTS RELATED TO
CHILDBIRTH FROM THE ACCESS TO INFORMATION
Rafael Santos de Oliveira**
Gabriela Rousani Pinto***
RESUMO
O feminismo provocou inúmeras mudanças sociais, políticas e culturais na
sociedade mundial e possui, atualmente, como uma de suas pautas de
reivindicação, as questões relativas à proteção dos direitos e da autonomia da
mulher durante o parto. O Brasil possui alta incidência de violência obstétrica e
de violação de direitos relativos à questão do parto, além da omissão de
informações sobre os procedimentos médicos, o que leva a uma total anulação
do controle de escolha por parte da gestante. Essa deficiência está sendo
suprida, dentre outros fatores, a partir da atuação das redes ciberfeministas, com
a utilização de sites, redes sociais e blogs na Internet. Nesse contexto, o artigo
questiona: qual é a importância do ciberfeminismo para o empoderamento da
mulher em relação a questões do parto e os reflexos sociais e jurídicos desse
empoderamento? Para isso, foram utilizados a abordagem dedutiva, o
procedimento funcionalista e as técnicas de pesquisa bibliográfica e observação
sistemática participativa e não-participativa. Chegou-se a conclusão que, além
* Artigo recebido em: 24/11/2016.
Artigo aceito em: 20/12/2016.
Fomento: Fundo de incentivo a Pesquisa (FIPE/CCSH/UFSM) - ano de 2016.
Artigo desenvolvido no âmbito do projeto de pesquisa: Ativismo digital e as novas mídias: desafios e
oportunidades da cidadania global desenvolvido junto ao CEPEDI
** Professor do Departamento de Direito e Programa de Pós-graduação em Direito da Universidade Federal
de Santa Maria/RS. Doutor em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina. Líder do Centro de
Estudos e Pesquisas em Direito e Internet desenvolvido na UFSM (CEPEDI/UFSM). Editor da Revista
Eletrônica do Curso de Direito da UFSM. E-mail: rafael.oliveira@ufsm.br
*** Pesquisadora do Centro de Estudos e Pesquisas em Direito e Internet (CEPEDI/UFSM). Bolsista do
Fundo de incentivo a Pesquisa (FIPE/CCSH/UFSM) no ano de 2016, vinculado ao projeto de pesquisa
Ativismo digital e as novas mídias: desafios e oportunidades da cidadania global desenvolvido junto ao
CEPEDI. E-mail: gabrielarousanip@gmail.com
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do empoderamento feminino a partir do acesso à informação, a mudança da
percepção em relação ao parto levou à criação de políticas públicas e leis que
tutelassem os direitos da mulher.
Palavras-chave: Ciberfeminismo. Empoderamento. Parto. Acesso à informação
ABSTRACT
The feminism caused numerous social, political and cultural changes in world
society and has, currently, as one of its guidelines of claim, matters relating to
the protection of the rights and autonomy of women during the childbirth. Brazil
has high incidence of obstetric violence and violation of rights relating to the
question of childbirth, as well as the omission of information about medical
procedures, which leads to a total annulment of the control of choice on the
childbirth of the pregnant woman. This deficiency is being addressed, among
other factors, from the action of the ciberfeminists networks, with the use of
websites, social networks and blogs on the Internet. In this context, the article
questions: what is the importance of ciberfeminism for women’s empowerment in
relation to issues of labour and the social and legal reflections of this
empowerment? For this, it was used the deductive approach, the functionalist
procedure and techniques of bibliographical research and participatory and non-
participatory systematic observation. It has come to the conclusion that, in
addition to female empowerment from the access to information, the change of
perception in relation to childbirth has led to the creation of public policies and
laws that protect the women's rights.
Keywords: Ciberfeminism. Empowerment. Childbirth. Acess to information.
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SUMARIO
1 INTRODUÇÃO
2 FEMINISMO: UMA BREVE RESPECTIVA HISTÓRICA
3 CIBERFEMINISMO E A UTILIZAÇÃO DAS TIC
4 A PROBLEMATIZAÇÃO DO PARTO NO BRASIL E O EMPODERAMENTO
DA MULHER A PARTIR DO CIBERFEMINISMO
5 CONCLUSÃO
6 REFERÊNCIAS
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1 INTRODUÇÃO
O feminismo é um movimento político e social surgido no final do século
XIX, majoritariamente na Europa e nos Estados Unidos, que objetiva a igualdade
de gênero e a desconstrução do “feminino” como objeto de domínio e
subordinação. Desde seu surgimento, a luta das mulheres provocou mudanças
sociais, políticas e culturais na sociedade mundial, tendo, atualmente, como uma
de suas pautas, a proteção contra a violência obstétrica e a proteção dos direitos
da mulher durante o parto.
O Brasil possui alta incidência de violência obstétrica, de violação de
direitos, como o direito ao acompanhante, por exemplo, e de omissão de
informações importantes em relação aos procedimentos de parto, desde o
período pré-natal até o momento da concepção. Além disso, grande parte das
instituições hospitalares adotam um procedimento padrão para o parto, que não
leva em conta o que é mais adequado para a saúde da mulher e do bebê, além
de ignorar a preferência da gestante, fato que torna os índices brasileiros
incompatíveis com as recomendações da Organização Mundial da Saúde. Isso
pode ser considerado como reflexo da desigualdade de gênero, pois a mulher
sempre foi considerada como um ser sem voz e sem autonomia.
Entretanto, essa realidade está começando a se modificar, pois, a partir
das novas Tecnologias de Informação e Comunicação, as mulheres estão tendo
a oportunidade de encontrar os mais variados conteúdos e recomendações
sobre o assunto, além de ter acesso aos seus direitos e a grupos de apoio, onde
também podem compartilhar experiências. Nesse contexto, o ciberfeminismo é
protagonista em produzir e compartilhar informações, que vão desde conteúdos
científicos e jurídicos, até a disponibilização de cursos de capacitação e
depoimentos, a partir de páginas na internet, blogs e grupos em redes sociais.
O acesso à informação, portanto, é essencial para o empoderamento
feminino e a reivindicação pelos direitos da gestante durante o parto, além de
gerar efeitos em políticas públicas e na legislação, a partir da pressão das
mulheres para que suas demandas se efetivem e o Estado torne efetivos os seus
direitos.
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Nesse sentido, busca-se questionar: qual é a importância do
ciberfeminismo para o empoderamento da mulher em relação a questões do
parto e os reflexos sociais e jurídicos desse empoderamento?
Para isso, foi utilizado o método de abordagem dedutivo, a partir da
contextualização do movimento feminista, o aparecimento do ciberfeminismo,
sua atuação como mediador da mulher para o acesso à informação, diante do
contexto da violência obstétrica no Brasil e os seus efeitos sociais e jurídicos.
Como procedimento, foi utilizado o método funcionalista, a fim de verificar a
função do ciberfeminismo na modificação de uma realidade dentro da totalidade
do contexto social brasileiro. Já em relação às técnicas de pesquisa, foram
empregadas a bibliográfica, a partir de obras, teses e dissertações e a
observação sistemática participativa e não-participativa em redes sociais,
páginas e blogs das redes ciberfeministas que defendem a pauta.
Dessa forma, o artigo foi estruturado em três partes para melhor elucidar
o assunto. A primeira descreve brevemente a evolução do movimento feminista
e o aparecimento do ciberfeminismo, enquanto a segunda aborda a utilização
das novas tecnologias de informação e comunicação pelo ciberfeminismo e sua
importância para proporcionar o acesso à informação. Já a terceira problematiza
a questão do parto e da violência obstétrica no Brasil, o empoderamento da
mulher a partir das redes ciberfeministas da Internet e as consequentes
mudanças jurídicas a partir da mudança de percepção em relação ao parto.
2 FEMINISMO: UMA BREVE RESPECTIVA HISTÓRICA
O feminismo é um movimento político e social surgido no final do século
XIX, majoritariamente na Europa e nos Estados Unidos, que objetiva a igualdade
de gênero e a desconstrução do “feminino” como objeto de domínio e
subordinação.
Desde seu surgimento, a luta das mulheres provocou mudanças sociais,
políticas e culturais na sociedade mundial, como a conquista do voto pelas
sufragistas até a luta pela liberdade dos corpos e pela consciência de não-
objetificação. Entretanto, sua evolução encontra diversas barreiras, como a
desqualificação do contra-discurso feminino e a ilusão de que já existe uma
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sociedade igualitária e justa por parte de grupos contrários, devido,
principalmente, a construções culturais que tornaram “natural” a posição
subalterna da mulher.
O feminismo, bem como outros movimentos sociais, sofreu diversas
modificações e ramificações internas ao longo do tempo, influenciado pelo
surgimento de correntes ideológicas, que favoreceram a ampliação da pauta de
debate e de militância. Diante dessas mutações dinâmicas, academicamente, o
movimento foi dividido em “ondas”, obedecendo a critérios de época,
características do público participante e a pauta de reivindicações.
A primeira onda do feminismo
1
ocorreu entre o século XIX e o fim do
século XX e teve como principais pautas questões jurídicas e a promoção de
direitos, como a igualdade dos direitos contratuais e de propriedade, tendo como
foco principal a conquista do sufrágio feminino. No entanto, nesta época,
existiam reivindicações pelos direitos sexuais, reprodutivos e econômicos das
mulheres.
A segunda onda iniciou-se na década de 60, e caracterizou-se como uma
continuação natural dos objetivos alcançados da primeira. As mulheres
obtiveram alguns direitos, mas necessitavam de regulamentações que os
garantissem. Além disso, o movimento passou a se preocupar com questões de
igualdade, o fim da discriminação e o reconhecimento e valorização de suas
subjetividades. Geneviéve Fraisse
2
afirma que essa diferença entre os gêneros
se sobrepõe à questão filosófica e interfere no campo político, sugerindo que as
subjetividades do homem e da mulher por não serem idênticas, causam
desequilíbrios de poder. Por isso, surge no feminismo o conceito de equidade,
em que, apesar das diferenças, as subjetividades entre mulheres e homens
podem não ser idênticas, mas sim equivalentes.
A terceira onda do feminismo, que se desenvolveu nos anos 1980 e 1990,
desafia os paradigmas de gênero construídos pelas feministas brancas, de
classe média, que não representaram as experiências de exclusão, opressão e
1
NOGUEIRA, Conceição. Feminismo e discurso do gênero na psicologia social. Revista da Associação
Brasileira de Psicologia Social, v. 13, n. 1, p. 107-128, 2001. Disponível em: <
http://repositorium.sdum.uminho.pt/bitstream/1822/4117/1/feminismo%20e%20discurso%20do%20g%C
3%A9nero%20na%20psicologia%20social.pdf>. Acesso em: 02 dez. 2016.
2
FRAISSE, Geneviéve. La place des femmes. Les enjeux de l’identité et de l’égalité au regard des sciences
sociales. Paris: Dé-couverte, 1995.
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discriminação de outros coletivos de mulheres
3
, o que culminou no feminismo
interseccional.
Feministas passaram a questionar o foco das reivindicações da segunda
onda ter sido nas mulheres brancas de classes sociais privilegiadas em
detrimento de mulheres negras, pobres e vulneráveis socialmente. Por este
motivo, iniciou-se a ramificação do movimento em inúmeros feminismos que
abarcassem todas as formas de opressão e cada situação social e de classe,
como, por exemplo, o feminismo negro, trans, lésbico, etc. Além disso, o foco da
reivindicação deixou de ser a mulher e passou a ser as relações de gênero.
Nessa fase, também se fortaleceram, inclusive no Brasil, os centros de estudo
sobre a mulher, sobre gênero e feminismo nas academias
4
.
No final da década de 1990 e no início do século XXI, quando as novas
tecnologias de comunicação e informação (TIC) digital começam a ser mais
utilizadas,
já era evidente a exclusão e a sub-representação das mulheres nesses meios.
Por este motivo, inúmeras correntes feministas viam as novas tecnologias com
pessimismo, desenvolvendo, inclusive, uma “tecnofobia”, após a constatação de
que a tecnologia, desde seu surgimento, nunca foi um meio neutro quanto à
descriminação de gênero
5
.
Todavia, com o crescimento do acesso à internet, o feminismo passou a
ser otimista quanto às novas tecnologias de informação e comunicação,
principalmente a Internet, uma vez que as TIC proporcionam novas
possibilidades para a comunicação e produção de informação e a distribuição de
poder. A partir da Web 2.0, que oferece plataformas que propiciam a troca de
informações, surgiu o ciberfeminismo, por meio das práticas do movimento
incorporadas online, em que mulheres anteriormente à margem da produção de
3
MAYORGA, Claudia. Algumas contribuições do feminismo à psicologia social
comunitária. Athenea Digital: Revista de Pensamiento e Investigación Social.
Barcelona, v. 14, n. 1, p. 221-236, mar. 2014. Disponível em:
<http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=53730481010>. Acesso em: 02 dez. 2016.
4
LOURO, Guacira Lopes. Gênero, história e educação: construção e desconstrução. Educação e
realidade, v. 20, n. 2, p. 101-132, 1995.
5
LEMOS, Marina Gazire. Ciberfeminismo: novos discursos do feminismo em redes eletrônicas.
(Dissertação). Mestrado em Comunicação e Semiótica. PUC/SP, São Paulo, 2009, 129 p. Disponível em:
<https://sapientia.pucsp.br/handle/handle/5260>. Acesso em: 18 dez. 2016.
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conteúdo conquistaram espaço e voz, além da possibilidade de organização e
comunicação de mulheres distantes geograficamente.
As novas tecnologias de comunicação possibilitam um
redimensionamento dos modos de organização de inúmeros movimentos sociais
como,
por exemplo, o feminismo, que nesse contexto é atualizado por uma nova prática
denominada Ciberfeminismo, que será abordado na parte subsequente.
3 CIBERFEMINISMO E A UTILIZAÇÃO DAS TIC
As novas tecnologias de informação e comunicação possibilitaram que os
modos de organização de inúmeros movimentos sociais fossem
redimensionados, renovados e tornados mais acessíveis, por meio do
ciberativismo, impactando positivamente na conquista de reivindicações, na
conscientização da sociedade e no aumento do número de ativistas e
simpatizantes. A popularização das redes sociais permitiu ao feminismo, por
exemplo, produzir novas construções de seus discursos, novas linguagens e
reflexões.
Esses ativismos ocorrem no ciberespaço, que é definido por Pierre Lévy
6
como:
O espaço de comunicação aberto pela interconexão mundial dos
computadores e das memórias dos computadores. Essa definição inclui
o conjunto dos sistemas de comunicação eletrônicos […], na medida
em que transmitem informações provenientes de fontes digitais ou
destinadas à digitalização. Insisto na codificação digital, pois ela
condiciona o caráter plástico, fluido, calculável com precisão e tratável
em tempo real, hipertextual, interativo e, resumindo, virtual da
informação que é, parece-me, a marca distintiva do ciberespaço. Esse
novo meio tem a vocação de colocar em sinergia e interfacear todos os
dispositivos de criação de informação, de gravação, de comunicação e
de simulação.
David de Ugarte
7
conceitua ciberativismo como toda estratégia que
persegue a mudança da agenda pública, a inclusão de um novo tema na ordem
do dia da grande discussão social, mediante a difusão de uma determinada
6
LÉVY, Pierre. Cibercultura. 2. ed. Tradução de Carlos Irineu da Costa. São Paulo: 34, 2000, p. 93.
7
UGARTE, David de. O poder das redes. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2008, p. 55.
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mensagem e sua propagação através dos meios de comunicação e publicação
eletrônica pessoal. Além de proporcionar a maior acessibilidade ao contra-
discurso e a problematização sobre questões referentes à discriminação de
gênero, o espaço digital se tornou não apenas um local de informação e de
produção de conteúdo, mas também um lugar acolhedor, onde as mulheres
podem encontrar apoio, compartilhar histórias de vida e se empoderar. De
acordo com Manuel Castells
8
:
Os atores da mudança social são capazes de exercer influência decisiva
utilizando mecanismos de construção do poder que correspondem às
formas e aos processos do poder na sociedade em rede. Envolvendo-se
na produção de mensagens nos meios de comunicação em massa e
desenvolvendo redes autônomas de comunicação horizontal, os
cidadãos da era da informação tornam-se capazes de inventar novos
programas para suas vidas com as matérias-primas do seu sofrimento,
suas lágrimas seus sonhos e esperanças.
O ciberfeminismo, como fenômeno social e político, é um ativismo online
vinculado à terceira onda feminista, a partir da concepção de que as TIC
poderiam transformar a sociedade, os próprios meios tecnológicos e as posições
de gênero convencionais. Ele surge como uma proposta de remodelação do
feminismo interseccional, pois, apesar de trazer novamente algumas de suas
questões prévias, como as assimetrias de gênero, e a questão do corpo feminino
como espaço de luta política, suas estratégias se adaptaram às novas
tecnologias, que possibilitaram um maior acesso de mulheres com diferentes
realidades e a inter-relação entre as diferentes vertentes.
Sadie Plant
9
, filósofa e pesquisadora do tema, começou a usar o termo
ciberfeminismo para identificar toda e qualquer questão relacionada às mulheres
e às novas tecnologias. Portanto, o movimento ciberfeminista tem, em sua base,
a cooperação entre mulher, máquina e novas tecnologias, a fim de libertá-la de
tradicionais injustiças e assimetrias de valores e poderes em que vivem, além de
ter a possibilidade de construir sua identidade, sexualidade e gênero da forma
que achar melhor.
8
CASTELLS, Manuel. Redes de indignação e esperança: movimentos sociais na era da internet. Rio de
Janeiro: Zahar, 2013, p. 14.
9
PLANT, Sadie. Mulher digital: O feminino e as novas tecnologias. Tradução de Ruy Jungmann. Rio de
Janeiro: Record/Rosa dos Tempos, 1999.
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A origem dessa concepção pode ser atribuída à bióloga e filósofa Donna
Haraway
10
, com o artigo intitulado “Manifesto Ciborgue: ciência, tecnologia e
feminismo-socialista no final do século XX”, publicado originalmente na revista
inglesa Socialist Review, em 1985. Nele, a autora critica o marxismo, o
feminismo radical e outros movimentos sociais que, de acordo com ela, foram
insuficientes e fracassaram em operar com categorias como classe, raça e
gênero diversos.
Hawaray se opõe ao denominado “feminismo da deusa”, que prega que
as mulheres poderão encontrar a liberdade apenas na medida em que se
desprenderem do mundo moderno, dominado pelo patriarcalismo e descobrirem
sua relação espiritual com a natureza. A autora explica que por gerações, as
mulheres foram consideradas “naturalmente” fracas, submissas, sensíveis e
incapazes de pensamento abstrato. Que seria incompatível com sua natureza,
por exemplo, mulheres se tornarem executivas, políticas e cientistas, visto que
elas eram feitas para serem mães e submissas.
Haraway argumenta que esse pensamento de que todas as
circunstâncias e questões são naturais e inerentes à vida leva a crer que o status
quo não pode ser modificado. Por outro lado, se as mulheres (e os homens) não
são naturais, mas construídos, tal como um ciborgue, então, dados os estímulos
adequados, toda e qualquer situação pode ser reconstruída e adaptada. Ou seja,
a identidade é produto do poder da consciência e da oposição
11
.
Os movimentos de mulheres têm construído aquilo que se pode chamar
de “experiência das mulheres”. Essa experiência é tanto uma ficção quanto um
fato sócio-político. A libertação da identidade feminina depende da
desconstrução da consciência da opressão. De acordo com Haraway
12
:
As tecnologias de comunicação e as biotecnologias são ferramentas
cruciais no processo de remodelação de nossos corpos. Essas
ferramentas corporificam e impõem novas relações sociais para as
mulheres no mundo todo. As tecnologias e os discursos científicos
podem ser parcialmente compreendidos como formalizações, isto é,
10
HARAWAY, Donna. Manifesto ciborgue Ciência, tecnologia e feminismo-socialista no final do século
XX. In: HARAWAY, Donna; KUNZRU, Hari; TADEU, Tomaz (Orgs.). Antropologia do ciborgue As
vertigens do pós-humano. 2 ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2009.
11
HARAWAY, Donna. Manifesto ciborgue Ciência, tecnologia e feminismo-socialista no final do século
XX. In: HARAWAY, Donna; KUNZRU, Hari; TADEU, Tomaz (Orgs.). Antropologia do ciborgue As
vertigens do pós-humano. 2 ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2009, p. 49.
12
Ibidem, p. 64.
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como momentos congelados das fluidas interações sociais que as
constituem, mas eles devem ser vistos também como instrumentos para
a imposição de novos significados.
A internet, principal TIC utilizada, possibilitou uma forma mais rápida e
dinâmica de intercâmbio de ideias entre diferentes concepções de feminismos
se consolidou como um veículo de produção de conteúdo e diálogo com os mais
diversos setores da sociedade sobre as problemáticas dos feminismos
contemporâneos. Desse modo, é pertinente ressaltar que a webmilitância
feminista pode incitar diversificados debates e reflexões sobre as mulheres,
gênero, sexualidade e cultura
13
. Segundo Marina Lemos
14
:
A Internet, instrumento basal do Ciberfeminismo, é uma força poderosa
para conectar e dividir, o conhecimento e as fontes. Mas também, é a
tecnologia que originalmente pretendia a dominação global e militar.
Há muitos benefícios, desde que tenhamos em mente o uso consciente
e o conhecimento histórico de seu contexto. Crítica é a resistência à
imersão total na tecnologia que resulta no destacamento do mundo ao
invés do engajamento com este, e também, um dos pressupostos para
que o movimento feminista como um todo mantenha sua força diante
das discussões sobre gênero e tecnologia.
O acesso à Internet evidencia violências antes não problematizadas e
proporciona o controle do poder de decisão e a consciência sobre o próprio
corpo, o que passa a culminar, consequentemente, na reivindicação por direitos
e mudanças no sistema, como, por exemplo, o controle sobre os direitos sexuais
e reprodutores, mais especificamente o poder de escolha por parte da mulher do
procedimento do parto e os direitos relacionados, que serão abordados na
próxima parte.
4 A PROBLEMATIZAÇÃO DO PARTO NO BRASIL E O EMPODERAMENTO
DA MULHER A PARTIR DO CIBERFEMINISMO
Historicamente, o parto se constituiu em uma arena de intensa luta de
poder entre as mulheres e a ordem médica, pelo controle sobre o corpo, a
13
FERREIRA, Gleidiane de S.. Feminismo e redes sociais na Marcha das Vadias no Brasil. Revista
Ártemis, João Pessoa, v. 15, n. 1, p.33-43, jan./jul. 2013. Disponível em:
<http://periodicos.ufpb.br/ojs/index.php/artemis/article/viewFile/16636/9493>. Acesso em: 01 dez. 2016.
14
LEMOS, Marina. Ciberfeminismo: Novos discursos do feminino em redes eletrônicas. Tese (Mestrado
em Comunicação e Semiótica). São Paulo: PUC-SP, 2009, p. 121-122.
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sexualidade e a emoção
15
. Para o feminismo, as questões relativas à
reprodução, dentro do direito da saúde da mulher, são colocadas no plano das
relações de poder e da luta política pela autodeterminação
16
. Ou seja, o
reconhecimento à individualidade da mulher e a percepção de suas
necessidades fazem parte da ação humanizada e geram relações menos
desiguais e autoritárias.
Nesse contexto, o direito à informação é um direito que permite a
possibilidade de gerar conhecimento e facilitar o exercício de outros direitos.
Assim, o acesso à informação sobre os diferentes elementos que interferem em
sua saúde é estratégia fundamental para que as mulheres adquiram maior
controle e poder de decisão sobre tais fatores. O principal mediador para o
acesso a informações em saúde deveria ser o médico, porém, em muitas
situações, principalmente no que se refere à saúde da mulher, o profissional é
omisso em relação à totalidade das opções de procedimentos, tratamentos, etc.,
disponíveis ou o faz de forma incompatível com a cognição da paciente.
De acordo com a Portaria 1286, de 26 de outubro de 1993, do Ministério
da Saúde
17
:
O paciente tem direito a informações claras, simples e compreensivas,
adaptadas à sua condição cultural, sobre as ações diagnósticas e
terapêuticas, o que pode decorrer delas, a duração do tratamento, a
localização, a localização de sua patologia, se existe necessidade de
anestesia, qual o instrumental a ser utilizado e quais regiões do corpo
serão afetadas pelos procedimentos.
As informações devem ser adaptadas às circunstâncias do caso e às
condições sociais, psicológicas e culturais do destinatário, por meio de uma
abordagem informativa apropriada, para facilitar o acesso cognitivo à
15
BRENES, A. C. História da parturição no Brasil, Século XIX. Cadernos de Saúde Pública, v, 7, n. 2,
abr/jun, p. 135-149, 1991. Disponível em: < http://www.scielo.br/pdf/csp/v7n2/v7n2a02.pdf>. Acesso em:
02 dez. 2016.
16
ÁVILA, Maria Bethânia. Modernidade e cidadania reprodutiva. Estudos Feministas, v. 1, n. 2, p. 382-
393, 1993. Disponível em: <https://periodicos.ufsc.br/index.php/ref/article/view/16070/14604>. Acesso
em: 02 dez. 2016.
17
Ministério da Saúde Portaria nº 1286, de 26 de outubro de 1993. Dispõe sobre os direitos do paciente.
Diário Oficial da União, Brasília, 1994. Disponível em:
<www.centroruibianchi.sp.gov.br/usr/share/documents/F-POR1286-OUT93.DOC>. Acesso em: 21 dez.
2016.
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informação
18
. A deficiência do acesso à informação fornecido pelos profissionais
da saúde está sendo suprido pelas novas tecnologias de informação e
comunicação, uma vez que o conteúdo pode ser produzido sem a utilização de
linguagem técnica e acadêmica e adaptado às mais diversas realidades sociais.
Na concepção de Maria Eduarda Gonçalves, “a informação aparece-nos sob
diversas formas e com diferentes conteúdos. No contexto da sociedade da
informação e devido ao uso das novas tecnologias, formas inovadoras de
tratamento da informação tornaram possível organizar e apresentar sob formatos
diversos uma maior quantidade e diversidade de factos, dados e/ou
conhecimentos”
19
.
Utilizar as TIC como ferramentas para promover a conscientização,
discussão e quebra da invisibilidade da violência obstétrica também se faz
estratégico em função dos benefícios que a participação em ações via internet
pode trazer às mulheres que sofreram. Com a participação em ações promovidas
na Internet, por exemplo, a mulher tem a possibilidade de ser ouvida e
reconhecida em sua dor, ter suporte psicológico e empoderar-se, por sentir que
alguém “lhe deu voz”, além de se contribuir, também, para o apoio a outras
mulheres.
Sabe-se que o Brasil é conhecido como um dos países com mais altas
taxas de cirurgia cesariana, ultrapassando significativamente os critérios da
Organização Mundial de Saúde (OMS), que aceita uma taxa anual de 15 % do
total de partos
20
, recomendados apenas quando haja risco para a mãe e para o
bebê. O crescimento dos partos cirúrgicos, ainda que muitas vezes justificados,
chegou a um ponto tal que se tornou, dependendo da região e do hospital, o
procedimento padrão de uma mulher dar à luz.
Vários dos estudos que sustentam as recomendações da OMS
referem-se às correlações entre forma de assistência ao parto e índices de
18
FORTES, Paulo Antônio de Carvalho. Reflexões sobre a bioética e o consentimento esclarecido.
Bioética, Brasília, v. 2, n. 2, p. 129-135, 1994. Disponível em:
<http://revistabioetica.cfm.org.br/index.php/revista
_bioetica/article/view/458>. Acesso em: 18 dez. 2016.
19
GONÇALVES, Maria Eduarda. Direito da Informação. Coimbra: Livraria Almedina, 1994, p. 16.
20
OMS. Declaração da OMS sobre as Taxas de Cesáreas. Genebra: OMS/Woman Reproduction
Programme, 2014. Disponível em: <http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/161442/3/WHO_RHR_
15.02_por.pdf>. Acesso em: 02 dez. 2016.
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morbidade
21
e mortalidade infantil, em que a intervenção cirúrgica e a alta
medicalização do parto não correspondem a melhorias nos indicadores de
saúde. De acordo com Carmem Susana Tornquist
22
, pesquisadores do tema têm
mostrado que os países que apresentam um sistema de assistência menos
intervencionista revelam os melhores índices de saúde materno-infantil, como o
caso da Holanda, onde a forma de atenção ao parto oficial inclui o trabalho de
parteiras, partos a domicílio e baixo intervencionismo.
As recomendações da Organização Mundial da Saúde apontam, segundo
Tornquist
23
para:
[...] uma relativa desmedicalização do parto, na medida em que
compreendem os seguintes pontos: incentivo ao parto normal (vaginal);
revalorização do papel das mulheres como parteiras e enfermeiras
capazes de atender a partos normais; diminuição de intervenções
agressivas; incorporação de técnicas mecânicas de alívio para o dor;
valorização do suporte emocional a parturiente, através de doulas e
acompanhantes; estímulo ao vínculo mãe-bebê imediato ao pós-parto.
Conceber os filhos através de cesárea é uma prática tão difundida e
comum que o procedimento de parto no Brasil é estruturalmente construído
para a realização da cesariana
24
. O modelo de saúde, centrado no médico e não
em enfermeiras especializadas já induz ao procedimento cirúrgico, ao contrário
de países europeus onde o médico é chamado quando ocorrem
complicações. Além disso, os serviços de saúde se baseiam no método de
intervenção de rotina, o que gera a crença de que uma postura intervencionista
seja realmente mais eficaz do que outras opções.
De acordo com a obstetra Suzzane Serruya, diretora da OMS no Brasil, a
“epidemia de cesáreas” tornou-se uma questão cultural além de um problema de
21
Propensão ou capacidade para desenvolver doenças.
22
TORNQUIST, Carmen Susana. Parto e poder: o movimento pela humanização do parto no Brasil. (Tese)
Universidade Federal de Santa Catarina, Centro de Filosofia e Ciências Humanas, Programa de Pós-
Graduação em Antropologia Social. 429 p. Disponível em: <
https://repositorio.ufsc.br/bitstream/handle/123456789/86639/207876.pdf?sequence=1>. Acesso em: 06
dez. 2016.
23
Ibidem, p. 11.
24
BARBOSA, Gisele Peixoto; et al. Dados sobre a alta incidência de cesáreas e o poder de escolha das
mulheres. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 19, n. 6, p.1611-1620, nov-dez, 2003. Disponível em:
<http://www.scielo.br/pdf/csp/v19n6/a06v19n6.pdf >. Acesso em: 02 dez. 2016.
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saúde em praticamente todo o mundo
25
. A partir do século XX, o parto normal
começou a ser visto como vergonhoso, devido à exposição das partes intimas
da mulher a estranhos e, também, passou a ser considerado como algo
assustador e arriscado.
Não obstante, as consequências podem atingir a esfera econômica. Para
o médico, com a possibilidade de marcar a hora e a data do parto, abre-se uma
grande margem para o lucro, quando possui a liberdade de marcar quantas
cesáreas conseguir realizar ao mesmo dia. Para o hospital, o uso indiscriminado
de cesarianas gera mais gastos, inclusive para conter possíveis complicações e
doenças ocasionadas pela cirurgia à mãe e ao bebê. Ou ainda, quando o filho
nasce prematuro, acaba necessitando de uma assistência neonatal intensiva por
algum tempo, aumentando a demanda pelos serviços de saúde. Tudo isso,
acaba por gerar gastos desnecessários para o sistema de saúde público e
privado.
Uma pesquisa foi realizada pela Fundação Oswaldo Cruz entre fevereiro
de 2011 e outubro de 2012, com 23.894 mulheres entrevistadas, em
maternidades públicas, privadas e mistas (maternidades privadas conveniadas
ao Sistema Único de Saúde SUS) e incluiu 266 hospitais de médio e grande
porte, localizados em 191 municípios, contemplando as capitais e também
cidades do interior de todos os estados do Brasil
26
. O estudo identificou que
apenas 59% das mulheres entrevistadas foram orientadas adequadamente
sobre os procedimentos de parto. A maioria das mulheres teve seus filhos por
meio de cesarianas, cirurgia realizada em 52% dos nascimentos. Ao analisar
apenas o setor privado, a situação é ainda mais alarmante: 88% dos bebês
nasceram por meio de cesarianas. As estimativas apontam que, no Brasil,
anualmente, cerca de um milhão de mulheres são submetidas à cesariana sem
indicação obstétrica adequada, perdendo, assim, a oportunidade de serem
protagonistas do nascimento de seus filhos.
De acordo com a pesquisa:
25
DENÚNCIA da OMS sobre a epidemia de cesáreas no mundo, onde o Brasil é líder. Zero Hora.
Disponível em: <http://zh.clicrbs.com.br/rs/vida-e-estilo/vida/bem-estar/noticia/2015/04/oms-denuncia-
epidemia-de-cesareas-no-mundo-e-brasil-e-lider-4737240.html>. Acesso em: 02 dez. 2016.
26
FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ. Nascer no Brasil: Inquérito Nacional sobre Parto e Nascimento A
mãe sabe parir e o bebê sabe como e quando nascer, 2012. Disponível em: <www.ensp.fiocruz.br/portal-
ensp/informe/site/arquivos/anexos/nascerweb.pdf>. Acesso em: 01 dez. 2016.
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[...] entre as gestantes que tiveram parto vaginal, observou-se a
predominância de um modelo de atenção extremamente medicalizado
que ignora as melhores evidências científicas disponíveis. A maioria
das mulheres foi submetida a intervenções excessivas, ficou restrita ao
leito e sem estímulo para caminhar, sem se alimentar durante o trabalho
de parto, usou medicamentos para acelerar as contrações (ocitocina),
foi submetida à episiotomia (corte entre a vagina e o ânus) e deu à luz
deitada de costas, muitas vezes com alguém apertando sua barriga
(manobra de Kristeller).
27
Quase 70% das mulheres desejavam um parto vaginal durante o pré-natal.
Entretanto, poucas foram apoiadas pelos médicos em sua opção: nos serviços privados,
esse valor foi de apenas 15% para as mulheres que estavam em seu primeiro parto.
Embora a preferência inicial pelo parto vaginal fosse maior, observou-se que, ao longo
da gravidez, houve uma mudança da decisão em relação ao tipo de parto, que não pode
ser explicada pela ocorrência de problemas e complicações. Isso sugere que a partir do
momento em que a mulher entra no hospital para ter o seu bebê, o procedimento ocorre
de acordo com os protocolos determinados pela instituição, sem esclarecimento em
relação às opções e a supressão da possibilidade de escolha e autonomia da mulher.
O acesso à informação possibilita a efetivação de direitos e a garantia da
autonomia do indivíduo e as novas tecnologias de informação e comunicação se tornaram
o principal meio de superar as deficiências no seu fornecimento. O ciberfeminismo é o
principal responsável pela democratização de conteúdo relativo à saúde da mulher e aos
direitos sexuais e reprodutivos e o apoio às internautas e sua importância será retratada
no tópico seguinte.
4.1 EMPODERAMENTO FEMININO A PARTIR DO ACESSO À INFORMAÇÃO
PROPORCIONADO PELO CIBERFEMINISMO
As novas TIC proporcionam um espaço de denúncia e compartilhamento de
histórias que não eram problematizadas pelos meios tradicionais de comunicação,
principalmente no que se refere àquelas que revelam o quanto parcelas vulneráveis da
população, como as mulheres, sofrem com a violência, que muitas vezes é disfarçada e
silenciosa.
27
Ibidem, p. 3.
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Segundo Ana Flávia D’Oliveira et al
28
, a violência obstétrica se apresenta desde
a negligência na assistência, a discriminação social, o tratamento grosseiro e a humilhação
intencional, além da violência física (incluindo não utilização de medicação analgésica
quando tecnicamente indicada), até o abuso sexual. Também pode ser considerada como
prática de violência o uso inadequado de tecnologias, intervenções e procedimentos
desnecessários frente às evidências científicas, resultando numa cascata de intervenções
com potenciais riscos complicações.
Os incisos III, V e VI do artigo 7º da Lei 8.080 de 1990
29
prevêem, como
princípios básicos do Sistema Único de Saúde, a “preservação da autonomia das pessoas
na defesa de sua integridade física e moral”, o direito à informação, às pessoas assistidas,
sobre sua saúde e “a divulgação de informações quanto ao potencial dos serviços de
saúde e a sua utilização pelo usuário”, que devem ser seguidos por hospitais públicos e
privados. O ato de ocultar informações às principais interessadas no momento do pré-
natal sem considerar suas integridades físicas e morais, portanto, constitui-se como um
ato ilegal e um atentado ao direito individual da parturiente, entretanto isso vem
ocorrendo diariamente nos hospitais brasileiros.
A recorrência de casos de negligência, de inacessibilidade a informações, de
tratamento humilhante e violento na hora do parto está cada vez mais aparente, devido à
possibilidade de manifestação e compartilhamento que as TIC, com ênfase na Internet,
possibilitam, a partir do incentivo das páginas ciberativistas.
Cabe ressaltar que o movimento em prol do empoderamento das mulheres
grávidas não está limitado ao procedimento do parto, mas abrange, também, o incentivo
ao pré-natal e ao planejamento familiar. Entretanto, nem sempre a problemática do parto
foi pauta do movimento feminista, pois acreditava-se que desvincular a maternidade
do corpo feminino significaria o acesso a uma situação de igualdade, visto que esta era
considerada como a principal função da mulher na sociedade. Postulava-se, também, que,
retirando a reprodução humana para fora dos corpos biológicos, a partir da qual se
28
D’OLIVEIRA, Ana Flávia Pires Lucas; et al. Violence against women in health-care institutions: an
emerging problem. Lancet, v. 359, n. 9318, maio, p. 1681-1685, 2002.
29
BRASIL. Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990. Esta lei regula, em todo o território nacional, as ações
e serviços de saúde, executados isolada ou conjuntamente, em caráter permanente ou eventual, por pessoas
naturais ou jurídicas de direito Público ou privado. DOU. Brasília: 19 set. 1990. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8080.htm>. Acesso em: 02 dez. 2016.
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geravam as desigualdades sociais, ter-se-ia como consequência um futuro igualitário
entre os gêneros
30
.
Com o passar do tempo, a concepção foi repensada, pois a opção pela
maternidade ou não deveria ser da mulher e a maternidade está diretamente relacionada à
liberdade do corpo, aos direitos reprodutivos e sexuais. A informação é essencial para a
libertação das mulheres e a produção de conteúdo pelas ciberfeministas por meio das TIC
poderá suprir a deficiência da disponibilidade da orientação médica.
É fundamental enfatizar a necessidade urgente de uma mudança que priorize a
recuperação da autonomia da mulher a partir da apropriação do direito sobre seu próprio
corpo e do acesso à informação, a fim de oferecer um contraponto à cultura medicalizante
e omissiva, que reproduz a submissão feminina e retira a autonomia da mulher. O
empoderamento por meio da informação e a denúncia da realidade da violência obstétrica
são estratégia do ciberfeminismo, pois a promoção da saúde e da igualdade está
definitivamente relacionada ao aumento das possibilidades que as mulheres têm de
exercer controle sobre sua própria saúde.
As redes ciberfeministas auxiliam, inclusive, na confecção do Plano de parto, que
é um documento redigido durante a gestação e registrado no cartório, que contém, uma
lista do que a mulher deseja e do que não deseja que aconteça durante o parto, incluindo
as leis que dizem respeito à gestação, como, por exemplo a Lei 11.108/2005
31
, que dispõe
sobre o direito ao acompanhante durante o procedimento, assim como normativas e
portarias do Ministério da Saúde, a fim de efetivar os direitos da gestante.
O ciberfeminismo proporciona não apenas a produção e o acesso à informação,
mas também a conversão dessa informação em conhecimento, a partir da compreensão e
apropriação cognitiva de cada destinatária do conteúdo. Esse conhecimento se incorpora
à realidade da mulher e se torna essencial para o empoderamento e para a reivindicação
pela liberdade de escolha. O conhecimento sobre ginecologia e obstetrícia, antes
confinado a livros e ao contexto acadêmico, está mais acessível, e essa ampliação do
acesso é chave para que as mulheres se empoderem. Cada vez mais as mulheres são
30
LEMOS, Marina Gazire. Ciberfeminismo: novos discursos do feminismo em redes eletrônicas.
(Dissertação). Mestrado em Comunicação e Semiótica. PUC/SP, São Paulo, 2009.
31
BRASIL. Lei 11.108, de 7 de abril de 2005. Altera a Lei no 8.080, de 19 de setembro de 1990, para
garantir às parturientes o direito à presença de acompanhante durante o trabalho de parto, parto e pós-parto
imediato, no âmbito do Sistema Único de Saúde - SUS. Diário Oficial da União. Brasília: 7 abr. 2005.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2005/Lei/L11108.htm>. Acesso
em: 02 dez. 2016.
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orientadas, compartilham a informação, formando uma inteligência coletiva que, de
acordo com Pierre Lévy, significa “uma inteligência distribuída por toda parte,
incessantemente valorizada, coordenada em tempo real
32
, valorizando as habilidades de
cada indivíduo, ou seja, uma inteligência que não fique restrita a poucas pessoas. Nesse
sentido, as detentoras dessa inteligência, construída a partir do acesso e da participação
de grupos e páginas ciberfeministas, deixam de ser conduzidas para um procedimento de
parto indesejado e desnecessário, que visa apenas o maior lucro do corpo médico e da
instituição hospitalar. Sem o ciberespaço, possivelmente, as gestantes teriam dificuldade
em contradizer os argumentos dos médicos e ter autonomia de escolha.
4.2 REDES CIBERATIVISTAS BRASILEIRAS
Grande parte da atuação do ciberfeminismo com foco central na problemática do
parto (que, vale lembrar, abrange desde o pré-natal até a fase pós-nascimento) utiliza da
estratégia do empoderamento pela informação e é organizada, no cenário brasileiro, por
redes feministas e ONGs, como, por exemplo, a Amigas do Parto
33
, a Rede pela
Humanização do Parto e do Nascimento (REHUNA)
34
e o Despertar do Parto
35
, que estão
presentes em páginas na web, em blogs e nas redes sociais, articulando ideias e pessoas,
divulgando informações e atualizando-se constantemente, além de estimular atividades
para mães, pais e bebês, como cursos, workshops, rodas de apoio e conversa e a
capacitação de parteiras tradicionais.
O site da rede Amigas do Parto, por exemplo, possui links que remetem a
informações sobre a situação obstétrica no Brasil; os tipos de parto; os profissionais,
artigos científicos e bibliografias; evidências científicas; direitos da gestante;
depoimentos; realidade do parto em outros países; informações de contato; além de listas
de discussão, onde as internautas podem compartilhar suas histórias e experiências.
Já a página do Facebook possui mais de 27 mil curtidas e a classificação de 4,8 e
publica quase diariamente questões atuais como a humanização do parto e o aborto, mitos
e tabus, além de informar a disponibilidade de cursos à distância como o de doula, de
32
LÉVY, Pierre. A inteligência coletiva: por uma antropologia do ciberespaço. 4. ed. São Paulo: Loyola,
2003, p. 28.
33
Página na web: <http://www.amigasdoparto.com.br/>.
34
Página na web: <http://www.rehuna.org.br/>.
35
Página na web: <http://www.despertardoparto.com.br/atividades.html>.
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educadora perinatal e facilitadora de leite materno. A rede possui também grupos de
discussão na rede social, correspondentes a mulheres de vários municípios e regiões,
como de Manaus, Porto Alegre, Santo André e Paranaguá.
Apesar da grande importância dessas páginas nacionais no empoderamento
através da informação e no embasamento teórico das mulheres, diferentemente de outras
pautas feministas, com articulação nacional e organização por entidades, como ONGs, a
principal forma de atuação do ciberfeminismo, em relação a esta problemática, é
descentralizado e possui redes e grupos municipais e autônomos, que se retroalimentam
a partir das experiências vividas e da realidade local das mulheres integrantes, como é o
caso do grupo Nascer Sorrindo
36
, de Santa Maria no Rio Grande do Sul, que se tornou
referência na região para quem busca orientações sobre a fase pré-natal, do parto e da
amamentação.
O grupo é composto por doulas, profissionais da saúde e colaboradoras, que
buscam orientar as futuras mães através de rodas de conversa e trocas de experiências
online e offline, por meio de encontros mensais, onde são abordados temas diversos,
como a nutrição na gestação, o parto, a humanização no nascimento, a amamentação e
cuidados com o recém-nascido. O foco das atividades está centrado na rede social
Facebook, visto que proporciona uma maior interação entre as participantes e o acesso
mais simplificado e imediato à pagina, que possui cerca de 2.500 curtidas e ao grupo de
discussão, onde também são disponibilizados inúmeros cursos capacitantes.
Nota-se que a produção das informações é feita pelas próprias internautas, por
meio de abertura de tópicos de conversa, dúvidas, indicações de profissionais,
experiências e dicas, em uma relação horizontal de disseminação de conhecimento e
aprendizagem. Ademais, elas reconhecem a importância das TIC para o empoderamento
feminino e para o apoio às conquistas da causa.
A partir da criação de um tópico com a pergunta a internet e as redes sociais
auxiliam em relação ao acesso à informação e à busca pelo protagonismo das mulheres
em todo o processo antes, durante e pós-parto. Essas ferramentas ajudam a atingir cada
vez mais mulheres?, foi possível perceber a forma positiva com que as mulheres encaram
a utilização das TIC, por meio de respostas como os seguintes exemplos:
36
Página na web: <http://nascersorrindosm.wixsite.com/nascersorrindosm>; Página no Facebook:
<https://www.facebook.com/GrupoNascerSorrindo/?ref=ts&fref=ts>.
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Fonte: Página no Facebook do grupo Nascer Sorrindo/SM
Fonte: Página no Facebook do grupo Nascer Sorrindo/SM
Fonte: Página no Facebook do grupo Nascer Sorrindo/SM
Mostra-se evidente a importância do ciberfeminismo para o
empoderamento feminino através da informação, mas, a conquista da autonomia
da mulher e do controle sobre seu próprio corpo não é o único efeito da atuação
desse ativismo online, visto que esse novo contexto traz reflexos também na
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criação de novas políticas públicas e outros instrumentos que efetivem e
protejam os direitos das mulheres.
4.3 CONSEQUÊNCIAS DA MUDANÇA DE PERCEPÇÃO EM RELAÇÃO AO
PARTO
O procedimento obstétrico atual no Brasil é incompatível com a proteção
e a autonomia da mulher. Cada vez mais empoderadas de seus direitos através
do ciberfeminismo, as brasileiras não estão mais aceitando essa realidade e, por
isso, passaram a pressionar os órgãos públicos a garantirem seus direitos e
tornarem o tratamento neonatal mais humano. Assim, humanização do parto
refere-se ao respeito e à promoção dos direitos de mulheres e crianças a uma
assistência baseada na segurança e na informação a partir de evidências
científicas e não na conveniência de instituições ou profissionais.
O conceito de humanização adotado pelo movimento feminista é o de:
[...] uma atenção que reconhece os direitos fundamentais de mães e
crianças, além do direito à tecnologia apropriada, baseada na evidência
científica. Isso inclui: o direito à escolha do local, pessoas e formas de
assistência no parto; a preservação da integridade corporal de mães e
crianças; o respeito ao parto como experiência altamente pessoal,
sexual e familiar; a assistência à saúde e o apoio emocional, social e
material no ciclo gravídico-puerperal; e a proteção contra abuso e
negligência.
37
Em 28 de abril de 2011, foi publicada a Lei n° 12.401
38
, que altera
diretamente a Lei nº 8.080 de 1990 dispondo sobre a assistência terapêutica e a
incorporação de tecnologias em saúde no âmbito do SUS. Essa lei define que o
Ministério da Saúde, assessorado pela Comissão Nacional de Incorporação de
Tecnologias no SUS (CONITEC), tem como atribuições a incorporação, exclusão
ou alteração de novos medicamentos, produtos e procedimentos, bem como a
constituição ou alteração de Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas e a
37
REDE FEMINISTA DE SAÚDE. Dossiê Humanização do Parto. São Paulo: Rede Feminista de Saúde,
2002. Disponível em: <http://www.redesaude.org.br/home/conteudo/biblioteca/biblioteca/dossies-da-rede-
feminista/015.pdf>. Acesso em: 21 dez. 2016, p. 14.
38
BRASIL. Lei nº 12.401, de 28 de abril de 2011. Altera a Lei no 8.080, de 19 de setembro de 1990, para
dispor sobre a assistência terapêutica e a incorporação de tecnologia em saúde no âmbito do Sistema Único
de Saúde - SUS. Diário Oficial da União. Brasília: 28 abr. 2011. Disponível em: <
http://www.planalto.gov.br/CCIVIL_
03/_Ato2011-2014/2011/Lei/L12401.htm>. Acesso em: 21 dez. 2016.
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questão obstétrica, por ser incompatível com as recomendações da OMS
recebeu especial, por meio da Diretriz Nacional de Assistência ao Parto Normal
e das Diretrizes de Atenção à Gestante
39
.
Em 2015, a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), com a
Resolução Normativa 368, estabeleceu novas regras para estimular o parto
normal e reduzir as cesarianas desnecessárias. A partir dela, as operadoras de
planos de saúde, sempre que solicitadas, deverão divulgar documento com os
percentuais de cirurgias cesáreas e de partos normais por estabelecimento de
saúde e por médico. Também serão obrigadas a fornecer o Cartão da Gestante
e a Carta de Informação à Gestante, no qual deverá constar informações sobre
os procedimentos de parto e registro de todo o pré-natal. Além disso, os
obstetras deverão utilizar o Partograma, documento gráfico onde é registrado
tudo o que acontece durante o trabalho de parto
40
.
Em relação à legislação, a Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo
pioneiramente aprovou a Lei nº 15.759, de 25 de março de 2015, que assegura
o direito ao parto humanizado nos estabelecimentos públicos de saúde do
Estado, a partir de um atendimento que, de acordo com o art. 2º:
Artigo 2º - Para os efeitos desta lei, ter-se-á por parto humanizado, ou
assistência humanizada ao parto, o atendimento que:
I - não comprometer a segurança do processo, nem a saúde da
parturiente ou do recém-nascido;
II - só adotar rotinas e procedimentos cuja extensão e conteúdo tenham
sido objeto de revisão e avaliação científica por parte da Organização
Mundial da Saúde - OMS ou de outras instituições de excelência
reconhecida;
III - garantir à gestante o direito de optar pelos procedimentos eletivos
que, resguardada a segurança do parto, lhe propiciem maior conforto e
bem-estar, incluindo procedimentos médicos para alívio da dor.
em âmbito federal, inúmeros Projetos de Lei estão sendo apreciados
pelas Comissões da Câmara dos Deputados e do Senado, como por exemplo: o
39
BRASIL. CONITEC. Ministério da Saúde. Diretriz Nacional de Assistência ao Parto Normal. Brasília,
2016. Disponível em: <http://conitec.gov.br/images/Consultas/2016/Relatorio_Diretriz-
PartoNormal_CP.pdf>. Acesso em: 18 dez. 2016.
40
BRASIL. Agência Nacional de Saúde Suplementar. Entram em vigor novas regras sobre parto na
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PL 7.633/2014, que estabelece que médicos e profissionais de saúde devem dar
prioridade à assistência humanizada à mulher e ao recém-nascido no ciclo da
gravidez até o pós-parto. Os hospitais deverão respeitar o limite de 15% de
cesáreas, recomendado pela Organização Mundial da Saúde; e o PLS 8/2013,
Já aprovado no Senado e remetido à Câmara, que visa obrigar a obediência às
diretrizes e orientações técnicas e o oferecimento de condições que possibilitem
a ocorrência do parto humanizado nos estabelecimentos do SUS. Vale ressaltar
que esse projeto foi motivado pelos esforços da Rehuna, coletivo de profissionais
de saúde em Rede pela Humanização do Parto e Nascimento, mencionado
neste artigo.
Servem igualmente para exemplificação o PLS 75/2012, o qual proíbe que
a gestante detenta seja algemada durante o parto; a PEC 100/2015, que visa
disponibilizar equipe multiprofissional para atenção integral no pré-natal, parto e
pós-parto nos estabelecimentos atendidos pelo SUS e o PL 359/2015, que
propõe fornecer curso de qualificação básica para as parteiras tradicionais e
incluir sua atividade no âmbito do SUS.
5 CONCLUSÃO
O feminismo pode ser considerado um dos fenômenos de desconstrução
da cultura mais significativo do século XX e XXI, devido à ruptura paradigmática
com uma cultura política profundamente autoritária e excludente para as
mulheres. Esse movimento exerce um questionamento profundo às concepções
sobre as relações humanas e os contextos sociopolíticos, econômicos culturais
e sexuais. Sendo assim, a luta das mulheres por empoderamento é atual e
ampla, além de extremamente necessária para as mutações sócio-históricas.
Ao fortalecer as redes, a participação política das mulheres também é
ampliada e a expansão do acesso às TIC, as informações e as trocas de
experiências as tornam mais informadas e conscientes sobre seus direitos, seus
corpos e sua saúde.
O ciberfeminismo, como fenômeno social e político, é recente. Seus
primeiros passos foram dados junto à terceira onda feminista, iniciada entre as
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décadas de 1980 e 1990, e levavam a ideia de que as TIC poderiam reconfigurar
a sociedade, os próprios meios tecnológicos e as posições de gênero instituídas.
O parto é um ato cultural, pois reflete os valores sociais reproduzidos
historicamente em cada sociedade. No processo do parto, a mulher tem a
expectativa de receber informações sobre o que acontece com ela e com o seu
bebê. O profissional de saúde tem a obrigação ética e legal de oferecer
informações claras e completas sobre o cuidado, os tratamentos e as
alternativas, e dar à mulher a oportunidade de participar das decisões em relação
ao que lhe foi informado, entretanto, na maioria dos casos, esse direito não é
respeitado e a mulher perde seu poder de tomada de decisão, tendo que se
sujeitar aos procedimentos determinados pelo corpo médico e pela instituição,
que, geralmente, são desnecessários e submetem a mulher e o bebê a inúmeros
riscos e complicações.
O domínio da informação relativa aos procedimentos de parto,
disponibilizada por meio de grupos e redes ciberfeministas, é uma forma da
mulher ter controle sobre si e seu próprio corpo. Além disso, a mulher
empoderada, apresenta-se mais segura durante a evolução do trabalho de parto,
pois tem a possibilidade de contestar as decisões do médico e decidir o que é
melhor para si.
A mudança de percepção em relação à problemática da violência
obstétrica no Brasil e da violação de direitos da mulher também levou a uma
cobrança em relação ao poder público, para a criação de políticas públicas e leis
que resguardassem o controle da mulher sobre o corpo e incentivassem a
autonomia de escolha em relação aos procedimentos do pré-natal e parturientes,
por meio de pressão, principalmente por parte do ciberfeminismo.
A mulher está cada vez mais se empoderando e assumindo o seu lugar
no combate contra as desigualdades de gênero, visto que essas diferenças
geram efeitos nas mais variadas situações, inclusive durante o parto, com a
mitigação da sua autonomia de escolha e ao risco da violência obstétrica. Por
meio do acesso à informação, proporcionado principalmente pelas redes
ciberfeministas na Internet, as mulheres se tornam capazes de questionar as
estruturas vigentes e reivindicar por seus direitos, além de pressionar o Estado
para que assuma o seu papel de tutela.
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Article
The work approaches the lack of legislation to regulate acts of obstetric violence. The analysis is carried out from the perspective of the demands of the cyberfeminist movement in Brazil. Therefore, the research consists of verifying whether the Bills in Process in Brazil from 2015 to 2021 meet the requirements of cyberfeminism. For the analysis, specific criteria were determined, based on the understanding of the movement. The demands of cyberfeminism point to the need for a conception of obstetric violence, in legal documents that define and criminalize it, which will help in identifying and holding the driver responsible, in addition to public policies in favor of restraint. Therefore, it was possible to see that most of the Projects partially meet the requirements of cyberfeminism, and it is possible to note that law project No. 878/2019 is the one that best suits the specificities of the movement.
Chapter
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In this book, we present some experiences that go through a scientific, theoretical and technical foundation, and of practical application. The book begins with a theoretical approach in which the focus is on the introduction to ehealth and the strategies for evaluating and validating these technologies. In the second part of the book, we demonstrate the application of ehealth in designing tools for improving health care in 14 chapters that bring successful experiences that can inspire readers.
Book
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In this book, we present some experiences that go through a scientific, theoretical and technical foundation, and of practical application. The book begins with a theoretical approach in which the focus is on the introduction to ehealth and the strategies for evaluating and validating these technologies. In the second part of the book, we demonstrate the application of ehealth in designing tools for improving health care in 14 chapters that bring successful experiences that can inspire readers.
Article
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Neste artigo, analisamos as contribuições do debate feminista sobre interseccionalidade de categorias sociais para a psicologia social comunitária no Brasil. Esta se constituiu como campo teórico dedicado a analisar as desigualdades sociais que marcam as sociedades contemporâneas e a propor processos metodológicos de intervenção para problematização e transformação dessas realidades. Discutimos como a emergência de novos atores e demandas no espaço público, de forma distinta dos anos 1960/1970, tem exigido compreender as opressões a partir de sistemas de poder diversos, como os de gênero, de raça e de sexualidade. Conclui-se que a análise interseccional deve considerar diversos níveis de relação entre as categorias, o histórico diferenciado destas e os aspectos comuns dos distintos sistemas de poder, como naturalização das desigualdades, relação entre o público e o privado e relação entre igualdade e diferença. As análises baseadas na interseccionalidade podem contribuir para processos de intervenção social que considerem a complexidade das sociedades contemporâneas.
Article
Maternal morbidity and mortality in childbirth is a matter of utmost importance in public health. In this article, we argue that part of the problem lies in violence committed by health workers in childbearing or abortion services, which affects health-service access, compliance, quality, and effectiveness. We analysed rigorous research from the past decade and discuss four forms of violent abuse by doctors and nurses: neglect and verbal, physical, and sexual abuse. These forms of violence recur, are often deliberate, are a serious violation of human rights, and are related to poor quality and effectiveness of health-care services. This abuse is a means of controlling patients that is learnt during training and reinforced in health facilities. Abuse occurs mainly in situations in which the legitimacy of health services is questionable or can be the result of prejudice against certain population groups. We discuss ways to prevent violent abuse.
Rede Feminista de Saúde
  • D E Rede Feminista
  • Saúde
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  • São Paulo
REDE FEMINISTA DE SAÚDE. Dossiê -Humanização do Parto. São Paulo: Rede Feminista de Saúde, 2002. Disponível em: <http://www.redesaude.org.br/home/conteudo/biblioteca/biblioteca/dossies-darede-feminista/015.pdf>. Acesso em: 21 dez. 2016.
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Cadernos de Saúde Pública
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