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FORMAÇÃO DE JOVENS APRENDIZES-TRABALHADORES: trabalho, acidentes e identidades profissionais

Authors:

Abstract

O Programa Jovem Aprendiz oportuniza a formação de jovens em determinada profissão, expandindo seus conhecimentos, por mais limitada que seja a formação profissional. A pesquisa qualitativa descritiva em andamento discute as coerções estruturais emergentes das práticas pedagógicas e dos discursos empregados por instituições formadoras dos aprendizes-trabalhadores, Camp e CIEE, parceiras de uma indústria automotiva de São Bernardo do Campo na preparação destes jovens para e no trabalho. Objetivando saber se a formação profissional no trabalho auxiliou um grupo de aprendizes, próximos a concluírem a aprendizagem, a se identificarem com as profissões escolhidas e se o tema acidente do trabalho foi suficientemente abordado, utilizou-se as técnicas de observação direta e dinâmica de grupo guiada por Roteiro de Entrevista. A interlocução sobre as falas dos aprendizes-trabalhadores quanto às suas identificações entre a teoria abordada pelas instituições formadoras e a práxis desenvolvida na indústria automotiva, e o sentido do tema Acidente do Trabalho, é mediada pela sociologia reflexiva de Anthony Giddens (2002). Os resultados apontam que para boa parte dos aprendizes não há correlação entre a parte teórica e a práxis laboral, sentem-se à parte da cultura organizacional da fábrica, reclamam que a disciplina da segurança do trabalho não considera os fatores psicossociais, e preferem ter um emprego ao acertar na escolha da profissão. Abstract The Young Apprentice Program allows the training of young people in a given profession, expanding their knowledge, however limited vocational formation. The descriptive qualitative research underway discusses the emerging structural constraints of pedagogical practices and discourses employed by apprentices-workers training institutions, Camp and CIEE, partners of an automotive industry in São Bernardo do Campo in the preparation of these young for and at work. In order to know if the vocational training in the work helped a group of apprentices, to conclude the learning, to identify themselves with the professions chosen and if the subject of work accident was sufficiently approached, the techniques of direct observation and group dynamics were used guided by Interview Script. The interlocution of the learner-worker speeches as to their identifications between the theory approached by the training institutions and the praxis developed in the automotive industry, and the meaning of the Work Accident theme, is mediated by the reflective sociology of Anthony Giddens (2002). The results show that for most of the apprentices there is no correlation between the theoretical part and the labor praxis, they feel apart from the organizational culture of the factory, they complain that the discipline of work safety does not consider psychosocial factors, and prefer to have to employment in choosing the profession.
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FORMAÇÃO DE JOVENS APRENDIZES-TRABALHADORES: trabalho, acidentes e
identidades profissionais.
FORMATION OF YOUNG APPRENTICES-WORKERS: work, accidents and
professional identities
Solange Regina Schäffer
1
Maria Gabriela Silva Martins da Cunha Marinho
2
Júlio Francisco Blumetti Facó
3
RESUMO
O Programa Jovem Aprendiz oportuniza a formação de jovens em determinada profissão,
expandindo seus conhecimentos, por mais limitada que seja a formação profissional. A pesquisa
qualitativa descritiva em andamento discute as coerções estruturais emergentes das práticas
pedagógicas e dos discursos empregados por instituições formadoras dos aprendizes-
trabalhadores, Camp e CIEE, parceiras de uma indústria automotiva de São Bernardo do Campo
na preparação destes jovens para e no trabalho. Objetivando saber se a formação profissional
no trabalho auxiliou um grupo de aprendizes, próximos a concluírem a aprendizagem, a se
identificarem com as profissões escolhidas e se o tema acidente do trabalho foi suficientemente
abordado, utilizou-se as técnicas de observação direta e dinâmica de grupo guiada por Roteiro
de Entrevista. A interlocução sobre as falas dos aprendizes-trabalhadores quanto às suas
identificações entre a teoria abordada pelas instituições formadoras e a práxis desenvolvida na
indústria automotiva, e o sentido do tema Acidente do Trabalho, é mediada pela sociologia
reflexiva de Anthony Giddens (2002). Os resultados apontam que para boa parte dos aprendizes
não há correlação entre a parte teórica e a práxis laboral, sentem-se à parte da cultura
organizacional da fábrica, reclamam que a disciplina da segurança do trabalho não considera
os fatores psicossociais, e preferem ter um emprego ao acertar na escolha da profissão.
Palavras-Chave: Formação para o Trabalho. Identidade Profissional. Jovens Aprendizes-
Trabalhadores. Programa Jovem Aprendiz. Região do ABC Paulista.
ABSTRACT
The Young Apprentice Program allows the training of young people in a given profession,
expanding their knowledge, however limited vocational formation. The descriptive qualitative
research underway discusses the emerging structural constraints of pedagogical practices and
discourses employed by apprentices-workers training institutions, Camp and CIEE, partners of
an automotive industry in São Bernardo do Campo in the preparation of these young for and at
work. In order to know if the vocational training in the work helped a group of apprentices, to
conclude the learning, to identify themselves with the professions chosen and if the subject of
work accident was sufficiently approached, the techniques of direct observation and group
dynamics were used guided by Interview Script. The interlocution of the learner-worker
speeches as to their identifications between the theory approached by the training institutions
1
Doutoranda em Ciências Humanas e Sociais pela Universidade Federal do ABC (UFABC), ingressante pelo
Curso de Doutorado Acadêmico Industrial (DAI), Pedagoga e Mestre em Gestão: solange.schaffer@ufabc.edu.br.
2
Profª. Drª.do Programa de Pós-Graduação em Ciências Humanas e Sociais da Universidade Federal do ABC
(UFABC), Historiadora Social: gabriela.marinho@ufabc.edu.br.
3
Prof. Dr dos Programas de Graduação em Engenharia de Gestão e Pós-Graduação em Engenharia e Gestão da
Inovação (UFABC), Engenheiro e Administrador: julio.faco@ufabc.edu.br.
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and the praxis developed in the automotive industry, and the meaning of the Work Accident
theme, is mediated by the reflective sociology of Anthony Giddens (2002). The results show
that for most of the apprentices there is no correlation between the theoretical part and the labor
praxis, they feel apart from the organizational culture of the factory, they complain that the
discipline of work safety does not consider psychosocial factors, and prefer to have to
employment in choosing the profession
Key Words: Formation at the work. Professional Identify. Yong Apprentices-Workers.
Program Young Aprrentice. ABC Region of Paulista.
1 INTRODUÇÃO
1.1 Política pública de aprendizagem
A política Jovem Aprendiz obriga indústrias a empregar determinada porcentagem
de aprendizes cumprimento à cota aprendizagem de acordo com o número de funcionários
que necessitem qualificação profissional. Em contrapartida é direito dos aprendizes o
recebimento do salário mínimo-hora, registro em carteira de trabalho, contrato de trabalho não
superior a 2 anos, e formação técnica-profissional metódica que garanta o desenvolvimento de
atividades teóricas e práticas em empresas, organizadas em tarefas de complexidade
progressiva, das mais fáceis às mais complexas, na realização da prática laboral.
A lei de aprendizagem de 1943 determinou a contratação de 5% de aprendizes sob
o total de funcionários que deveriam ser formados pelo Senai (BRASIL, 1943). Outras
pequenas alterações na lei de 1943 foram feitas, porém, de maior impacto foi a lei de 2000 que
amplia a cota aprendizagem para 15% e expande a formação técnica-profissional metódica às
Escolas Técnicas de Educação e Entidades sem Fins Lucrativos (BRASIL, 2000). Pontos
importantes da lei de 1943 foram mantidas pelas tímidas reformulações legais posteriores: aos
menores de 18 anos, proibido o trabalho noturno e em atividades insalubres e de periculosidade.
Os anos 1990, marcado pela política neoliberal de expansão da globalização, a
vigência de um Estado mínimo e a ampliação da terceirização nas relações de trabalho, permitiu
que Organizações Não-Governamentais (ONGs) contratem aprendizes como mão-de-obra
terceirizada e barata às empresas, afinal jovens sem experiência estão em fase de aprendizagem,
e forneçam o conteúdo teórico como parte da formação profissional dos aprendizes.
O avanço da lei de 2000 em reconhecer a formação profissional das ETECs como
uma via direta de contratação de aprendizes que estejam matriculados em cursos nestas escolas,
pouco mudou a preferência das empresas em terceirizar essa contratação via ONGs. Assim, as
tímidas alterações na lei da aprendizagem nas últimas décadas são direcionadas sob o único e
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legítimo objetivo de corrigir detalhes que atrapalham a funcionalidade do sistema capitalista de
reprodução entre capital-trabalho, sem alterar a lógica (LOMBARDI; SAVIANI, 2005).
Se não bastasse, a adoção do modelo pedagógico ultrapassado baseado nas séries
às metódicas criado pelo Senai, os governos Lula (BRASIL, 2005) e Dilma (BRASIL, 2016)
deram continuidade de abertura das ONGs na contratação de aprendizes e formação destes,
atitudes contraditórias às ideologias propaladas por estes dois últimos governos.
ONGs como o Greenpeace ganhou elevada estima por suas ações voluntárias em
favor do desenvolvimento sustentável natural e humano. Mas, nem todas ONGs atuam com
políticas e éticas coerentes e consistentes como as do Greenpeace, e quando se fala em educação
brasileira com atuação mínimo do Estado é de se abismar sob quais experiências e práticas
pedagógicas, comprometimento ético e político ONGs se legitimam a educar os mais
vulneráveis? Sob o pretexto de docilizar os jovens trabalhadores à lógica capitalista?
Regina Novaes e Paulo Vanucci (2004) citam que em nome da ética que a
população transfere à ação voluntária às pessoas carentes, ONGs ganham legitimidade e
simpatia sem nenhuma delegação expressa dos sujeitos sociais para que estas exercitem seu
papel. Os autores citam que enquanto o Estado se ausenta da efetividade no desenvolvimento
das políticas públicas, seus benefícios são diretamente aquinhoados pelas ONGs sem que suas
ações pontuais respondem às expectativas dos sujeitos sociais nelas depositada.
Assim, ONGs como o Centro de Formação e Integração Social (Camp) e o Centro
de Integração Empresa-Escola (CIEE), instaladas na Região do ABC, ganham simpatia, a
primeira por seu assistencialismo aos jovens vulneráveis e suas famílias, fundada por um grupo
de rotarianos e, o segundo, pela facilitação de indicação ao emprego nas indústrias de jovens
que queiram se inserir no mercado de trabalho, respaldado pela Fundação Roberto Marinho.
E qual o modelo educacional destas duas ONGs, objeto de estudo deste trabalho.
Será o de replicar os valores sociais de perpetuação das classes sociais mais abastadas? Educar
para que tipo de trabalho, como e sobre quais princípios? Estas ONGs estão preparadas para
articular os conteúdos sobre o tema saúde e segurança no trabalho (SST) a práxis desses jovens,
ainda em fase de maturidade física, psicológica e emocional nas indústrias e fábricas?
O tema SST é pertinente e necessário, pois o Brasil é um dos países recordistas em
acidentes do trabalho, incluindo adolescentes e jovens (MPS, 2015). A naturalização da cultura
de uso de adolescentes ou jovens como aprendizes e mão-de-obra barata pelo sistema
capitalista, e ainda, a culpabilização do trabalhador pelo próprio acidente descendem do modelo
utilizado às épocas das primeiras e segundas revoluções industrias.
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Embora o Ministério do Trabalho sugira que todas as instituições formadoras de
aprendizes abordem o conteúdo “Direitos trabalhistas e previdenciários, saúde e segurança no
trabalho”, não há por parte desse órgão estudos aprofundados e uma sistematização dos dados
quanto a articulação teórica dos conteúdos ministrados e as tarefas realizadas pelos aprendizes.
Os temas sugeridos pelo Ministério do Trabalho compreendem: 1- Normas
Regulamentadoras (NRs) de SST; 2- Direitos e deveres de empregadores e trabalhadores em
relação à SST; 3- Prevenção de acidentes e doenças relacionadas ao trabalho, controle médico
de saúde ocupacional (PCMSO) e dos riscos ambientais (PPRA); ergonomia; equipamentos de
proteção individual (EPIs); 4- A Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (CIPA); 5-
Higiene e conforto nos locais de trabalho; 6- O Programa de Alimentação do Trabalhador.
Sob um modelo mais desumano, hostil e sem proteção social, Alexis de Tocqueville
(1979) relatou em 1858 acidentes de trabalho com crianças em fábricas durante suas viagens
pela Inglaterra e Irlanda na segunda revolução industrial, entrevistando um trabalhador de uma
indústria de tecelagem, pai de duas meninas menores de idade que também trabalhavam lá;
Pergunta: A que horas vão as menores à fábrica?
Resposta: Durante seis semanas foram às três horas da manhã e voltaram às dez horas
da noite.
Pergunta: Quais os intervalos concedidos durante as dezenove horas, para descansar
ou comer?
Resposta: Quinze minutos para o desjejum, meia hora para o almoço e quinze minutos
para beber.
Pergunta: Tinha muita dificuldade para despertar suas filhas?
Resposta: Sim. A princípio, tínhamos que sacudi-las para despertá-las e se levantarem,
bem como vestirem-se antes ir ao trabalho.
Pergunta: Quanto tempo dormiam?
Resposta: Nunca se deitavam antes das onze horas, depois de lhes dar algo que comer.
Pergunta: Então, somente tinham quatro horas de repouso?
Resposta: Escassamente quatro.
Pergunta: Quanto tempo durou essa situação?
Resposta: Umas seis semanas.
Pergunta: Trabalhavam desde as seis horas da manhã até às oito e meia da noite?
Resposta: Sim, é isso.
Pergunta: As menores estavam cansadas com esse regime?
Reposta: Sim, muito. Mais de uma vez ficaram adormecidas com a boca aberta. Era
preciso sacudi-las para que comessem.
Pergunta: Suas filhas sofreram acidentes?
Resposta: Sim, a maior, a primeira vez que foi trabalhar prendeu o dedo em uma
engrenagem e esteve cinco semanas no hospital de Leeds.
Pergunta: Recebeu o salário durante esse tempo?
Resposta: Não, desde o momento do acidente, cessou o salário.
Pergunta: Suas filhas foram remuneradas?
Resposta: Sim, ambas.
Pergunta: Qual era o salário em semana normal?
Resposta: Três shillings por semana, cada uma (TOCQUEVILLE, 1979, p. 107) 14.
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À época, a educação aos filhos de pobres era reservada às igrejas protestantes por
meio da educação profissionalizante e aos filhos de operários, o aprendizado fabril ministrado
dentro das próprias fábricas pelos mestres de ofício, quem detinha o direito de punir com
severos castigos os aprendizes que dormiam durante o aprendizado ou não cumpriam as tarefas.
Em tempos atuais, os dias de trabalho perdidos por causa de acidentes são geralmente
indenizados, contudo, os sofrimentos e pressões psicológicas pelo ainda vigente erro humano
perdura.
O paradigma do erro humano é empregado em quase todo o mundo pelo sua
facilidade e tendenciosidade em achar o culpado pelo acidente: o trabalhador ou falha humana
muito comum em acidentes aéreos. Muito provavelmente ONGs não fogem à essa regra, e nem
a fácil abordagem de replicar os modelos de relações sistêmicas capitalistas consolidados a
partir do conceito, conforme aponta Anthony Giddens (1997), de que todas as estruturas sociais
são simultaneamente facilitadora e coerciva do conhecimento. István Mészáros (2005) traz uma
profunda reflexão sobre utilizar o conhecimento como auto-transformação humana:
A aprendizagem é a nossa própria vida, desde a juventude até a velhice. Seria o
conhecimento o elemento necessário para transformar em realidade o ideal da
emancipação humana, em conjunto com uma firme determinação e dedicação dos
indivíduos para alcançar a auto-emancipação da humanidade, ou será, a adoção pelos
indivíduos, de modos de comportamento que apenas favorecem a concretização dos
objetivos reificados do capital? (MÉSZÁROS, 2005, p. 47).
Será então que as ONGs formadoras de aprendizes para o trabalho contribuem para
suas emancipações profissionais ou os treinam que seus comportamentos sejam de aceitação as
regras já institucionalizadas? Marise Nogueira Ramos (2006) concebe o processo de formação
humana como produtora do sentido do trabalho, transformadora e transformada pelas relações
econômicas e sócio-afetivas, subjugado ao modo de produção de bens e produtos, onde as
potencialidades humanas sicas, intelectuais e emocionais são alienadas ao próprio
trabalhador e apropriadas pelo capitalismo como mercadoria da força de trabalho.
Atualmente, o processo de formação está atrelado aos modelos de competência
intimamente ligados à cultura institucional de cada organização reprodutora do conhecimento,
habilidades e ética social. Para José Lombardi e Dermeval Saviani (2005), as novas
configurações das competências individuais na conquista de posição no mercado de trabalho e
empregabilidade se dá pela suposta satisfação à alienação crítica e a lógica econômica arraigada
aos modelos educacionais, ou à sua adaptação à cultura institucionalizada.
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1.1.1 Inserção, formação e identidades profissionais
A política de aprendizagem objetiva a inserção formal no trabalho de jovens entre
14 e 24 anos e a formação profissional como oportunidade às organizações formarem sua
própria mão de obra, e quando possível, efetivarem esses jovens após a finalização da
aprendizagem. Embora o processo de inserção de aprendizes no mercado não ser objetivo deste
trabalho é importante destacar que aprendizes são utilizados como mão de obra temporária,
barata, terceirizada, pois a legislação assim permite.
Sob a premissa que todos têm direito a construir identidades e subjetividades a partir
doo trabalho, Alexandre Soares (2010) participou de uma pesquisa junto aos jovens de
comunidade de baixa renda do Rio de Janeiro para conhecer os obstáculos enfrentados para a
inserção. Um desses obstáculos é a projeção dos pais para que os jovens cumpram etapas
previamente previstas como estudar, trabalhar e constituir sua própria família. Outro integrante
da equipe desta pesquisa, o americano Malcom Bush, ressalta que inserção juvenil em seu país
e na Europa Ocidental requer estratégias de qualificação em computação e tecnologia,
familiaridade com códigos de conduta das empresas, e aproximação com os empregadores.
Obviamente, computação e tecnologia são fatores primordiais ao desenvolvimento
das competências de jovens como um todo, e a familiaridade com a cultura institucional é
imprescindível para a adequada evolução profissional dos jovens. Contudo, a aproximação com
empregadores não garante projeção e inspiração profissional aos aprendizes, principalmente se
grandes diferenças socioeconômicas entre os atores. Assim, a vivência no trabalho e a
formação recebida é quem auxiliará ou não os aprendizes a se identificarem profissionalmente.
A identidade social é traçada pela trajetória um indivíduo, construída e reconstruída
a partir de sua profissão e escolaridade, repleta de sentido coerente e satisfatório. Para Giddens
(2002), somente a partir da diferenciação da divisão do trabalho no mundo moderno, com a
especialização de tarefas, é que indivíduos se tornaram pontos de atenção: se refere à divisão
do trabalho: a especialização de tarefas, baseada nos modelos das competências, é quem
diferencia, pune ou destaca um trabalhador de outro.
Contudo, ao considerar a realidade brasileira com altos índices de desemprego,
principalmente jovens, desigualdades socioeconômicas e precária formação básica, é possível
que esses jovens tenham dificuldades em construir uma identidade profissional clara e
organizada, segundo a concepção de Giddens (2002).
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Giddens (1997) afirma que indivíduos possuem capacidade para transformar a
práxis ou somente reproduzir o que já é dado para manter a continuidade do que é produzido
material e socialmente, pois, estruturas sociais. Por mais poder de transformação de regras e
recursos implícitos na reprodução material e social, estas fixam limites motivacionais e
racionais aos atores, para que as coisas funcionam de acordo com o escopo de desenvolvimento
produtivo.
Para Giddens (1997), o escopo produtivo compreende produtos, normatizações e
fornecedores, assim, toda a estrutura de modos de coerção sanções, ou seja, desaprovações,
em menor ou maior grau, podem levar distintos grupos ao isolamento cultural diante do que é
designado como princípios estruturais: quanto mais as instituições se fixam no tempo-espaço,
mais ela s resistem à manipulação ou mudanças realizadas pelos agentes sociais.
1.1.1.1 Os aprendizes-trabalhadores na região do ABC
A re/inauguração da Via Anchieta em 1947. Antônio de Almeida (2008) relata a
utilização de menores a partir dos 10 anos de idade como mão-de-obra fabril como parte dos
46,3 mil trabalhadores contratados por grandes indústrias automotivas multinacionais,
instaladas nas principais cidades de Santo André, São Bernardo do Campo e São Caetano do
Sul.
Outras fábricas de médio e pequeno porte, fornecedoras de insumos - autopeças,
mecânicas, elétricas e metalúrgicas também surgiram provocando intenso processo migratório
para vilas adjacentes da região, formada hoje por sete municípios Diadema, Mauá, Ribeirão
Pires e Rio Grande da Serra (ALMEIDA, 2008). Com a industrialização, o CIEE e o Camp se
instalaram nesta região, o primeiro, grupo pertencente à Fundação Roberto Marinho, têm filiais
em São Caetano do Sul e Santo André. O Camp chegou à região em 1972 com um grupo de
rotarianos e atualmente tem filiais em Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra.
A parceria dessas ONGs com empresas da região, estas formalizam o contrato de
trabalho, fazem o registro na carteira e assumem o recolhimento das férias, 13% salário e INSS,
e ministram a carga teórica da formação profissional, assim, justificam o repasse de verba do
governo federal e entram para a estatística do Ministério do Trabalho como instituição que
contribui para a inserção de jovens no mercado. À empresa cabe supervisionar as atividades
práticas exercidas pelos aprendizes, alimentação e transporte fretado: é uma terceirização sem
maiores custos e sem a obrigatoriedade de contratação posterior à aprendizagem.
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O CAMP é voltado a assistência social de jovens em situação de vulnerabilidade
social com renda per capita familiar menor que 2 salários mínimo e visa fortalecer o
desenvolvimento de atitudes e habilidades cidadãs. Ao se inscrever no Programa Jovem
Aprendiz, o adolescente cursa a Formação Básica para o Trabalho por mais ou menos 6 meses
de duração, e após aprovação no curso, aguarda convocação para participar de entrevistas em
empresas parceiras.
No CIEE, o currículo enviado pelo jovem é analisado e se o perfil se adequa às
exigências de alguma empresa parceira, o candidato é chamado para e entrevista e depois é
encaminhado às empresas: boa parte dos aprendizes são indicados por funcionários das próprias
empresas parceiras. Esta ONG acredita que seu método de formação do aprendiz estimula a
autonomia e pró-atividade do jovem, sob o slogan “Aprendiz Legal”, o jovem assume o papel
de agente no desenvolvimento de sua própria carreira e de colaborador da empresa que o recebe,
canalizando sua energia, criatividade e ousadia à renovação de ideias, estruturas e processos.
Para a grande maioria dos pouco mais de 100 (cem) de aprendizes-trabalhadores
4
auxiliares administrativos Camp e CIEE, entre 17 e 19 anos, o contrato de aprendizagem é sua
primeira experiência laboral formal. Os primeiros têm tempo de vigência de 15 meses, jornada
de 06 horas-diárias e salário médio de R$ 580,00, os segundos, 24 meses, jornada de 04 horas-
diárias, remuneração média de R$ 520,00, transporte fretado da empresa no deslocamento entre
residência-trabalho ou trabalho-faculdade, e refeições feitas nos restaurantes da indústria.
2 OBJETIVO
O objetivo da pesquisa realizada em 2015 junto a um grupo de auxiliares
administrativos Camp e CIEE, lotados em uma indústria automotiva, ambas do ABC, analisou
se a formação recebida auxiliou esses aprendizes, próximos a concluírem a aprendizagem, a se
identificarem com a profissão escolhida e se o tema acidente do trabalho foi suficientemente
abordado.
Os aprendizes auxiliares administrativos são bem distribuídos quanto à origem,
Camp ou CIEE, sexo e etnia - o número de aprendizes pode variar, pois depende do número de
funcionários da empresa - a grande maioria residem no ABC e têm nível médio completo,
aqueles em fase de conclusão cursavam o ano em escola estadual, e quase a metade deles
cursam faculdade a noite nas cidades de São Bernardo do Campo e Santo André.
4
Expressão escolhida pela pesquisadora para qualificar a formação profissional desses aprendizes que mais
trabalham 4 vezes por semana na indústria automotiva, que estudam - somente 1 dia na semana.
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A pesquisa teve como problema, o processo de formação no trabalho contribui para
a identificação profissional com a profissão escolhida, a partir dos conteúdos teóricos abordados
pelo Camp e CIEE? A pesquisa teve por hipótese a fato dos aprendizes possuírem prévia
identificação com a profissão escolhida ao se inscrevem no Jovem Aprendiz, e que essa
identidade profissional poderia sofrer mudanças ao longo do processo de aprendizagem.
Parte-se da premissa que a aprendizagem permite aos aprendizes vivenciarem todas
as facetas da profissão escolhida, expressarem suas impressões quanto o que é necessário
melhorara, e ainda sentirem-se parte das corporações, pois a etapa da formação profissional de
aprendizes compreende a fase mais importante da política Jovem Aprendiz: a) conteúdos
teóricos, conceitos sobre organização do trabalho, condições de trabalho, formas de regulação
de conflitos e gestão da força do trabalho; b) parte prática a realização rotineira e sistematizada
das atividades laborais em distintos setores administrativos da empresa.
A empresa pesquisada tem por queixa a evasão de aprendizes durante a vigência
do contrato de trabalho. Embora com índice baixíssimo de evasão, a empresa alega todo um
dispêndio de tempo e de logística voltados à contratação dos jovens evadidos. Assim, conhecer
se a formação propiciou a identificação dos aprendizes com a profissão escolha e quais as
opiniões dos aprendizes sobre o processo de formação, contribuirá com um feedback à empresa
sobre ajustes e melhorias que podem ser efetivadas, evitando novas evasões.
3 METODOLOGIA
A pesquisa qualitativa descritiva se utilizou de amostra não probabilística por
conveniência, ou seja, a amostra foi definida de acordo com interesse escolhido pelos
orientadores e a pesquisadora. Como procedimento de pesquisa foi realizada revisão
bibliográfica sistematizada dos temas formação profissional de aprendizes, inserção de jovens
no mercado de trabalho, política pública Jovem Aprendiz e acidentes do trabalho com menores.
Como estratégias da pesquisa foram utilizadas as técnicas Observação Participante,
aplicação de uma dinâmica de grupo junto a um grupo de aprendizes auxiliares administrativos
próximos ao término da aprendizagem, norteada por 4 questões centrais, e realização de reunião
junto aos coordenadores da empresa, Camp e CIEE (MINAYO, 2004).
Devido ao espalhamento dos aprendizes por distintas áreas administrativas da
empresa, decidiu-se saber onde e em que momento poderia encontrar o maior número de
aprendizes reunidos. Supervisionados por distintos orientadores, almejou-se ter uma prévia das
opiniões quanto à identificação ou não dos aprendizes com a profissão escolhida, para um
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melhor aprofundamento das fases seguintes da pesquisa de doutorado. Felizmente, um projeto
da empresa realizado anualmente aos sábados por tempo integral, ministrado por uma terceira
entidade contratada, se encontrava em fase de finalização.
Por meio deste projeto eram oferecidos cursos variados a determinado número de
aprendizes Camp e CIEE que se inscreveram e foram aprovados num processo seletivo interno:
tratava-se de uma qualificação profissional a mais para a fase de aprendizagem. Participavam
do curso cerca de quarenta aprendizes. Solicitei então reunião junto a coordenadora do projeto
da empresa e após explicar a proposta da pesquisa tive acesso à coordenação da outra terceira
via, quem me autorizou a conversar com os professores que ministravam as aulas.
Com permissão dos professores para o acesso às aulas, foi utilizada a técnica de
observação direta para assistir algumas aulas teóricas e apresentações de trabalhos feitas pelos
aprendizes. A técnica consiste em observar as mensagens transmitidas pelos professores, as
reações dos alunos frente às mensagens passadas, e a anotação sistematizada das informações
passadas e reações não verbais expressas por professores e aprendizes.
Depois de dois sábados assistindo e tendo contato com os aprendizes, fui autorizada
por uma docente, utilizar uma aula dela para a aplicação de uma dinâmica de grupo. Antes da
data marcada da dinâmica foi elaborado um roteiro de quatro questões que nortearam o debate
junto aos aprendizes. Para cada questão a ser debatida ao que chamei de reflexão, estabeleci
uma premissa, ou seja, suposição que serviram de base para decidir a necessidade de serem
aprofundadas ou não nas etapas posteriores da pesquisa aplicada, e um objetivo.
No último dia dos cursos ministrados aos sábados, foi cedido o tempo de 40 minutos
de determinada aula para aplicação da dinâmica de grupo junto a 26 alunos - 15 CAMP e 11
CIEE. Com questões centrais previamente elaboradas foram destinados 10 minutos para
discussão de cada questão provocada. Devido ao pouco tempo para escrever cada uma das
respostas, utilizei o quadro magnético da sala e a caneta hidrográfica, divide-o em quadro partes
verticais e no cabeçalho anotei cada questão, e as respostas foram anotadas em forma de itens.
1) Premissa A: a política Jovem Aprendiz objetiva preparar jovens para o trabalho,
assim, próximos à finalização do contrato de aprendizagem, esses aprendizes encontram-se bem
preparados quanto às habilidades pessoais e competências técnicas para atuarem no mercado?
Objetivo A: conhecer se os aprendizes sentem-se preparados para ocuparem a vaga
de estagiários dentro da indústria onde realizam a prática da aprendizagem ou em outra
empresa.
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Reflexão A: Vocês se sentem adequadamente preparados para serem contratados
por esta empresa como estagiários ou pelo mercado de trabalho externo? Se não, o que falta?
Respostas A: Por unanimidade, todos aprendizes afirmaram não estar preparada
para o mercado de trabalho, pois a carga horária teórica é insuficiente, impedindo o aprofundado
teórico sobre administração empresarial, e que falta planejamento da parte teórica da
aprendizagem como um todo. Um aprendiz CIEE disse que seus colegas devem se dedicar ao
curso.
2) Premissa B: Orientadores dos aprendizes tem por compromisso a acompanhar as
atividades práticas desses jovens durante o processo de aprendizagem, articulando a teoria
aprendida com a práxis laboral, além de contribuir com a emancipação de valores sociais.
Objetivo B: Saber a opinião dos aprendizes se seus orientadores acompanham e
instruem de forma suficiente seus processos de aprendizagem.
Reflexão B: Seus orientadores auxiliaram para incrementar o desenvolvimento
profissional de vocês ao longo da aprendizagem? O que não funcionou? Quais sugestões de
melhoria?
Respostas B: Grande parte afirmou que os orientadores contribuíram com o
desenvolvimento profissional, mas alguns reclamaram da falta de compromisso do orientador
com atividades extra-empresa, que a comunicação entre os orientadores e os aprendizes deveria
ser melhorada, e que o papel desses deveria ser melhor definido. Um aprendiz Camp ressaltou
deveria ter ex-aprendizes, atuais funcionários da empresa, como orientadores.
3) Premissa C: A boa articulação entre conteúdos teóricos apreendidos e atividades
práticas são fundamentais para uma satisfatória formação profissional.
Objetivo C: Saber se houve articulação entre os conteúdos teóricos abordados pelo
Camp e CIEE e as atividades práticas desenvolvidas na empresa auxiliaram na sua formação
profissional.
Reflexão C: Acreditam que houve boa articulação entre conteúdos teóricos
abordados pelo Camp e CIEE e as atividades práticas desenvolvidas na empresa?
Respostas C: Boa parte afirmou que de modo geral sim, um aprendiz Camp
reclamou que foi inserido na empresa sem antes fazer o curso de redação ministrado, fato que
prejudicou seu desenvolvimento profissional, e que esse tipo de aula seja ministrado aos
sábados. No entanto, muitos reclamaram que as palestras: os palestrantes não foram dinâmicos
ao apresentarem os assuntos. As sugestões de melhoria compreenderam acrescentar palestra
com o tema Postura Profissional, e usar o tempo de uma palestra para escolher eventos culturais
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e não recreativos, relacionados à aprendizagem administrativa, como por exemplo, visita a feira
da World Skills. Um aprendiz Camp sugeriu que ex-aprendizes, atuais funcionários da empresa,
palestrassem nas ONGs Camp e CIEE para mostrar o caminho que percorreram para tornarem-
se efetivos.
4) Premissa D: Atividades técnicas, pedagógicas, educativas e culturais abordadas
ao longo da aprendizagem contribuíram para o desenvolvimento técnico e social dos alunos.
Objetivo D: Investigar se as atividades práticas e teóricas - atividades, aulas,
palestras eventos culturais - auxiliaram os aprendizes a se identificarem com a profissão
auxiliar administrativo.
Reflexão D: Vocês escolheram a profissão auxiliar administrativo. Vocês se
identificaram com essa carreira ou pretendem seguir outro caminho?
Respostas D: Grande parte afirmou que não, pois as aulas do CIEE e CAMP são
muito teóricas e não apresentam interlocução entre teoria e prática. Alguns destacaram que os
assuntos abordados pelo Camp não têm coerência entre, são muito confusos e vagos, centrado
apenas no cumprimento das funções e menos no desenvolvimento de habilidades e
competências pessoais.
A técnica observação participante mostrou-se eficiente para compreender as
mensagens transmitidas pelos professores, as reações dos alunos frente às mensagens passadas,
e a anotação sistematizada das informações passadas e reações não verbais expressas por
professores e aprendizes, podendo ser largamente utilizadas em pesquisas qualitativas.
A dinâmica em grupo foi importante para aprofundar outros aspectos que serão
aprofundados nas fases posteriores da pesquisa de doutorado, mas o tempo de 40 minutos se
mostrou insuficiente para um grupo de 26 alunos, pois, geralmente eram sempre os mesmos
que respondiam as provo ações, enquanto outros por medo de se expressar ou por timidez não
se pronunciaram, mesmo sob provocação da pesquisadora.
4 CONCLUSÃO
As observações participantes feitas pela pesquisadora retrataram que os conteúdos
ministrados pelo Camp estão centrados nas regras sociais que os aprendizes devem cumprir: o
respeito às hierarquias e regras institucionais, o saber se portar no trabalho e na sociedade
etiquetas à mesa, modo de falar, se vestir, cuidado com o vocabulário. O tema SST é abordado
de forma isolada sem profundidade que o tema exige e desconexo da realidade do aprendiz.
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O CIEE possui abordagem mais técnica da profissão auxiliar administrativo quanto
as habilidades e competências necessárias para ser um aprendiz nesta área, mas erra ao misturar
aprendizes de 14, 18 e 24 anos na mesma sala de aula, não respeitando a fase de
desenvolvimento intelectual e emocional, abordando temas muito aquém para os mais novos
que não conseguem acompanhar a teoria, ou enfadonho aos mais velhos.
Devido à indisponibilidade ou falta de interesse da empresa na contratação desses
aprendizes após finalização do contrato de trabalho, a formação desses jovens o é
acompanhada pela empresa: possível contratação se restringe a vaga de estágio para aqueles
que cursam o terceiro grau, em tema de interesse da empresa. O aprendiz CAMP apresenta
vulnerabilidade social, enquanto o CIEE contrata candidatos indicados por funcionários da
empresa, fato que pode privilegiar estes para a vaga de estágio em detrimento aos outros.
Quanto ao objetivo principal da pesquisa averiguou-se que a formação recebida
pelos aprendizes, próximos a concluírem a aprendizagem, não auxiliou na identificação destes
com a profissão auxiliar administrativo, deixando uma enorme insegurança em assumir novo
posto de trabalho em outras empresas, após a finalização do contrato de aprendizagem. Talvez
estes sejam os principais motivos que levam alguns aprendizes à evasão da aprendizagem.
Os conteúdos teóricos do Camp e CIEE desconexos da prática labora, a carga
horária teórica insuficiente desses conteúdos, a falta de comprometimento dos orientadores da
empresa no acompanhamento do processo de formação profissional, e a ausência de articulação
entre as ONGs e a empresa no desenvolvimento da aprendizagem como um todo contribuíram
para a não identificação profissional dos aprendizes com a profissão auxiliar administrativo.
Resgatando o conceito de identidade de Giddens (2002), a trajetória profissional
desses aprendizes foi construída com muitos valores e aprendizado, mas a falta de sentido,
coerente e satisfação entre conteúdos teóricos e práticas realizadas não proporcionou um lastro
adequado para a identificação profissional de todos deste grupo participante da pesquisa. A
hipótese inicial de que os aprendizes possuem prévia identificação com a profissão escolhida
ao se inscrevem no Jovem Aprendiz foi refutada, pois para a grande maioria a profissão é o que
menos importa, mas sim a oportunidade de ter um emprego em uma indústria tão renomada.
Quanto ao tema SST alguns aprendizes Camp relatam ansiedade por sofrerem
bullying dos aprendizes CIEE devida à diferença socioeconômico e reclamam que os fatores
psicológicos no trabalho não são abordados no conteúdo de SST. Essa situação demonstra falta
de preparo dos orientadores em resolver essa situação. Embora boa parte dos aprendizes
expressarem alegria pelos conhecimentos adquiridos e conquistas de novas amizades, as
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potencialidades intelectuais e emocionais não são respeitadas pelas ONGs, uma vez que são
alienadas aos próprios aprendizes, inconsciente ou conscientemente norteadas.
Não se trata de ser contra a cota aprendizagem, que no Brasil essa é uma das
poucas formas dos jovens vulneráveis terem a oportunidade de vivenciar uma profissão,
experenciar projetos, aumentar a rede de relacionamentos pessoais, ter um registro formal de
trabalho e receber por isso, mas sim se indignar com a incipiente monitoração por parte do
Estado e seus respectivos órgãos federativos, quanto aos conteúdos ministrados, da forma e sob
quais discursos essas ONGs preparam os jovens para e no trabalho.
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Article
Full-text available
O propósito do estudo foi examinar as ramificações de uma política pública no domínio da juventude em um sistema de formação profissional. Para essa finalidade, foi considerado o Programa de Aprendizagem Profissional, que foi implementado em um município do interior de São Paulo a partir de 2019. A coleta de informações foi conduzida por meio desse Programa, através da aplicação de questionários aos Jovens Aprendizes inscritos nos cursos oferecidos pelo SENAI-SP. Com base nos dados coletados, o objetivo era verificar a conformidade do mencionado Programa com as orientações estabelecidas pelo Sistema Nacional da Juventude (SINAJUVE). A trajetória dos Jovens Aprendizes foi examinada para compreender os resultados do programa de formação profissional e, concomitantemente, avaliar a eficácia das políticas públicas implementadas, especialmente a coordenação proposta pelo Sistema Nacional da Juventude. Por último, uma avaliação do impacto social e acadêmico do programa na vida dos Jovens Aprendizes foi conduzida.
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  • Brasil
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