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Uma visão crítica sobre a implantação da Base Nacional Comum Curricular em consonância com a reforma do Ensino Médio

Authors:
  • Secretaria de Estado da Educação e do Esporte do Paraná
  • Prefeitura Municipal de Nova Esperança/PR

Abstract

O presente artigo originou-se de pesquisa qualitativa a partir da análise de fontes bibliográfica e documental em que se discutiu a implantação da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) na perspectiva da Reforma do Ensino Médio (Lei Nº 13.415/2017). O objetivo foi investigar como as políticas de cunho neoliberal definem os rumos da educação brasileira, especialmente no currículo da educação básica, com ênfase na etapa do ensino médio. A partir das análises é notório que tais mudanças contribuem para a consolidação das políticas neoliberais em favor da hegemonia capitalista e atendem aos interesses mercadológicos. Além disso, indicam mais um retrocesso na qualidade e equidade da educação nacional, colaborando com o esvaziamento e a precarização do ensino público.
Givanildo da Silva
Universidade Federal do Vale do São Francisco
(UNIVASF)
givanildopedufal@gmail.com
Welson Dias de Oliveira
Universidade Federal do Vale do São Francisco
(UNIVASF)
welsondiasdeoliveira@gmail.com
Este obra está licenciado com uma Licença Creative Commons
Atribuição-NãoComercial-SemDerivações 4.0 Internacional.
OS DESAFIOS DOS GESTORES NA
ESCOLA ESTADUAL DE TEMPO
INTEGRAL NO MUNICÍPIO DE SÃO
RAIMUNDO NONATO/PI
RESUMO
A pesquisa teve como objetivo apresentar os desafios dos gestores
escolares (diretor e coordenador pedagógico) na escola estadual de
tempo integral no município de São Raimundo Nonato, no estado do
Piauí. A metodologia desenvolvida esteve pautada na abordagem
qualitativa, tendo como técnica de pesquisa o estudo de caso. A coleta
dos dados foi realizada por meio de entrevistas semiestruturadas com os
participantes. Os principais resultados apontaram que: a) a estrutura da
escola ainda não está nos parâmetros ideais para o atendimento de
estudantes à escola em tempo integral; b) Os professores que trabalham
na escola têm formação específica em sua área, favorecendo o processo
pedagógico na relação ensino e aprendizagem; c) há um pequeno
número de estudantes que não se adaptam à realidade da escola em
tempo integral e acabam desistindo; e, por fim, d) são necessários
maiores investimentos financeiros, por parte do Estado, para a
concretização da escola em tempo integral, a qual possa cumprir todas
as suas especificidades.
Palavras-chave: Política educacional. Educação em Tempo Integral.
Gestores Escolares.
THE CHALLENGES OF MANAGERS IN THE
STATE SCHOOL INTEGRAL IN A MUNICIPALITY
OF SAN RAIMUNDO NONATO/PI
ABSTRACT
The purpose of this research was to present the challenges of school
managers (director and pedagogical coordinator) at a full - time state
school in the municipality of São Raimundo Nonato, in the state of Piauí.
The methodology developed was based on the qualitative approach,
having as a research technique the case study. Data were collected
through semi-structured interviews with the participants. The main results
pointed out that: a) the structure of the school is not yet in the ideal
parameters for attending students to school full time; b) teachers who
work in the school have specific training in their area, favoring the
pedagogical process in the relation between teaching and learning; c)
there are a small number of students who do not adapt to the reality of the
school full time and end up giving up; and, finally, d) greater financial
investments by the State are required for the completion of the full-time
school, which can fulfill all its specificities.
Keywords: Educational policy. Integral Education.School Managers.
Submetido em: 06/05/2018
Aceito em: 25/07/2018
DOI: 10.28998/2175-6600.2018v10n21p71-88
Vol. 10 | Nº. 21 | Maio/Ago. | 2018
Os desafios dos gestores na Escola Estadual de Tempo Integral no Município de São Raimundo Nonato/PI
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1 INTRODUÇÃO
Cabe ressaltar que a participação e a construção de uma educação que tenha a
cara da nossa realidade e dos nossos sonhos não é apenas resultado de leis. É
fruto também do nosso compromisso com um projeto de sociedade, de educação e
de nossa ação concreta no dia-a-dia, na escola e no contexto das políticas
educacionais (SOUSA; CORRÊA, 2002, p. 47).
A educação é considerada como um campo em construção (SILVA, 2015), o qual
apresenta dilemas e desafios para a vivência de um espaço democrático, inclusivo e
referenciado socialmente. Esses dilemas são resultados dos entraves e das contradições
existentes no campo da política educacional e nas formas de organização dos espaços
educativos em cada sistema de educação. As configurações políticas de cada realidade
geográfica demandam ações específicas as quais devem estar em consonância com os
dispositivos legais nacionais, destacando-se a Constituição Federal de 1988, a Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional, n. 9.394 de 20 de dezembro de 1996 e o atual
Plano Nacional de Educação 2014/2024.
No âmbito das políticas educacionais o Estado em Ação (MARTINS, 1994;
AZEVEDO, 2004) tem o papel de redimensionar as propostas educativas com a finalidade
de orientar e reestruturar as políticas de organização da educação e das práticas escolares.
Essas ações são visíveis por meio dos programas e dos projetos implementados para
desenvolver as atividades suplementares no espaço escolar, configurando-se em
estratégicas do Estado em Ação para o campo da educação.
Compreendendo a educação como espaço em construção vivenciado pelos atores
escolares e pelo Estado em Ação, as propostas educacionais surgem com a finalidade de
“renovar”, “reconstruir”, “reorganizar”, “redimensionar” as práticas educacionais, sendo
elaboradas por um conjunto de técnicos os quais, na maioria das vezes, não é composto
por profissionais da educação para propor e implementar políticas à área. Nessa dimensão,
os atores escolares recebem os programas e os projetos educacionais para desenvolver
os objetivos, ocasionando mudanças na rotina, no trabalho e no desenvolvimento
organizativo das propostas curriculares.
As proposições sinalizadas são resultado das reformas governamentais no âmbito
da educação, as quais são os mecanismos utilizados pelos diferentes grupos políticos para
implantar sua marca nos espaços públicos. As reformas educacionais, na maioria das
vezes, não passam de meros instrumentos sem fundamentos epistemológicos, acarretando
ônus para os diferentes profissionais da educação. Na visão de Afonso (2000, p.59-60), o
Estado em Ação falha em suas reformas porque:
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[...] ou as reformas falham porque não conseguem solucionar o problema que
procuram resolver, ou o problema que é definido como importante para ser resolvido
não é um problema que precisa ser resolvido, e, portanto, as soluções (reformas)
não são apropriadas, ou, então, os problemas são dilemas persistentes que
envolvem escolhas difíceis em relação a valores que podem estar em conflito.
As reformas que permeiam as políticas educacionais necessitam de efetivas análises
(política, cultural, social e econômica) para perceber as reais possibilidades e limitações
que estas causam no contexto escolar. A política pública é compreendida como “um
fenômeno social e histórico que expressa os interesses e necessidades de diversos sujeitos
sociais, através do exercício de poder, e do processo de tomada de decisões baseado nos
valores presentes na sociedade” (SOUZA, 2009, p. 24). A educação como parte integrante
das políticas sociais, destaca-se como um relevante aspecto dessa dimensão, uma vez que
o processo de elaboração das políticas possibilita que diferentes sujeitos estejam inseridos
no contexto das decisões e do planejamento, viabilizando propostas para serem
vivenciadas no contexto educacional.
Em meio à complexidade do processo de implementação e de vivência das políticas
educacionais, a discussão sobre os conflitos, as tensões e os embates da área em distintas
realidades se torna um mecanismo relevante na contemporaneidade, uma vez que as
diferentes experiências e situações podem favorecer no itinerário da construção de
estratégias e de diálogos acerca dos limites e das possibilidades de efetivação das políticas
educacionais contemporâneas. Dessa forma, a pesquisa teve como objetivo apresentar os
desafios dos gestores escolares (diretor e coordenador pedagógico) na escola estadual de
tempo integral no município de São Raimundo Nonato, no estado do Piauí.
A metodologia desenvolvida esteve pautada na abordagem qualitativa. Na
perspectiva de Minayo (1994), a pesquisa qualitativa responde a questões muito
particulares. Ela se preocupa, nas ciências sociais, com um nível de realidade que não pode
ser quantificado. Ou seja, ela trabalha com o universo de significados, motivos, aspirações,
crenças, valores e atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das relações,
dos processos e dos fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização das
variáveis.
O método desenvolvido na pesquisa foi o estudo de caso. Assim, “como método de
pesquisa, o estudo de caso é usado em muitas situações, para contribuir ao nosso
conhecimento dos fenômenos individuais, grupais, organizacionais, sociais, políticos e
relacionados” (YIN, 2010, p. 24). De um modo geral, o estudo de caso “permite que os
investigadores retenham as características holísticas e significativas dos eventos da vida
real - como os ciclos individuais da vida, o comportamento dos pequenos grupos, os
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processos organizacionais e administrativos, a mudança da vizinhança, o desempenho
escolar [...]” (YIN, 2010, p. 24).
A coleta dos dados foi realizada por meio de entrevistas semiestruturadas com a
diretora e uma das coordenadoras pedagógicas
da escola. As entrevistas foram realizadas
individualmente, em diferentes espaços da instituição, de acordo com a disponibilidade das
participantes. Foram feitos três contatos com as profissionais, sendo o primeiro a
apresentação da proposta de pesquisa e os demais para a realização das entrevistas. Os
dados foram analisados por meio da análise do conteúdo, na perspectiva de Bardin (2002),
tendo como categorias: política educacional; educação em tempo integral e gestores
escolares.
O texto está composto em três partes que se completam, além da introdução e das
considerações finais. A primeira apresenta os princípios e as características da educação
em tempo integral, articulando com as políticas educacionais contemporâneas. Na segunda
é apresentado o papel dos gestores escolares na escola pública em meio aos conflitos e
aos dilemas das políticas para o campo da educação. Na terceira e última parte são
discutidos os desafios da escola de tempo integral no município de São Raimundo Nonato,
no estado do Piauí, por meio das vozes dos gestores (diretora e uma coordenadora
pedagógica) da instituição.
2 A EDUCAÇÃO EM TEMPO INTEGRAL: ESPECIFICIDADES,
PRINCÍPIOS E CARACTERÍSTICAS
A educação em tempo integral não é uma discussão atual. Suas bases
epistemológicas e políticas remontam à década de 1930, em meio ao Manifesto dos
Pioneiros da Escola Nova(1932) no contexto das lutas e das tensões pela melhoria da
qualidade ofertada e das possibilidades de efetivar uma educação pública, inclusiva e
integral para todos. No cenário das políticas e legislações educacionais, as conquistas
alcançadas pelos Pioneiros da Educação Nova (1932) estiveram centradas na Constituição
Federal de 1934, sendo substituída três anos após a sua promulgação, devido ao contexto
político da época. Dessa forma, percebe-se que a descontinuidade das políticas e dos
projetos educacionais se constitui como um desafio da educação brasileira. Esse desafio
A equipe gestora da escola em análise é composta por uma diretora e duas coordenadoras pedagógicas.
O critério para a escolha da coordenadora pedagógica foi a disponibilidade da profissional em participar da
pesquisa. Cabe destacar ainda que durante os momentos da entrevista não foi possível encontrar com a
segunda coordenadora.
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também está presente na atualidade, somando-se a outros que intervém na política
organizacional da educação pública brasileira.
Na compreensão de Leclerc e Moll (2012, p. 22-23), a educação é um processo
interligado aos contextos de desigualdades econômica, política e social, assim os jovens e
os adultos se veem limitados a providenciar a cada dia os meios de reprodução de sua
própria existência; por isso a educação de tempo integral pode contribuir com algumas
problemáticas vivenciadas pelos estudantes. As autoras apontam que:
Educação integral remete ao legado de diferentes movimentos teóricos e políticos
que buscaram respostas para os problemas de seu tempo, considerando a lacuna
entre direitos preconizados e sua realização, legado notadamente expresso no
Manifesto dos Pioneiros de 1932; nas formulações de Anísio Teixeira e Darcy
Ribeiro sobre a superação do caráter parcial e fragmentado do tempo e da oferta
educativa propiciados aos estudantes, docentes e trabalhadores da educação; e no
diálogo entre Paulo Freire, os movimentos sociais e as experiências
governamentais.
A educação integral busca constituir uma educação completa, sem fragmentação
vivenciada na perspectiva do currículo tradicional. Nessa lógica, três vertentes precisam
estar conectadas para o desenvolvimento das atividades em uma perspectiva
emancipatória, são elas: o tempo, o espaço e o conteúdo. Essas dimensões são
mecanismos necessários para a concretização da educação em tempo integral, a qual tem
suas especificidades e demandas. Na visão de Cavaliere (2015, p. 1016):
A ampliação do tempo diário de escola pode ser entendida e justificada de diferentes
formas: (a) ampliação do tempo como forma de se alcançar melhores resultados da
ação escolar sobre os indivíduos, devido à maior exposição desses às práticas e
rotinas escolares; (b) ampliação do tempo como adequação da escola às novas
condições da vida urbana, das famílias e particularmente da mulher; (c) ampliação
do tempo como parte integrante da mudança na própria concepção de educação
escolar, isto é, no papel da escola na vida e na formação dos indivíduos.
Além dessas questões, a educação integral para cumprir seus princípios e suas
características necessita de formação e de condições de trabalho para os agentes
formativos, tendo como referências a formação inicial e continuada; a suficiência e a
estabilidade das equipes; os espaços de diálogo e de troca entre educadores e professores;
tempo para planejamento, sistematização e avaliação das atividades (TEIXEIRA; ANAYA,
2015). As questões destacadas são instrumentos relevantes para o processo de melhoria
da qualidade do ensino ofertado, uma vez que a formação inicial e continuada dos
diferentes profissionais da educação se caracterizam como elementos necessários, tendo
como finalidade repensar as práticas educativas.
A forma de organização da escola de tempo integral também é um relevante
mecanismo para ser pensado e discutido, uma vez que diferentes atores estão
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desenvolvendo atividades as quais são referências para a melhoria do ensino ofertado.
Entende-se que a gestão democrática e participativa é a concepção de gestão escolar mais
indicada para a vivência das práticas escolares, tendo como características um projeto ou
um plano de ação definido e conhecido por todos; rotinas de planejamento instituídas;
informações democratizadas; espaços de participação da comunidade atuantes;
compreensão e uso dos indicadores de avaliação das experiências (TEIXEIRA; ANAYA,
2015). As proposições sinalizadas contribuem para a concretização de espaços
democratizantes e dialógicos favorecendo maiores oportunidades a todos os participantes.
A concretização das práticas educativas em um viés participativo contribui com as
ações democráticas no espaço escolar, assim como favorece um ambiente no qual é
construído por todos por meio das diferentes percepções e das múltiplas possibilidades de
resolução dos desafios. Para o significativo processo de organização e de gestão da
educação em tempo integral é necessário que todos os agentes estejam envolvidos no
projeto educacional e sejam autores das decisões e das ações planejadas e desenvolvidas.
Em meio às especificidades da educação em tempo integral, é válido destacar a
relevância do ambiente físico, uma vez que essa dimensão se caracteriza como uma das
mais importantes para a concretização do planejamento e das condições de trabalho.
Nessa perspectiva, o ambiente físico das escolas em tempo integral deve oferecer
oportunidades formativas que valorizem os sujeitos envolvidos, destacando-se a
suficiência, a qualidade e o bom uso de ambientes físicos, de equipamentos e de materiais
para as atividades (TEIXEIRA; ANAYA, 2015).
Outra característica que cabe mencionar é a observação do público que é atendido
nos espaços que ofertam educação em tempo integral, adequando o projeto pedagógico
aos anseios dos atores envolvidos, isso porque é necessário dar sentido às práticas
vivenciadas, sem descaracterizar a função social da educação. Na visão de Teixeira e
Anaya (2015, p. 30):
[...] é preciso aliar educação integral com tempo integral, bem como ampliar as
possibilidades de atendimento, considerando cada contexto histórico, político,
econômico, social, cultural e educacional, cabendo à escola abarcar uma série de
novas possibilidades que, não raro, para uns, a descaracteriza como espaço
formativo.
As múltiplas possibilidades de desenvolvimento da educação integral perpassam por
itinerários formativos que buscam contribuir com o processo pessoal, social, político,
cultural e educacional dos atores, tendo como referencial o lugar no qual cada ator está
envolvido na busca de sincronização entre os assuntos e as temáticas abordados com a
realidade local. Essa perspectiva aponta para a prática da educação como um projeto
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amplo, no qual caminha pelas expectativas do paradigma educacional construído pelos
atores escolares, indo de encontro com a prescrição do currículo tradicional, buscando
atividades no campo da cultura para a ampliação da função da escola, assumindo
dimensões da formação humana tradicionalmente pouco valorizadas no currículo, como o
teatro, a dança, as artes visuais e as tradições populares (MENEZES; LEITE, 2012, p. 62).
Nessa dimensão, Teixeira e Anaya (2015, p. 29) destacam:
A priori, educação integral reconhece e, portanto, viabiliza oportunidades educativas
que vão além dos conteúdos compartimentados e fragmentados do currículo
tradicional e compreende o processo formativo de forma integrada, transformando
o currículo prescrito na própria experiência formativa.
As práticas formativas em espaços de educação em tempo integral são
oportunidades para contribuir com o processo multidimensional, o qual não prioriza apenas
um saber e/ou área em detrimentos dos demais, mas dimensiona e interliga os vários
conhecimentos em atividades que apresentam sentido e significado para os estudantes.
Essa perspectiva pressupõe a integração de saberes, “contextualizando-os e favorecendo
o estabelecimento de relações entre o aprendido e o experienciado, para que os sujeitos
em formação aprendam a organizar e reorganizar continuamente o conjunto de informações
e experiências que encontram na escola e fora dela” (TEIXEIRA; ANAYA, 2015, p. 33).
No cenário das políticas educacionais e da implementação de novas configurações
organizativas, o financiamento é uma das questões postas para a reflexão, pois sem
condições financeiras fica inviável realizar as atividades previstas. Assim, pensar o
processo organizativo da educação em tempo integral requer desprender em um montante
considerável para cumprir com os princípios e as especificidades da/na educação em tempo
integral. Para Leclerc e Moll (2012, p. 23):
Atualmente, a perspectiva de um cenário possível para construção de uma política
de educação básica de dia inteiro mantém a convivência com a escola de turnos; a
novidade segue da disputa por mais recursos para financiar a educação pública,
com conquistas no marco legal, em termos de repasses obrigatórios e com o
incremento das transferências voluntárias da União.
O processo de organização dos tempos e dos espaços, a estruturação do currículo,
as múltiplas atividades formativas e a concretização de um itinerário formativo democrático
e inclusivo demandam ações financeiras para o alcance dos objetivos propostos no projeto
pedagógico. Nesse cenário, é relevante que o Estado tenha um olhar diferente para com
as escolas em tempo integral, de modo que implemente políticas educacionais que
repassem recursos financeiros para a vivência das práticas planejadas.
Diante das inúmeras atividades a serem realizadas no contexto da escola pública, e
em especial da educação em tempo integral, a forma de organização e de gestão escolar
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contribui para a o amadurecimento das propostas e das condições de oferta de uma
educação para todos. Na perspectiva de Silva (2015, p. 80), “a gestão escolar é a ponte
para uma escola contemporânea, inovadora, com novas perspectivas que viabilizem
alternativas de compreensão, solidariedade e promoção humana, é o caminho que busca
a melhoria de ensino”.
3 O PAPEL DOS GESTORES ESCOLARES NA ORGANIZAÇÃO DA
ESCOLA PÚBLICA
As práticas educativas e políticas desenvolvidas pelos profissionais da educação
apresentam a concepção de sociedade, de homem e de educação que cada espaço escolar
tem em suas bases epistemológicas, por meio da proposta pedagógica construída
coletivamente, situação que não é muito recorrente nas realidades brasileiras,
especialmente no contexto da política global atual. Quando se propõe discutir sobre o papel
dos gestores da escola pública, requer pensar acerca da compreensão desse espaço e da
concepção política que ele apresenta.
Na visão de Casassus (1995), o paradigma educacional de uma determinada
sociedade perpassa pelas políticas implementadas pelo Estado, as quais regulamentam as
ações escolares. Para o autor (1995, p. 60):
[...] a um Estado não corresponde necessariamente um grupo homogêneo de
indivíduos, como o faria supor a ideia comumente sustentada do Estado-Nação,
mas antes a um Estado corresponde uma nação, que se apresenta como um
projeto, como uma construção ideal. O Lócus onde se materializa este projeto ideal
da comunidade imaginada é, no final das contas, o sistema “nacional” de educação,
cuja acepção de “nacional” tem a ver com a nação como tal, mais do que com seu
aspecto territorial. Este seria o significado da observação que se diz que a escola é
o ato diário em que a nação se constitui e que encontra sua expressão mais sintética
no dia do início do ano letivo que a reforça reiterativamente em cada ocasião.
As posições políticas e educacionais vivenciadas no âmbito da escola pública são
referenciais orientados pelo Estado, gerando, em algumas situações, conflitos de
interesses, uma vez que o Estado tem intenções na proposição de programas e de projetos
desenvolvidos no cenário da escola pública. É nesse espaço no qual os gestores escolares
e todos os profissionais da educação juntamente com os pais, familiares e a comunidade
local têm o compromisso de realizar suas atividades profissionais, a partir de um projeto de
nação e de educação.
Nesse sentido, pensar sobre a especificidade da escola pública no cenário brasileiro
torna-se um dos papéis necessário para os gestores escolares, isso porque é o espaço que
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pode contribuir para a formação política, social, humana e pessoal dos envolvidos. De
acordo com Wittmann e Klippel (2010, p. 30), a função da educação deve contribuir para a:
Integração social, a apropriação da cultura, no tempo e no espaço da existência das
pessoas; a inscrição autônoma e original das pessoas na evolução histórica da
humanidade; integrar as pessoas no mundo sociocultural de seu tempo e espaço;
e, desenvolver ou construir as condições subjetivas de intervenção original na
evolução dos acontecimentos.
As proposições sinalizadas pelos autores contribuem para a compreensão de que a
educação escolar pode apresentar oportunidades relevantes no processo de
desenvolvimento dos estudantes. As ações educacionais que possibilitam a vivência de
experiências emancipatórias e de construção de liberdade são favoráveis para a
participação dos envolvidos em diferentes dimensões sociais, entre elas na construção de
uma sociedade justa e igualitária, a qual preza por melhorias políticas e sociais. Desse
modo, o projeto educacional construído pelos profissionais é o mecanismo fundamental
para alcançar esses objetivos, por meio da visão e da ação coletiva de todos.
A busca pela construção de um projeto original, coletivo e emancipatório de
educação na escola é papel dos gestores escolares, especialmente na condução de sua
vivência, situação que apresenta maiores desafios em meio aos entraves financeiros,
administrativos e profissionais. A defesa por essa concepção de educação é atual,
especialmente porque esbarra em limites instaurados pelas políticas educacionais
contemporâneas, as quais prezam por competitividade entre escolas, estudantes e
profissionais; eficiência e eficácia no desenvolvimento das atividades escolares; busca por
resultados quantitativos por meio dos testes padronizados em larga escala; incentivo à
formação fragmentada oferecida por empresas e sistemas educacionais pensada pelo viés
empresarial; programas de governos desconectados com a realidade escolar; falta de apoio
aos processos participativos e democráticos; responsabilização dos profissionais e da
comunidade por ações financeiras e estruturais das escolas, entre outros.
Essas questões destacadas sinalizam as contradições presentes no contexto
educacional viabilizadas pelas políticas públicas, descaracterizando a defesa de uma
educação humanitária e coletiva. O modelo de gestão instaurado no Estado brasileiro desde
a década de 1990, por meio das políticas educacionais, é o gerencial, cabendo destacar
que “as teorias de gerenciamento, como mecanismo de objetivação, definem os seres
humanos como sujeitos a serem administrados. Esse é um discurso de direita, que legitima
o exercício da autoridade. Seu instrumento principal é a hierarquia de controle contínuo e
funcional” (BALL, 2011, p. 85).
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Desse modo, entende-se que as teorias do gerencialismo são os fundamentos
epistemológicos das políticas educacionais, os quais têm repercussões no trabalho
administrativo, pedagógico e financeiro dos gestores escolares. Cabe mencionar, ainda, a
contradição que existe entre o modelo instaurado nos dispositivos legais (CF/1988;
LDB/1996; PNE 2014/2024) e as políticas contemporâneas, isso porque os marcos
normativos apresentam que a concepção de gestão escolar deve ser pautada nos princípios
da gestão democrática, no entanto percebe-se que os programas e os projetos são
desenvolvidos pelo viés e princípios do gerencialismo.
É válido sinalizar que os gestores enfrentam dilemas no processo de organização da
escola, isso porque as proposições imanadas pelas propostas do Estado não viabilizam a
construção de um processo dialógico, contínuo e fortalecido pelas estruturas democráticas.
Os princípios do gerencialismo não prezam pelas instâncias colegiais, mas pelo interesse
individual, pelas decisões práticas e pela eficiência dos gestores, configurando o papel
desses profissionais como um administrador empresarial, lógica defendida pelos
empresários no cenário atual.
Mesmo com perspectivas gerenciais nas atividades escolares, mediante os
princípios das políticas, é papel dos gestores implementar a cultura da participação por
meio das instâncias colegiadas como o Conselho Escolar, o Grêmio Estudantil, a
Associação de Pais e Mestres e o Conselho de Classe. Esses mecanismos contribuem no
processo de organização da escola, bem como salientam um modelo de educação
democrática que valoriza a participação de todos os segmentos e favorece oportunidades
de decisão coletiva. Na visão de
Wittmann e Klippel (2010, p. 119):
Para que realmente o conselho seja um órgão agregador, é preciso que ele atente
para a necessidade de combinar critérios do saber e da responsabilidade social na
sua composição. Isso significa que entre seus componentes deve estar
representada a pluralidade de saberes: o acadêmico e o das experiências
singulares de cada pessoa, bem como as vivências sociais.
Compreender a relevância das múltiplas experiências torna-se um ponto necessário
para a implementação de práticas culturais que valorizem a participação e as instâncias
colegiadas. Os gestores escolares tornam-se os principais responsáveis pela instauração
dos mecanismos democráticos no cotidiano das escolas, sendo profissionais
comprometidos pelos processos participativos e democráticos. De um modo geral, o
diálogo, a colaboração, a empatia, a resolução dos conflitos no coletivo são os elementos
necessários para a vivência de ações democráticas no espaço escolar.
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Em meio aos papeis dos gestores escolares, Penin e Vieira (2002, p.27) salientam
que é necessário pensar na forma de organicidade da escola e nos objetivos da sua função
social:
[...] repensar profundamente sua organização, sua gestão, sua maneira de definir
os tempos, os espaços, os meios e as formas de ensinar ou seja, o seu “jeito de
fazer escola”. É hora de jogar fora as roupas velhas e tornar a vestir a escola, a
partir da essência sua função social que permanece: ensinar bem e preparar os
indivíduos para exercer a cidadania e o trabalho no contexto de uma sociedade
complexa, enquanto se realizam como pessoas.
O modelo de gestão democrática no qual tem diferentes segmentos envolvidos na
organização da escola é um fator importante para expressar a possibilidade de construção
de instrumentos participativos os quais requerem posicionamentos, avaliação, sugestões e
planejamento nas práticas educacionais, redirecionando possibilidades democráticas das
vivências organizativas.
A conquista de posturas participativas na política educacional foi um avanço no
cenário da escola pública, necessitando de maiores oportunidades para a concretização de
uma sociedade inclusiva e participativa, uma vez que “uma sociedade não é democrática
pela simples afirmação de valores, mas também, e sobretudo, pela construção e prática
cotidiana dos mesmos, ou seja pelos processos que os instauram e reafirmam” (PENIN;
VIEIRA, 2002, p. 31). Refletir coletivamente sobre os melhores caminhos para o
direcionamento das práticas educativas torna-se um aspecto favorável para a
concretização dos ideais participativos e políticos da escola pública.
4 A ESCOLA DE TEMPO INTEGRAL NO MUNICÍPIO DE SÃO
RAIMUNDO NONATO/PI: A VOZ DOS GESTORES
A Rede Estadual de Educação do Piauí é composta por vinte e uma (21) Gerências
Regionais de Ensino (GRE). A pesquisa foi desenvolvida em uma escola da 13ª GRE, a
qual tem sede no município de São Raimundo Nonato, cidade polo da região. A 13ª GRE
possui 24 escolas, distribuídas nos municípios de Anísio de Abreu, Bonfim do Piauí,
Caracol, Coronel José Dias, Dirceu Arcoverde, Dom Inocêncio, Fartura do Piauí, Guaribas,
Jurema, São Braz do Piauí, o Lourenço do Piauí, São Raimundo Nonato e Várzea
Branca. Apenas dois destes municípios têm um Centro Estadual de Tempo Integral (CETI),
Guaribas e São Raimundo Nonato.
Os gestores (diretores e coordenadores) das escolas de tempo integral na rede
estadual do Piauí são escolhidos por meio de um processo seletivo. Esse consiste na
Os desafios dos gestores na Escola Estadual de Tempo Integral no Município de São Raimundo Nonato/PI
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elaboração de uma proposta de intervenção, a partir da realidade apresentada pelo Sistema
de Avaliação Educacional do Piauí (SAEPI). O processo seletivo é aberto para toda a rede
e qualquer professor efetivo pode concorrer, a fim de democratizar a escolha. A proposta
de intervenção deve viabilizar estratégias para a melhoria dos campos pedagógico,
administrativo e financeiro das escolas.
As participantes da pesquisa foram escolhidas por meio desse processo seletivo. A
gestora está há 09 meses na direção da escola e a coordenadora pedagógica há 08 meses.
As participantes destacaram nas entrevistas que existem diversos desafios para serem
enfrentados na condução de uma escola de tempo integral, especialmente quando se trata
de uma escola no interior do estado. Para as entrevistadas, mesmo com as limitações, é
possível desenvolver um trabalho satisfatório e interessante com os estudantes e demais
profissionais. Essa afirmação é possível ser comprovada pelos resultados do SAEPI e pela
avaliação da comunidade local, a qual tem a escola como referência e uma das melhores
da rede pública da região, segundo as entrevistadas.
As participantes destacaram em seus depoimentos que são muitos os desafios para
desenvolver as atividades em uma escola em tempo integral, entre esses estão:
Os maiores desafios que a gente tem é gerir uma escola sem os recursos
necessários para ofertar uma educação de qualidade, para que a gente possa obter
bons resultados. Outro ponto que a gente enfrenta muito é a ausência da família na
escola e está buscando saber como está andamento do seu filho [...] A outra
questão também que a gente ver, muitas vezes, é a pessoa do professor, não de
modo geral, mas como em qualquer categoria profissional porque, na maioria das
vezes, a gente conta aqui com professores comprometidos porque você está vendo
uma escola de tempo integral exige de nós essa dedicação em tempo integral, você
tem que passar nove horas do dia com esse aluno, então é uma atenção
diferenciada que exige também essa postura de todos nós, inclusive dos
professores, de estar vendo dessa forma, então exige um comprometimento. A
gente percebe que um número mínimo de professores não colabora como deveria
e poderia fazer (GESTORA DA INSTITUIÇÃO).
Os docentes dessa escola já têm o privilégio diante das outras porque todo mundo
fica aqui. Poucos professores não são do quadro integral. Nós temos professores
que complementam carga horária aqui. São 4 professores apenas, o restante é
integral. Como é uma escola de tempo integral o número de professores é reduzido,
facilita o trabalho quando o número é reduzido. Todo mundo é integral, então todo
mundo fica disponível o dia todo. Disponível eu digo com relação ao contato... Se
eu chego aqui às 7 horas todo mundo está aqui nesse horário, qualquer imprevisto
que venha a acontecer, falta de um professor por motivo de doença, mudança na
grade do dia, então está todo mundo aqui. Eu vejo isso como um ponto positivo,
não como um problema. E também eles vêm para na certeza de que aqui é
uma escola de tempo integral, já vêm conscientes disso (COORDENADORA
PEDAGÓGICA).
Os destaques apresentados pelas participantes são interessantes, uma vez que as
problemáticas para a vivência da educação em tempo integral são inúmeras, sendo estes
desafios cotidianos os quais demandam participação dos envolvidos para serem
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solucionados. A oferta da educação pública de boa qualidade demanda ação coletiva de
todos os agentes, os profissionais, os familiares, os estudantes e o Estado para que se
cumpram as funções de cada segmento com responsabilidade e satisfação.
Como sinalizado pelas participantes, a participação dos pais e o envolvimento dos
profissionais da educação requer uma dimensão cuidadosa, a fim de que todos
desempenhem o seu papel para a concretização da educação planejada e almejada pelo
coletivo. Nessa lógica, Souza e Corrêa (2002) destacam que a escola precisa compreender
que sua função extrapola a mera transmissão do conhecimento sistematizado, à medida
que precisa conceber, organizar e avaliar o trabalho que produz, potencializando o senso
crítico dos sujeitos que compõem. Sob essa ótica, “os seus vários grupos precisam
examinar as práticas que eles próprios desenvolvem, buscando compreender as
possibilidades que o seu trabalho apresenta rumo à construção de uma escola
verdadeiramente democrática” (SOUSA; CORRÊA, 2002, p. 48).
Sobre a estrutura da escola para o atendimento das especificidades da educação
em tempo integral, as participantes mencionaram:
Nós temos o refeitório que de certa forma não contempla porque não tem assentos
para todos os alunos, mas no revezamento dá certo. A gente tem o horário de
almoço de cada sala, por exemplo. O lanche é mais curto para acontecer
tranquilo. Nossas salas de aula não são climatizadas, então uma coisa é você
passar um turno, aqui não... Eles chegam 7h30min da manhã e vão embora às
16h30min e o nosso clima é quente e necessita bastante e os professores precisam
competir com os ventiladores e aí por conta do barulho dos ventiladores eles
precisam desligar. começa gerar um certo atrito porque os alunos não
conseguem suportar o calor e é compreensível, então isso atrapalha bastante.
Os vestuários não são suficientes para que os alunos possam, no intervalo de meio
dia, tomar um banho. Se for toda a escola, 400 alunos, parar para tomar um banho,
nós vamos perder aí, pela quantidade de banheiro que nós temos, mais de uma
hora de aula. E faltam os laboratórios... Nós temos um laboratório de Matemática,
não temos de informática e temos um laboratório que é usado pelos professores de
Biologia e Química, mas não são satisfatórios, então de certa forma ainda não
apresenta uma estrutura totalmente adequada para ser uma escola de tempo
integral (GESTORA DA INSTITUIÇÃO).
Quase que na sua totalidade porque quando foi para iniciar a proposta da educação
em tempo integral foi escolhido esse prédio porque era o mais adequado na época.
Depois disso passou por uma pequena reforma, algumas adaptações, mas a gente
acaba reclamando porque a gente mora na escola e como a gente mora na escola
acaba exigindo um certo conforto. E é nesse conforto que nós temos essa
necessidade. Esse período ainda está um pouco fresco e a temperatura está mais
tranquila, mas no período de julho e agosto, principalmente agosto e setembro que
são os meses mais quentes a gente sofre porque a energia não suporta, os
ventiladores ficam mais fracos, as lâmpadas ficam acessas... Então por conta da
energia não tem como colocar um ar condicionado nas salas. Elas foram adaptadas
para ar condicionado. São todas salas forradas, janelas fechadas e portas que
fecham... Então isso acaba maltratando fisicamente um pouco todo mundo
(COORDENADORA PEDAGÓGICA).
Os depoimentos das participantes mostram as defasagens que ainda existem na
estrutura da escola para o efetivo atendimento dos estudantes que vivenciam a educação
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em tempo integral. Os vestuários e os refeitórios necessitam ser ampliados para atender
toda a demanda, uma vez que os espaços que a escola possui, no momento, não são
satisfatórios. Outra evidência urgente e necessária é a climatização das salas, isso porque
devido ao clima quente da região, os estudantes e demais profissionais sofrem com a
temperatura.
As entrevistadas destacaram que dois projetos em andamento, o primeiro é a
construção de uma subestação na escola, a fim de que possa comportar a carga de energia
consumida pela escola, sendo possível climatizar todas as salas de aula. E o segundo
projeto é uma reforma, já licitada, com a finalidade de ampliar os espaços que ainda não
são favoráveis, como os refeitórios, os vestiários e os laboratórios que ainda não existem.
O governo do estado está dependendo de um empréstimo para realizar os projetos citados.
Os laboratórios de aprendizagens foram destacados pelas participantes como
necessários para o desenvolvimento das atividades e experiências educacionais, no
entanto, ainda não espaços suficientes para a instalação, situação que prejudica a
qualidade do processo de ensino e aprendizagem. A coordenadora pedagógica enfatizou
que o laboratório de informática seria de grande relevância para a escola, uma vez que os
estudantes e os demais profissionais necessitam de computador com internet para
desenvolver algumas atividades, sendo realizadas nas residências ou em outros espaços
pela falta do laboratório de informática, situação recorrente nas escolas públicas brasileiras.
Na visão de Teixeira e Anaya (2015), para a plena efetivação da educação em tempo
integral, enquanto processo formativo, não basta apenas ampliar a jornada diária de
escolaridade. São necessários recursos financeiros para investimento em formação
continuada dos agentes multiplicadores e docentes, para a adequação da infraestrutura da
escola, para a aquisição de material didático e equipamentos, além de uma ampla política
pública para viabilizar a implantação, com competência e responsabilidade, de uma
educação, de fato, inclusiva e integral.
Nesse sentido, as gestoras da escola em questão vivenciam um dilema diário no
processo de organicidade das atividades pedagógica, administrativa e financeira, uma vez
que ainda falta a ampliação de espaços para a acomodação de todos os envolvidos. Na
perspectiva de Sousa e Corrêa (2002), cabe à equipe gestora e à comunidade escolar fazer
uma análise das características organizacionais da escola para identificar as suas áreas
críticas que inviabilizam o sucesso escolar e as áreas que possuem um potencial a ser
desenvolvido.
É relevante que o desenvolvimento desse trabalho aconteça de forma coletiva
possibilitando que todos os agentes escolares e a comunidade possam estar envolvidos,
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fortalecendo o vínculo entre a escola, os profissionais e a comunidade, a fim de cobrar dos
responsáveis, ações para a resolução dos problemas existentes. De um modo geral, a voz
do coletivo causa mais impacto no Estado do que a voz de apenas um segmento. Na visão
de Hora (1994), a construção de um projeto de educação e, consequentemente, de escola
requer um trabalho coletivo e comunitário, tomando a comunidade como sujeito histórico,
político, social e culturalmente considerado.
O processo participativo gera aprendizagem contínua para os envolvidos,
redirecionando práticas e projetos. No âmbito dos desafios das ações escolares, as
propostas de reivindicação e avaliação coletiva favorece a autonomia dos partícipes em
observar as fragilidades políticas dos programas governamentais, a fim de direcionar
discussões e contribuições para a melhoria das questões educacionais. Essa ação mobiliza
os participantes a serem agentes políticos e comprometidos com a melhoria da qualidade
da educação, sistematizando princípios e objetivos a serem reconstruídos coletivamente.
Cabe aos gestores escolares possibilitar que essa ação possa acontecer para que todos
sejam agentes ativos da política cultural, organizacional e interventiva da escola.
Outro desafio que as participantes revelaram foi acerca dos estudantes atendidos:
Estes desafios estão mais voltados para a parte humana - pessoas. Nós temos um
público que requer atenção de mais, nós trabalhamos com adolescentes, é uma
fase que eles acham que já sabem tudo. E eles têm realmente um grande
conhecimento porque as informações hoje são muito fáceis, são muito acessíveis.
E aí por esse entendimento deles a gente tem muitas dificuldades porque a questão
da orientação, de impor, de eles perceberem os limites. Também a questão da ética,
muitos não têm esse entendimento amplo. A gente trabalha com jovens de várias
vertentes, nós temos jovens que vêm da rede pública, da rede privada, do município
e de outras cidades. Então é uma troca muito grande de saberes, é uma interação
muito rica, se a gente souber lidar. A gente ver isso também como um desafio, a
gente conseguir que eles interajam sem que haja atrito, que eles interajam com
respeito, que eles não tentem se afastar de pessoas por cultura A ou religião B. A
gente tem esse desafio porque é muita cultura misturada (COORDENADORA
PEDAGÓGICA).
Também eu vejo que a gente tem um público hoje, uma geração que está sendo
muito fragilizada no sentido de disciplina, de saber escutar um não e isso está
atrapalhando bastante de certa forma porque as gerações anteriores conseguiam
lidar com limites, hoje é bem difícil, eles acham que têm direito a tudo e, muitas
vezes, deixam de cumprir seus deveres (GESTORA DA INSTITUIÇÃO).
As questões apontadas pelas participantes são corriqueiras em todas as escolas,
especialmente por conta do novo perfil que se tem na sociedade e da geração que está se
formando. Os adolescentes são muito influenciados pela mídia, pelas redes sociais e pelas
culturas que cada grupo se insere. É uma questão contemporânea que requer um olhar
cuidadoso e especial da escola e dos diferentes profissionais para o sucesso do trabalho
dos envolvidos. Para Davis e Grosbaum (2002), a conquista dos estudantes é um processo,
o qual requer que estes sejam partícipes ativos de todo o processo de construção das
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propostas educativas. As autoras mencionam que é necessário possibilitar que os
estudantes possam “ouvir, discordar, discutir, defender seus valores, respeitar a opinião
alheira e chegar a consensos” (DAVIS; GROSBAUM, 2002, p. 77).
De um modo geral, acredita-se que a conquista dos estudantes é uma ação contínua
e permanente. O principal caminho a ser trilhado é construir itinerários formativos nos quais
possibilitem a efetiva participação dos adolescentes e dos jovens nas propostas
educacionais na escola pública. No caso específico das escolas em tempo integral, a
participação dos estudantes se torna um aspecto favorável, pois os estudantes vivenciam
uma carga horária maior no espaço educativo, sendo necessária a participação em
diferentes atividades. Teixeira e Anaya (2015) enfatizam que o compromisso social da
escola em pensar no estudante como sujeito em processo de aprendizagem, de direito,
ativo, histórico, social e autônomo e, a partir dessa consideração repensar práticas que
contribuam na sua formação integral, é necessário com a finalidade da escola cumprir sua
função política e social.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
As discussões apresentadas sobre os desafios dos gestores escolares na escola
pública de tempo integral no município de São Raimundo Nonato, no estado do Piauí, foram
relevantes, pois foi possível perceber os principais entraves que a comunidade escolar e
local vivenciam no processo de organicidade das práticas administrativa, financeira e
pedagógica. A educação em tempo integral tem suas especificidades e requer estrutura
adequada para o atendimento dos estudantes no seu processo formativo e educacional. Os
gestores escolares, por sua vez, tentam, a partir dos recursos disponíveis, desenvolver
atividades que contribuam para a melhoria da qualidade educacional ofertada, a fim de que
a escola possa cumprir com a sua função social, tendo os estudantes como foco para todas
as ações planejadas.
Nessa dimensão, ficou explícito que o trabalho coletivo é o fio condutor para a
concretização das atividades organizativas, sendo indispensável o desenvolvimento e a
aprendizagem dos estudantes. Na visão de Davis e Grosbaum (2002, p. 88), é interessante
que “todos funcionem como uma orquestra: afinados em torno de uma partitura e regido
pela batuta de um maestro que aponta como cada um entra para obter um resultado
harmônico. Esse maestro é o gestor. E a partitura, o projeto pedagógico da escola, um
arranjo sob medida para os alunos e que é referência para todos”.
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Os principais resultados da pesquisa apontaram que: a) a estrutura da escola ainda
não está nos parâmetros ideais para o atendimento de estudantes à escola em tempo
integral; b) os professores que trabalham na escola têm formação específica em sua área,
favorecendo o processo pedagógico na relação ensino e aprendizagem; c) há um pequeno
número de estudantes que não se adaptam à realidade da escola em tempo integral e
acabam desistindo; e, por fim, d) são necessários maiores investimentos financeiros, por
parte do Estado, para a concretização da escola em tempo integral, a qual possa cumprir
todas as suas especificidades.
A necessidade de construção de uma escola pública, democrática e inclusiva para
todos com perspectivas de boa qualidade é uma demanda antiga. Essa pauta requer
empenho e disposição de luta dos sujeitos sociais, pois o modelo de educação e de escola
que temos é resultado das forças políticas e sociais que se enfrentaram ao longo da história.
Assim, somos convidados a nos empenhar na luta para alcançarmos escolas em tempo
integral que ofereça reais condições para os estudantes e os profissionais, com a finalidade
de ofertar um projeto educacional referenciado socialmente, o qual tenha as condições
estruturais, profissionais e políticas. Eis, portanto, o desafio!
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... conhecimentos são uma soma de habilidades desenvolvidas pelas estudantes com o intuito de agir, não com o intuito de transformação social, mas como adaptações às exigências do mercado de trabalho, com vistas a atender os interesses da classe dominante(Branco et al., 2018).O documento traz também uma defesa da autonomia e do protagonismo da estudante, possibilitando ainda, o cumprimento de unidades curriculares em outros espaços de aprendizagem(Bahia, 2022). A problemática que se apresenta com essa discussão sobre escolha e flexibilização é justamente que essas escolhas dos estudantes estão condicionadas à oferta que a escola poderá dar a partir dos recursos disponíveis para os mesmos, o que se agrava com a consolidação do teto dos gastos públicos e dos desmontes da educação.Outra incerteza é como ficará o processo de avaliação do ENEM a partir dessas mudanças e como isso pode agravar a entrada de estudantes de camadas populares nas universidades, direito historicamente negado à grande parcela da população. ...
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A mais recente reformulação do ensino médio, lei federal nº 13.415/2017, junto com a Base Nacional Comum Curricular, propõem uma mudança estrutural no currículo desta etapa da educação básica. Trata-se de uma reforma em curso no país e coube a cada Estado definir o seu processo de implantação nas escolas. Deste modo, este artigo busca analisar a Reforma do Ensino Médio no Estado da Bahia. Para tanto, recorre à pesquisa qualitativa, de estudo bibliográfico e de documentos. Após análise, cabe destacar a presença do setor empresarial na elaboração do documento curricular baiano, o que se configura pelo desmonte das políticas educacionais e pela desvalorização da formação crítica das/os estudantes.
... Entretanto, faz-se necessário trazer como cerne as críticas à implementação da BNCC. Branco et al (2018) salientam que, ainda que o discurso do Governo para implementação da BNCC apontasse para melhorias na área da Educação, outros setores não ligados a esta área participaram de sua implantação. A participação dos educadores foi negligenciada, dando espaço ao atendimento de questões políticas e econômicas a favor dos interesses do mercado e da ideologia neoliberal. ...
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A História da ciência pode ser utilizada para destacar e reconhecer a contribuição e o papel expressivo da mulher na ciência. Nessa perspectiva, o presente trabalho, de abordagem qualitativa-propositiva, tem como objetivo apresentar um produto educacional (uma sequência didática) desenvolvido para trabalhar o filme “Radioactive” (2019), indo além dos conteúdos científicos ao trazer para o debate a temática da história das mulheres na ciência e às questões de gênero e ciência. No contexto de uma abordagem metodológica propositiva, partimos da análise fílmica para explorar as potencialidades didáticas definidas em uma sequência de atividades iniciada pelo levantamento dos conhecimentos prévios dos/as alunos/as, seguida por uma problematização da temática e pelos excertos do filme específicos para introduzir o ensino da radioatividade e promover o debate acerca da dificuldade ao ingresso à carreira cientifica, da discriminação e apagamento perpetuado da produção feminina na ciência, e finalizada com um momento de avaliação construído coletivamente pelos alunos. Como resultado, a sequência didática prioriza o processo interventivo para romper com um ensino de ciências que ignora a produção da mulher na ciência e a desigualdade de gêneros ao longo da história da ciência. Dessa forma, mostra-se com potencial orientado para o desenvolvimento de uma postura questionadora e crítica dos/as alunos/as diante do seu processo de aprendizagem voltado para uma formação cidadã.
... O documento enfrenta hoje críticas controversas enquanto sua estrutura e propósito, conforme é encontrado na literatura. Diversos autores consideram a BNCC um retrocesso histórico no que tange a garantia de uma educação libertadora e crítica, respondendo aos interesses neoliberais da elite, do capitalismo e da educação bancária (ROCHA;PEREIRA, 2016;BRANCO et al., 2018BRANCO et al., , 2019SUSSEKIND, 2019;LEITE;MEIRELLES, 2021). ...
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A Base Nacional Comum Curricular é o documento curricular em vigência no país. Frente a controvérsias, a BNCC vem sendo discutida sob diferentes óticas científicas e filosóficas. Neste artigo, objetivou-se caracterizar o estruturalismo e o pós-estruturalismo enquanto elementos curriculares nos objetos de conhecimento e habilidades do eixo Vida e Evolução, das Ciências da Natureza, na BNCC. Através da análise de conteúdo verificou-se o predomínio da perspectiva estruturalista com foco no caráter empírico. A baixa aderência do caráter sinóptico, que promove a construção de novos saberes, reflete o papel escolar de reprodução de conceitos pré-estruturados, intensificando discursos lineares científicos. A construção de novos saberes nas Biociências ocorre na superação do processo científico como absoluto, ao reconhecer subjetividades no conhecimento biológico.
... A implementação de uma pedagogia de competências, associada a uma visão reformista da educação e da sociedade (da Silva & Boutin, 2018;Saviani, 2013), avaliada nacional e internacionalmente por testes de grande escala, tem sido acusada de pretender ajustar os indivíduos às condições da sociedade. Há, ainda, críticas aos itinerários formativos, associandoos às opções formativas da ditadura militar e fazendo ressalvas à sua oferta insuficientemente variada, que desfaz o discurso de protagonismo e flexibilidade subjacente à sua proposta (Branco et al. 2018;da Silva & Boutin, 2018;Gonçalves, 2017). No caso da área de matemática e suas tecnologias, orienta-se para o não uso de contextos artificiais, produzidos apenas para exemplificar uma falsa aplicação de conceitos, e de uma abordagem de conteúdos que contemplem temas atuais e relevantes, com destaque para o PC, cujo impacto de sua inclusão nas obras didáticas da supracitada área é analisado em articulação com a metodologia a seguir. ...
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A inclusão do pensamento computacional (PC) na Base Nacional Comum Curricular (BNCC), sobretudo associado à matemática e seus desdobramentos no ensino médio brasileiro reformado, provocaram mudanças também nos materiais didáticos produzidos com potenciais reflexos na prática docente. Cientes disso, neste artigo, buscamos responder a seguinte pergunta: Qual o impacto da inserção do PC no conteúdo das obras didáticas da área de matemática e suas tecnologias do novo ensino médio? Nessa perspectiva, objetivamos analisar o impacto da inserção do PC no conteúdo das obras didáticas da área de Matemática e suas tecnologias do novo ensino médio. Nossa pesquisa, de abordagem qualitativa, é do tipo documental, e seu traçado metodológico foi construído com base nos pressupostos da análise de conteúdo. Para tanto, utilizamos como eixos de análise a frequência com que são feitas menções ao PC, sua posição na estrutura das obras e das coleções e a importância que lhe é dada para a aprendizagem matemática. Os dados foram analisados à luz de investigações sobre o PC e o novo ensino médio. Os resultados mostraram que o PC impactou significativamente os conteúdos da maioria das obras que analisamos devido à frequência com que é mencionado, à posição que ocupa em sua estrutura e à importância que lhe é dada para a aprendizagem matemática, com potenciais implicações na prática e na formação do professor dessa disciplina no novo ensino médio.
... Inúmeros autores ao analisarem a BNCC apontam a colaboração da iniciativa privada, bem como o atendimento do interesse da classe empresarial, ao propor competências direcionadas ao mer-cado de trabalho BRANCO, et al., 2018;SI-QUEIRA, 2019). Observa-se também a ausência de referência em relação aos conteúdos científicos, artísticos e filosóficos, e a ênfase em métodos, procedimentos, competências e habilidades voltadas para a adaptação do indivíduo aos interesses da classe empresarial (MAR-SIGLIA, et al., 2017). ...
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A relação recente entre ser humano-sociedade-natureza é caracterizada pelo uso excessivo dos recursos naturais. A pedagogia e o currículo podem ser estratégicos para tornar o desenvolvimento mais sustentável. Assim, o curso Técnico Integrado de Química, associado a temas transversais, é essencial para a compreensão dos processos químicos no ambiente e das consequências da ação humana na natureza. Este trabalho objetivou analisar o Projeto Pedagógico do Curso Técnico Integrado em Química do Instituto Federal de Santa Catarina, Florianópolis (IFSC), em relação à sustentabilidade. Utilizou-se a Pesquisa Documental (FONSECA, 2002) e a Análise de Conteúdo (BARDIN, 1977). Devido à pandemia da Covid-19, não foi possível a realização de entrevistas. A hipótese é que o curso apresenta a sustentabilidade de forma superficial e associada à ideia de causar menos impacto na sociedade de consumo, não alinhado à perspectiva de sustentabilidade considerada pelas autoras, que envolve a preservação da biodiversidade. Embora o termo “sustentabilidade” não tenha sido mencionado no PPC (Projeto Pedagógico do Curso), os demais resultados mostram que ela está presente no currículo do curso. Reforça-se a importância de dedicar esforços à Educação Continuada para formar o corpo docente em questões ambientais, uma vez que esse profissional é importante ator de mudança
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O processo de ensino e aprendizagem de botânica se dá majoritariamente através da utilização de livros didáticos e aulas teóricas, por vezes descontextualizadas do cotidiano dos estudantes da educação básica. O documento curricular vigente denominado Base Nacional Comum Curricular (BNCC) configura-se como um parâmetro para a elaboração do planejamento curricular em todas as etapas e modalidades de ensino. Entretanto, é possível notar diversas tensões e controvérsias no documento, como um “enxugamento” de conteúdos e um menor destaque atribuído às questões sociais, ambientais e temas transversais. Com o objetivo de mapear os sentidos e acepções atribuídos à botânica/biologia vegetal veiculados na BNCC, foi realizada uma análise de conteúdo a partir de descritores relacionados ao ensino de botânica. Os resultados apontaram pouca presença de um viés crítico das plantas, além de um aspecto utilitarista e morfofuncional. Urge a necessidade de reflexão sobre os retrocessos que a BNCC representa não somente no meio escolar e acadêmico, mas socioculturalmente também.
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Recorrente em publicações científicas e documentos curriculares nacionais, a interdisciplinaridade tem sido discutida sob diferentes contextos ao longo das últimas décadas, sobretudo, a partir da possibilidade de religação dos saberes, como propõe Edgar Morin. Nesse sentido, buscou-se aqui investigar como a interdisciplinaridade se faz presente na Base Nacional Comum Curricular do Ensino Médio (BNCC EM) – um documento educacional normativo dos currículos da Educação Básica de abrangência nacional – a partir de seus textos introdutórios e da área de conhecimento das Ciências da Natureza e suas Tecnologias, considerando como abordagem epistemológica o pensamento complexo de Morin. Para tanto, adotou-se uma abordagem qualitativa descritiva, do tipo pesquisa documental, cujo percurso metodológico foi constituído por três etapas: estudo dos referenciais teóricos; análise de trechos específicos da BNCC-EM, segundo a Análise Textual Discursiva; e elaboração do metatexto, a partir das categorias analíticas. A interdisciplinaridade e a complexidade sutilmente se apresentam em esparsos trechos do documento, sem explicitação de fundamentos e referenciais teóricos, metodológicos, epistemológicos ou pedagógicos sobre esses temas. Tal constatação faz evidência de lacunas que precisam ser discutidas, considerando a envergadura e a importância da BNCC-EM na consolidação de diversas outras políticas educacionais do país.
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Este artigo é um recorte para a dissertação de mestrado e tem como objetivo realizar uma revisão de literatura acerca de trabalhos que utilizam o WhatsApp para interação discursiva entre professores de Matemática e alunos no processo de ensino e aprendizagem, visando promover um panorama sobre o tema no período de 2019 a 2020. Durante esse período, o cenário educacional passou por transformações devido a pandemia da COVID-19, e as tecnologias digitais passaram a ser utilizadas cada vez mais para o desenvolvimento das atividades educacionais. Os resultados mostram que o uso das tecnologias móveis podem contribuir para a aprendizagem em Matemática, onde os alunos têm a possibilidade de aprender em qualquer lugar e a qualquer momento, diante de seus interesses e que o WhatsApp permite a criação de um ambiente de aprendizagem colaborativa, além de aproximar professores e alunos no contexto educacional.
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Esta investigação averiguou condutas e compreensão da operação aritmética de multiplicação por estudantes do ensino fundamental. Participaram 40 estudantes de duas escolas públicas de Planaltina (DF), sendo 20 do 5º ano e 20 do 6º ano do ensino fundamental. O instrumento utilizado para averiguar as condutas foi uma situação de aprendizagem que permite encontrar seis níveis de compreensão da multiplicação, do mais elementar ao mais complexo. Os resultados mostraram que os estudantes têm dificuldade com a multiplicação e divisão com números naturais, o que inviabiliza a inserção dos números racionais conforme proposto na Base Nacional Comum Curricular para esses anos escolares. Somente quatro estudantes alcançaram o nível mais elevado das condutas de multiplicação, compreendendo a relação quantitativa “n vezes x” sem necessidade de recorrer a comprovação empírica, antecipando todas as composições possíveis e operando mentalmente por procedimentos aditivos e multiplicativos. Não foram verificadas diferenças significativas entre estudantes de 5º e 6º anos quanto a gênero, idade ou ano escolar. Este estudo abre discussões sobre o ensino da matemática nos anos iniciais, as metodologias de ensino-aprendizagem e a formação inicial de professores.
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O objetivo da pesquisa foi analisar o PDDE como mecanismo da descentralização financeira, da participação e da autonomia escolar, no contexto de uma escola da rede pública no municí­pio de Maceió - Alagoas. A metodologia desenvolvida foi caracterizada na abordagem qualitativa, tendo como técnica de pesquisa o estudo de caso. O instrumento de coleta de dados foi realizado por meio de entrevistas semiestruturadas com os atores envolvidos. Como resultados foi possí­vel perceber que a descentralização que as normatizações do PDDE apontam é na concepção da gestão gerencialista e neoliberal, cujo responsáveis pela oferta de uma educação de boa qualidade é responsabilidade da comunidade a qual a escola pertence.
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RESUMO: O artigo é uma reflexão sobre as relações entre o tempo de escola e a qualidade do trabalho educativo que se realiza dentro dela. O turno integral, com notável expansão nos sistemas públicos educacionais brasileiros, é analisado do ponto de vista dos estudos so-bre a eficácia escolar e as condições culturais e históricas que o deter-minam. Abordam-se, ainda, as diferentes concepções que dão supor-te às propostas pedagógicas e administrativas de tempo integral e que se traduzem em diferentes soluções institucionais. ABSTRACT: The present study is a reflection on the relationship between school hours and the quality of the educational work de-livered at school. Full-time school, which is increasingly adopted by the Brazilian public school system, is analyzed from the stand point of the studies on school effectiveness and the cultural and historical conditions that define it. The different concepts sup-porting the full-time pedagogical and administrative propositions, which are translated into different institutional solutions, are also approached.
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A avaliação do contexto da instituição educacional pode ser vista de vários ângulos, desde o ponto de vista estritamente didático e das estratégias de avaliação da aprendizagem escolar até questões epistemológicas, sociais e políticas que estão implicadas na instituição educacional e em outras instituições que envolvem relações de saber-poder. Esse livro expressa um explícito compromisso com a qualidade e democratização da educação e praticando um diálogo que envolve muitas vozes. Esse compromisso será compartilhado com o leitor, especialista ou não.
Avaliação Educacional: regulação e emancipação
  • Almerindo Afonso
  • Janela
AFONSO, Almerindo Janela. Avaliação Educacional: regulação e emancipação. São Paulo: Cortez, 2000.
Intelectuais ou técnicos? o papel indispensável da teoria nos estudos educacionais
  • Stephen J Ball
BALL, Stephen J. Intelectuais ou técnicos? o papel indispensável da teoria nos estudos educacionais. In: BALL, Stephen J.; MAINARDES, Jefferson (Orgs.). Políticas educacionais: questões e dilemas. São Paulo: Cortez, 2011.
Federal de 1988. Brasília
  • Brasil
  • Constituição
BRASIL. Constituição Federal de 1988. Brasília, 1988. BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da educação Nacional (1996). Biblioteca Digital da câmara dos deputados. Lei nº 9.394 de 20 de dezembro de 1996.
Lei nº 13.005, de 25 junho de 2014: Plano Nacional de Educação
  • Brasil
BRASIL. Lei nº 13.005, de 25 junho de 2014: Plano Nacional de Educação. Brasília, 2014.
Gestão democrática na escola: artes e ofícios da participação coletiva
  • Dinair Hora
  • Leal Da
HORA, Dinair Leal da.Gestão democrática na escola: artes e ofícios da participação coletiva. Campinas, SP: Papirus, 1994.
técnica e arte: o desafio da pesquisa social
  • Maria Minayo
  • Cecília De Souza
  • Ciência
MINAYO, Maria Cecília de Souza. Ciência, técnica e arte: o desafio da pesquisa social. In: MINAYO, Maria Cecília de Souza (Org.). Pesquisa Social: teoria, método e criatividade. Petrópolis, RJ: Vozes, 1994.
Avaliação educacional: desatando e reatando nós
  • Maria Dazzani
  • Virgínia
DAZZANI, Maria Virgínia (Orgs.). Avaliação educacional: desatando e reatando nós. Salvador: EDUFBA, 2009.