Available via license: CC BY 4.0
Content may be subject to copyright.
Psicol. Argum. 2013 abr./jun., 31(73), 237-246
ISSN 0103-7013
Psicol. Argum., Curitiba, v. 31, n. 73, p. 237-246, abr./jun. 2013
PSICOLOGIA ARGUMENTO DOSSIÊ
[T]
Engajamento paterno no cuidado a crianças de 4 a 6 anos
[I]
Paternal engagement in caring for children of 4-6 years
[A]
Abstract
This article aims to investigate the characteristics of parental involvement in caring for children
of 4 to 6 years old. Fifty fathers with children at age 4-6 years old responded to the Questionnaire
of Paternal Engagement which comprises 56 items divided into seven dimensions. Through sta-
tistical analysis it was found that the father is engaged in caring for children, although variations
the activities related to emotional support and discipline than those related to basic care end
household chores, which shows that this involvement is still not equal for all dimensions of care.
It was found that parents are engaged with their children and that engagement is higher in some
spheres in comparison with other, indicating that fatherhood is going through a transition period
which combines the traditional activities and the father of a modern and more participatory.
#]
[K]
Keywords: Paternal engagement. Paternal involvement. Father. Child development.
#]
[R]
Resumo
O presente artigo tem como objetivo investigar as características do engajamento paterno no
de 4 a 6 anos responderam ao Questionário de Engajamento Paterno, o qual é formado por 56
itens distribuídos em sete dimensões. Por meio de análises estatísticas constatou-se que o pai
suporte emocional e à disciplina em comparação com aquelas referentes aos cuidados básicos
e a tarefas de casa, o que demonstra que esse envolvimento ainda não é igual para todas as
-
jamento é maior em algumas esferas em comparação com outras, indicando que a paternidade
passa por um período de transição, no qual se mesclam as atividades tradicionais e as de um
pai moderno e mais participativo. [#]
[P]
Palavras-chave
[#]
[A]
Carina Nunes Bossardi[a], Lauren Beltrão Gomes[b], Mauro Luís Vieira[c], Maria Aparecida Crepaldi[d]
[a] Psicóloga, doutoranda em
Psicologia pela Universidade
Federal de Santa Catarina
(UFSC), Florianópolis, SC -
Brasil, e-mail:
carinabossard@yahoo.com.br
[b] Psicóloga, doutoranda em
Psicologia pela Universidade
Federal de Santa Catarina
(UFSC), Florianópolis, SC -
Brasil, e-mail:
laurenbeltrao@yahoo.com.br
[c]
pela Universidade de São
Paulo (USP), professor do
Universidade Federal de Santa
Catarina (UFSC), Florianópolis,
SC - Brasil, e-mail:
mlveira@gmail.com.br
[d]
pela Universidade Estadual
de Campinas (Unicamp),
de Psicologia da Universidade
Federal de Santa Catarina
(UFSC), Florianópolis, SC -
Brasil, e-mail:
maria.crepaldi@gmail.com.br
Recebido: 03/06/2011
Received: 06/03/2011
Aprovado: 13/10/2011
Approved: 10/13/2011
Psicol. Argum. 2013 abr./jun., 31(73), 237-246
Bossardi, C. N., Gomes, L. B., Vieira, M. L., & Crepaldi M. A.238
progenitor (Borsa & Nunes, 2010; Fleck & Wagner,
2003; Jablonski, 2010; Staudt & Wagner, 2008). A vi-
são tradicional do pai como provedor do lar vem se
-
do associada à maior participação no que se refere
& Costa, 2009; Perucchi & Beirão, 2007).
Os papéis sociais atribuídos a homens e mu-
lheres estão mudando rapidamente, criando novas
expectativas, crenças e atitudes sobre o que pais
Piccinini, 2007). No tocante à paternidade, o padrão
ideal que vem sendo constituído é o de um pai par-
Percebe-se a ampliação das funções paternas que
-
porte e sustento familiar, a interação direta com a
criança como alimentar, dar banho, vestir, levar ao
médico, e a responsividade no cuidado parental
como cuidar, pegar no colo quando a criança pede
e consolá-la quando chora (Bandeira et al., 2005;
Fleck & Wagner, 2003).
-
-se que o pai participe e se envolva de modo a com-
partilhar as tarefas familiares com a mãe. O termo
com o qual Pleck J. e Pleck E. (1997) descrevem esse
novo modelo de paternidade, que tem como marca
central a igualdade de responsabilidade pela cria-
deve se envolver com as crianças, dividir igualmen-
-
ticipar ativamente no desenvolvimento da criança,
desde o nascimento até a fase adulta. Este modelo
é considerado ideal até os dias de hoje e é ele que
o pai não necessariamente desempenha todas as ta-
refas em igualdade com a mãe, mas espera-se dele
que cuide, brinque, instrua e demonstre afeto e ami-
A manifestação do envolvimento paterno varia
de acordo com culturas e contextos e é determinada
por fatores biológicos, sociais e culturais (Bandeira,
2009). No período inicial de vida da criança, o cui-
dado parental está centrado na mãe devido a carac-
terísticas como gestação, amamentação e interação
mãe-bebê nas primeiras horas após o nascimento.
Contudo, estudos têm mostrado que hormônios
Introdução
A família é considerada como o principal contex-
to de desenvolvimento da criança, especialmente
durante os anos iniciais de sua vida. O envolvimento
conferiram caráter de inquestionabilidade ao im-
portante papel da mãe no desenvolvimento infantil.
-
pai com a criança.
O pa-
pel do pai no desenvolvimento infantil, abriu caminho
para investigações sistemáticas por meio das quais
se constatou que o papel do pai vai além da função de
observação do comportamento dos recém-nascidos
mostrou que, desde os primeiros dias, o bebê já é ca-
evidencia-se que o pai entra muito mais cedo na vida
da criança do que se imaginava e desempenha impor-
tante função no processo de desenvolvimento infan-
Com a ascensão de um novo modelo econômico
industrial no ocidente e a consolidação do movimen-
to feminista, muitas mulheres se inseriram no mer-
cado de trabalho, com carga horária e cargos seme-
lhantes aos dos homens, e passaram a dividir com
eles a condição de provedor do lar. Iniciou-se uma
pressão no sentido de que estes também passas-
-
-
mésticas (Pleck J. & Pleck E., 1997; Jablonski, 2010).
No Brasil, as transformações sociais contemporâ-
neas como o incremento da inserção da mulher no
-
ou seja, lares em que o trabalho feminino passou a
representar a principal fonte de sustento econômico
da família. Tais mudanças têm repercutido para além
da dinâmica familiar, nas questões conjugais, bem
-
ções nos papéis e funções desempenhados por cada
Psicol. Argum. 2013 abr./jun., 31(73), 237-246
Engajamento paterno no cuidado a crianças de 4 a 6 anos 239
respeito das mudanças relativas à paternidade, bem
-
bre o envolvimento paterno remete ao conceito de
a partir de três dimensões: acessibilidade, interação
e responsabilidade. Acessibilidade concerne à pre-
sença e à disponibilidade do pai para com a criança,
sem que ocorra interação direta entre eles. A intera-
-
dos e atividades compartilhadas como brincadeiras
papel que o pai exerce garantindo cuidados e recur-
participar de reuniões na escola).
A equipe ProsPère (http://www.graveardec.
uqam.ca/prospere/), sediada na Universidade de
-
-
-
-
pação contínua do pai biológico ou substituto acerca
se exprime de diferentes formas: pai em interação
(presença do pai para com a criança, direta ou indi-
reta); pai que cuida (compartilha as tarefas cotidia-
nas); pai afetuoso (gestos e palavras que tranquili-
para o desenvolvimento da criança); pai provedor
-
Pouco se sabe sobre como os pais estão viven-
ciando as mudanças na dinâmica familiar, como se
avaliam e que sentimentos possuem com relação
Picininni (2007) sobre os sentimentos em relação
à paternidade e o envolvimento paterno, os pais
revelaram estar satisfeitos com a paternidade, ter
-
pais participavam dos cuidados básicos e, embo-
ra com frequência irregular, dividiam com a mãe
-
sultados sugerem que o pai pode ter uma ampla
-
seios e a brincadeiras.
relacionados ao cuidado materno, como a ociticina
e a prolactina também podem estar relacionados ao
comportamento paterno e, que, além disso, o homem
pode sofrer mudanças neuroendócrinas ativadas por
estímulos vindos do contato com os recém-nascidos
inicial do desenvolvimento (Bandeira et al., 2005).
O reconhecimento de que o pai exerce importante
papel no desenvolvimento infantil e as transforma-
ções pelas quais vem passando o ideal de paternida-
de abriram caminho para novos estudos nessa área.
maior frequência para se referir aos cuidados pater-
nos: investimento, envolvimento e engajamento.
é derivado da biologia
evolucionista e refere-se a atividades nas quais os
pais se engajam para contribuir com a sobrevivên-
cia da espécie e garantir seu sucesso reprodutivo
(Hewlett, 1992). Segundo o autor, o investimento
-
cia imediata na sobrevivência da criança tais como
alimentar, transmitir conhecimentos e fornecer re-
-
garantir o acesso a recursos e alimentação e provi-
denciar suporte emocional e econômico à mãe.
proximidade com a criança (Hewlett, 1992) e pode
-
engloba a proximidade com a criança, sem necessa-
riamente implicar uma ação, como dormir junto e
interessados em pesquisas interculturais do desen-
volvimento, que investigam como a presença do pai
e da mãe e seu nível de envolvimento com a criança
cognitivo, da personalidade e da moral.
recente na literatura psicológica, e em muitos estu-
engajamento paternal surgiu das investigações, mui-
comportamentos dos pais em relação às crianças, a
Psicol. Argum. 2013 abr./jun., 31(73), 237-246
Bossardi, C. N., Gomes, L. B., Vieira, M. L., & Crepaldi M. A.240
o pai e visando a implementação e validação de ini-
ciativas de intervenção comunitária no sentido de
favorecer o engajamento dos pais. O presente ar-
-
e canadenses. Entrevistaram-se pais (homens) de
crianças de 4 a 6 anos com o objetivo investigar as
características do engajamento paterno com crian-
ças nessa faixa etária. Posteriormente, pretende-se
comparar os resultados encontrados no contexto
brasileiro com os resultados encontrados pelos
pesquisadores canadenses.
de que após os 3 anos de idade, as crianças demons-
tram maior abertura para estabelecerem outras re-
lações, além da relação com a mãe, passando a inte-
Shaffer, 2005). Ademais, crianças em idade escolar
já não demandam tantos cuidados por parte do
fornece dados mais pontuais acerca das caracterís-
ticas de cada fase das crianças.
Método
Foram investigados 50 pais, biológicos ou não,
O pai deveria estar vivendo junto com a companhei-
ra há pelo menos seis meses.
-
tes instrumentos: (a) Questionário sociodemográ-
instrumento construído pela equipe ProsPère e va-
lidado no Canadá com uma amostra de 468 famílias
anos de idade. Os alphas de Cronbach variaram en-
tre 0,72 e 0,86; a estabilidade temporal variou de
0,50 a 0,77 (Paquette et al., 2000). O instrumento
-
-
Por outro lado, pesquisas revelam que os pais
participam pouco das tarefas domésticas e dos cui-
Crepaldi, Andreani, Hammes, Ristof & Abreu, 2006).
Outros estudos referem maior participação mas-
-
centes transformações na dinâmica familiar retra-
papéis que envolvem a maternidade, a paternidade
e, consequentemente, a família e seu papel no de-
senvolvimento infantil.
Percebe-se um aumento dos estudos na área de
paternidade, embora ainda sejam poucos aqueles
que buscam entender como os pais estão viven-
ciando as mudanças de expectativas, o que sen-
tem em relação à paternidade e como se avaliam
neste papel. O envolvimento paterno tem sido es-
tudado de forma qualitativa (Crepaldi et al., 2006;
Fleck & Wagner, 2003; Silva & Picininni, 2007) e
também quantitativa (Bandeira, 2009; Paquette,
Srivastava, 2009).
um instrumento sobre crenças parentais e práticas
de cuidados, construído e validado por pesquisado-
-
dos pelos participantes por meio de uma escala que
vai de pouco importante a muito importante.
-
litativas e quantitativas para investigar o nível de
-
vista semiestruturada e para a quantitativa foi utili-
-
ração de envolvimento, participação nos cuidados
decisões de educação infantil e disponibilidade.
A equipe multidisciplinar de pesquisadores
ProsPère desenvolveu um instrumento chamado
Questionário de Engajamento Paterno (QEP), ba-
seada no resultado de uma série de pesquisas com
Psicol. Argum. 2013 abr./jun., 31(73), 237-246
Engajamento paterno no cuidado a crianças de 4 a 6 anos 241
-
to QEP passou por um processo de adaptação para
o contexto brasileiro. Originalmente escrito em
A tradução e a versão original foram revisadas e
comparadas pelos próprios pesquisadores. A seguir,
adaptar o instrumento para o contexto brasileiro com
a substituição de algumas palavras e expressões. Esse
procedimento teve como objetivo tornar mais clara
a compreensão dos itens pelos participantes da pes-
quisa. Por exemplo, a tradução literal do item 40 era:
-
-
quisadores na área de interesse do instrumento para
que avaliassem a correspondência entre o original e
a tradução para o português, além da correspondên-
cia do construto teórico do fenômeno e o questioná-
o objetivo do instrumento e a descrição do material
para sua aplicação. Receberam também, além das
o construto teórico que o embasa, originário da lite-
ratura sobre o tema, bem como a demonstração da
Nesse processo foram sugeridas alterações na
forma de descrever alguns itens no que se refere à
-
ra. Algumas palavras tiveram que ser substituídas
por equivalentes semânticos ou foram acrescen-
tados exemplos para as questões que pudessem
-
procedimento de backtranslation, processo este
-
back-
translation-
com frequência absoluta de cinco pontos (nunca,
sempre). É composto por 56 itens distribuídos em
sete dimensões:
-
jam a criança, por exemplo: cuidar de seu/
-
errado com ele(a);
a incentivar a criança a ir mais longe e a ex-
plorar o ambiente, por exemplo: ir ao parque
-
nhos e assistir com ele(a) um programa in-
fantil na televisão;
-
necer cuidados essenciais à sobrevivência,
por exemplo: dar de comer ou beber a seu/
-
-
lembrar e/ou falar da criança, por exemplo:
-
era mais novo(a);
controle de comportamentos, ou seja, ao ato
de corrigir e repreender a criança, como por
exemplo: corrigir comportamentos de seu/
algo errado (machucar alguém, por exemplo);
atividades com a casa em geral, por exemplo:
preparar as refeições, lavar a louça e lavar
roupa.
Psicol. Argum. 2013 abr./jun., 31(73), 237-246
Bossardi, C. N., Gomes, L. B., Vieira, M. L., & Crepaldi M. A.242
semanais, 24 (48%); possuíam jornada de até 40
44 horas semanais; e nove (18%) trabalhavam até
44 horas semanais. Quanto ao salário, a média foi de
R$ 2.056 reais (d.p. = 1.343,62), sendo o mínimo de
R$ 510,00 e o máximo de R$ 8.000,00 reais. Com re-
lação ao tipo de família: 39 pais (78%) constituíam
família nuclear, com pai e mãe biológicos da criança;
seis (12%) formavam famílias recasadas, com pai e
mãe biológicos da criança focal; quatro (8%) eram
padrastos; e uma família era recasada, com pai bio-
lógico e madrasta (2%).
do instrumento. Constatou-se que a média de en-
gajamento paterno geral foi de 4,06 (d.p. = 0,49) e
obtiveram-se os seguintes escores por dimensões:
suporte emocional = 4,48 (d.p.= 0,43); disciplina =
evocações = 3,78 (d.p. = 0,81); cuidados básicos =
3,55 (d.p. = 0,88); abertura ao mundo = 3,38 (d.p. =
0,65) e tarefas de casa = 3,09 (d.p. = 0,73).
de escolaridade e renda não apresentaram nenhuma
resultados estão explicitados na Tabela 1.
Constatou-se que suporte emocional (que obte-
ve a maior participação do pai) está correlaciona-
ao mundo, evocações, disciplina e tarefas de casa.
A disciplina apareceu correlacionada com cuida-
dos básicos. Por outro lado, a dimensão tarefas de
casa (que obteve a mais baixa participação do pai)
apareceu correlacionada com abertura ao mundo,
cuidados básicos, suporte emocional e evocações.
É importante destacar que foram encontradas cor-
relações positivas entre as dimensões, o que parece
indicar que, quando o pai se engaja em uma ativida-
Discussão
Este estudo, que teve como objetivo investigar as
características do engajamento paterno com crianças
-
mento quantitativo, permitiu constatar que o pai, de
que o escore de engajamento geral foi alto. Ao analisar
oito participantes (três pais e cinco mães), a partir
instrumento. Por meio dessa aplicação, puderam
questões e o tempo que cada participante levava
para responder. Além disso, notou-se também que
alguns trechos das assertivas e perguntas necessita-
vam do acréscimo de palavras no masculino e no fe-
Os participantes foram recrutados em Insti-
tuições de Educação Infantil de quatro cidades de
um estado do sul do Brasil. As escolas que autori-
convite aos pais das crianças de 4 a 6 anos. Aqueles
que retornaram as cartas preenchidas foram conta-
tados via telefone e foi agendada uma visita, prefe-
rencialmente no domicílio dos participantes, para
Comitê de Ética para Pesquisa em Seres Humanos
da Universidade Federal de Santa Catarina (pro-
tocolo 520/09) e pelas secretarias municipais de
Educação do estado.
Para a análise dos dados obtidos, foram utili-
-
grama Statistical Package for Social Sciences for
Windows (SPSS 18.0). Os dados foram analisados
mediante estatística descritiva explicativa (frequên-
cias, percentuais, médias e desvio padrão) e esta-
tística inferencial quanto ao envolvimento paterno
(correlação de Spearman).
Resultados
A idade média dos participantes foi de 37,20
(d.p. = 9,39), variando entre 26 e 63 anos. A mé-
dia de escolaridade em anos foi 11,25 (d.p = 3,14).
Em termos de variável nominal (fundamental in-
completo, médio incompleto, superior incompleto
e superior completo/pós-graduação), a escolari-
dade variou de ensino fundamental incompleto
(20%) a ensino superior completo (18%); 6% dos
pais possuíam ensino fundamental incompleto;
8% possuíam ensino médio incompleto; 34% pos-
suíam ensino médio completo; e 14% possuíam
ensino superior incompleto (14%). A maioria dos
pais (92%) apresentou jornada de trabalho fora de
casa; três (6%) dos pais trabalhavam até 30 horas
Psicol. Argum. 2013 abr./jun., 31(73), 237-246
Engajamento paterno no cuidado a crianças de 4 a 6 anos 243
segundo escore mais alto, vai ao encontro da visão
tradicional de papéis parentais, evidenciando a im-
a autoridade social, como aponta Paquette (2004).
como corrigir comportamentos, repreender e punir
Outra dimensão com escore alto foi a que se re-
rirem. Em menores proporções, aparecem os cui-
dados básicos (dar de comer ou beber a criança,
dar banho, vestir, colocar na cama, levar ao médico
e levantar a noite) e a abertura ao mundo (as sistir
parque, passear, ensinar esportes, propor brinca-
deiras educativas e mostrar novos brinquedos).
qual destoa da maioria das dimensões; em termos
refeições, lavar louça e roupa, limpar a casa, levar o
-
Corroborando com a pesquisa de Bandeira et al.
(2005) e de Fleck e Wagner (2003), constata-se que o
ao suporte emocional da criança em detrimento das
atividades domésticas. A dimensão disciplina aparece
-
Percebe-se que a abertura ao mundo, desta-
cada como uma dimensão significativa no estudo
o engajamento no que se refere às dimensões mais
se envolve mais com atividades referentes ao suporte
-
pectivamente, do que com atividades que envolvam
evocações, cuidados básicos, abertura ao mundo e ta-
refas domésticas. Chama a atenção o fato de a dimen-
são suporte emocional ter atingido o escore mais alto,
maior inclusive do que a pontuação de engajamento
geral, pois se esperava que atividades referentes à dis-
O destaque da dimensão suporte emocional
pode indicar as transformações pelas quais vem
passando a dinâmica familiar, transformações estas
impulsionadas especialmente pelo incremento da
participação da mulher no mercado de trabalho, o
-
péis parentais. Portanto, a constatação de que o pai
-
solar a criança, oferecer os primeiros socorros, di-
oferece evidências de que a paternidade vai, grada-
tivamente, englobando aspectos antes pertencentes
exclusivamente ao universo da maternidade, con-
ideal de paternidade que está sendo construído ca-
ao pai e pela exigência de uma maior participação
resultados encontrados nesta pesquisa, se trate de
um cuidado afetivo.
Tabela 1 - Correlações entre as dimensões do envolvimento paterno
Suporte
emocional
Abertura ao
mundo
Cuidados
básicos
Jogos
físicos
Evocações Disciplina Tarefas de
casa
Suporte emocional _
Abertura ao mundo 0,51** _
Cuidados básicos 0,26 0,39** _
0,27 0,34* 0,21 _
Evocações 0,51** 0,58** 0,38** 0,25 _
0,36* 0,20 0,29* 0,25 0,23 _
Tarefas de casa 0,32* 0,37** 0,58** -0,0 0,28* 0,26 _
Psicol. Argum. 2013 abr./jun., 31(73), 237-246
Bossardi, C. N., Gomes, L. B., Vieira, M. L., & Crepaldi M. A.244
a maior participação paterna indicada pelos pes-
quisadores. O estudo evidencia que o pai se engaja
-
esperadas conforme a literatura como disciplina e
-
nais do pai.
Considerações finais
-
conceitos e atribuições que envolvem a maternidade,
a paternidade e, consequentemente, a família e seu
papel no desenvolvimento infantil. Os estudos empre-
-
tribuíram para o reconhecimento da importância da
instrumentos desenvolvidos e validados a partir de
amostras de mães, e este fato, indubitavelmente,
compromete os resultados encontrados. Portanto,
-
2009). Os autores ressaltam ainda a importância de
trabalhos com a abordagem quantitativa, visto que
-
avaliação do envolvimento paterno inclui também
-
ções familiares existentes na atualidade, apesar da
relevância das pesquisas com famílias biparentais,
estudos que abordem o envolvimento paterno no
caso de famílias monoparentais, separadas ou di-
-
cias do envolvimento do pai para a criança precisam
ser distinguidas dos efeitos de outras característi-
cas paternas. O envolvimento tem efeitos diretos e
-
doras, na relação com a mãe e irmãos da criança, e
na relação da criança com seus pares.
É relevante, ainda, considerar nas pesquisas so-
bre a participação paterna, o estudo com famílias
biparentais com o objetivo de comparar o engaja-
mento paterno com o materno e, assim, explorar
2004), não apresentou um escore expressivo; ela
aparece relacionada a jogos físicos, que foi a ter-
ceira dimensão mais pontuada pelos pais. Supõe-
se que os itens referidos nos jogos físicos sejam
mais representativos das atividades do pai com o
filho do que os itens que compõem a dimensão
parece desempenhar papel expressivo na con-
tribuição para o ajustamento social, abertura ao
mundo, especialmente relacionada à autonomia e
controle do risco, assertividade, graduação da rai-
va em relações sociais com pares e desempenho
acadêmico. O pai favorece a abertura ao mundo
já que incentiva a criança a ir mais longe em sua
exploração e esta aprende a lidar com ameaças e a
estranhar seu ambiente (Paquette, 2004).
O engajamento paterno vem aumentando gra-
crescimento ainda não é grande em termos abso-
lutos, o que indica que o pai está distante de uma
paridade com a mãe. Em comparação com a parti-
cipação da mãe, autores concluem que, mesmo com
seus esforços e com o reconhecimento da sua maior
-
da não se iguala e não substitui as funções da mãe
(Borsa & Nunes, 2010; Staudt & Wagner, 2008).
Nesse sentido, o engajamento paterno pode variar,
não sendo exercido da mesma forma em todos os lu-
-
reconhecem que o nível de compromisso paterno
resulta da interação dinâmica de fatores como as ca-
(relacionamento com as mães) e social.
do pai, renda, escolaridade e jornada de trabalho.
Neste estudo as variáveis como idade, escolaridade
quando correlacionadas com o envolvimento pa-
terno, o que pode ser explicado pelo fato de que os
participantes possuíam, em média, uma faixa sala-
rial alta e maiores níveis de escolaridade, não sendo
possíveis outras formas de comparação.
Psicol. Argum. 2013 abr./jun., 31(73), 237-246
Engajamento paterno no cuidado a crianças de 4 a 6 anos 245
gement paternel, un concept aux multiples facettes.
Em La paternité au XXI sièle
Fleck, A. C., & Wagner, A. (2003). A mulher como a prin-A mulher como a prin-
cipal provedora do sustento econômico familiar.
Psicologia em Estudo, 8(n. esp), 31-38.
responsabilidade social do homem no papel de pro-
vedor. Revista Saúde Pública, 43(1), 85-90.
O desvelar da paternidade em uma família contempo-
rânea. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 20(2), 119-125.
Hewlett, B. S. (1992). Father-child relations: Cultural and
biosocial contexts
Jablonski, B. (2010). A divisão de tarefas domésticas en-
tre homens e mulheres no cotidiano do casamento.
, 30(2), 262-275.
(1985). Paternal behavior in humans. American
Zoologist, 25, 883-894.
The role of the father in child
development. New York: John Wiley & Sons.
Nós
estamos grávidos.
Construção e validação da Escala de Crenças
Parentais e Práticas de Cuidado (E-CPPC) na primei-
ra infância. Psico-USF, 15(1), 23-34.
Bouchard, C. (2000). A new typology of fathering:
Infant and Child
Development, 9
-
ship: mechanisms and developmental outcomes.
Human Development, 47(4), 193-219.
Parke, R. S. (1996). Fatherhood
Novos arranjos fa-
miliares: paternidade, parentalidade e relações de
gênero sob o olhar de mulheres chefes de família.
Psicologia Clinica, 19(2), 57-69.
melhor as variáveis que podem apresentar relações
com o engajamento e também saber como as famí-
que se apresentam delineadas no cenário socioeco-
nômico brasileiro. Salienta-se também a necessida-
de de ampliar a amostra e a diversidade de contex-
tos de estudo.
Embora em pesquisas recentes o engajamento
crescimento quantitativo quando comparado aos
resultados advindos das mães, existe um maior de-
sejo de participação por parte do pai na criação de
de paternagem, cujas características estão mais as-
& Piccinini, 2007).
Este estudo permitiu evidenciar que, de fato,
apresenta variações no nível de engajamento, de
-
cipam em maior grau, por exemplo, de atividades de
suporte emocional e disciplina do que de cuidados
básicos e tarefas de casa.
Referências
-
tre a intenção e o gesto. Revista Brasileira de Ciências
Sociais, 21(62), 45-68.
Bandeira, T. T. A. (2009). Crenças sobre investimento pa-
rental
Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro.
(2005). O cuidado parental e o papel do pai no con-
Temas pertinentes
. (pp. 191-
230). Belém-Pará: UFPA.
da parentalidade: O papel de homens e mulheres na fa-
mília nuclear. Psicologia Argumento, 29(64), 31-39.
& Abreu, S. R. (2006). A participação do pai nos cui-
dados da criança, segundo a concepção de mães.
Psicologia em Estudo, 11(3), 579-587.
Psicol. Argum. 2013 abr./jun., 31(73), 237-246
Bossardi, C. N., Gomes, L. B., Vieira, M. L., & Crepaldi M. A.246
Staudt, A. C. P., & Wagner, A. (2008). Paternidade em tem-
pos de mudança. Psicologia: Teoria e Prática, 10(1),
174-185.
(2009). Cuidado e responsividade parentais: uma
Teoria do Investimento Parental.
Otta. (Org.). Psicologia evolucionista. (pp. 86-95). Rio
Correspondence between maternal and paternal
parenting styles in early childhood. Early Childhood
Research Quarterly, 20, 1-12.
Pleck, J. H., & Pleck, E. H. (1997). Fatherhood ideals in the
The role of the father in child development. (pp. 33-
48). New York: John Wiley & Sons.
Saraff, A., & Srivastava, H. C. (2009). Pattern and determi-
nants of paternal involvement in childcare: An empir-
ical investigation in a metropolis of India. Population
Research and Policy Review, 29(2), 249-273.
Psicologia do desenvolvimento: Infância
a paternidade e o envolvimento paterno: um estudo
qualitativo. Estudos de Psicologia, 24(4), 561-573.