ArticlePDF Available

A malacofauna fóssil da Bacia de Itaboraí, Rio de Janeiro: histórico dos estudos e perspectivas para o futuro

Authors:
Revista da Biologia (2013) 11(2): 1–6
DOI: 10.7594/revbio.11.02.01
A malacofauna fóssil da Bacia de Itaboraí,
Rio de Janeiro: histórico dos estudos e
perspectivas para o futuro
The fossil mollusks of Itaboraí Basin, Rio de Janeiro: historical review and
future prospects
Rodrigo Brincalepe Salvador1,2* e Luiz Ricardo Lopes de Simone3
1Staatliches Museum für Naturkunde Stuttgart; Stuttgart, Alemanha
2Mathematisch-Naturwissenschaftliche Fakultät, Eberhard Karls Universität Tübingen; Tübingen, Alemanha
3Museu de Zoologia da Universidade de São Paulo; São Paulo, SP, Brasil
Recebido 17dez12
Aceito 30jul2013
Publicado 23jan14
Resumo. Os calcários da Bacia de Itaboraí (Paleoceno Médio) guardam um registro fóssil riquíssimo,
composto principalmente por mamíferos e gastrópodes pulmonados, mas também contando com
aves, répteis, anfíbios e vegetais. Esses fósseis começaram a ser estudados na década de 1930, com o
início da exploração do calcário para a produção de cimento, e muitos mais foram descobertos durante
as décadas seguintes, até a bacia ser abandonada com o nal das atividades da pedreira nos anos 80.
Só recentemente o estudo desses fósseis foi retomado. Apesar da extensa pesquisa, o conhecimento
sobre a fauna fóssil de Itaboraí permanece incompleto, não indo muito além das descrições originais
das espécies.
Palavras-chave. Gastropoda; Mollusca; Paleoceno Médio; Pulmonata; Terciário.
Abstract. The limestones of Itaboraí Basin (Middle Paleocene) harbors a rich fossil record, mainly of
mammals and pulmonate gastropods, but also containing birds, reptiles, amphibians and plants. The
studies started in the 1930’s, with the beginning of limestone extraction for cement production. Many
new fossils were discovered in the next decades until the end of the quarry’s activity in the 1980’s, when
the basin was abandoned. Only recently the studies have started again. Despite the extensive research,
the knowledge of Itaboraí’s fossil fauna still remains largely incomplete, not venturing much beyond
the species’ original description.
Keywords. Gastropoda; Middle Paleocene; Mollusca; Pulmonata; Tertiary.
Contato do autor: salvador.rodrigo.b@gmail.com
Revisão
A Bacia de São José de Itaboraí, ou simplesmente Bacia de
Itaboraí, localiza-se no estado do Rio de Janeiro (Fig. 1). É
uma das menores bacias do Brasil, mas, apesar do tama-
nho, apresenta um rico registro fóssil do Paleoceno (início
do período Terciário). Sua riqueza fossilífera, entretanto,
cou em segundo plano em relação a outro tipo de rique-
za: após a descoberta de rochas calcárias de bom grau de
pureza, a bacia começou a ser explorada pela Companhia
Nacional de Cimento Portland Mauá. Durante as escava-
ções, muitos fósseis foram encontrados (notavelmente, os
primeiros foram os moluscos) e estudados principalmente
pelos pesquisadores de duas instituições do Rio de Janei-
ro: o Museu Nacional e a Divisão de Geologia e Minera-
logia do DNPM (Departamento Nacional de Produção
Mineral). A exploração do calcário para a produção de
cimento durou cerca de 50 anos (1933 a 1984) e cada vez
que um novo fóssil era encontrado na bacia, menos rochas
restavam para novas descobertas (Rodrigues Francisco e
Cunha, 1978; Bergqvist et al., 2008).
Com o término das escavações, interrompeu-se a
drenagem da água que se acumulava no fundo da bacia
e, desse modo, um lago se formou na depressão, sendo
utilizado atualmente para o abastecimento de água do
município (Bergqvist et al., 2008). Como resultado, hoje
os aoramentos fossilíferos são poucos e de difícil acesso.
Ainda assim, a Bacia de Itaboraí é um sítio paleontológico
muito importante e, portanto, em 1995 foi criado o Parque
Paleontológico de São José de Itaboraí com o intuito de
preservá-lo (Bergqvist et al., 2008).
Os fósseis de Itaboraí
Os fósseis mais estudados da Bacia de Itaboraí são
sem dúvida os mamíferos, com cerca de 40 espécies co-
nhecidas, dentre as quais os marsupiais são os mais diver-
sos, com presença marcante também de ungulados (Ber-
gqvist et al., 2006). Além dos mamíferos, a bacia contém
2
ib.usp.br/revista
Salvador & Simone: Malacofauna fóssil da Bacia de Itaboraí
moluscos, répteis, anfíbios, aves e plantas (Bergqvist et al.,
2006).
A malacofauna fóssil de Itaboraí, isto é, a sua fauna de
moluscos, é muito diversa, sendo inteiramente composta
por pulmonados. A Ordem Pulmonata é um grupo de gas-
trópodes terrestres e de água doce, cuja principal caracte-
rística, como o próprio nome já diz, é a presença de um
“pulmão. Estima-se que existam cerca de 35.000 espécies
de pulmonados, atuais e fósseis, distribuídas pelo mundo
inteiro com exceção da Antártica e representando, portan-
to, a mais bem sucedida “invasão” do ambiente terrestre
pelos moluscos (Solem, 1984; Pearce e Örstan, 2006).
No Brasil, há aproximadamente 700 espécies atu-
ais conhecidas de pulmonados, mas estima-se que exista
pelo menos três vezes esse número (Simone, 2006). O re-
gistro fóssil mundial de Pulmonata é rico, mas no Brasil
ele infelizmente não é muito expressivo: até o momento,
há cerca de 30 espécies conhecidas (Simone e Mezzalira,
1994), sendo que cerca de 20 espécies são de Itaboraí; daí
a importância dessa fauna.
Histórico dos estudos
Os fósseis da Bacia de Itaboraí são de extrema im-
portância no cenário da Paleontologia brasileira e mun-
dial, devido à sua riqueza e diversidade e especialmente
à sua idade paleocênica, sendo um registro “logo após” o
evento de extinção do nal do Cretáceo. Entretanto, apesar
de sua importância, a paleofauna de Itaboraí é em grande
parte desconhecida fora do Brasil, principalmente porque
a maioria dos trabalhos foi publicada em português e em
periódicos nacionais de circulação muito restrita, cenário
esse que só mais recentemente começou a mudar. Assim,
aqui foi resumido o conhecimento sobre a malacofauna da
bacia, apresentado como um histórico dos estudos segui-
do por algumas perspectivas para o futuro.
1928 – 1946: os primeiros estudos
Após a descoberta da Bacia de Itaboraí, logo no iní-
cio das escavações, alguns fósseis de gastrópodes foram
encontrados e três pequenas coleções foram criadas (Ro-
drigues Francisco e Cunha, 1978). A primeira coleção se
extraviou nas dependências do Serviço Geológico e Mine-
ralógico, Rio de Janeiro. A segunda foi enviada à paleon-
tóloga Carlota J. Maury (do American Museum of Natural
History, Nova York, EUA), mas o material precário, com-
posto somente por moldes internos incompletos, permitiu
apenas um breve relato em um artigo lidando com fósseis
do Brasil em geral (Maury, 1929). A terceira coleção, feita
por Alberto R. Lamego, continha espécimes melhores (in-
clusive uma mandíbula crocodiliana) e também foi envia-
da a Maury. Com esses novos fósseis (Fig. 2), foi possível
descrever quatro espécies novas de pulmonados: Brasilen-
nea arethusae, Bulimulus fazendicus, Itaborahia lamegoi
Figura 1. Localização da Bacia de Itaboraí. Adaptado de http://commons.wikimedia.org.
3
Revista da Biologia (2013) 11
ib.usp.br/revista
P R O V A P R O V A P R O V A
e Strophocheilus sanctijosephi, sendo os dois novos gêne-
ros, Brasilennea e Itaborahia, endêmicos da bacia (Maury,
1935). Provavelmente por ser o único trabalho escrito em
inglês, essas quatro espécies foram praticamente as únicas
de Itaboraí que caram conhecidas por paleontólogos do
restante do mundo.
A seguir, Oliveira (1936) publicou uma nota corri-
gindo no trabalho de Maury (1935) dados referentes aos
coletores e fornecendo a localização de espécimes adi-
cionais em coleções de instituições cariocas não mencio-
nados por Maury. Logo depois, veio o primeiro trabalho
lidando com a geologia da bacia (Leinz, 1938), com uma
descrição das sequências de rochas que permanece basi-
camente válida até hoje, recebendo apenas renamentos
posteriores. Uma década depois, Mezzalira (1946) descre-
veu um novo gastrópode, Australorbis itaboraiensis, uma
espécie de água doce, enquanto todas as demais eram ter-
restres. Entretanto, esse gênero foi posteriormente sinoni-
mizado com Biomphalaria (International Commission on
Zoological Nomenclature, 1965) e a espécie passou então
a se chamar Biomphalaria itaboraiensis.
1946 – 1952: os mamíferos e a idade dos calcários
Somente muito tempo após a descoberta dos molus-
cos, os primeiros mamíferos e restos vegetais foram en-
contrados em Itaboraí (Price e Paula Couto, 1946a, 1946b;
Simpson, 1947; Magalhães, 1948). Transcorrido mais al-
guns anos, a descoberta de mais mamíferos permitiram
a datação dos calcários da bacia. A idade que autores an-
teriores sugeriam para a bacia era muito variável, indo
desde o Cretáceo Superior até o Plioceno, dependendo do
enfoque dado por cada um (para uma lista completa, ver
Bergqvist et al., 2006). Enm, Paula Couto (1952) correla-
cionou a fauna de mamíferos de Itaboraí com a do Grupo
Rio Chico da Argentina, estabelecendo a idade Paleocêni-
ca. Essa idade está hoje bem estabelecida: Bergqvist et al.
(2006) propões uma idade entre 59 e 57 Ma (milhões de
anos) para essas rochas, chamando esse intervalo de tem-
po informalmente de “Paleoceno Médio”.
1953 – 1990: os microgastrópodes e outras des-
cobertas
A próxima espécie de Pulmonata descoberta foi
Clausilia magalhaesi, um registro interessante da família
Clausiliidae (Trindade, 1953). Trindade (1956) descreveu
Brasilennea arethusae var. minor, uma variedade peque-
na da espécie, que posteriormente Brito (1967) elevou à
categoria de espécie, resultando no binômio Brasilennea
minor. Além disso, Brito (1967) descreveu também duas
espécies novas, Carinifex uminensis e Bulimulus carva-
lhoi, além de colocar o gênero Itaborahia em sinonímia
com Bulimulus. Klappenbach e Olazarri (1970) descreve-
ram o novo gênero fóssil Eoborus para alocar os Stropho-
cheilidae fósseis do Brasil, Uruguai e Argentina; assim, a
espécie Strophocheilus sanctijosephi de Itaboraí passou a
ser Eoborus sanctijosephi.
A partir da década de 1970, o processo de tamisa-
gem (isto é, a separação de objetos diminutos através de
uma peneira) passou a ser utilizado nas coletas, resultan-
do na descoberta de microgastrópodes. Ferreira e Coelho
(1971) descreveram novas espécies dessa fauna diminuta
(Carychium sommeri e Vertigo mezzalirai), assim como
outras novas espécies maiores: Brachypodella britoi, Buli-
mulus trindadeae e Strobilopsis mauryae. A seguir, Palma e
Brito (1974) descreveram as novas espécies Bulimulus fer-
reirai e Bulimulus sommeri, além de transferirem Carinifex
uminensis para o gênero Vorticifex. Finalmente, Ferreira
e Coelho (1989) descreveram a nova espécie Austrodiscus
lopesi. Além dos moluscos, diversos outros fósseis eram
descobertos conforme a extração de calcário prosseguia,
dentre eles anfíbios (Estes, 1972), palinomorfos (Curvello,
1981; Lima e Cunha, 1986), aves (Alvarenga, 1983) e ser-
pentes (Albino, 1990). Em 1984, a extração do calcário
cessa e a bacia é abandonada (Bergqvist et al., 2008).
1999: atualização da geologia da bacia
Após quase uma década sem novidades, surge uma
excelente atualização do perl geológico da bacia (Medei-
ros e Bergqvist, 1999). Essas autoras deniram três sequ-
ências estratigrácas na bacia, correspondentes às sequên-
cias indicadas por Leinz (1938). Para o presente trabalho,
Figura 2. As primeiras espécies encontradas em Itaboraí. A.
Brasilennea arethusae (altura da concha: 21 mm). B. Bulimulus
fazendicus (16,5 mm). C. Eoborus sanctijosephi (44,5 mm). D.
Itaborahia lamegoi (30 mm).
4
ib.usp.br/revista
Salvador & Simone: Malacofauna fóssil da Bacia de Itaboraí
interessam apenas as duas sequências paleocênicas, deno-
minadas S1 e S2. A sequência S1 é a inferior, ou seja, a mais
antiga, e é composta por rochas carbonáticas de origem
química (relacionadas à atividade hidrotermal da bacia) e
terrígena (resultado de uxos gravitacionais que traziam
sedimentos para dentro da bacia). Os calcários cinzentos
desta sequência contêm todas as espécies de pulmonados
conhecidas na bacia, assim como alguns restos de plantas,
mamíferos e répteis. Após a deposição de S1, formaram-se
ssuras nessa camada por dissolução da rocha. Sedimen-
tos terrígenos foram transportados para dentro da bacia
por uxos gravitacionais e preencheram essas ssuras.
Tais sedimentos deram origem à sequência S2, de idade
mais jovem, onde se encontra a grande maioria dos fósseis
da bacia, notavelmente os diversos mamíferos. Algumas
espécies de pulmonados aparentemente também eram
encontradas em S2, mas tais fósseis provavelmente per-
tenciam a S1 e foram secundariamente incluídos em S2
(Ferreira e Coelho, 1971; Rodrigues Francisco e Cunha,
1978; Bergqvist et al., 2006; Salvador e Simone, 2013).
2003 – presente: retomada dos estudos
Ribeiro (2003) apresentou mudanças na classica-
ção de algumas espécies de pulmonados, mas sem indicar
a razão para tal; ela revalidou o gênero Itaborahia, transfe-
rindo para ele as espécies Bulimulus lamegoi, B. carvalhoi,
B. trindadeae e B. coelhoi, além de estabelecer a sinonímia
entre Bulimulus fazendicus e B. ferreirai. Entretanto, como
esse trabalho é um resumo de congresso, seus atos nomen-
claturais não têm validade ocial de acordo com o ICZN,
o Código Internacional de Nomenclatura Zoológica (In-
ternational Commission on Zoological Nomenclature,
1999). A seguir, é publicado o livro de Bergqvist et al.
(2006), um relato bastante completo dos estudos sobre
Itaboraí. Interessantemente, esses autores aceitaram as
mudanças na nomenclatura dos moluscos propostas por
Ribeiro (2003), tornando-as válidas segundo o ICZN.
Após esse trabalho, as pesquisas foram sendo reto-
madas. Inicialmente, isso se deu de forma mais tímida,
como o relato sobre icnofósseis de Souto (2007) e a brevís-
sima revisão bibliográca sobre a malacofauna de Rodri-
gues e Fonseca (2007), que inclusive rejeitou as mudanças
nomenclaturais feitas por Ribeiro (2003). Entretanto, mais
recentemente estudos sobre Itaboraí começaram a reapa-
recer em congressos, em dissertações de pós-graduação, e
em artigos publicados em periódicos nacionais e interna-
cionais, lidando tanto com os moluscos (Salvador, 2011;
Salvador e Simone, 2011a, 2011b; Salvador et al., 2011;
Salvador e Simone, 2012, 2013) quanto com os mamífe-
ros (Bergqvist e Tinoco, 2011; Castro et al., 2011; Aquino,
2012) e palinomorfos (Abranches et al., 2011). Isso não só
indica que as pesquisas sobre Itaboraí estão retornando,
mas também que estão começando a explorar novos ca-
minhos. Até então, os trabalhos sobre a bacia haviam li-
dado somente com as descrições das espécies e a geologia,
com pouquíssimos comentários sobre seu paleoambiente.
Já com os trabalhos recentes, além da taxonomia, tópicos
como paleoecologia, paleobiogeograa e paleoambiente,
começaram a ser abordados mais diretamente.
Esses últimos trabalhos obviamente trouxeram
novidades para a malacofauna de Itaboraí. Salvador et
al. (2011) revisaram o gênero Brasilennea e sua aloca-
ção anterior na família Streptaxidae, julgando que esses
fósseis pertencem na verdade à família Cerionidae. Essa
mudança é de grande signicado biogeográco, uma vez
que é um registro muito distante da distribuição atual da
família (Ilhas do Caribe), e paleoecológico, uma vez que
os estreptaxídeos são tipicamente carnívoros enquanto os
cerionídeos são herbívoros. Já Salvador e Simone (2012)
descreveram duas espécies novas, Brasilennea guttula e
Eoborus rotundus, encontradas na coleção do Museu de
Ciências da Terra, no Rio de Janeiro, além de relatarem
um novo registro da espécie Plagiodontes a. dentatus
para a bacia, conhecida desde o Mioceno até o Recente,
na Argentina e Uruguai. Além disso, esse trabalho ressalta
o importante papel das coleções de museus não só na ma-
GASTROPODA: PULMONATA
CERIONIDAE
Brasilennea arethusae Maury, 1935
Brasilennea guttula Salvador & Simone, 2013
Brasilennea minor Trindade, 1956
CHAROPIDAE
Austrodiscus lopesi Ferreira & Coelho, 1989
CLAUSILIIDAE
Temesa magalhaesi (Trindade, 1953)
FERUSSACIIDAE
Cecilioides sommeri (Ferreira & Coelho, 1971)
GASTROCOPTIDAE
Gastrocopta itaboraiensis Salvador & Simone, 2013
Gastrocopta mezzalirai (Ferreira & Coelho, 1971)
ORTHALICIDAE
Bulimulus fazendicus Maury, 1935
Bulimulus trindadeae Ferreira & Coelho, 1971
Cortana carvalhoi (Brito, 1967)
Cyclodontina coelhoi (Palma & Brito, 1974)
Leiostracus ferreirai (Palma & Brito, 1974)
Itaborahia lamegoi Maury, 1935
Plagiodontes a. dentatus (Wood, 1828)
PLANORBIDAE
Biomphalaria itaboraiensis (Mezzalira, 1946)
STROPHOCHEILIDAE
Eoborus fusiforme Salvador & Simone, 2013
Eoborus rotundus Salvador & Simone, 2012
Eoborus sanctijosephi (Maury, 1935)
UROCOPTIDAE
Brachypodellabritoi Ferreira & Coelho, 1971
Tabela 1. Classicação atual das espécies de pulmonados fósseis
da Bacia de Itaboraí, de acordo com Salvador e Simone (2013).
5
Revista da Biologia (2013) 11
ib.usp.br/revista
P R O V A P R O V A P R O V A
nutenção do conhecimento passado, mas também como
fonte de novas descobertas.
Finalmente, o trabalho de Salvador e Simone (2013)
revisou toda a fauna de moluscos da bacia, trazendo di-
versas mudanças (Tabela 1): o gênero Itaborahia foi reva-
lidado, contando apenas com sua espécie-tipo, I. lamegoi;
Bulimulus sommeri foi considerada sinônimo de I. lame-
goi; Strobilops mauryae foi considerada sinônimo de Bra-
silennea arethusae; Vorticifex uminensis foi considerada
sinônimo de Eoborus sanctijosephi; Clausilia magalhaesi
foi transferida para o gênero Tem e s a; Vertigo mezzalirai foi
transferida para Gastrocopta; Bulimulus coelhoi foi transfe-
rida para Cyclodontina; Bulimulus ferreirai foi transferida
para Leiostracus; Carychium sommeri (família Ellobiidae)
foi transferida para Cecilioides (família Ferussaciidae); e,
nalmente, a classicação da espécie Brachypodella britoi
nesse gênero é posta em dúvida. Além disso, foram descri-
tos um novo gênero, Cortana, para alocar a espécie previa-
mente classicada como Bulimulus carvalhoi, e duas novas
espécies Eoborus fusiforme e Gastrocopta itaboraiensis, en-
contradas nas coleções dos museus cariocas. Finalmente,
o estudo também apontou que a Bacia de Itaboraí possui
os registros fósseis mais antigos das famílias Ferussacii-
dae, Gastrocoptidae, Orthalicidae e Strophocheilidae.
Perspectivas para estudos futuros
A maioria dos fósseis de Itaboraí conta apenas com
sua descrição original. O primeiro passo é sem dúvida re-
visar essa fauna (e ora), algo que acaba de ser feito no caso
dos moluscos (Salvador e Simone, 2013), mas que ainda é
necessário para o restante. Além disso, os fósseis da bacia
têm grande potencial para estudos paleobiogeográcos,
algo até agora abordado apenas de maneira muito breve e
supercial (Simpson, 1971; Salvador e Simone, 2013). Fi-
nalmente, a exuberante fauna da bacia incita em especial
trabalhos sobre seu paleoambiente e paleoecologia, uma
área na qual os mamíferos certamente teriam grande des-
taque, como mostra Aquino (2012). Enm, muito ainda
pode ser feito com os importantes fósseis de Itaboraí e,
portanto, espera-se que essa nova leva de trabalhos sejam
apenas os primeiros de muitos.
Agradecimentos
A Marcelo V. Fukuda (IB-USP) e um revisor anônimo, pe-
los comentários e sugestões. A CAPES, pela concessão da
bolsa (CAPES PROAP-2010; Programa de Pós-Graduação
em Zoologia do Departamento de Zoologia, IB-USP) a
R.B.S.
Referências
Abranches CTS, Garcia MJ, Bergqvist LP, Aquino B. 2011.
Novos achados palinológicos na Bacia de Itaboraí e sua
contribuição para o entendimento da dieta de alguns
mamíferos paleocênicos. XXII Congresso Brasileiro de
Paleontologia: 330-332.
Albino AM. 1990. Las serpientes de São José de Itaboraí (Edad
Itaboraiense, Paleoceno Medio), Brasil. Ameghiniana
27(3-4): 337-342.
Alvarenga HMF. 1983. Uma ave Ratitae do Paleoceno brasileiro:
Bacia calcária de Itaboraí, Estado do Rio de Janeiro,
Brasil. Boletim do Museu Nacional, Série Geologia 41:
1-11.
Aquino B. 2012. Estudo do desgaste dentário de notoungulados
(Mammalia) da Bacia de São José de Itaboraí, Rio de
Janeiro (Itaboraiense). Dissertação de mestrado (inédita).
Rio de Janeiro: Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Bergqvist LP, Tinoco P. 2011. Didelphimorphia da Bacia de S.
J. de Iitaboraí, Rio de Janeiro (Paleoceno): dos dentes ao
corpo. XXII Congresso Brasileiro de Paleontologia: 643-
646.
Bergqvist LP, Mansur K, Rodrigues MA, Rodrigues Francisco
BH, Perez RAR, Beltrão MCMC. 2008. Bacia São José
de Itaboraí, RJ: berço dos mamíferos no Brasil. In: Winge
M, Schobbenhaus C, Souza CRG, Fernandes ACS,
Berbert-Born M, Queiroz ET, editores. Sítios geológicos
e paleontológicos do Brasil. Publicado na Internet: www.
unb.br/ig/sigep/sitio123/sitio123.pdf.
Bergqvist LP, Moreira AL, Pinto DR. 2006. Bacia de São José
de Itaboraí: 75 Anos de História e Ciência. Rio de Janeiro:
Serviço Geológico do Brasil, CPRM.
Brito IM. 1967. Gastrópodos continentais do Paleoceno do
estado do Rio de Janeiro, Brasil. Boletim de Geologia do
Instituto de Geociências da UFRJ 1: 7-28.
Castro LOR, Aquino B, Bergqvist LP. 2011. Análise da
dentição molar de Colbertia magellanica (Mammalia,
Notoungulata), Bacia de Itaboraí, Rio de Janeiro
(Itaboraiense) sob o enfoque do macrodesgaste dentário
e das variabilidades morfológica e biométrica. XXII
Congresso Brasileiro de Paleontologia: 797-799.
Curvello WS. 1981. Esporos de fungos na bacia calcárea de
S. José de Itaboraí, RJ. Anais da Academia Brasileira de
Ciências 53(1): 210.
Estes R. 1972. The rst fossil record of caecilian amphibians.
Nature 239: 228-231.
Ferreira CS, Coelho ACS. 1971. Novos gastrópodes pulmonados
da Bacia calcária de São José de Itaboraí, RJ, Brasil.
Geocronologia. Anais da Academia Brasileira de Ciências
43(supl.): 463-472.
Ferreira CS, Coelho ACS. 1989. Novo gastrópode fossil da
Bacia de São José de Itaboraí, Estado do Rio de Janeiro,
Brasil (Mollusca, Gastropoda, Pulmonata, Endodontidae).
Memórias do Instituto Oswaldo Cruz 84(supl. IV): 193-
195.
International Commission on Zoological Nomenclature
(ICZN). 1965. Opinion 735. Biomphalaria Preston
1910 (Gastropoda): grant under the plenary powers of
precedence over Planorbina Haldeman, 1842, Taphius H.
& A. Adams, 1855, and Armigerus Clessin, 1884. Bulletin
of Zoological Nomenclature 22(pt. 2): 9499.
International Commission on Zoological Nomenclature. 1999.
International Code of Zoolgical Nomenclature, Fourth
Edition. Londres: The International Trust for Zoological
Nomenclature.
Klappenbach MA, Olazarri J. 1970. Notas sobre Strophocheilidae
(Moll. Gastr.), III. Eoborus, nuevo género para especies
fósiles de esta familia sudamericana. Archiv für
Molluskenkunde 100(3/4): 179-182.
Lima MR, Cunha FLS. 1986. Análise palinológica de um nível
linhítico da Bacia de São José de Itaboraí, Terciário do
Estado do Rio de Janeiro, Brasil. Anais da Academia
Brasileira de Ciências 58(4): 580-588.
Leinz V. 1938. Os calcareos de São José, Niteroi, Estado do Rio.
Mineração e Metalurgia 3(15): 153-155.
6
ib.usp.br/revista
Salvador & Simone: Malacofauna fóssil da Bacia de Itaboraí
Magalhães J. 1948. Sôbre a ocorrência de vegetal fóssil na
Fazenda São José, Mun. De Guaxindiba, R.J. Mineração e
Metalurgia 13(75): 194.
Maury CJ. 1929. Novas coleções paleontológicas do Serviço
Geológico do Brasil. Boletim do Serviço Geológico e
Mineralógico do Brasil 33: 1-23.
Maury CJ. 1935. New genera and new species of fossil terrestrial
Mollusca from Brazil. American Museum Novitates 764:
1-15.
Medeiros RA, Bergqvist LP. 1999. Paleocene of the São José de
Itaboraí Basin, Rio de Janeiro, Brazil: lithostratigraphy
and biostratigraphy. Acta Geologica Leopoldensia 22(48):
3-22.
Mezzalira S. 1946. Australorbis itaboraiensis n. sp. Revista do
Instituto Geológico e Geográco 4(2): 158-160.
Oliveira E. 1936. Molluscos fosseis de Iporanga e Itaborahy.
Notas Preliminares e Estudos do DNPM 15: 4-6.
Palma JMC, Brito IM. 1974. Paleontologia e estratigraa da Bacia
de São José de Itaboraí, Rio de Janeiro. Anais da Academia
Brasileira de Ciências 46(3/4): 383-406.
Paula Couto C. 1952. Fossil mammals from the beginning of
the Cenozoic in Brazil - Marsupialia: Polydolopidae and
Borhyaenidae. American Museum Novitates 1559: 1-27.
Pearce TA, Örstan A. 2006. Terrestrial Gastropoda. In: Sturm,
CF, Pearce TA, Valdés A, editores. e mollusks: a guide
to their study, collection, and preservation. Pittsburgh:
American Malacological Society 261-285.
Price LI, Paula Couto C. 1946a. Vertebrados fósseis do Eoceno
Inferior de Itaboraí. Notas Preliminares e Estudos do
DNPM 31: 1-3.
Price LI, Paula Couto C. 1946b. Vertebrados terrestres do Eoceno
na bacia calcária de Itaboraí. Mineração e Metalurgia
11(64): 212-213.
Ribeiro AMC. 2003. A família Bulimulidae (Gastropoda-
Pulmonata) na Bacia de São José de Itaboraí, Paleoceno do
Estado do Rio de Janeiro. XVIII Congresso Brasileiro de
Paleontologia: 232.
Rodrigues VMC, Fonseca VMM. 2007. O estado da arte de
taxonomia dos gastrópodes (Pulmonata) do Paleoceno da
Bacia de São José de Itaboraí, Estado do Rio de Janeiro.
Anuário do Instituto de Geociências 30: 253.
Rodrigues Francisco BH, Cunha FLS. 1978. Geologia e
estratigraa da Bacia de São José, Município de Itaboraí,
RJ. Anais da Academia Brasileira de Ciências 50(3): 381-
416.
Salvador RB. 2011. Revisão taxonômica da malacofauna fóssil da
Bacia de Itaboraí (Paleoceno), Rio de Janeiro. Dissertação
de mestrado (inédita). São Paulo: Universidade de São
Paulo.
Salvador RB e Simone LRL. 2011a. Distribuição geográca
das famílias Cerionidae e Urocoptidae (Gastropoda,
Pulmonata) com vistas ao seu registro fóssil. XXII
Encontro Brasileiro de Malacologia: 249.
Salvador RB, Simone LRL. 2011b. e importance of Itaboraí
Basin (paleocene) as the home to early records of many
pulmonate snail families. XXII Congresso Brasileiro de
Paleontologia: 521-524.
Salvador RB, Simone LRL. 2012. New fossil pulmonate snails
from Itaboraí Basin, Paleocene, Brazil. Archiv für
Molluskenkunde 141(1): 43-50.
Salvador RB, Simone LRL. 2013. Taxonomic revision of the fossil
pulmonate mollusks of Itaboraí Basin (Paleocene), Brazil.
Papéis Avulsos de Zoologia 53(2): 5-46.
Salvador RB, Rowson B, Simone LRL. 2011. Rewriting the
fossil history of Cerionidae (Gastropoda, Pulmonata):
new family assignment of the Brazilian Paleocene genus
Brasilennea Maury, 1935. Journal of Molluscan Studies
77(4): 445-447
Simone LRL. 2006. Land and Freshwater Mollusca of Brazil. São
Paulo: EGB, Fapesp.
Simone LRL, Mezzalira S. 1994. Fossil Molluscs of Brazil.
Boletim do Instituto Geológico 11: 1-202.
Simpson GG. 1947. A new Eocene marsupial from Brazil.
American Museum Novitates 1357: 1-7.
Simpson GG. 1971. e evolution of marsupials in South
America. Anais da Academia Brasileira de Ciências
43(supl.): 103-118.
Solem A. 1984. A world model of land snail diversity and
abundance. In: Solem A, van Bruggen, AC, editors. World-
wide snails: biogeographical studies on non-marine
Mollusca. Leiden: E.J. Brill 6-22.
Souto, PRF. 2007. Os coprólitos da Bacia de São José de
Itaboraí, Estado do Rio de Janeiro, Brasil. In: Carvalho,
IS. Paleontologia: Cenários da Vida, Vol. 1. Rio de Janeiro:
Interciência p811-818.
Trindade NM. 1953. Contribuição à paleontologia de São José
de Itaboraí, Estado do Rio de Janeiro. Revista Cientíca
4(3/4): 37-46.
Trindade NM. 1956. Contribuição ao estudo da malacofauna
da São José de Itaboraí, Estado do Rio de Janeiro. Notas
Preliminares e Estudos do DNPM 96: 1-22.
... Literature: or, original description; f, figured specimen. Institutions: AMNH, American Museum of Na- tural History (New York, USA); ANSP, Academy of Natu- ral Sciences of Philadelphia (Philadelphia, USA); CMNH, Carnegie Museum of Natural History (Pittsburgh, USA); CNP-PIIC, Centro Nacional Patagónico, Paleontología de Invertebrados e Icnología (Puerto Madryn, Argentina); DGM, Divisão de Geologia e Mineralogia do DepartamentoLiterature: Mezzalira 1946 (or, f);Paula couto 1949Paula couto , 1953trindade 1956a, 1956bBrito 1967 (f);ferreira & coelho 1971;ferreira 1974;PalMa & Brito 1974 (f);siMone & Mezzalira 1994 (f);Medeiros & Bergqvist 1999;Bergqvist et al. 2006 (f);rodrigues & fonseca 2007;salvador & siMone 2013asalvador & siMone , 2013b. Fig. 1. ...
... Dimensions: H 2.5, D 1.5, W 6. 1974;siMone & Mezzalira 1994 (f); Medeiros & Bergqvist 1999;Bergqvist et al. 2006 (f);rodrigues & fonseca 2007;salvador & siMone 2013asalvador & siMone , 2013b (f). ...
... References: ferreira & coelho 1971 (or, f); PalMa & Brito 1974;Breure 1979;siMone & Mezzalira 1994 (f);Medeiros & Bergqvist 1999;Bergqvist et al. 2006 (f);rodrigues & fonseca 2007;salvador & siMone 2013asalvador & siMone , 2013b. ...
Article
Full-text available
The South American fossil record of pulmonate gastropods counts with circa 100species from the Cretaceous to the Pliocene. As this knowledge is largely scattered in the literature, we present here a checklist of these fossils, with relevant data about each species’ type locality, stratum and age, and illustrating the type specimens whenever possible. Moreover, some taxonomical problems are highlighted in the hope of garnering attention for future research. © 2018 E. Schweizerbart’sche Verlagsbuchhandlung, Stuttgart, Germany.
Article
Full-text available
In the Late Cretaceous fossil record of Uruguay, three morphotypes of Bulimulus (Bulimulidae) have been recorded: Bulimulus klappenbachi and two undescribed ones. A geometric morphometric analysis was conducted to show whether the three morphotypes represent one or more species. With this aim, the three fossils were compared with three extant species of the same genus: Bulimulus bonariensis, B. guadalupensis and B. rushi. Variability within and among these three well-known extant species was tested to evaluate differences in the fossil morphotypes. Twenty-eight landmarks were selected (9 permanent landmarks and 19 semi-landmarks) and principal component analysis and canonical variate analysis were performed. Results indicate that only one of the unnamed morphotypes can be described as a new species and that the other is a variant of B. klappenbachi. The latter fossil species is described as Bulimulus frenguellii n. sp.