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Enfermagem
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Prática Hospitalar • Ano XVII • Nº 97 • Jan-Fev/2015
Durante a hospitalização, os pacien-
tes são submetidos a diversos pro-
cedimentos invasivos para fins de
diagnóstico e tratamento, deparando-se,
com frequência, com riscos de complicações
associadas ao cuidado da saúde.
Além disso, pacientes com doença em fase
avançada apresentam, geralmente, desnutri-
ção calórica e proteica e requerem intervenção
nutricional e medicamentosa. Por conseguin-
te, há a necessidade de sonda enteral com a
finalidade de garantir as necessidades nutri-
cionais diárias e de favorecer a administração
segura dos medicamentos.
Todavia, estudos revelam que pacientes
em uso dessas sondas são vulneráveis aos
eventos adversos, e que as diretrizes de
enfermagem voltadas para o manuseio das
sondas para alimentação não são baseadas
em evidências científicas, mas em rituais e
em opiniões de especialistas.
(1-5)
Nos Estados Unidos, por ano, cerca de um
milhão de sondas são introduzidas em adul-
tos e crianças, e os erros associados ao mau
posicionamento desses tubos são comuns.
Embora seja considerado um procedimento
relativamente inócuo, o posicionamento ina-
dequado da sonda pode causar complicações
graves e até fatais.
(1-6)
A realização da ausculta abdominal e
a verificação do pH do conteúdo gástrico
aspirado, por exemplo,
são técnicas comuns
adotadas pela equipe
de enfermagem com o
propósito de confirmar
o seu adequado posi-
cionamento. No entanto,
elas são consideradas
inconclusivas
(5)
e estão
relacionadas a falsos po-
sitivos, mesmo quando
localizadas na traqueia.
(7)
Estudos revelam que é comum o posiciona-
mento inadvertido da sonda para alimentação
no trato respiratório, resultando em bronco-
-aspiração e pneumotórax, expondo pacien-
tes vulneráveis a riscos significativos.
(2-8,9)
A aspiração pulmonar ocorre em 2% a 10%
dos pacientes em uso dessas sondas, o que
requer dos profissionais monitoração rotineira
e adoção de estratégias voltadas para a segu-
rança dos pacientes.
(10,11)
Outros eventos adversos também foram
identificados nessas pesquisas, tais como,
saída não programada da sonda, obstrução do
Manuseio de Sonda Enteral:
uma Revisão Integrativa
da Literatura
Dra. Fernanda Raphael Escobar Gimenes1 • Renata Karina Reis2
Dra. Fernanda Raphael
Escobar Gimenes (à esq.) e
Renata Karina Reis.
1 - Doutora em Enfermagem, Docente da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da
Universidade de São Paulo – Centro Colaborador da OMS para o Desenvolvimento da
Pesquisa em Enfermagem. Ribeirão Preto-SP. COREN-SP 118.290.
2 - Doutora em Enfermagem, Docente da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da
Universidade de São Paulo – Centro Colaborador da OMS para o Desenvolvimento da
Pesquisa em Enfermagem. Ribeirão Preto-SP. COREN-SP 100.789.
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tubo e conexão da sonda em via errada,
tal como a intravenosa. A concepção
destes dispositivos é tal que é possível
infundir dietas e/ou medicamentos atra-
vés de uma via não desejada.
(12-14)
Diante deste cenário, percebe-se a
necessidade do enfermeiro empregar
todo o seu repertório de conhecimentos
e de competências para proporcionar
um cuidado seguro e de qualidade, visto
que o número de pessoas acometidas
por doenças crônicas têm aumentado
significativamente em todo o mundo,
assim como no Brasil.
(15,16)
No entanto,
percebe-se uma lacuna no conhecimen-
to voltado para o manuseio seguro de
sondas para alimentação, especialmente
nos hospitais brasileiros.
Logo, o objetivo deste estudo foi
analisar a produção científica sobre o
manuseio de sondas para alimentação
divulgada por enfermeiros brasileiros.
MÉTODOS
Estudo descritivo e exploratório rea-
lizado por meio da revisão integrativa
da literatura. Este método de pesquisa
permite a incorporação de evidências na
prática clínica, pois possibilita a síntese
do conhecimento produzido sobre um
determinado tema, além de apontar para
as lacunas que podem ser resolvidas a
partir de estudos futuros.
(17)
Nesta investigação a pergunta nortea-
dora que guiou a seleção dos artigos
publicados foi: qual o conhecimento
científico produzido por enfermeiros
brasileiros sobre o manuseio de sonda
para alimentação em pacientes com
nutrição enteral?
A seleção dos artigos se deu por
meio de busca nas bases de dados: Li-
teratura Latino-Americana e do Caribe
em Ciências da Saúde (LILACS), Medical
Literature Analysis and Retrieval System
On Line (MEDLINE) e Web of Science.
Os descritores utilizados foram: “tubo
para alimentação”; “nutrição enteral”;
“enfermagem”; e no idioma inglês “tube
feeding”; “enteral nutrition”; e “nursing”.
Os critérios de inclusão propostos
para a seleção dos artigos foram: arti-
gos completos publicados no período
de 2000 a 2012; estudos realizados por
enfermeiros brasileiros que respondes-
sem à pergunta da pesquisa; estudos
realizados com pacientes adultos em
uso de sonda para alimentação por via
nasal ou oral; e artigos publicados nos
idiomas inglês, português e espanhol.
Foram excluídas as revisões bibliográfi-
cas, artigos repetidos, textos provenien-
tes de cartilhas, manuais, monografias,
dissertação e/ou tese.
Identificou-se um total de 3.106 arti-
gos, sendo 601 na base de dados LILACS;
2.003 na MEDLINE; e 502 na Web of
Science. Após a leitura exaustiva dos títu-
los e resumos oito estudos responderam
aos critérios de inclusão estabelecidos
para a pesquisa. Destes, dois foram ex-
cluídos por estarem citados em mais de
uma base de dados; e um por se tratar
de artigo produzido por farmacêuticos.
Logo, a amostra foi composta por cinco
artigos, os quais foram lidos na íntegra
e analisados segundo um instrumento
de coleta de dados elaborado pelas
pesquisadoras.
O instrumento contemplava infor-
mações relacionadas à autoria, local de
atuação dos autores, ano de publicação,
metodologia empregada, e principais
resultados obtidos. Identificamos também
o nível de evidência dos estudos segun-
do o sistema de classificação em seis
níveis: Nível I – metanálise de múltiplos
estudos controlados; Nível II – estudos
experimentais individuais; Nível III – es-
tudos quase experimentais, como ensaios
clínicos não randomizados, grupo único,
pré e pós-teste, além de séries temporais
ou caso controle; Nível IV – estudos não
experimentais como pesquisa descritiva,
correlacional e comparativa, com aborda-
gem qualitativa e estudos de caso; Nível
V – dados de avaliação de programas
obtidos de forma sistemática; e Nível
VI – opiniões de especialistas, relatos de
experiência, consensos, regulamentos e
legislações.
(18)
RESULTADOS
Nesta revisão integrativa analisamos
um total de cinco artigos na íntegra, os
quais responderam a questão norteadora
da pesquisa. Identificamos que, apesar
do frequente uso de sondas enterais
para fins de alimentação, hidratação
e administração de medicamentos nos
pacientes atendidos nas instituições de
saúde, poucos são os estudos publicados
por enfermeiros brasileiros.
Os estudos selecionados encontra-
vam-se nos idiomas português, inglês e
espanhol. Dos cinco artigos analisados,
três foram publicados em inglês; e dois
não foram publicados em periódico de
Enfermagem (tabela 1).
Quanto ao delineamento dos estu-
dos, a maioria era do tipo descritivo
(nível IV). Apenas um estudo apresentou
delineamento quase-experimental (nível
III). Há de se considerar, igualmente,
que todos os estudos selecionados
Tabela 1. Distribuição dos artigos publicados por enfermeiros brasileiros no período de
2000 a 2012
Nº Ano
Publicação Idioma Nível de
Evidência Periódico
01 2003 Português IV Rev. Brasileira de Enfermagem
02 2003 Inglês IV Rev. Hosp. Clín. Fac. Med. S. Paulo
03 2007 Inglês III Journal of Clinical Nursing
04 2008 Português IV Cogitare Enfermagem
05 2010 Português/Inglês/Espanhol IV Rev. Latino-Am Enfermagem
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Enfermagem
estavam voltados para os cuidados de
enfermagem a pacientes críticos em uso
de sonda para alimentação (quadro 1).
Os estudos revelam que são fre-
quentes as complicações associadas à
alimentação por sonda e, no geral, os
pacientes não recebem o volume total de
dieta prescrito, independente da técnica
de infusão empregada (intermitente ou
contínua).
(19-20)
Algumas das complicações asso-
ciadas à alimentação por sonda mais
citadas nestes artigos foram: obstrução
da sonda; estase gástrica; distensão
abdominal; deslocamento da sonda;
aspiração traqueobrônquica; vômito;
diarreia; e pneumonia aspirativa.
(9-20-21)
Também citaram as principais interven-
ções de enfermagem necessárias para
evitar tais complicações. Dentre elas,
controlar rigorosamente a velocidade de
infusão da dieta; manter a cabeceira do
leito elevada; e administrar medicamen-
tos pró-cinéticos, conforme prescrição
Quadro 1. Síntese dos artigos incluídos na revisão integrativa
N° Estudo Desenho Sujeitos/Local Assunto Estudado Recomendação/Conclusão
1 Mori S;
Matsuba CST;
Whitaker IW
(23)
Descritivo /
quantitativo
Equipe de enfermagem
de UTI geral
Avaliação do volume
residual gástrico (VRG)
antes da infusão da dieta
e as condutas da equipe
de enfermagem.
Não há consenso em relação ao VRG necessário para a
interrupção da dieta enteral.
Há necessidade de uniformizar as ações da equipe quanto ao
VRG.
Recomenda-se a elaboração de protocolos e diretrizes que
norteiem a prática de enfermagem no suporte nutricional.
2 Serpa LF
et al.
(14)
Estudo prospectivo
controlado
Pacientes críticos de UTI Avaliação dos benefícios
e das complicações
relacionadas à infusão
da dieta enteral contínua
e intermitente, via sonda.
Ambas modalidades de infusão permitiram administração
efetiva da dieta e apresentaram complicações, mas pouco
significativas. Estudos futuros devem ser realizados para
elucidar as diferenças entre as duas modalidades.
N° Estudo Desenho Sujeitos/Local Assunto Estudado Recomendação/Conclusão
3 Matsuba CST,
Gutierréz MGR;
Whitaker IW
(24)
Estudo de
intervenção,
desenho quase-
experimental
Pacientes em UTI geral e
Unidade coronariana
Manutenção da
permeabilidade da
sonda nasoenteral em
pacientes com restrição
de volume de líquidos,
e identificação dos
fatores associados
à permeabilidade da
sonda.
A redução do fluxo da solução enteral esteve associada com
a obstrução da sonda, detectada pelo alarme da bomba de
infusão.
A implementação de protocolo sistematizado, em conjunto
com equipe de enfermagem treinada, reduziu os índices de
obstrução das sondas.
Necessidade de ensaios clínicos para avaliar a relação entre os
diferentes diâmetros das sondas e o volume de água ideal para
mantê-las desobstruídas, e a frequência de lavagem da sonda.
N° Estudo Desenho Sujeitos/Local Assunto Estudado Recomendação/Conclusão
4Hermann AP;
Cruz EDA
(25)
Descritivo /
quantitativo
Equipe de enfermagem
de Unidade
semi-intensiva
Observação da
prática assistencial de
enfermagem a pacientes
com nutrição enteral
(NE), e investigação do
conhecimento da equipe
sobre NE, e elaboração
de material educativo.
Não houve uniformidade das respostas quanto às condutas
relacionadas à estase gástrica. A equipe de enfermagem
mantém a cabeceira do leito elevada durante a administração
da dieta e os profissionais controlam a velocidade de infusão.
A maioria dos profissionais não verificou o posicionamento
da sonda antes de administrar a dieta. Observou-se ausência
da higienização das mãos e uso de adornos em mãos e
antebraços. Foram verificadas inadequações nos registros
quanto ao procedimento, falhas importantes na comunicação,
na prevenção de complicações, e descompasso entre o
conhecimento referido pela equipe com o observado na prática.
N° Estudo Desenho Sujeitos/Local Assunto Estudado Recomendação/Conclusão
5 Mota MLS
et al.
(26)
Descritivo /
quantitativo
Enfermeiros de UTI Avaliação do
conhecimento dos
enfermeiros quanto
à administração de
medicamentos por
sonda nasogástrica e
nasoentérica.
Dos enfermeiros, 36,7% relataram não dar atenção as formas
farmacêuticas durante a administração dos medicamentos por
sonda. O pilão de metal, madeira ou plástico foi o método mais
referido para triturar as formas sólidas. 32,65% costumam
dissolver os fármacos em 20 ml de água; 65,3% atribuem
ao médico a responsabilidade sobre a decisão da formulação
farmacêutica e sua correlação com a localização da sonda.
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médica, com a finalidade de aumentar
a motilidade gastrointestinal.
(21)
No entanto, não houve uniformidade
nas condutas da equipe de enfermagem
quanto à verificação da estase gástrica
antes da infusão da dieta por sonda, e
os profissionais nem sempre verificam
o posicionamento da sonda antes de
administrar a dieta.
(21)
Outro dado bastante preocupante
refere-se à ausência da higienização das
mãos pelos profissionais antes de mani-
pularem as sondas. Também é frequente
o uso de adornos pela equipe, enquanto
manuseiam estes dispositivos.
(21)
Durante a administração da alimen-
tação por sonda as autoras citam a im-
portância de se lavar a extensão do tubo
com água filtrada em intervalos regulares
quando o método de infusão contínua
é empregado.
(20)
Também mencionam a
necessidade de bomba de infusão com-
putadorizada para garantir a velocidade
e o tempo de infusão prescritos, bem co-
mo para diminuir o desconforto gástrico
e intestinal no paciente; a manutenção
adequada da velocidade de infusão,
no caso de gotejamento gravitacional;
e a manutenção da cabeceira do leito
elevada.
(9-20-21)
Em relação aos cuidados de enfer-
magem necessários após a infusão da
dieta por sonda, as autoras mencionaram
a necessidade de lavar a sonda com
água filtrada para prevenir a obstrução
do tubo; e a manutenção da cabeceira
elevada.
(20-21)
Apenas um artigo mencio-
nou a importância do registro das ações
de enfermagem após a realização do
procedimento.
(21)
Verificou-se também em um dos
estudos
a participação insuficiente do
enfermeiro na administração de dietas
por sonda, ficando a atividade sob a
responsabilidade dos auxiliares e dos
técnicos de enfermagem.
(19)
No que diz respeito às técnicas de
preparo e de administração de medica-
mentos por sonda, um estudo indicou
que os enfermeiros não valorizam o
conhecimento referente às formulações
farmacêuticas e sua correlação com
o posicionamento da sonda no trato
gastrointestinal no momento da admi-
nistração de medicamentos.
(22)
Para os
enfermeiros, este conhecimento é de
responsabilidade do médico. Ainda,
esses profissionais demonstram dúvidas
quanto às técnicas corretas de preparo e
de administração de medicamentos por
sonda, e quanto aos cuidados necessá-
rios para mantê-la desobstruída.
De modo geral, os estudos sinalizam
que há diferença entre o que é preco-
nizado pela literatura e o que se realiza
na prática clínica no que diz respeito ao
manuseio e aos cuidados com as sondas
para alimentação.
Logo, os autores recomendam a
uniformidade das ações da equipe de
enfermagem quanto ao manuseio seguro
das sondas para alimentação; citam a
necessidade de investimento substancial
em recursos humanos em favor da quali-
dade assistencial; a criação de estratégias
que incentivem a formação de enfermei-
ros especialistas em terapia nutricional; a
elaboração de protocolos e guias sobre
boas práticas no suporte nutricional,
bem como sobre o preparo e a admi-
nistração de medicamentos por sonda.
Além disso, destacam a necessidade de
mais estudos para avaliar a relação entre
os diferentes diâmetros das sondas e o
volume de água necessário para a ma-
nutenção de sua permeabilidade, bem
como a frequência de lavagem da sonda.
DISCUSSÃO
São poucos os estudos publicados
por enfermeiros brasileiros sobre o ma-
nuseio seguro das sondas para alimen-
tação nos últimos 12 anos, e é claro o
baixo nível de força da evidência destes
estudos, apesar de frequente o uso dos
dispositivos nos pacientes hospitalizados
e no domicilio, para fins de alimentação,
hidratação e administração de medi-
camentos. Este achado é semelhante
à pesquisa realizada por enfermeiros
brasileiros, com enfoque na eliminação
urinária.
(23)
Os resultados também revelam a
necessidade urgente de pesquisas de
intervenção relacionadas com a temá-
tica, visando à melhoria da qualidade
da assistência de enfermagem prestada
aos pacientes em uso das sondas para
alimentação.
Observou-se, também a baixa parti-
cipação do enfermeiro na administração
das dietas por via enteral. De acordo
com a Resolução do Conselho Federal
de Enfermagem, é de responsabilidade
do enfermeiro a orientação e a supervi-
são das ações dos demais membros da
equipe durante o cuidado ao paciente
com sonda.
(24)
No que diz respeito às complicações
associadas ao manuseio das sondas para
alimentação, pesquisadores afirmam
que as mais temidas, e potencialmente
fatais, dizem respeito ao posicionamento
inadvertido da sonda na árvore traqueo-
brônquica, e pneumotórax, embora
complicações relacionadas ao posicio-
namento da sonda no cérebro também
tenham sido relatadas.
(12-25-31)
A presença da sonda no esôfago ou
na junção gastroesofágica também é
considerada um risco para a seguran-
ça do paciente, visto que aumenta a
possibilidade de regurgitação e, conse-
quentemente, de aspiração do conteúdo
gástrico, favorecendo a pneumonia
aspirativa.
(26,30,33)
É preciso considerar, no entanto,
que os guidelines e os protocolos de
enfermagem voltados para a assistên-
cia aos pacientes em uso de sonda
para alimentação não são baseados em
evidências científicas, mas em rituais e
opiniões de especialistas.
(4)
Por exem-
plo, não há uma técnica universalmente
aceita para confirmar o posicionamento
correto da sonda para alimentação na
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Enfermagem
beira do leito. A maioria dos métodos
é realizada após a inserção da sonda
no estômago ou no intestino, quando
o posicionamento inadequado e/ou as
complicações potenciais já podem ter
ocorrido.
(33)
O método auscultatório, o mais
empregado por enfermeiros em todo o
mundo, tem sido questionado por ser
incapaz de determinar com precisão
a localização da sonda, devendo este
método ser abolido da prática assis-
tencial.
(25)
Outros métodos frequentemente
utilizados pelos enfermeiros para testar
o posicionamento correto da sonda na
beira do leito (tais como teste de pH do
aspirado gástrico/entérico; observação
do aspecto do conteúdo aspirado; e
a monitoração do dióxido de carbono
no gás expirado) não são considerados
suficientemente precisos para assegurar
a localização inadvertida da sonda na
via respiratória em pacientes de alto
risco.
(27)
Logo, o raio X de abdome ainda
é considerado o padrão ouro para testar
e garantir o posicionamento correto da
sonda para alimentação.
(4,25-28)
Todavia, a sonda, mesmo quando
adequadamente posicionada, pode ser
desalojada do intestino para o estôma-
go, do estômago para o esôfago, ou até
mesmo deste para a traqueia. O deslo-
camento pode ocorrer, especialmente na
presença de vômito, de tosse severa, ou
diante da aspiração de vias aéreas. Por
este motivo, especialistas recomendam
que o seu posicionamento seja confir-
mado antes de cada infusão intermitente
da dieta enteral ou da administração de
medicamentos, e em intervalos regulares
durante a infusão contínua da alimen-
tação por sonda. Tipicamente a cada 8
a 12 horas.
(26)
Os resultados também revelam que
não há uniformidade das práticas de
enfermagem voltadas para os cuidados
com as sondas para alimentação. Tam-
bém evidenciam a falta de conhecimento
dos profissionais de enfermagem quanto
à manutenção das sondas; infusão de
dietas; preparo e administração segura
de medicamentos, e quanto à prevenção
de complicações potenciais.
A elaboração de protocolos e de
indicadores de avaliação pode ser uma
estratégia eficaz para a padronização
das ações da equipe de enfermagem e
constitui-se numa ferramenta gerencial
importante para a melhoria da qualidade
da assistência e para a segurança do pa-
ciente.
(34)
Além disso, é fundamental que,
antes da implementação do protocolo, a
equipe de saúde seja capacitada com os
objetivos de atualizar o conhecimento,
de torná-la capaz de reconhecer os riscos
potenciais relacionados ao procedimento,
e de tomar decisões clínicas eficazes,
baseadas em evidências cientificas.
Outro problema comum relacionado
às sondas para alimentação diz respeito
ao preparo e à administração de me-
dicamentos. Conforme observado em
estudo prévio,
(22)
triturar medicamentos
sólidos com o auxílio de pilão de metal,
madeira ou plástico é o método mais
frequentemente empregado pelos profis-
sionais de enfermagem na administração
de medicamentos por sonda. Embora
alguns enfermeiros prefiram deixar o
medicamento na água, para que o mes-
mo se dissolva de maneira espontânea.
Evidências sugerem que os profis-
sionais de enfermagem têm o hábito
de misturar os medicamentos sólidos
em um mesmo recipiente durante o
preparo e a administração por sonda.
Esta prática é um fator de risco para a
ocorrência de interações medicamento-
sas, além de favorecer a obstrução da
sonda, principalmente se o profissional
não tiver o cuidado de lavá-la após o
procedimento.
(35,36)
Também, o processo de trituração e
de solubilização de formas farmacêuti-
cas sólidas orais pode gerar problemas
como a destruição do revestimento de
proteção dos medicamentos de liberação
entérica ou controlada, resultando em
eventos adversos significativos, além
de aumento dos custos referentes ao
tratamento medicamentoso.
(37)
Outra questão a ser considerada é
que a maioria das farmácias hospitalares
brasileiras não disponibiliza diferentes
formas farmacêuticas, e os profissio-
nais de enfermagem são os principais
responsáveis pela reconstituição dos
medicamentos. Por conseguinte, os com-
primidos e/ou as cápsulas que deveriam
ser administrados íntegros por boca,
acabam sendo triturados e/ou abertos
e diluídos nas mais diversas substâncias
antes de serem administrados através
das sondas enterais. Esta prática resulta
em destruição das películas protetoras,
alterando a velocidade e o local de ab-
sorção do medicamento, podendo levar
a efeitos indesejáveis no paciente.
(36)
Há de se considerar, igualmente, que
nem sempre a água potável comum é o
diluente mais indicado para a diluição
dos medicamentos, visto que pode haver
incompatibilidades químicas que podem
decorrer da combinação de sólidos dis-
solvidos presentes nela e dos medica-
mentos que estão sendo acrescentados,
resultando em precipitação, em mudan-
ças na coloração e, em alguns casos,
em efervescência. Métodos incorretos
de preparo e de administração de me-
dicamentos por sondas podem resultar
"A elaboração de
protocolos e de
indicadores de
avaliação pode ser uma
estratégia eficaz para
a padronização das
ações da equipe de
enfermagem"
18
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em obstrução do tubo, em redução da
eficácia do tratamento, e em riscos para
a segurança dos pacientes.
(38,39)
Administrar medicamentos correta-
mente é tarefa que compete à equipe de
enfermagem, visto que esta representa
importante barreira para interceptação
de erros. Entretanto, é preciso que
os profissionais estejam respaldados
técnica e cientificamente para a realiza-
ção de uma prática segura e eficaz na
administração da farmacoterapia por
sondas enterais. Ações multidisciplinares
integradas envolvendo toda a equipe
multidisciplinar promovem a correta
terapia medicamentosa, principalmente
em pacientes com sonda.
(37)
Ainda, estas recomendações de-
vem estar contidas nos manuais e nos
protocolos assistenciais, de modo a
uniformizar e sistematizar a prática da
enfermagem, com o propósito final de
minimizar os eventos adversos associa-
dos às técnicas de preparo e de adminis-
tração de medicamentos não embasadas
em evidências científicas.
A equipe de enfermagem também
deve estar inserida em programas de
educação continuada, com o propósito
de melhorar as habilidades e as com-
petências voltadas para a segurança do
paciente na terapêutica medicamentosa,
e suas atividades devem ser supervisio-
nadas, continuamente, pelo enfermeiro.
A maioria dos artigos selecionados
focou no uso de sondas para alimenta-
ção em pacientes críticos, e na equipe
de enfermagem de unidades de terapia
intensiva. No entanto, observa-se eleva-
do número de pacientes em uso destas
sondas em clínicas médicas e cirúrgicas.
Muitos destes pacientes retornam para
suas residências com o tubo enteral
devido a comprometimento neuroló-
gico, dificuldades para a mastigação
e deglutição, dentre outros, onde as
complicações podem ser ainda maiores.
Os resultados apontam para a ne-
cessidade dos enfermeiros brasileiros
considerarem, cada vez mais, a segurança
do paciente no manuseio de sondas para
alimentação. Para tanto, é preciso que
estes profissionais ampliem os estudos
em outros cenários de atuação, a fim de
minimizar os riscos e os eventos adversos
associados à alimentação por sonda em
unidades hospitalares de baixa e média
complexidade, assim como no domicílio.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Poucos foram os estudos publicados
por enfermeiros brasileiros voltados para
o manuseio de sondas para alimentação.
De modo geral, os estudos abordaram a
assistência de enfermagem aos pacientes
hospitalizados, especialmente aos inter-
nados em unidades de cuidados críticos.
Há a necessidade de novos estudos vol-
tados para a identificação dos problemas
associados ao uso dessas sondas, bem
como para o estabelecimento de inter-
venções de enfermagem adequadas e
baseadas em evidências científicas para
a redução dos riscos e de complicações
associadas ao seu uso.
Destaca-se a necessidade do en-
fermeiro desenvolver e implementar
protocolos assistenciais voltados para
o manuseio seguros dessas sondas, vi-
sando a padronização da prática. Além
disso, é fundamental a supervisão, pelo
enfermeiro, da utilização destes guias
para que haja coerência entre o conhe-
cimento produzido e sua aplicação na
prática clínica.
Para uma cultura que promova a
qualidade da assistência e a seguran-
ça do paciente, é fundamental que as
instituições de saúde desenvolvam pro-
gramas de educação continuada com o
propósito de melhorar as habilidades e
as competências voltadas para o cuida-
do do paciente em uso de sonda para
alimentação em diferentes cenários de
atuação do enfermeiro.
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promova a qualidade
da assistência e a
segurança do paciente,
é fundamental que as
instituições de saúde
desenvolvam programas
de educação continuada"
19
Prática Hospitalar • Ano XVII • Nº 97 • Jan-Fev/2015
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Endereço para correspondência:
Av. Bandeirantes 3900 - Monte Alegre
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