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Da democratização da Cultura a um conceito e prática alternativos de Democracia Cultural

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Abstract

Questões de Sociologia da Cultura. A cultura, a sociedade, a pessoa. Papel e papeis da escola. Questões de“didáctica social e cultural”.
“Da democratização da Cultura a um conceito e prática alternativos de
Democracia Cultural”
J. M. Teixeira Lopes
Professor do Departamento de Sociologia da Faculdade de Letras da Universidade do Porto, Portugal.
Investigador e coordenador do Instituto de Sociologia.
Resumo
Questões de Sociologia da Cultura. A cultura, a sociedade, a pessoa. Papel e papeis da escola. Questões de
“didáctica social e cultural”.
Palavras-chave
Democracia Cultural, Sociedade, Pessoa, Escola
“De la démocratisation de la Culture à un concept et pratique alternatives de Démocratie
Culturelle”
J. M. Teixeira Lopes
Professeur du Département de Sociologie de la Faculté de Lettres de l’Université de Porto, Portugal. Investigateur
e coordinateur de l’Institut de Sociologie.
Résumé
Questions de Sociologie de la Culture. La culture, la société, la personne. Rôle et rôles de l’école. Questions de
“didactique sociale et culturelle”.
Mots-clé
Démocratie Culturelle, Société, Personne, École
Abstract
Issues of Sociology of Culture. The culture, society, the person. School role and roles. Issues of "social and cultural
didactics."
Keywords
Cultural Democracy, Society, Person, School
Resumen
Cuestiones de Sociología de la Cultura. La cultura, la sociedad, la persona. Papeles y funciones de la escuela.
Cuestiones de "didáctica social y cultural".
Palabras clave
Democracia Cultura, Sociedad, Persona, Escuela
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A Activista Cultural
O passo decidido não acerta com o cismar do palácio
O ouvido não ouve a flauta da penumbra
Nem reconhece o silêncio
O pensamento nada sabe dos labirintos do tempo
O olhar toma nota e não vê
O Búzio de Cós e Outros Poemas
1. BREVE ENQUADRAMENTO HISTÓRICO: A INVENÇÃO FRANCESA DA POLÍTICA CULTURAL
Não é por acaso que encontramos na França dos anos sessenta do século passado a raiz das formulações actuais
sobre a centralidade dos públicos na elaboração de políticas culturais públicas. As preocupações e intervenções
sobre a participação da sociedade civil na concepção e até mesmo na gestão dos equipamentos culturais têm outra
génese, associada, em particular, aos movimentos cívicos dos Estados Unidos. Os contextos societais, como
tentarei demonstrar, exercem forte influência nesta diferença. Será da maior importância transmitir a ideia da
mediação ou sobredeterminação que exercem os grandes valores e mitos nacionais, actualizados em situações
históricas concretas e, em particular, na configuração do campo de possíveis da acção política, matizada por uma
determinada ideia de Nação e de Estado. Os casos francês e português, por comparação, desempenharão, assim o
creio, relevante pertinência pedagógica. Trata-se, tão-só, de não renunciar à análise da génese sócio-histórica de
produção das categorias através da qual o campo político classifica politicamente o mundo.
Em 1961 nasce, em França, a primeira comissão incumbida especificamente do campo cultural e artístico no seio
do Quarto Plano, sob a designação de «Equipamentos culturais e patrimónios artísticos». Antes, por decreto de 24
de Julho de 1959, concretizava-se a existência do Ministério dos Assuntos Culturais, confiado a André Malraux,
com os seguintes objectivos: “O ministério encarregue dos Assuntos Culturais tem por missão tornar acessíveis as
obras capitais da humanidade e, em primeiro lugar, as da França, ao maior número possível de Franceses; de
proporcionar a mais vasta audiência ao nosso património cultural e de favorecer a criação das obras de arte e de
espírito que o enriquecem”1. Como refere Jean Caune, tratava-se, na verdade, pela própria vontade de De Gaulle,
de um Ministério das Belas Artes, «mais a presença de André Malraux». Este, na cumplicidade com o General,
desenvolve, pelo nascimento da política cultural (enquanto definição de objectivos sistemáticos e estruturados do
papel interventivo e regulador do poder de Estado nas esferas cultural e artística, servidos por meios financeiros,
técnicos e humanos autónomos que subtraem a circulação das chamadas grandes obras às leis mercantis da oferta
e da procura), o projecto civilizador francês. Não nos esqueçamos que, para Malraux, a Arte e o Grande
Património eram concebidos como uma espécie de substitutos funcionais da religião, um conjunto de poderosos
símbolos elevados ao Olimpo dos mitos seculares, carregados, todavia, da aura inefável do sagrado.
Malraux é visto, ele próprio, como «o Ministro do verbo», o «distribuidor de símbolos», «Ministro do esplendor
francês», aquele que serve o Príncipe (De Gaulle) em nome dos princípios fundadores da V República – o projecto
civilizador da França assente nas obras imateriais, as únicas que vencem a morte e o desgaste da sociedade de
massas, uma espécie de metafísica sobre o destino do homem e do mundo que só o encontro com a Arte (as Belas
Artes) pode, enfim, salvar. Pelas suas palavras, tratava-se de «proporcionar à vida o seu génio passado, dar à vida
o seu génio presente e acolher o génio do mundo”2, transformando o destino em consciência.
Ora, o projecto político de Malraux assentava no núcleo-duro do que, doravante, se designou por democratização
cultural: “a ambição de tornar acessíveis as obras da humanidade ao maior número possível”3 de pessoas. Para
tal, exigia-se uma concentração de esforços administrativos e financeiros em torno da difusão (em particular junto
das funções de arquivo e de salvaguarda do património), a par do apoio, em menor grau ou como segunda
prioridade, à criação artística nobilitada e consagrada. Como pano de fundo surge, evidentemente, uma ideologia
fortíssima da Nação, consubstanciada na estatização da política cultural.
Neste contexto, multiplicam-se um pouco por toda a França as casas da cultura, microcosmos do tal encontro
mágico, ardente e salvívico entre o Homem e a Arte. Estas instituições representam uma das mais significativas
intervenções sistemáticas numa rede nacional e descentralizada de equipamentos culturais, enquanto canal
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1 - Citado por Jean Caune in La Culture en Action. De Vilar à Lang : le sens perdu, Grenoble, Presses Universitaires de
Grenoble, 1999, p. 114.
2 - Citado in Jean Caune, op. cit, p. 113.
3 - Jean Caune, op.cit., p. 116.
privilegiado de “circulação das obras, de incitação ao encontro e de organização da difusão”4, ligando, numa
perspectiva evolucionista, a passagem da instrução pública obrigatória, à educação popular e, finalmente, à acção
cultural, dispositivo associado às casas da cultura.
Encontramo-nos, assim, em condições de propor as linhas fundamentais do conceito de democratização cultural.
Importa, no entanto, insistir na configuração espácio-temporal que lhe serviu de berço.
Antes de mais, os aspectos históricos que classificaria de conjunturais, já que ligados a um conjunto de
acontecimentos circunstanciais (ainda que da maior importância, como veremos): o fim do império colonial
francês, a guerra da Argélia e a procura, por parte de De Gaulle, de uma solução política para o conflito acentuam
o cariz integrador da Cultura e da Arte, instrumentos de coesão social, cimentos ideológicos de uma virtual
unidade nacional.
Mas insistirei, ainda de forma mais vincada, numa série de configurações superestruturais5 fortemente
sedimentadas nas disposições cultivadas das elites que, pelo menos desde o Iluminismo, fortemente reforçado
pelo triunfo do imaginário da Revolução Francesa, aproximaram a cultura da civilização – A Civilização – obra da
Razão, Razão Ocidental, maxime A Razão Francesa. Neste sentido, a ideologia das Luzes toma a cultura no
singular, enquanto totalidade, entidade que se opõe intrinsecamente à Natureza constituindo o cariz distintivo da
humanidade e, por conseguinte, aproximando-se do processo civilizacional, centrando-se a cultura no afinamento
das disposições individuais e a civilização nas dinâmicas colectivas. Uma e outra contribuindo, então, para o
proselitismo da Razão, a disseminação das boas práticas, a ideia de um progresso ininterrupto. É neste caldo em
que “as ideias optimistas de progresso, inscritas nas noções de «cultura» e de «civilização», podem ser
consideradas uma espécie de sucedâneo da esperança religiosa”6 que bebem De Gaulle e Malraux, acreditando,
simultaneamente, na unidade do género humano e no posicionamento superior da França (crença evolucionista
de uma sucessão linear de estádios de progresso civilizacional). Uma vez terminado o Império Colonial político,
seguir-se-ia o Império Colonial das ideias e do espírito.
Convirá relembrar que, a contrario, nos Estados Unidos cedo se preferiu um uso descritivo do conceito de cultura,
levando à sua des-singularização e à sistemática utilização do plural culturas. Será porventura útil, do ponto de
vista pedagógico, aconselhar revisitações de sociologia urbana, a propósito da emergência da Escola de Chicago e
dos «culturalismos».
Longe da homogeneidade francesa e da refundação das suas classes dominantes em torno do projecto
civilizacional, “os estados Unidos representam-se a si próprios, desde sempre, como um país de imigrantes de
diferentes origens culturais. Nos Estados Unidos, a imigração funda e precede, portanto, a nação que se reconhece
como nação pluriétnica (...) a pertença do indivíduo à nação caminha muitas vezes a par da sua participação
reconhecida numa comunidade particular; é por isso que a identidade dos americanos foi qualificada por alguns
de «identidade de traço de união»: pode-se com efeito ser «ítalo-americano», polono-americano», «judeu-
americano», etc.”7.
Ambos as formações sociais – francesa e americana – permitirão, assim o penso, uma compreensão fina das
conexões existentes entre o essencialismo das identidades nacionais, a relativa autonomia da ordem cultural e
simbólica, os particulares contextos históricos e a estruturação das elites no surgimento francês do conceito de
democratização cultural.
Importa, no entanto, precisar conceitos. Não raras vezes, democratização e democracia cultural surgem como
sinónimos quando, na verdade, apresentam perspectivas díspares e, em certo sentido, até opostas, de política
cultural (o que não significa que não possamos encontrar, como de resto proporei, eixos de complementaridade).
Alexandre Melo, por exemplo, usa sem distinção os dois conceitos: começa por referir que “a democratização é,
aparentemente, um objectivo consensual para todas as áreas políticas e para todas as políticas culturais”8. A
afirmação só poderá merecer o meu acordo se nos referirmos ao campo da grandiloquente retórica. Mas,
acrescenta: “embora haja zonas relativamente pacíficas, outras há em que a conflitualidade das definições ou das
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4 - Idem, ibidem.
5 - Ao falar de configurações superestruturais não pretendo ressuscitar a metafísica das estruturas, utilizando a expressão
com que Elias critica um estruturalismo cego à agência, incapaz de superar a sua deriva desumanizadora, crente na sua
existência transcendente aos indivíduos. Daí a ligação que explicitamente faço entre tais configurações e as disposições de
indivíduos particulares, unidos entre si por uma afinidade de habitus.– cf. Norbert Elias, Introdução à Sociologia, Lisboa,
Edições 70, 1999, pp. 13-34.
6 - Vd. Denys Cuche, A Noção de Cultura nas Ciências Sociais, Lisboa, Fim de Século, 1999, p. 31.
7 - Idem, ibidem, pp. 55-56.
8 - Vd. Alexandre Melo, Equívocos e complexidade na definição de políticas culturais” in OBS, n.º 2, 1997, p. 9.
interpretações ganha um peso considerável. A noção de democracia cultural, nas suas várias vertentes (...)”9. Os
dois conceitos surgem, pois, numa equívoca amálgama. Mais adiante, ainda, menciona “a ampla zona de
vizinhanças conceptuais da definição de democratização cultural...”. Urge, então, clarificar equívocos.
2. DEMOCRATIZAÇÃO CULTURAL: CONCEITO E CRÍTICA DO CONCEITO
Assim contextualizado, o conceito de democratização cultural pode ser caracterizado por quatro dimensões
fundamentais:
- Concepção descendente da transmissão cultural, próxima dos dispositivos da difusão, o que implica,
necessariamente, que se parta do património cultural e/ou da criação artística, pertencente a uma minoria de
especialistas altamente consagrados e nobilitados, em ambos os casos levando o espírito dos grandes templos
culturais às mais anódinas e descentralizadas casas da cultura;
- Concepção paternalista da política cultural, assente, antes de mais, na ideia de que urge «elevar o nível cultural
das massas»10, tidas como beneficiárias do afã civilizador e apreendidas como consumidoras mais ou menos
passivas e não enquanto receptoras, isto é, prestes a sucumbir ao arrepio do contacto inefável e aurático com a
Grande Obra de Arte, mas incapazes de a reinterpretarem e de a integrarem, com novos e inusitados sentidos,
numa história de vida pessoal e social;
- Concepção fortemente hierarquizada de cultura, baseada na tricotomia cultura erudita (A Cultura)/cultura de
massas/cultura popular. A primeira surge como a única com valor patrimonial, fortemente distinta da alienação
consumista da cultura de massas ou da falta de acumulação de poder simbólico da cultura popular, confinada a
usos profanos e triviais;
- Concepção arbitrária do que ou não é cultura, subtraindo a sua delimitação à configuração conflitual que lhe
está subjacente, o que implica, necessariamente, ainda que por meios dissimulados, isto é, não explicitamente
declarados, a economia da compreensão do conjunto de (dis)posições sociais em relação, negando, por
conseguinte, qualquer abertura à diversidade;
- Concepção essencialista das audiências, jamais como públicos da cultura – porque isso implicaria a
consideração de plurais modos de relação com a cultura instituída – , mas, preferencialmente, como «povo» ou
«Nação», conceitos atemporais e intemporais, intimamente associados a uma determinada natureza apta a
procurar a integração social e societal através da mediação transcendental da Arte;
- Concepção liquidatária do indivíduo enquanto agente que, dentro de um campo estruturado de possíveis, tem o
poder de optar pela dissidência em vez da convergência, pelos sentidos múltiplos em vez do sentido único.
Ora, cedo a sociologia – teria de ser a sociologia11
... – apercebe-se das profundas limitações desta majestática
política cultural, desiludindo os mais ingénuos e minando o caminho aos cínicos. Em 1963 emerge o primeiro
centro de estudos e de pesquisa no recém-criado Ministério dos Assuntos Culturais. Em 1966 é publicada a
primeira edição da obra pioneira de Bourdieu, Darbel e Schnapper, L’Amour de l’art12, embora fosse a segunda
edição, consideravelmente mais divulgada, a “conter uma bomba: ela revelava que os obstáculos ao acesso à
cultura revelam ser de natureza simbólica e não material”13, afastando-se, desse modo, da vulgata marxista que
concentrava quase exclusivamente os seus esforços analíticos na importância explicativa do capital económico
(gerado nas desiguais relações sociais de produção e na propriedade dos meios de produção).
A ênfase que Bourdieu e a sua equipa colocam no capital cultural, chama a atenção para uma economia dos bens
simbólicos, não redutíveis a valores de mercadoria e adquiridos, antes de tudo, por um sistema de disposições que
requer precoce e durável processo de socialização/interiorização/incorporação. Assim, como refere Nathalie
Heinich, explode um reducionista espaço unidimensional (o económico), para a emergência de um espaço
multidimensional (embora com dois eixos ou princípios de distribuição fundamentais: o económico e o cultural).
Através do conceito de campo e de habitus, posteriormente desenvolvidos, torna-se possível compreender o
falhanço prático e real da democratização cultural: as barreiras à entrada da alta cultura derivam “não tanto de
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9 - Idem, ibidem.
10 - Cf. E. Grosjean e H. Ingberg, “Implicaciones de una política de animación sociocultural” in Animación Sociocultural,
Madrid, Ministerio da Cultura, 1980.
11 - A Sociologia e os sociólogos concretos que a fazem!
12 - Vd. Pierre Bourdieu e Alain Darbel, L’Amour de l’Art (com a colaboração de Dominique Schnapper), Paris, Éditions de
Minuit, 1969.
13 - Vd. Laurent Fleury, “Le pouvoir des institutions culturelles” in AAVV, Les Institutions Culturelles au Plus Près des
Publics, Paris, Musée du Louvre/La Documentation Française, 2002
um défice de meios financeiros, nem mesmo, por vezes, de conhecimentos, mas, antes de tudo, da falta de à-
vontade e de familiaridade, a consciência difusa de «não estar no seu lugar», que se manifesta nas posturas do
corpo, na aparência indumentária, na maneira de falar ou de se deslocar”14.
As revoltas estudantis europeias, com o seu epicentro mais visível no movimento do Maio de 68, em França,
revelam, igualmente, a centralidade da cultura e do simbólico na estruturação dos pensamentos, modos e estilos
de vida, ao mesmo tempo que traduzem, nos espaços-tempos da esfera pública, intensas mudanças societais. O
capitalismo está, ele próprio, em mutação15 e clamam tais movimentos sociais, com crescente influência na
determinação da agenda política, ao invés da década anterior, por uma ênfase acrescida na participação social,
enquanto crítica à passividade auto e heteroimposta, à alienação consumista e à demissão cívica. Repare-se que,
estes últimos itens – alienação, consumismo, apatia – estiveram igualmente na génese da orientação pela
democratização cultural...Contudo, a resposta pretende marcar a diferença, uma vez que, nos finais de sessenta e
inícios de setenta, as próprias instituições vão dando conta, uma após outra, dos limites e falhanços da lógica de
difusão cultural descendente. Essa diferença radica, antes de mais, no afastamento face a qualquer «suspeição» de
elitismo.
Nos fora internacionais discutem-se os limites da crença numa espécie de determinismo associado à generalização
de níveis superiores de escolaridade ou à promoção da cultura e da literacia pelos media (uma suposta escola
paralela, como lhes chamou Louis Porcher), enquanto virtuais vectores causais de uma aproximação e
familiarização com as formas culturais e artísticas mais exigentes. Entre 1970 e 1974, o Conselho da Europa marca
a sua posição na viragem, orientando-se “agora, principalmente, para os equipamentos culturais e esforça-se por
estabelecer os limites conceptuais da animação sociocultural. Chega-se à conclusão de que a cultura não é a
apenas um bem de consumo, mas também um espaço para que os cidadãos possam formar a sua própria cultura.
Por outras palavras: o «consumo cultural» dá lugar à «participação cultural»16 e em 1976, em Oslo, aquando da
Primeira Conferência de Ministros Europeus responsáveis pelos Assuntos Culturais determina-se a
implementação de uma política de animação sócio-cultural. Opera-se, então, formalmente, a mudança de
paradigma.
3. DEMOCRACIA CULTURAL: CONCEITO E CRÍTICA DO CONCEITO
A democracia cultural implanta-se, paulatinamente, nos escombros do descrédito das políticas de democratização
cultural que pouco mais conseguiram do que a salvaguarda do Grande Património e, em alguns melhores casos, a
proliferação de equipamentos culturais unidimensionais. De facto, os observatórios e a sucessão de estudos
mostram a irrelevância do alargamento social de públicos, bem como a cristalização das hierarquias sociais e
simbólicas no acesso e fruição culturais.
Assim, e de acordo com a perspectiva da animação sócio-cultural, tratava-se, de certa forma, de resvalar para o
pólo oposto – o das culturas populares. Em norma, este ponto de vista elabora-se a partir do elogio das
comunidades e da persistência de uma concepção essencialista do «povo», associados a novas lógicas de
desenvolvimento, profundamente críticas das versões funcionalistas e tecnocráticas, valorizando, pelo contrário,
os factores endógenos e a pequena escala (small is beautiful), uma espécie de territorialidade infranacional
definida, deste modo, por Rogério Roque Amaro: “Busca das identidades perdidas ou de raízes de segurança
(afectiva e não só), abaladas pelas pressões «nacionalistas» e pela aculturação transnacional e transregional dos
percursos migratórios e dos canais de comunicação e informação mundiais”17.
Na sua versão transformadora, a animação sócio-cultural assume-se como processo político, defendendo a
democracia cultural enquanto emporwement por parte das populações, auto-consciência dos constrangimentos
holísticos a que estão submetidas e das possibilidades de emancipação, fundada, por isso, numa acção vivencial e
comunitária atravessada por práticas culturais comprometidas 18
. A acção cultural é doravante encarada de baixo
para cima e de dentro para fora, a partir das necessidades e aspirações das populações.
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14 - Vd. Nathalie Heinich, “Sociologie de l’art: avec e sans Bourdieu” in Sciences Humaines L’œuvre de Pierre Bourdieu,
número especial, 2002, p. 41.
15 - Cf., por exemplo, David Harvey, A Condição Pós-Moderna, São Paulo, Edições Loyola, 1992; Fredric Jameson,
“Postmodernism or the cultural logic of late capitalism” in New Left Review, n.º 146 ; Edward Soja, PostModen Geographies,
London, Verso, 1999 ; Scott Lash e John Urry, The End of Organised Capitalism, Cambridge, Polity Press, 1987.
16 - Vd. António Petrus I Rotger, “Animação sociocultural e estado do bem-estar” in Jaume Trilla (coord.), Animação
Sociocultural – Teorias, programas e âmbitos, Lisboa, Edições Piaget, 2004, p. 320.
17 - Vd. Rogério Roque Amaro, “Especialização e crescimento industrial” in Sociologia – Problemas e Práticas, nº 10, 1991,
p. 169.
18 - Cf., a este respeito, José António Caride Gómez, “Paradigmas teóricos na animação sociocultural” in Jaume Trilla
(coord.), op. cit., pp. 45-63. Itálicos do autor.
Multiplicam-se, por isso, os estudos de diagnóstico sócio-cultural, no esforço de implicar os destinatários na
concepção das próprias políticas (plano estratégico) e projectos (plano operativo), defendendo-se, a jusante, o seu
igual envolvimento na execução/intervenção e na avaliação de projectos e políticas. Desta forma, o emporwement,
com clara ressonância marxista, pretende transformar os sujeitos em protagonistas activos da sua própria história
sem perder, todavia, o enfoque privilegiado do quotidiano: das suas tensões, experiências e pulsões (clara
influência da escola de Paulo Freire). A auto-consciência é um processo social indispensável para combater a
dominação social e cultural, ambas intima e finamente imbricadas. Mas, também, de vencer a tendência
amplamente instalada de dissociação entre conhecimento e acção, saber e poder, bem como a habitual limitação a
soluções parciais para problemas que exigem complexidade e totalidade.
As instituições europeias foram, entretanto, formalizando e institucionalizando o conceito, sem deixar de salientar
a viragem ideológica que lhe subjaz. Por exemplo, Crevoisier, redactor-geral do Conselho da Europa, afirma:
“Não se deve restringir a cultura ao património artístico, dando-o como «alimento» à sociedade de consumo, mas
sim reconhecer-lhe uma acepção bastante mais larga que, sem excluir o património artístico, encare a cultura
como um processo criador contínuo que não é apenas fruto do trabalho dos artistas, mas de todos os grupos
culturais”19.
Desta breve síntese, importa salientar o que me parecem ser os dois principais limites do conceito e prática da
«democracia cultural», tal como entendida desde finais da década de sessenta do século passado até inícios da de
oitenta (persistindo, ainda hoje, em heteróclitas construções de política cultural).
Em primeiro lugar, a tendência para o populismo, não raras vezes associado a uma transferência de poder para os
técnicos (animadores, mediadores), benévolos ou activistas que cedo se outorgam o privilégio de falarem pelo
povo. Os porta-vozes, como Bourdieu tantas vezes denunciou, transmutam, amiúde, o seu discurso particular na
proclamação universal da fala dos oprimidos. Esta tendência liga-se à já referida essencialização do conceito de
povo, desta feita encarado como protagonista activo e consciente de uma história e de um devir, jogo de espelhos,
afinal, com a concepção elitista da democratização cultural que o encarava como um receptáculo harmonioso,
desejoso, passivo e neutro perante o encontro mágico com as grandes obras do Espírito. Num outro plano,
Grosjean opera um deslizamento nos critérios de legitimação: a definição de cultura é a que resulta dos esquemas
de percepção e de classificação da população. Mas que população é esta, aparentemente tão homogénea? Não se
fará, desta forma generosa, um esquecimento ambíguo mas irreversível das desigualdades e conflitualidades
sociais, com as suas inevitáveis traduções nas mediações culturais e simbólicas?
Simultaneamente, ao aceitar-se esta democracia semiótica, perdem-se referenciais ou padrões de qualidade. Dir-
se-á: todos os padrões de gosto são arbitrários e exercem, ilegitimamente, um trabalho de violência simbólica.
Mas aceitar como válidos todos os cânones, padrões ou critérios não significará aceitar uma amálgama
perceptiva? Não escaparemos, uma vez mais, à questão central das lutas e dos campos de força constitutivos da
atribuição de sentido? Mas, por outro lado, quem define o que é ou não cultural, ou pelo menos, o que tem
legitimidade cultural, ou, ainda de forma mais simples, o que tem «qualidade»? As versões populistas coincidem,
curiosamente, com a «lei» pós-moderna de que tudo o que é ilegítimo, no campo cultural e artístico, pode ganhar
legitimidade (é apenas uma questão de contexto, ou efeito de meio) e, simultaneamente, com nihilismo mais
radical que vê a mesma porção de qualidade num par de botas e na obra completa de Shakespeare... Tem razão,
por isso, Eduardo Prado Coelho, ao questionar: “(...) que significa «qualidade» (...)? Porque «qualidade» exige
uma tábua de valores que permitam distinguir a qualidade da não-qualidade. E o mesmo em relação à formação
de públicos. Ou a democracia cultural aceita horizontalmente que todos os públicos são legítimos nos seus gostos,
ou acha que é preciso formar públicos e isso entra já numa lógica descendente”20. No mesmo fundo de inquietação
– porque, muitas vezes, mais importantes do que as respostas, são as perguntas que levantam o pó que cobre a
realidade – o crítico de cinema, João Lopes, questiona: “as ideias dominantes ensinam-nos que a edição do mais
recente Saramago é cultural, mas um jornal baseado em escândalos e «fait-divers» não é; um concerto no Centro
Cultural de Belém é cultural, mas um estádio de futebol com oitenta mil pessoas não é; um filme de Manoel de
Oliveira é cultural, mas a imagem de Teresa Guilherme num pequeno ecrã não é”21. Voltarei a esta premente
questão adiante. Ela poderá, aliás, pelo seu potencial de polémica e desafio alimentar interessantes discussões no
espaço-tempo da sala de aula.
Em segundo lugar, intimamente associado ao populismo existe a deriva do voluntarismo. Em ambos os casos
esquece-se a complexidade dos circuitos de construção, circulação e incorporação de sentido. Neste último ponto,
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19 - Vd. J. C. Crevoisier, “Des pratiques sócio-culturelles à une politique de l’animation », Montier, Conseil de l ‘Europe,
1979, p. 4 (itálicos do autor)
20 - Vd. Eduardo Prado Coelho...
21 - Vd. João Lopes, “Bruscamente, a cultura” in Expresso, 26 de Junho de 1998.
a atitude voluntarista associa-se a um proselitismo próprio da pedagogia sem pedagogia do choque cultural. Tudo
o que há a fazer é colocar, sem mediações, a arte na rua, os artistas com o povo e este no meio de tudo.
São célebres os estudos sobre os efeitos destas intuições performativas: Dario Gamboni, por exemplo, estudou, as
formas contemporâneas de iconoclasmo face à presença de obras de arte colocadas em espaço público,
nomeadamente através da criação de um efeito de dupla exclusão: “exclusão das práticas estéticas que presença
manifestava e exclusão do espaço momentaneamente consagrado a estas práticas”22. Idalina Conde, por seu lado,
analisou as modalidades de desentendimento perceptivo entre artistas e «povo», nos primórdios das Bienais de
Vila Nova de Cerveira23. Ao revisitar este seu estudo pioneiro, Idalina Conde utiliza expressões conceptuais como
«públicos não voluntários», “aceitação sem adesão” ou “familiaridade esquiva ou equívoca do ponto de vista da
afinidade com o evento”. A suavidade das atitudes populares pode, neste caso, ser contextualizada quer pelo lastro
do período revolucionário, em que as aproximações imediatas e «empáticas» entre criadores e públicos possuíam
uma aura própria, quer pela mais-valia económica e especificamente turística que as populações associavam a
eventos como as Bienais. Mas podemos e devemos falar de desentendimentos: uns, convertiam o «campo» em
«paisagem», como refere a autora; outros aproveitavam a ocasião para, mesmo ao lado da exuberante
modernidade artística das vanguardas, exaltar a natureza do «velho Minho» e as suas potencialidades ecológicas
ou mesmo o seu ancestral artesanato...24.
Ainda mais recentemente, em 1997, a fotografia de Salazar, inserida numa intervenção artística de Cristina
Mateus, no âmbito do projecto «Além da Água», foi destruída por um conjunto de activistas conotados pelos
media com a extrema-esquerda. A autora pretendia, de acordo com as suas declarações, denunciar a calamitosa
política agrícola do salazarismo no Alentejo, consubstanciada nas «campanhas do trigo» e causadora de ruína
económica, social e ambiental. O que para uma era uma denúncia, para outros foi «lido» como exaltação da figura
do ditador...Na polémica então em curso, um dos responsáveis pela concepção da instalação insurgiu-se contra a
sua destruição, apelidando o sucedido de «intolerância reaccionária»; «gesto vergonhoso e hipócrita»,
«consagração da intolerância, da censura e da mais absoluta selvajaria”25. No entanto, o mesmo autor, em
passagem mais reflexiva (reflectida?), acrescenta: “É um facto que a «arte pública» corre riscos. Se o produto
artístico se afastar dos paradigmas perceptivos dominantes, da habituação e socialização estéticas, dos padrões
morais vigentes, recolhe muito provavelmente a indiferença, a insensibilidade ou a contestação do público”26. A
este respeito escrevi que é patente, de um lado, uma reacção pública à «arte pública», o que, para além da
destruição do ícone, prova, pelo menos em parte, que o projecto resultou, ainda que de forma paradoxal ou
mesmo perversa (mas não é esse o jogo – os «riscos» do espaço público?); do outro, a incompreensão, parcial ou
total, ou mesmo a indignação perante um acto que os artistas remetem para a barbárie, ou, mais serenamente,
para uma situação de recepção incompetente. Em ambos os lados a consciência, mais ou menos difusa, de que as
lutas sociais são sempre lutas simbólicas e viceversa. Em ambos os casos, também, uma dupla ingenuidade inicial
(iniciática?): a dos activistas, anulando a distância entre significado e significante, representação e objecto
representado. Mas igualmente a dos artistas, patente na necessidade, posterior ao ocorrido, de «explicar» a
intencionalidade da obra, como que reconhecendo a falácia de uma sintonia perceptiva com os públicos, em
particular quando se tenta despertar uma questão social e política pela via oblíqua, distante do naturalismo ou do
realismo de empatia e imediata interpretação27.
Ora, falarmos em desentendimentos perceptivos na apropriação e construção de sentido implica questionarmos o
desconhecimento voluntarista sobre os processos de incorporação da experiência social e cultural dos sujeitos.
Adriano Duarte Rodrigues relembra, numa perspectiva fenomenológica, que a experiência social integra-se numa
«totalidade de sentido», abolindo, desse modo, mas só desse modo, a «estranheza perante a obra original». De
outra forma, “multiplicam-se as discrepâncias e desencontros dos quadros da experiência” gerando-se
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22 - Vd. Dario Gamboni, “L’iconoclasme contemporain: agressions physiques contre des oeuvres d’art et perception
esthétique” in Idalina Conde (coord.), Percepção Estética e Públicos da Cultura, Lisboa, Acarte/Fundação Calouste
Gulbenkian, 1992, p. 40.
23 -Vd. Idalina Conde, “O sentido do desentendimento nas Bienais de Cerveira: arte, artistas e público” in Sociologia
Problemas e Práticas, n.º 2, 1987.
24 - Vd. Idalina Conde, “Desentendimento revisitado” in AA.VV, Públicos da Cultura, Lisboa, Observatório das Actividades
Culturais, 2004, pp. 171-189.
25 - Vd. António Manuel Revez, “Salazar, entre a indignação e a liberdade artística” in Público, 4 de Junho de 1997.
26 - Idem, ibidem.
27 - Vd. João Teixeira Lopes, “Trinta anos de políticas culturais: a revolução inacabada e o país complexo” in Francisco
Louça e Fernando Rosas (Orgs.), Ensaio Geral – Passado e Futuro do 25 de Abril, Lisboa, D. Quixote, 2004, pp. 142-144.
potencialmente “saborosos equívocos” ou mesmo “manifestações imprevistas.28 A economia deste conhecimento
impede um compromisso de trabalho entre artistas e públicos. Não há, por assim dizer, um jogo a jogar; ignoram-
se as mútuas expectativas e predominam as representações sociais assentes, por vezes, nos mais toscos
estereótipos.
4. CONTRIBUTOS PARA UMA PROPOSTA ALTERNATIVA DE «DEMOCRACIA CULTURAL»
Afirmei já que, face à realidade social portuguesa, não faz sentido abdicar dos contributos válidos das várias
gerações de políticas culturais. Se a democratização cultural (a que chamaria política cultural de primeira
geração29) se revela insípida e tardia; se, apesar da insistência transversal ao espectro ideológico, na salvaguarda
e difusão do património e das grandes obras, não se deram senão passos titubeantes; se os próprios equipamentos
culturais – desde logo os museus (!) – não possuem, amiúde (e apesar da construção incessante, qual fontismo
cultural, de novos auditórios e cinetreatros), condições de salubridade e segurança infraestrutural que permitam a
abertura sistemática das suas portas aos públicos, então será uma falsa alternativa colocar a prioridade absoluta,
de um lado, na difusão das «obras de qualidade», ou, a contrario, na ligação da animação ao vivido e às práticas
sociais locais, adaptando os produtos culturais aos seus destinatários. As duas vias são ainda urgentes.
Por outro lado, se, maugrado o grande investimento público em educação, e apesar dos inegáveis resultados
obtidos30, continuamos com níveis de escolaridade fortemente díspares face à média comunitária; se, mesmo
entre os mais instruídos, possuidores de um curso superior, a escolaridade se revela, nos mais diferentes estudos,
como condição necessária mas não suficiente para a inculcação de disposições culturais e estéticas (fazendo notar
a descoincidência entre capital cultural institucionalizado – ou capital escolar – e capital cultural e simbólico
incorporados), então, importa continuar, também, nesta frente (a que chamei políticas culturais de segunda
geração, crentes na força socializadora das instituições públicas), diversificando contextos de aprendizagem e
articulando de outra forma a educação formal, informal e não-formal.
Adepto que sou da democracia cultural – a que apelidei de política cultural de terceira geração – mostro-me no
entanto, cada vez mais, fortemente crítico de algumas das suas configurações iniciais (como de resto já o mostrei
anteriormente), bem como de vastas interpretações e actualizações no terreno. Aliás, tentei demonstrar, através
de um pequeno estudo recente31, como são frágeis e desarticulados os esforços públicos no terreno do que
considero ser o nó górdio da democracia cultural: a formação de públicos. Os manuais de civilidade que
prescrevem uma série de «boas maneiras culturais» mostram as dificuldades de quem os encomenda e edita,
nomeadamente as autarquias, mas até de alguns departamentos educativos de instituições públicas, em controlar
e domesticar novos públicos, de certa forma representados como selvagens (mercê, supostamente, de um
deficiente processo de socialização que os afasta de um outro processo, o civilizacional, assente num habitus
legítimo que se traduz em formas adequadas de apresentação pública e de apropriação dos espaços e cenários de
interacção). Perante estes novos públicos que se conquistaram tantas vezes de forma errática e a-sistemática, o
que fazer? Ora, como escrevi32
, em boa parte das instituições públicas o conhecimento dos públicos (do
conhecimento meramente sociográfico ao conhecimento propriamente etnográfico, este último praticamente
inexistente) é altamente deficitário. Formam-se, por isso, duras cristalizações espontâneas sobre públicos virtuais
que existem, apenas, nas representações sociais dos responsáveis institucionais (programadores, gestores,
produtores, animadores, mediadores...) que endurecem, generalizando-se como uma espécie de ponto de vista
oficial sobre os públicos, as suas origens e percursos sociais, rituais, modos de recepção, códigos, posturas e
linguagens. Opera-se, na verdade, um processo de invenção de um habitus colectivo, através de uma constelação
de representações sociais que tem como um dos seus principais objectivos fornecer alguma segurança aos
desmunidos mediadores culturais.
Tentarei, pois, apresentar sumariamente os pontos axiais da minha proposta de democracia cultural:
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28 - Vd. Adriano Duarte Rodrigues, “Para uma sociologia fenomenológica da experiência quotidiana” in Revista Crítica de
Ciências Sociais, n.º 37, 1993, pp. 126-127.
29 - Proposta apresentada no meu livro Escola, Território e Políticas Culturais (Porto, Campo das Letras, 2003) e que segue
de perto as considerações de Olivier Donnat em Les Français Face à la Culture, Paris, Éditions La Découverte, 1994.
30 - Portugal, apesar da persistência de um fortíssimo atraso face à média comunitária dado os atrasos de que parte foi,
ainda assim, um dos países que mais progressos registou de acordo com a monitorização feita pela Comissão Europeia à
aproximação às metas da Estratégia de Lisboa – Vd. Público, 23 de Maio de 2006, p. 29.
31 - Vd. João Teixeira Lopes, “Reflexões sobre o arbitrário cultural...”, art. cit.
32 - Idem, ibidem, p. 45.
Em primeiro lugar, uma clara negação de qualquer conceito de cultura como “ornamento de espírito, sinal de
distinção social, modo de supremacia dos iniciados sobre os demais, dotado de linguagens reservadas e de ritos
particulares que excluem aqueles que os ignoram”33. A negação peremptória, enfim, dos usos hierarquizados e
hierarquizantes, classificatórios e estigmatizantes da cultura como violência simbólica ou forma de infligir
sofrimento, infelicidade e humilhação a outros sujeitos sociais.
Em segundo lugar, uma opção: a democracia cultural entronca num direito à cultura, simultaneamente individual
e colectivo, devedor de uma concepção de serviço público centrado na própria ideia de liberdade: só há
democracia cultural na dignificação social, política e ontológica de todas as linguagens e formas de expressão
cultural e na abertura de repertórios e de campos de possíveis, condição sine qua non para a expressão e escolha
livres. Tal não significa abdicar de critérios de qualidade, mas tem como subjacente o questionamento do carácter
universal desses critérios, bem como a explicitação da sua construção intersubjectiva, provisória e
necessariamente conflitual.
Em terceiro lugar, a democracia cultural aponta para uma incidência transversal: na criação de bens e obras
culturais, na sua distribuição e recepção. Uma concepção de democracia cultural assente apenas na familiarização,
pela via da recepção, a todos os códigos e modos de expressão (numa acepção ideal-típica), seria uma versão
diminuída e ineficaz. José Madureira Pinto, num artigo tornado clássico, afirma claramente intenções de
democratização do campo da produção cultural: “propiciar a segmentos populacionais vastos, sobretudo das
camadas populares, o contacto com as formas culturais mais exigentes em termos dos instrumentos estético-
cognitivos necessários à sua descodificação e fruição (alargamento de públicos), procurando, de forma tão
sistemática quanto possível, que a recepção da obra se prolongue em aproximação empática ao acto criador
(participação) e que esta última promova a prazo uma intervenção autónoma e auto-enriquecedora ao nível da
criação (democratização da esfera da produção cultural)34.
Em quarto lugar, importa colocar a formação de públicos no centro da democracia cultural. Este conceito implica
a destruição sistemática do conceito mítico de público, no singular, espécie de comunidade imaginada ao serviço
de uma colectividade de práticas rituais, nomeadamente alicerçada na integração e coesão sociais sob o manto
diáfano da ideologia dominante. De igual modo, esta proposta de democracia cultural é incompatível com a noção
de utente, consumidor ou visitante. Impõe-se, por isso, uma sociologia dos usos e dos modos de relação com a
cultura, para desocultar a diversidade na mirífica ficção de igualdade patente na concepção singularizada e
homogénea de público – uma espécie de suspensão mágica das desigualdades sociais.
É impossível, por isso, dissociar a pluralidade dos públicos da pluralidade das culturas e da pluralidade, ainda,
dos modos de relação com as obras culturais. É neste último sentido, que pressupõe a dimensão institucional, que
me quero concentrar. Existe, é impossível negá-lo, uma normatividade nessa relação social institucionalmente
enquadrada que constitui um público, aproximando-me, ao referir público, do conceito proposto por António
Firmino da Costa: “uma relação das pessoas com as instituições – uma relação de generalidade ou de uma grande
parte das populações com as instituições especializadas da modernidade avançada, ou, pelo menos, com certas
instituições especializadas das sociedades contemporâneas”35. O autor vai mais longe ao precisar a ocorrência de
uma metamorfose social no decorrer dessa relação, uma espécie de transmutação que, a não ser sociologicamente
analisada, pareceria do encantado reino da alquimia social: “uma mudança profunda nos modos de relação das
pessoas com as instituições (...) que consiste, justamente, numa passagem do estatuto social de leigos ao estatuto
social de públicos – isto é, de uma relação mista de distância e subalternização, de alheamento e ignorância, de
reverência e desconfiança perante essas instituições, a uma relação com elas de carácter mais complexo, mais
próximo, mais próximo, mais informado, mais exigente, mais diversificado”36.
Ora, a formação de públicos, sendo muito mais vasta do que as possibilidades abertas pela institucionalização, não
pode delas prescindir. O seu poder, o das instituições, assenta na negação de certas fatalidades sociológicas,
versões laicizadas do mito da predestinação que, segundo Laurent Fleury, fundam o discurso da impotência,
legitimando a reprodução cultural: “o pressuposto determinista torna frívola toda e qualquer tentativa (...) A
fatalidade sociológica serve de argumento para explicar a ausência de reflexão política sobre os meios mais
eficazes de atenuar (por impossibilidade de suprimir) os efeitos dos obstáculos simbólicos que limitam o acesso da
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33 - Vd. J.C. Crevoisier, op. cit. , p. 12.
34 - Vd. José Madureira Pinto, “Uma reflexão sobre políticas culturais” in AA.VV, Dinâmicas Culturais, Cidadania e
Desenvolvimento Local, Lisboa, Associação Portuguesa de Sociologia, 1994, p. 773.
35 - Vd. António Firmino da Costa, “Dos públicos da cultura aos modos de relação com a cultura: algumas questões teóricas e
metodológicas para uma agenda de investigação” in AAVV, Públicos da Cultura, Lisboa, Observatório das Actividades
Culturais, 2004, p. 131.
36 - Idem, ibidem.
maioria à cultura”37. Além do mais, os dispositivos institucionais permitem, assim o defendo, incorporações mais
consolidadas e duráveis, desde que os recursos técnicos, humanos e financeiros assim o permitam e desde que a
concepção aberta de democracia cultural esteja no seu centro de gravidade. Muitos anos de luta por fora e mesmo
contra as instituições tiveram como melhor resultado a relativa abertura de algumas delas, na sua autonomia
relativa, aos conceitos mais avançados de democracia cultural. Nesses conceitos avançados deve constar,
precisamente, que o poder institucional não é um fim em si mesmo, assim como não o são a animação e a
mediação sócio-culturais. As instituições culturais podem funcionar de forma reticular, como “processo múltiplo
de socialização cultural”38 aberta à composição, também múltipla, das disposições dos agentes39.
Em contexto institucional, combatendo no seu âmago a fixidez espácio-temporal que serve as lógicas de
reprodução, a formação de públicos será devedora da durabilidade, sistematicidade e sustentabilidade de práticas
inovadoras que instauram, por um lado, regimes de familiaridade 40
, essenciais para a transformação das práticas
e a construção de novos comportamentos, isto é, de novas formas de relação com a cultura e a arte, com
implicações nas camadas mais profundas do habitus, nomeadamente esquemas cognitivos de percepção e de
classificação que estão na base da produção das identidades. Além do mais, os agentes sociais, transformados
pelas instituições (princípio da possibilidade de ressocializações parciais), não deixarão de transformar as
próprias instituições, exercendo sobre elas profícua pressão.
Em quinto lugar, a defesa da socialização institucional na formação de públicos obriga à invenção de uma nova
profissionalidade41, em particular no que se refere às funções de interpretação (nomenclatura anglo-saxónica) ou
de mediação (classificação francófona). Esta nova profissionalidade, enquanto processo dinâmico de comunicação
entre as instituições e os seus públicos, longe de ser meramente um sector pericial, especializado e acantonado
nos organigramas das instituições deve fazer valer a sua transversalidade, disseminando-se pelas competências
das várias categorias de intermediários culturais (conservadores, gestores, administradores, curadores,
comissários, programadores, animadores, mediadores...). Trata-se, afinal, não só de facilitar a familiarização com
a obra de arte através de uma nova cultura organizacional, mas de plasmar o respeito pelas apropriações e usos
dos espaços e equipamentos culturais, nomeadamente através das múltiplas interpretações e pontos de vista que a
relação com as obras suscita e que na base do ofício de público. Neste aspecto, tornar-se-á particularmente
relevante, do ponto de vista pedagógico, ler a Carta das Normas e Princípios da Educação nos Museus, da autoria
da American Association of Museums 42
:
“-Norma 1 (...) – Os responsáveis culturais conhecem e respeitam os públicos aos quais os museus se dirigem. Eles
velam para que os museus assegurem uma missão de serviço público no seio de uma sociedade em plena
evolução”
- “Princípio 1: Fazer participar toda a colectividade e colocar-se ao serviço dos públicos do museu:
. Desenvolver e manter relações sólidas com as associações, as escolas, as instituições culturais, as universidades,
os outros museus e o grande público (...)
. Orientar os conteúdos e a mediação de maneira a adaptar-se o melhor possível aos sujeitos e a criar um vasto
diálogo (...)
- Norma 2 – Diversidade de perspectivas – Os responsáveis culturais têm recurso a métodos de mediação que
consideram a variedade de pontos de vista culturais, científicos e estéticos em jogo nas percepções dos visitantes
(...)
- Princípio 2 – Ter em conta a existência de perspectivas diversas e multiplicar os pontos de vista (...)
- Princípio 3.2. – Colocar em prática as teorias da aprendizagem e a pesquisa pedagógica (...)
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37 - Vd. Laurent Fleury, “Le pouvoir des institutions culturelles” in Les Institutions Culturelles au Plus Près des Publics,
Paris, Musée du Louvre/La Documentation Française, 2002, p. 35.
38 - Idem, ibidem, p. 45.
39 - Vd. Bernard Lahire, L’Homme Pluriel – Les ressorts de l’action, Paris, Nathan, 2001.
40 - Laurent Fleury, “Le pouvoir...”, art. cit., p. 47.
41 - Vd. Claude Patriat, “Au bonheur des musées in Les Institutions Culturelles au Plus Près des Publics, Paris, Musée du
Louvre/La Documentation Française, 2002, pp. 190- 194.
42 - Vd. AA.VV, « La recherche de l’excellence – charte des normes et principes de l’éducation dans les musées », AA.VV
Les Institutions Culturelles au Plus Près des Publics, Paris, Musée du Louvre/La Documentation Française, 2002, p. 35. É
possível, ainda, consultar a versão original em inglês : www.edcom.org
- Norma 4: Defesa da missão educativa – Os responsáveis culturais farão valer o papel central da educação na
missão e objectivos do museu; eles farão compreender o carácter determinante da sua acção neste domínio (...)
Fazer com que a educação seja explicitamente integrada na missão, nos objectivos e na estratégia financeira dos
museus”43
Em suma, o primeiro passo deverá ser dado pelas instituições culturais. Os restantes serão dados em conjunto
com os públicos, sem nunca cair na ingenuidade de esquecer que uma determinada instituição ancora na
cristalização provisória de uma política cultural à qual não será jamais alheio um certo padrão de gosto que urge
sempre colocar à discussão pública, nomeadamente a respeito das suas condições de produção, circulação e
apropriação.
Em sexto lugar, exige-se o exercitar da imaginação metodológica no estudo dos públicos. Antes de mais, porque,
como defende Pascal Le Brun-Cordier 44
, a disseminação dos resultados resultante da multiplicação de pesquisas
só fará sentido se existir a nova profissionalidade e cultura organizacional anteriormente defendida. Por outro
lado, os instrumentos estritamente quantitativos, apesar da grande vantagem de fazerem sobressair
determinações, regularidades e comparações, negligenciam, por generalismo, as trajectórias individuais e dos
micro-grupos. Importa, por conseguinte, na conciliação entre quantitativo e qualitativo, exigência, aliás, do
próprio cariz relacional do objecto de estudo em causa, construir observatórios de públicos in situ45
, capazes,
numa primeira fase, de construir tipos-ideais e perfis (como de resto já acontece entre nós, particularmente nos
estudos do Observatório das Actividades Culturais), para, numa segunda fase, proceder à caracterização
etnográfica dos modos antropológicos de recepção dos públicos em formação, para além do necessário mas
insuficiente conhecimento sociográfico, seguindo o princípio defendido por Madureira Pinto: “procurar conciliar,
na organização global da pesquisa, isto é, em todo o ciclo que vai da problematização teórica até à fase da
observação, extensividade e intensividade, por esta ordem (e sublinho: “por esta ordem”) (...) acredito que a
análise conduzida à escala macro e meso segundo procedimentos de natureza mais extensiva, convencionalmente
associados à sociologia, tem precedência lógica e teórica sobre os procedimentos observacionais ditos
«etnográficos”46.
Dito isto, a etnografia dos públicos em acção permitirá, assim o creio, restituir à sociologia dos modos profanos
de recepção, particularmente no que respeita às dimensões corporais, emocionais e afectivas, tantas vezes
mitigadas ou mesmo silenciadas.
Em síntese, não é tarefa fácil, abrir os caminhos da democracia cultural, tal como aqui a defendo: renegando
critérios absolutos e essencialistas de gosto, enquanto exercício de violência simbólica; como direito individual e
colectivo à cultura, alicerçado na missão de serviço público; acção transversal e multidimensional de formação de
públicos, fortemente institucionalizados no seio de uma nova profissionalidade e cultura organizacional que
requer, também, progressos assinaláveis nas metodologias de estudos de públicos.
Mais ainda: é um esforço que decorrerá sempre entre tensões. A questão dos critérios de qualidade, já
anteriormente referida, é uma delas. A democracia cultural, tal como a entendo, não é niilista, nem resvala para o
consumismo ou a ditadura da procura. Colocar os públicos no centro das políticas culturais significa, também,
situá-los no coração do furacão, isto é, nas contradições e discussões fundadoras da própria democracia cultural.
Deve a formação de públicos prescindir de um projecto? Não. Deve esse projecto corresponder ao conforto e
reafirmação das expectativas já existentes por parte dos públicos? Novamente, não. Deve, esse projecto, criar
expectativas? Sem dúvida, no respeito antropológico pelos habitus individuais, sociais, colectivos. Como se
consegue? Sem automatismos, sem respostas mecânicas, com sensibilização, explicitação, mediação, negociação,
conflito e reapropriação dos conflitos em práticas inovadoras. É mais importante, então, suscitar a interrogação
do que dar a resposta. Ou, de forma mais correcta, criar socialmente as condições para a emergência das questões.
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43 - Idem, ibidem, pp. 211-218.
44 - Vd. Pascal Le Brun-Cordier, « Renforcer le lien entre l’étude des publics et l’action culturelle » AA.VV, Les Institutions
Culturelles au Plus Près des Publics, Paris, Musée du Louvre/La Documentation Française, 2002, p. 151.
45 - Ideia defendida, entre outros, por Francoise Roussel e Martine Kahane, “Le progrès de la connaissance des publics” in
AA.VV, Les Institutions, op. cit., p. 170.
46 - Vd. José Madureira Pinto, “Para uma análise sócio-etnográfica da relação com as obras culturais” in AA.VV., Públicos
da Cultura..., op.cit, p. 26.
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... The theoretical debate around policies and intervention strategies in the cultural sector is basically structured in three models (Teixeira Lopes, 2009;Santos, 2012b). One, which we call industrial, with a strong neoclassical dimension, which argues that it is the free acting of markets that allows a better resource allocation and, thus, the dynamic balance of the market should be given the proeminente role of promoting cultural development. ...
... The cult of heritage appears, in this sense, in the context of an endogenous development approach and within the ambit of citizenship cultural model, as a counter-power, aiming to counterbalance the ethical and economic dysfunctions that increasingly question the values of authenticity and even local legitimation (Teixeira Lopes, 2009). In seems, by this linkage to heritage, one can respond to the challenge that Jane Wagner, an American writer and filmmaker, put with some sense of humor: "All my life I wanted to be someone. ...
... Local and regional communities, this way, go from development spectators to true protagonists of their future, their future paths, their diversity and their development. This is clearly the domain of cultural democracy (Teixeira Lopes, 2009;Santos Silva et al., 2018;Hadley et al., 2018). It thus implies, on the portuguese context, avoiding the acritical emulation of events that propagate rapidly as mechanical and quick answers from municipalities, like the replication of medieval fairs as turnkey projects, pop or rock festivals, often heavily sponsored by the ICT and the beer industry, with no remaining positive impacts for the socioeconomic life of the local communities, etc. ...
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A cultura tem vindo a assumir crescente centralidade na retórica do desenvolvimento territorial, nem sempre se traduzindo, todavia, na renovação de estratégias e práticas de intervenção. Neste artigo, sugere-se que as políticas culturais de âmbito local devem revestir um claro figurino territorialista, ou endógeno, porque só assim poderão assumir-se como genuínos instrumentos de valorização dos ativos locais e de qualificação das comunidades. Face a alguns dos mais importantes desafios existentes no contexto português de desenvolvimento local, serão discutidos alguns princípios orientadores a que uma política cultural necessita de responder eficazmente, bem como as principais características que lhes devem transmitir forma e conteúdo.
... Democratising the public sphere through culture and the arts Implications of the recent evolution from the "democratisation of culture" to "cultural democracy" make visible the critical nature of many emerging artistic and cultural practices and the challenges they generate to the mainstream (Lopes, 2009;Bonet and Negrier, 2018;Nogales Muriel, 2019). Artistic and cultural expressions contribute to unlocking the imaginations and practices of other worlds and offer ways of living by communicating utopian and dystopian alternatives and criticisms. ...
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Drawing from the critical and transformative potential of culture and the arts, this special issue focuses on the role of social enterprises (SEs) and the social and solidarity economy(SSE), as well as third-sector organisations (TSOs) in the well-being and sustainability of local communities and society at large. In recent years, arts and culture have moved towards the centre of social entrepreneurship and SEs. In many parts of the world, arts-based creativity and culture in social entrepreneurship are significant drivers for developing life skills, empowerment, strengthened community relations and novel forms of SE. Arts and culture organisations engage in multiple kinds of value: social value, financial value, civil and democratic value, restorative and recovery value and productive value (Andersen and Green, 2024). Furthermore, the SSE is a heterospace for diverse economic activities and substantive economic relations related to peoples’ interaction when building their livelihood. As such, SSE is a slow-growing, diversifying and rooting of community activities, community economies, reciprocity and a regenerative and redistributive economy(Andersen et al., 2021). Arts and culture, then, if inscribed in such contexts as SEs or social economy organisations, possess transformative capacities in the small and the big.
... Another concept that subsequently made way for other cultural policies is "cultural democracy", which recognises and values the diversity of culture, and artistic manifestations, placing all subjects simultaneously as consumers and producers of culture. It has abandoned the universalistic definition of culture in favour of a broad, anthropological, pluralistic, relativistic definition, including amateur practices, community cultures, and audiovisual media (Martin, 2013) based on a cultural plurality (Lahire, 2006;Lopes, 2009). Thus providing the grounds for fundamental texts of international scopes, such as the Universal Declaration on Cultural Diversity (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura, 2002). ...
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A emergência de um novo grupo profissional para responder aos desafios colocados pela mudança do papel e do lugar dos artistas e das artes nas sociedades atuais, bem como da relação entre o(s) público(s) e as diversas manifestações artísticas e culturais, levou-nos a tentar (a) compreender como alguns potenciais empregadores, formadores e graduados veem o papel do mediador artístico e cultural; (b) identificar a(s) definição(ões) que propõe(m) de mediação artística e cultural; e (c) identificar os conhecimentos e competências que consideram necessários para este exercício profissional. Uma breve revisão da literatura (Arnaud, 2018; Henry, 2014; Lussier, 2015; Mörsch & Holland, 2012) traz contribuições para uma melhor definição do conceito de mediação artística e cultural que concilia as lógicas da democratização da cultura e da democracia cultural, destacando, entre outras coisas, as finalidades que podem ser prosseguidas. Ancorado num contexto específico da licenciatura em mediação artística e cultural da Escola Superior de Educação de Lisboa, foram realizados grupos de discussão com diplomados, docentes e profissionais cooperantes que enquadram os estagiários desta licenciatura. Os inquiridos apresentam definições da mediação artística e cultural com dimensões educativa, social, cultural, investigativa, política e económica e um largo conjunto de conhecimentos e competências necessários para uma intervenção nessa área assim como uma multiplicidade de funções exercidas. Concluímos com a importância de continuar a investigação no sentido de melhor circunscrever um domínio de conhecimento específico e o campo de intervenção como conceptual para a mediação artística e cultural.
... The issue at hand here is one of cultural democracy, in the sense of not hierarchizing cultural expressions while offering more access to the production than to the consumption of culture, thus enabling visitors to engage not only as spectators but also as active agents (Coelho, 2012, p. 162-163;Lopes, 2009). To quote Vlachou once again, Working with people does not mean "giving people what they want" [...] It does mean being sensitive to our local community's interests, worries, concerns, happiness, and piecing together a program that enables us to think about all this together. ...
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This book is the result of a series of transnational and transdisciplinary conversations around one leading question: how people relate to the tangible and intangible heritage, to plan a more just and inclusive future, in times of ecological transition and societal changes. Such a wide question has been explored digging into theories and practices, that can be interpreted as various forms of experimental and insurgent museologies, at the intersection with insurgent planning: spontaneous initiatives, as well as innovative breaches into the institutional machines, aimed at proposing alternatives to the mainstream. However, here the editors do not want to come out with a new definition. Rather, the book proposes an exploratory journey around different emerging concepts and examples that seem to open some windows of opportunities in the broad and diverse international community. It offers some insights on how various expressions of museologies are changing with current societal and ecological pressing issues. The idea of the title – Babel Tower – stresses the opportunity of exploring different languages, areas, and jargon related to the field of museums and other experimental devices (such as ecomuseums), their relations with communities, citizenship, territories, heritage, landscape, and local development. The book is structured as follows. After an introductory piece written by the editors, who present the theoretical framework and the fil rouge connecting the diverse contributions, the first part is dedicated to a reflection focused on some emerging forms of contemporary museology; the second part is called “Beyond the Museum: emerging territorial practices”, reflecting around some experiences “in-between” insurgent museologies and planning, such as ecomuseums. Conclusions are written by Alberto Garlandini.
... New perspectives on culture are also pushing cultural and arts organisations to cross the borders of its realms. This is, for instance, present in the idea of cultural democracy, encapsulated in the claim for all to have access to culture based on a non-hierarchical understanding of cultural practices sensitive to a plurality of cultural forms in contemporary societies (Lopes 2009;Bonet and Negrier 2018). ...
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Arts and culture gained multiple presence in individual and social life, with economic presence gaining relevance. We focus on social enterprises (SE) in arts and culture standing between the economic-oriented focus on arts and culture, and its socio-political and cultural roles and embeddedness. SEs are characterized by the centrality of a social mission instead of profit and participatory governance. We asked what are SEs in arts and culture and how they are influenced and aim at influencing institutional contexts. We place the research in the context of the Portuguese cultural mix. Based on five in-depth case studies of organisations oriented to the promotion of arts and culture that have social and community interventions, organisations where arts and culture are the main tools for social intervention and social welfare organisations with arts and culture projects, we describe their trajectories and organisational social, economic and governance characteristics. We argue that there is a mix of institutional entrepreneurship, public policies (and their lack) and societal trends influencing SEs pathways towards hybridisation.
... Sobre a ideia de acesso, são vários os países, como é o caso de Portugal, em que a Constituição da República, aprovada em 1976, afirma o direito de todos à cultura (artigo 73º). Além disso, as políticas culturais têm por base abordagens assentes na democratização da cultura e/ou na democracia cultural, que baseando-se em paradigmas distintos (Lopes 2009), por vezes coexistindo (Négrier 2020;Vale 2021), evocam perceções sobre como deve ser entendida a cultura e as condições em que se promove o seu acesso, levantando várias interrogações: que cultura(s)? Com quem, para quem e como? 8 Também se evidencia o papel da participação, que tem sido objecto de interesse crescente na concretização de políticas públicas (Négrier 2020), enquanto mecanismo que pode desencadear novas formas de envolvimento com vista à melhoria da acção pública, constituindo «a participação como 'desafio de' e objectivo para a democratização» (Carvalho e Falanga 2016, 29). ...
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O texto apresenta o contexto teórico que fundamenta a organização do dossier temático sobre o tema "políticas culturais e museus" e a relevância da sua discussão no momento actual. Esclarece quanto aos desafios das políticas culturais de museus e quanto ao racional de textos que integram o dossier.
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Partiendo de las prácticas patrimoniales en Brasil y Venezuela, el presente escrito asume como intencionalidad, abordar críticamente, la construcción discursiva de los objetos, colecciones y expresiones inmateriales, estudiadas por los investigadores culturales, procurando honrar la interculturalidad como fenómeno sociocultural de los pueblos, a fin de ofrecer posibles vías de solución que contribuyan a la integración en total horizontalidad de la institucionalidad del Estado, la academia y todos los grupos sociales que conforman los públicos como consumidores finales. Por tal razón, se realizó un trabajo de campo, declarado onto-epistemológicamente desde los postulados del paradigma socio-construccionista, además se desarrolló un abordaje etnográfico, fundamentado en entrevistas a profesionales del área, las cuales fueron analizadas hermenéuticamente y complejizadas con autores de gran trayectoria que estudian las políticas de patrimonialización, musealización, dignificación, salvaguarda y proyección de bienes y manifestaciones de interés público, como: Prats (1998), (2005), Poulot (2006), Brulon (2018) y García Canclini (2021).
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Armindo dos Santos de Sousa Teodósio 3 Democracy, culture and periphery: debate on cultural policies Democracia, cultura y periferia: debate sobre políticas culturales Resumo O objetivo deste estudo foi investigar os desafios mais proeminentes da de-mocracia cultural e a inserção dos sujeitos periféricos no Brasil a partir dos campos sociais. Trata-se de um estudo teórico que articula a discussão sobre democracia e cultura, a partir da noção de campo social e da reprodução de diferentes formas de capital, não apenas econômico, mas também simbólico e cultural, nas sociedades contemporâneas. É apresentada uma discussão sobre o que é periferia, sua hierarquização no campo cultural, com debate sobre o problema da inserção de sujeitos originários da periferia na cultura, e os desafios para superação da desigualdade no contexto brasileiro.
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Effects on Children of Participation in Children's Community Choirs – This article explores the possibility of developing musical, social and personal skills in children, reflecting on the effects of their participation in community choir projects. Two projects, designed by adults, in which children are active subjects of artistic practices, which enhance music as an instrument for their sociocultural and affective development, are analysed. Through an ethnographic approach, these projects were monitored and focus groups and interviews with participants were conducted. The data collected suggest that those involved recognise positive effects on children in terms of personal and social skills and their ability to enjoy and build musical taste. Keywords: Children; Children's Choirs; Community Musical Intervention; Arts; Education
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Effects on Children of Participation in Children's Community Choirs – This article explores the possibility of developing musical, social and personal skills in children, reflecting on the effects of their participation in community choir projects. Two projects, designed by adults, in which children are active subjects of artistic practices, which enhance music as an instrument for their sociocultural and affective development, are analysed. Through an ethnographic approach, these projects were monitored and focus groups and interviews with participants were conducted. The data collected suggest that those involved recognise positive effects on children in terms of personal and social skills and their ability to enjoy and build musical taste. Keywords: Children; Children's Choirs; Community Musical Intervention; Arts; Education
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Most of the people around us belong to our world not directly, as kin or comrades, but as strangers. How do we recognize them as members of our world? We are related to them as transient participants in common publics. Indeed, most of us would find it nearly impossible to imagine a social world without publics. In the eight essays in this book, Michael Warner addresses the question: What is a public? According to Warner, the idea of a public is one of the central fictions of modern life. Publics have powerful implications for how our social world takes shape, and much of modern life involves struggles over the nature of publics and their interrelations. The idea of a public contains ambiguities, even contradictions. As it is extended to new contexts, politics, and media, its meaning changes in ways that can be difficult to uncover. Combining historical analysis, theoretical reflection, and extensive case studies, Warner shows how the idea of a public can reframe our understanding of contemporary literary works and politics and of our social world in general. In particular, he applies the idea of a public to the junction of two intellectual traditions: public-sphere theory and queer theory.
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L'homme que les sciences humaines et sociales prennent pour objet est le plus souvent étudié dans un seul contexte ou à partir d'une seule dimension. On l'analyse en tant qu'élève, travailleur, consommateur, conjoint, lecteur, pratiquant d'un sport, électeur, etc. Or, dans des sociétés où les hommes vivent souvent simultanément et successivement des expériences socialisatrices hétérogènes et parfois contradictoires, chacun est inévitablement porteur d'une pluralité de dispositions, de façons de voir, de sentir et d'agir. S'interroger sur les manières dont la pluralité des mondes et des expériences s'incorpore au sein de chaque individu, observer son action sur une diversité de scènes, voilà l'horizon scientifique vers lequel tend cet ouvrage. Sociologue, l'auteur noue un dialogue avec une partie de la psychologie, de l'histoire, de l'anthropologie et de la philosophie. Ses réflexions débouchent sur le programme d'une sociologie psychologique et livrent certains des secrets des plis les plus singuliers du social.
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The article reflects on the work of symbolic violence contained in the new "guides to etiquette" for cultural audiences/"publics", as codes of conduct that more or less covertly impose positions that are presented as socially legitimate and hegemonic. This is in spite of the fact that they represent a contingent and historic product of particular and institutionally localized symbolic universes that define the change from lay status to that of a member of a particular public. Notes on the suffering and happiness of the "new publics".
O sentido do desentendimento nas Bienais de Cerveira: arte, artistas e público
  • Idalina Vd
  • Conde
Vd. Idalina Conde, " O sentido do desentendimento nas Bienais de Cerveira: arte, artistas e público " in Sociologia – Problemas e Práticas, n.º 2, 1987.
Desentendimento revisitado
  • Idalina Conde
Conde, Idalina. (2004). Desentendimento revisitado. In AA.VV, Públicos da Cultura. Lisboa: Observatório das Actividades Culturais.
Salazar, entre a indignação e a liberdade artística " in Público
  • António Manuel Revez
António Manuel Revez, " Salazar, entre a indignação e a liberdade artística " in Público, 4 de Junho de 1997. 26 -Idem, ibidem.