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Rev. bras. hematol. hemoter. 2005;27(1):72-74 Carta ao Editor / Letter to Editor
Sr. Editor,
As hemoglobinopatias podem ser resultantes de muta-
ções que afetam os genes reguladores promovendo um
desequilíbrio no conteúdo quantitativo das cadeias
polipeptídicas e conseqüentemente nos tipos normais de Hb,
causando as talassemias, ou, ainda, de alterações envolven-
do genes estruturais que promovem a formação de molécu-
las de Hb com características bioquímicas diferentes das Hb
normais, também denominadas Hb variantes.
1
Mais de 800 variantes de Hb já foram descritas até o
momento.
2
A maioria delas é originada por simples substitui-
ções de aminoácidos, resultantes de mudanças nas seqüên-
cias de nucleotídeos.
1
Atualmente, o número de Hb anormais identificadas
tem aumentado devido à melhoria nas metodologias de aná-
lises; no entanto, muitos laboratórios de rotina não estão
preparados para a correta identificação das Hb variantes.
Deste modo, objetivou-se caracterizar os mutantes de Hb
das amostras de sangue enviadas ao Laboratório de Hemo-
globinas e Genética das Doenças Hematológicas (LHGDH),
utilizando-se diversas metodologias de análises para eviden-
ciar sua aplicabilidade.
Foram analisadas 83 amostras de sangue periférico co-
lhidas com EDTA, após consentimento informado, proveni-
entes de diferentes estados brasileiros e da Colômbia, sem
distinção de sexo, idade, etnia ou classe social.
As amostras foram avaliadas pelos testes para identifi-
cação de hemoglobinopatias que consistiram da análise da
morfologia eritrocitária; resistência globular osmótica em NaCl
a 0,36 %; eletroforese em pH alcalino em acetato de celulose;
eletroforese em gel de ágar, pH ácido e cromatografia líquida
de alta pressão (HPLC) em Sistema Variant automatizado da
Bio-Rad com kit de análise para beta talassemia hetero-
zigota.
1,3,4,5,6
Para a identificação das cadeias globínicas mu-
tantes foram realizadas as metodologias de eletroforese de
cadeias em pH alcalino em acetato de celulose e eletroforese
de cadeias globínicas em pH ácido em gel de poliacrilamida
12%.
7,8
Após a realização dos procedimentos clássicos para o
diagnóstico de hemoglobinopatias, verificou-se a presença
de Hb com padrões de migração diversos, sendo que 37 (45%)
delas migraram em posição semelhante à Hb S em pH alcali-
no. Após a combinação dos resultados obtidos nas meto-
dologias clássicas citadas, as Hb variantes foram submeti-
das a análises para definição da cadeia globínica alterada.
Foram realizadas as eletroforeses de cadeias globí-
nicas em pH ácido e pH alcalino. Em pH ácido, a maioria dos
mutantes não apresentou separação das globinas normais
(α
A
β
A
), sendo possível reconhecer a fração mutante de Hb
C, utilizada como padrão para esses procedimentos eletro-
foréticas, Hb E Saskatoon, Hb J Oxford e Hb Hasharon,
sendo as duas primeiras mutantes de globina beta e as ou-
tras, mutantes de globina alfa. Também foram detectadas as
cadeias gama alanina e gama glicina nas amostras que apre-
sentaram Hb F aumentada. Em pH alcalino, foi possível iden-
tificar a cadeia globínica alterada em 68 (82%) amostras.
Foram encontrados 35 (42%) mutantes de cadeia beta, 24
(29%) de cadeia alfa, quatro (5%) de cadeia delta, três (4%)
de cadeia gama e duas (2%) fusões de cadeia delta/beta.
Não foi possível identificar a cadeia globínica alterada em
15 (18%) amostras.
Dos mutantes de cadeia beta, 20 (57%) migraram em
posição semelhante à Hb S em eletroforese em pH alcalino;
em pH ácido todas essas amostras apresentaram padrão de
migração normal e o perfil cromatográfico foi diferente do
padrão para Hb S. As suspeitas fenotípicas para esse grupo
foram de Hb D Los Angeles, Hb D Iran e Hb Korle Bu. Nove
amostras (26%) migraram na posição de Hb C na eletroforese
em pH alcalino. No entanto, os perfis eletroforético em pH
ácido e cromatográfico, não foram compatíveis com os de Hb
C. Os dados obtidos sugeriram os fenótipos de Hb E e Hb E
Saskatoon. Também foram observados seis casos (17%) de
Hb rápidas que migraram acima de Hb A em pH alcalino em
que as suspeitas fenotípicas foram de Hb J Baltimore, Hb J e
Hb Deer Lodge. Em dois casos (6%) não foi possível encon-
trar uma provável suspeita fenotípica com o conjunto de in-
formações laboratoriais obtido. As freqüências absolutas dos
fenótipos encontrados estão representadas na Figura 1.
Entre os mutantes de cadeia alfa, 14 (58 %) migraram na
posição de Hb S em eletroforese em pH alcalino. As suspei-
tas fenotípicas foram de Hb Queen, Hb Hasharon, Hb G e Hb
Q Índia. Em pH ácido, a Hb Queen apresentou uma fração
difusa abaixo da Hb A; a Hb Hasharon, uma fração difusa em
posição semelhante à Hb S; a Hb G, uma banda na posição da
Hb S e a Hb Q Índia uma fração entre Hb A e Hb S. Também
A importância do diagnóstico
laboratorial clássico na identificação
de variantes de hemoglobinas
The importance of classical laboratorial
diagnosis in the identification of variant
hemoglobins
Luciana S. Ondei
1
Paula J. A. Zamaro
1
Claudia R. Bonini-Domingos
1
1
Unesp – Universidade Estadual Paulista – Ibilce.
Trabalho realizado no Laboratório de Hemoglobinas e Genética
das Doenças Hematológicas (LHGDH) da Unesp – Campus de
São José do Rio Preto, SP.
Carta ao Editor / Letter to Editor
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Carta ao Editor / Letter to Editor Rev. bras. hematol. hemoter. 2005;27(1):72-74
foram encontrados 10 casos (42 %) de Hb rápidas que mi-
gram acima de Hb A em eletroforese em pH alcalino, nas quais
as suspeitas foram de Hb I e Hb J Oxford. Das 24 amostras
mutantes de cadeia alfa, não foi possível identificar uma sus-
peita fenotípica em cinco (21 %) delas. As freqüências abso-
lutas encontradas para esses fenótipos estão representadas
na Figura 2.
Também foram encontradas suspeitas de mutantes de
cadeia delta, cadeia gama e casos com fusão de cadeias del-
ta/beta. Das quatro suspeitas de cadeia delta, três casos fo-
ram de Hb B2; para os mutantes de cadeia gama não foi pos-
sível identificar corretamente as variantes, e as fusões de
cadeias delta/beta sugeriram Hb Lepore que também apre-
sentam migração na posição de Hb S.
O método amplamente utilizado para o diagnóstico das
hemoglobinopatias é a eletroforese em acetato de celulose,
pH alcalino, uma vez que as análises podem ser efetuadas
com rapidez e baixo custo.
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No entanto, não permite a distin-
ção de Hb com co-migração, como as que migram em posição
semelhante à Hb S.
10
A eletroforese em pH ácido pode auxiliar
na confirmação de algumas Hb como Hb A, Hb F, Hb C e Hb
D, porém não permite a distinção entre as Hb S, Hb G, Hb
Hasharon e Hb Q Índia, que migram em posições semelhan-
tes.
11
Portanto, são indicadas como testes de rastreamento
inicial para a detecção de Hb variantes, e metodologias com-
plementares devem ser realizadas para a caracterização das
Hb com migração semelhante.
10
Nesse trabalho verificou-se que as variantes não pu-
deram ser identificadas apenas pelos métodos eletroforéticos
usuais. As 37 (45 %) Hb variantes que migraram na posição
de Hb S em pH alcalino não foram confirmadas em pH ácido
e não se chegou a uma suspeita fenotípica. Os demais perfis
eletroforéticos também não puderam ser identificados ape-
nas com a aplicação dessas duas metodologias. Portanto,
evidenciou-se a dificuldade de interpretação das Hb varian-
tes, principalmente daquelas que migraram em posição seme-
lhante à Hb S em pH alcalino que poderiam ter sido
identificadas incorretamente apenas com a aplicação dessas
metodologias.
A HPLC com sistema automatizado Variant Bio-Rad é
um método rápido, preciso e com boa reprodutibilidade.
12
Para os resultados encontrados neste trabalho, a associação
das análises cromatográficas aos resultados eletroforéticos
foram fundamentais no levantamento das prováveis Hb vari-
antes.
A eletroforese de cadeias globínicas é uma metodologia
de separação das globinas bastante precisa, podendo ser
utilizada para a identificação das cadeias mutantes como uma
análise pré-molecular permitindo a visualização das cadeias
beta, delta, alfa normais e mutantes.
10
Em pH ácido, permitiu
a visualização das cadeias gama glicina e gama alanina nas
amostras que apresentaram Hb F aumentada e as frações
mutantes das Hb E-Saskatoon e Hb J Oxford. A técnica ana-
lítica em pH alcalino apresentou boa resolução para os
mutantes de cadeias alfa, beta e fusão delta/beta, permitindo
a identificação da cadeia globínica mutante na maioria das
Hb variantes.
Os resultados globais mostraram que as Hb variantes
não puderam ser identificadas apenas pelos métodos
eletroforéticos usuais os quais são utilizados, pela maioria
dos laboratórios, como únicas metodologias de análise. A
dificuldade na identificação das Hb variantes ficou evidenci-
ada para aquelas que apresentaram perfil semelhante à Hb S
em pH alcalino, podendo ser diagnosticadas incorretamente.
Portanto, para a identificação das Hb variantes e um diag-
nóstico seguro é fundamental a associação dos métodos
eletroforéticos clássicos com análises cromatográficas e as
eletroforeses de cadeias globínicas que constituem uma aná-
lise pré-molecular.
Abstract
Variant hemoglobins originate principally from simple amino acid
substitutions, resulting in nucleotides sequence changes. Currently,
the number of abnormal hemoglobins identified has increased due
to the improvement in the analytic methodologies; however, many
routine laboratories are not prepared for correct mutant
Figura 2. Suspeitas fenotípicas de Hb mutantes de cadeia alfa,
identificadas pelos métodos clássicos e análise de globina, com
sua freqüências absolutas
Figura 1. Suspeitas fenotípicas de Hb mutantes de cadeia beta,
identificadas pelos métodos clássicos e análise de globina, com
suas freqüências absolutas
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Rev. bras. hematol. hemoter. 2005;27(1):72-74 Carta ao Editor / Letter to Editor
identification. Thus, we aimed at characterizing the variant
hemoglobins in blood samples sent to our laboratory using several
analytic methodologies. Eighty-three samples of peripheral blood
collected in EDTA were analyzed by cytological, biochemical,
electrophoretical and chromatographic methods. The results of the
elecphoretical procedures in alkaline pH indicated several migration
patterns, with 45 % of the samples in the hemoglobin S position. The
differentiation of this hemoglobin was only possible with the
association of electrophoretical and chromatographic methods. The
profiles of the mutants observed in globin chain electrophoresis
were 42% of beta chain mutants, 29% of alpha chain, 5% of delta
chain, 4% of gamma chain and 2% of delta/beta chains fusion. The
global results showed that the variants could not have been identified
by the usual electrophoretical methods alone evidencing the difficulty
in identification, specifically in cases with profiles similar to
hemoglobin S in alkaline conditions, which can be incorrectly
diagnosised. Therefore, for the identification of variant hemoglobins
and a diagnostic reliability the association of electrophoretical,
chromatography and globin chain analyses as a pre-molecular
procedure is fundamental.
Key words: Hemoglobin variants; globin chains; hemoglobin
polymorphism; diagnosis.
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Avaliação: Editor Associado e dois revisores externos.
Conflito de interesse: não declarado
Recebido: 20/11/2004
Aceito após modificações:15/12/2004
Correspondência para: Luciana de Souza Ondei
LHGDH, Departamento de Biologia, Unesp-Ibilce
Rua Cristóvão Colombo, 2265, Jardim Nazareth
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