Content uploaded by Alan Sciamarelli
Author content
All content in this area was uploaded by Alan Sciamarelli on Jan 15, 2014
Content may be subject to copyright.
Anais 2º Simpósio de Geotecnologias no Pantanal, Corumbá, 7-11 novembro 2009,
Embrapa Informática Agropecuária/INPE, p.834-843.
834
Modelos de distribuição geográfica de cinco gramíneas invasoras em Mato Grosso
do Sul, Brasil
Adriana Guglieri
1
Francisco José Machado Caporal
1
Alan Sciamarelli
2
1
Universidade Federal de Mato Grosso do Sul - UFMS
Centro de Ciências Biológicas e da Saúde – CCBS
Departamento de Biologia – DBI
Cidade Universitária s.n. - Caixa Postal 549
79070-900 - Campo Grande – MS, Brasil
{adrianaguglieri, franciscocaporal}@ig.com.br
2
Universidade Federal da Grande Dourados – UFGD
Faculdade de Ciências Biológicas e Ambientais - FCBA
Rua João Rosa Góes 1761
79825-070 - Dourados – MS, Brasil
alansciamarelli@ufgd.edu.br
Resumo. Poaceae (Gramineae) é uma das mais importantes famílias das Angiopermas, pela sua importância
econômica e ecológica, sua ampla distribuição geográfica e seu elevado número de espécies. Em Mato Grosso
do Sul não existe um trabalho amplo de levantamento das gramíneas e são raros os trabalhos regionais com
enfoque neste grupo. A escassez de coletas em determinadas regiões e a dificuldade em identificar corretamente
os espécimes devido à sua morfologia peculiar não permite informações precisas acerca de sua diversidade. Nas
últimas décadas as práticas pecuárias em Mato Grosso do Sul favoreceram a utilização de algumas gramíneas
exóticas como forrageiras, as quais competem e comprometem a diversidade das nativas. O presente estudo teve
como objetivo conhecer a distribuição geográfica e os ambientes de ocorrência de Cynodon dactylon (capim-
bermuda), Hyparrhenia rufa (capim-jaraguá), Megathyrsus maximus (capim-colonião), Melinis minutiflora
(capim-gordura) e M. repens (capim-favorito) em Mato Grosso do Sul e construir modelos de distribuição
utilizando a modelagem. Para tanto, foram realizadas revisão dos herbários, coletas botânicas em diferentes
regiões do Estado e construídos modelos a partir do software MAXENT. As espécies foram constatadas em
regiões abrangidas pelo Cerrado, Pantanal e Chaco de Mato Grosso do Sul, onde ocorrem em diferentes
formações vegetacionais, preferencialmente em locais antropizados. No Pantanal foram confirmadas nas
subregiões do Paraguai, Paiaguás, Nhecolândia, Aquidauana e Porto Murtinho. Em geral gramíneas exóticas são
pouco coletadas e mal representadas nos herbários, podendo produzir idéias errôneas acerca de sua distribuição
geográfica, ambientes preferenciais de ocorrência e efeitos sobre a flora original.
Palavras-chave: Poaceae, Gramineae, Pantanal, forrageiras exóticas, espécies naturalizadas, modelagem
Anais 2º Simpósio de Geotecnologias no Pantanal, Corumbá, 7-11 novembro 2009,
Embrapa Informática Agropecuária/INPE, p.834-843.
835
Abstract. Geographic distribution models of five invasive grasses in Mato Grosso do Sul, Brazil. Poaceae
(Gramineae) is one of the most important families of Angiosperms for its ecological and economic importance,
its wide geographical distribution and its high number of species. In Mato Grosso do Sul there is not a work of
broad survey of grasses and works with regional focus in this group are scarce. The paucity of collections in
certain areas and difficulty in identifying specimens due to the peculiar morphology does not provide precise
information about species diversity. In recent decades the cattle farming in Mato Grosso do Sul favored the use
of some exotic forage grasses, which compete and reduce the diversity of native grasses. This study aimed to
know the geographical distribution, and habitats of Cynodon dactylon (bermuda grass), Hyparrhenia rufa
(thatching grass), Megathyrsus maximus (coloniao grass), Melinis minutiflora (molasses grass) and M. repens
(Natal grass) in Mato Grosso do Sul and to build distribution models using modelling. Thus, we review the
herbarium and made botanical collections in different regions of the State and constructed models from software
MAXENT. The species were found in different vegetation types of Cerrado, Chaco and Pantanal of Mato
Grosso do Sul, prefferably in disturbed areas. In the Pantanal theyr occurrence was confirmed in Paraguay,
Paiaguás, Nhecolândia, Aquidauana and Porto Murtinho subregions. Exotic grasses in general are poorly
collected and represented in herbaria and may produce erroneous ideas about geographical distribution, preferred
habitats and effects on the original flora.
Key-words: Poaceae, Gramineae, Pantanal, exotic forage, naturalized species, modelling
1. Introdução
Poaceae (Gramineae) é uma das mais importantes famílias das Angiopermas, pela sua
importância econômica e ecológica, sua ampla distribuição geográfica e seu elevado número
de espécies. Inclui cerca de 793 gêneros e 10.000 espécies, distribuídas em todas as regiões do
globo, sendo que no Brasil ocorrem aproximadamente 197 gêneros e 1368 espécies (Longhi-
Wagner et al. 2005).
Em Mato Grosso do Sul não existe um trabalho amplo de levantamento das gramíneas, e
são raros os trabalhos regionais com enfoque neste grupo. Dubs (1998), com base no acervo
de herbários europeus (coleções de Malme, Lindman e outros) e no Herbário MBM de
Curitiba (coletas de Hatschbach), constatou para Mato Grosso do Sul a ocorrência de apenas
44 espécies, distribuídas em 31 gêneros. Em levantamento recente, Guglieri (2009, dados não
publicados) confirmou a ocorrência de 324 espécies e 90 gêneros, com base no acervo dos
herbários do Estado e em coletas pessoais. Entretanto, acredita-se ainda que este número seja
subestimado em relação ao provável total de espécies de gramíneas existente no Estado. A
escassez de coletas em determinadas regiões e a dificuldade em identificar corretamente os
espécimes coletados devido à sua morfologia peculiar, não permitem informações precisas
acerca de sua diversidade.
Nas últimas décadas as práticas pecuárias em Mato Grosso do Sul favoreceram a
utilização de algumas gramíneas exóticas como forrageiras. Estas espécies, porém, passaram a
ocorrer escapadas de cultivo, a se disseminar de forma espontânea e a se comportar como
invasoras de ecossistemas naturais. As gramíneas exóticas competem com as nativas e
influenciam na diversidade da flora original (Filgueiras 2002), sobretudo da flora herbácea
que é mais vulnerável às alterações e impactos naturais e antrópicos (Batalha 2001). Antes
mesmo de se conhecer a diversidade e os ambientes preferenciais das gramíneas existentes no
Estado, a ocorrência de muitas espécies encontra-se severamente comprometida em função da
implantação de pastagens cultivadas nas propriedades rurais.
Coletas intensivas de material botânico e dados sobre a flora acumuladas nos herbários
constituem-se elementos essenciais para o inventário da diversidade florística, servindo de
base para estudos taxonômicos, florísticos, fenológicos, ecológicos e fitogeográficos. As
coleções botânicas podem também colaborar com o fornecimento de informações sobre a
perda da diversidade florística, como subsídio para o estabelecimento de políticas adequadas
que visem o desenvolvimento sustentável e a preservação ambiental (Magalhães et al. 2001).
Anais 2º Simpósio de Geotecnologias no Pantanal, Corumbá, 7-11 novembro 2009,
Embrapa Informática Agropecuária/INPE, p.834-843.
836
O entendimento de padrões de distribuição espacial das espécies é fundamental para a
conservação da diversidade biológica. É possível observar um acelerado processo de declínio
de populações (Hughes & Daily et al. 1997) em diferentes ecossistemas, devido
principalmente ao impacto da ocupação humana. Em virtude deste cenário, torna-se
fundamental a compreensão dos fatores que determinam a diversidade e o aprimoramento dos
métodos utilizados no seu estudo, uma vez que as decisões de conservar determinadas áreas
muitas vezes estão baseadas em dados limitados, principalmente aqueles disponíveis para as
regiões tropicais (Faith 1992; Ferrier 2002; Funk & Richardson 2002). Várias técnicas de
modelagem têm sido utilizadas no entendimento da distribuição e expansão geográfica de
espécies, bem como determinação de áreas prioritárias para conservação (p.ex., Funk et al.
1999; Guisan & Zimmermann 2000; Steege et al. 2000). Tais técnicas são auxiliadas com o
uso de ferramentas computacionais, como os Sistemas de Informação Geográfica (SIGs), que
permitem armazenar e relacionar uma grande quantidade de dados, de diferentes origens e
formatos. Dentro deste contexto, a utilização de táxons bem conhecidos (na sua taxonomia)
nos estudos de diversidade representa uma importante alternativa nos estudos de
biodiversidade nas regiões tropicais (Funk & Richardson 2002).
2. Objetivo
O presente estudo teve como objetivo conhecer a distribuição geográfica e os ambientes de
ocorrência de cinco gramíneas invasoras em Mato Grosso do Sul, com base em coletas
botânicas e no acervo dos herbários do Estado, e utilizando a modelagem de distribuição
geográfica de espécies, prever novas áreas de ocorrência além daquelas conhecidas nos
registros consultados.
3. Material e Métodos
Para este estudo foram selecionadas cinco espécies de gramíneas megatérmicas que se
comportam como invasoras em Mato Grosso do Sul: Cynodon dactylon (L.) Pers. (capim-
bermuda), Hyparrhenia rufa (Nees) Stapf (capim-jaraguá), Megathyrsus maximus (Jacq.)
B.K. Simon & S.W.L. Jacobs (capim-colonião), Melinis minutiflora P. Beauv. (capim-
gordura) e M. repens (Willd.) Zizka (capim-favorito).
Para obtenção dos dados de distribuição geográfica foram realizadas coletas de material
botânico das referidas espécies entre os anos de 2006 e 2009 em 48 municípios de Mato
Grosso do Sul (ca. 62% do total), tendo sido contemplados os biomas Cerrado, Pantanal e
Chaco e suas diferentes formações vegetacionais. Também foram revisados os acervos dos
herbários de Mato Grosso do Sul: CEUL (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul
campus Três Lagoas), CGMS (UFMS campus Campo Grande), COR (UFMS campus
Corumbá), DDMS (Universidade Federal da Grande Dourados), UNIDERP (Universidade
para o Desenvolvimento da Região do Pantanal), CPAP (Centro de Pesquisas Agropecuárias
do Pantanal) e HMS (Embrapa Gado de Corte). Os dois últimos herbários, durante o estudo,
encontraram-se em fase de reestruturação, sendo o seu acervo parcialmente revisado.
O clima de Mato Grosso do Sul, de acordo com a classificação de Köppen, varia entre os
subtipos Aw (clima tropical úmido com estação chuvosa no verão e seca no inverno) e o Cfa
(clima mesotérmico úmido sem estiagem), sendo a temperatura do mês mais quente superior a
22ºC, apresentando no mês mais seco uma precipitação superior a 30 mm de chuva. No
Estado, há predomínio de relevo suave ondulado e de Latossolos (Embrapa Solos 2008).
Para o Pantanal foi utilizada a divisão proposta por Silva & Abdon (1998), que
reconheceram 11 subregiões: Cáceres, Poconé, Barão de Melgaço, Paraguai, Paiaguás,
Nhecolândia, Abobral, Aquidauana, Miranda, Nabileque e Porto Murtinho.
Anais 2º Simpósio de Geotecnologias no Pantanal, Corumbá, 7-11 novembro 2009,
Embrapa Informática Agropecuária/INPE, p.834-843.
837
Para modelagem de distribuição de espécies foram utilizados os algoritmos contidos no
Maxent (Phillips et. al 2006). Estes algoritmos permitem previsões da distribuição geográfica
de uma dada espécie a partir de modelos de nicho fundamental de espécies e com base nos
dados de seus pontos de ocorrência e de um conjunto de variáveis ambientais climáticas
(temperaturas, preciptação, número de dias com chuva, umidade relativa, insolação,
evaporação) (INMET/wordclim), representados em Sistema de Informação Geográfica, na
resolução espacial compatível com a escala de análise do Estado. O sistema (ArcView 9.3.1
ESRI) possibilitou a estruturação da base de dados.
4. Resultados e Discussão
As cinco espécies estudadas foram constatadas em regiões abrangidas pelo Cerrado, Pantanal
e Chaco de Mato Grosso do Sul, onde ocorrem em diferentes formações vegetacionais,
preferencialmente em locais antropizados, avançando em direção a áreas nativas e
contribuindo consideravelmente com a descaracterização da fitofisionomia original.
Cynodon dactylon (capim-bermuda) – espécie nativa da Europa (Burkart 1969, Smith et
al. 1981, Lombardo 1984), África Tropical e Ásia Equatorial (Nascimento & Renvoize 2001),
atualmente considerada cosmopolita. É usada como forrageira, no controle da erosão e na
cobertura de solos e gramados (Nascimento & Renvoize 2001). Seu hábito rizomatoso-
estolonífero lhe confere ampla cobertura do solo e resistência a condições de seca, queima,
encharcamento temporário, pisoteio e sobrepastejo. Por outro lado, seu hábito dificulta a
germinação e desenvolvimento de outras espécies vegetais, o que a torna agressiva e invasora
de difícil erradicação. Kissmann (1997) fez referência ao seu caráter invasor e evidenciou seu
potencial alelopático.
Em Mato Grosso do Sul, a espécie foi observada em grande parte das regiões visitadas,
comumente em baixa freqüência. Foi constatada em locais alterados em margens de mata
ciliar e mata de galeria, margens de rios e córregos, em corixos, campo úmido, às margens de
rodovias e de estradas vicinais, em barragens, junto a cultivos de cana-de-açúcar e milheto,
em pastagens cultivadas, em solos degradados com voçorocamento, em propriedades rurais e
no perímetro urbano de alguns municípios. Os modelos de distribuição sugerem uma área de
ocupação relativamente maior que os registros de ocorrência, havendo potencialmente a
possibilidade de expansão em sua distribuição pelas áreas do Estado. Figura 1.
Silva (1981) citou a ocorrência de C. dacytlon no Pantanal, principalmente em campinas
de Miranda e Corumbá. Pott & Pott (1986) trataram a espécie como uma das mais comuns na
estrada “Transpantaneira” (da Fazenda Leque ao Retiro Chatelodo) na Nhecolândia. Allem &
Valls (1987) mencionaram que a mesma ocorre, preferencialmente, em locais perturbados e
não inundáveis do Pantanal, o que foi confirmado pelo presente estudo. Foram observadas
populações da espécie nas subregiões do Paraguai, Paiaguás, Nhecolândia e Porto Murtinho,
tendo sido coletadas às margens do Rio Paraguai e nas adjacências do Rio Negro.
Hyparrhenia rufa (capim-jaraguá) – espécie nativa da África, é naturalizada nas regiões
tropicais do mundo e ocorre em todo o Brasil (Smith et al. 1982, Pohl 1994). Nos anos de
1960 e 1970 foi largamente cultivada no Brasil, especialmente em áreas de criação de gado de
corte, sendo posteriormente substituída por outras gramíneas (Nascimento & Renvoize 2001).
Por apresentar fácil disseminação natural pela elevada produção de sementes (Nascimento &
Renvoize 2001), esta espécie comumente forma populações extensas e de grande porte que
podem assumir comportamento invasor, produzir considerável sombreamento e afetar a
germinação e o desenvolvimento de outras espécies vegetais.
Em Mato Grosso do Sul, a espécie foi observada na maioria das regiões visitadas e com
considerável freqüência. Foi constatada em locais alterados às margens de mata ciliar e mata
de galeria, remanescentes de cerradão, cerrado s.s., campo-cerrado e campo, margens de rios e
Anais 2º Simpósio de Geotecnologias no Pantanal, Corumbá, 7-11 novembro 2009,
Embrapa Informática Agropecuária/INPE, p.834-843.
838
córregos, às margens de rodovias e de estradas vicinais, junto a cultivos de cana-de-açúcar,
milho, aveia-preta, soja, algodão e a plantio de eucalipto, em pastagens cultivadas, em solos
degradados com voçorocamento, em propriedades rurais e no perímetro urbano de alguns
municípios. Da mesma forma que Cynodon dactylon, os modelos sugerem a possibilidade de
expansão na área, inclusive na região do Pantanal. Figura 1.
Silva (1981) citou coletas de H. rufa no Pantanal, no município de Miranda, onde ocorre
na transição da Serra da Bodoquena e campina. De acordo com Allem & Valls (1987), a
espécie não se dispersa pela planície inundável do Pantanal, o que também foi verificado no
presente estudo. Sua ocorrência foi confirmada nas subregiões do Paraguai, Paiaguás,
Nhecolândia, Aquidauana e Porto Murtinho. Populações desta espécie foram constatadas em
estrada “Transpantaneira” (Coxim), no Morro do Urucum (Corumbá) e às margens do rio do
Peixe (Rio Verde de Mato Grosso). Foi analisada uma coleta da espécie em um carandazal em
Corumbá.
Megathyrsus maximus (capim-colonião) – espécie nativa da África é amplamente
cultivada como forrageira em regiões tropicais do globo (Zuloaga et al. 2001). Durante a
década de 1970, foi a forrageira mais cultivada no Brasil, mas por não oferecer boa cobertura
e por sua exigência quanto à fertilidade do solo foi posteriormente substituída pelas
braquiárias (Nascimento & Renvoize 2001). A elevada produção de sementes aliada ao seu
grande porte e agressividade facilitam sua disseminação natural, a formação de altas e densas
populações, seu comportamento invasor e a dominância de extensos trechos de solo.
Foi observado que esta espécie encontra-se amplamente distribuída pelas regiões visitadas
de Mato Grosso do Sul, em geral sendo abundante. Foram constatadas coletas em locais
alterados às margens de mata ciliar e mata de galeria, cerrado s.s., campo-cerrado, cerrado em
regeneração, margens de rios e córregos, às margens de rodovias e de estradas vicinais, junto
a cultivos de cana-de-açúcar, milho, sorgo, soja, algodão e a plantio de eucalipto, em
pastagens cultivadas, em solos compactados, solos degradados com voçorocamento, em frente
a empresas de armazenagem e comercialização de grãos, propriedades rurais e no perímetro
urbano de alguns municípios. Como esta espécie foi a melhor amostrada, o modelo pode
sugerir com maior probabilidade mais áreas em que possa ocorrer a espécie, sugerindo uma
alta possibilidade de expansão pelo Estado principalmente na micro-região sudeste. Figura 1.
Silva (1981) citou a ocorrência de M. maximus no Pantanal, no município de Miranda, na
transição da Serra da Bodoquena e campina. Segundo Allem & Valls (1987), é cultivada em
áreas não inundáveis do Pantanal, pois não suporta a inundação periódica, como observado
pelo presente estudo. Foi confirmada nas subregiões do Paraguai, Paiaguás, Nhecolândia e
Porto Murtinho. Populações da espécie foram constatadas na Estrada Parque e no Morro do
Jacadigo (Corumbá) e às margens do Rio Paraguai (Ladário). Foi analisada uma coleta em um
paratudal em Corumbá.
Melinis minutiflora (capim-gordura) – espécie nativa da África, foi cultivada e
naturalizada nos trópicos de todo o mundo, ocorrendo em praticamente todo o Brasil (Smith
et al. 1982, Arce & Sano 2001a, Pott et al. 2006) e foi considerada uma das grandes soluções
econômicas para pecuária da Região Centro-Oeste (Smith et al. 1982). Indivíduos desta
espécie crescem rapidamente (Lorenzi 2000) e podem formar densas populações que
promovem uma grande vantagem competitiva sobre as demais espécies do estrato rasteiro, o
que pode levar à diminuição da biodiversidade local (Martins et al. 2004).
Foi constatada com baixa freqüencia em poucas das regiões visitadas de Mato Grosso do
Sul. Espécie preferentemente ombrófila, foi observada em margens de mata, mata ciliar, mata
de galeria, cerradão e cerrado s.s., localizados em geral nas proximidades de rodovias e
estradas vicinais. Os modelos sugerem que há uma grande potencialidade de expansão dessa
Anais 2º Simpósio de Geotecnologias no Pantanal, Corumbá, 7-11 novembro 2009,
Embrapa Informática Agropecuária/INPE, p.834-843.
839
espécie em áreas do Pantanal, podendo chegar a amplamente distribuída levando-se em conta
condições climáticas mais secas. Figura 1.
Allem & Valls (1987) mencionaram que M. minutiflora não se dispersa pela planícia
inundável do Pantanal, como também foi verificado pelo presente estudo. Sua presença foi
constatada nas subregiões do Paraguai, Paiaguás e Nhecolândia. Foi coletada na Estrada
Parque, Morro do Urucum e Morro Santa Cruz (Corumbá) e em estrada “Transpantaneira”
(Coxim). Nesses morros, ela foi semeada em áreas mineradas de recomposição para cobertura
verde.
Melinis repens (capim-favorito) – espécie nativa da África, naturalizada nos neotrópicos
(Arce & Sano 2001b) e disseminada em todo o Brasil (Smith et al. 1982). É utilizada para
fenação e como forrageira especialmente para ovinos e eqüinos (Kissmann 1997). Espécie
invasora com elevado potencial de disseminação e adaptabilidade, pode formar extensas
populações e se tornar dominante em solos arenosos.
Foi observado que esta espécie encontra-se amplamente distribuída pelas regiões visitadas
de Mato Grosso do Sul, em geral sendo freqüente. Foi constatada em locais alterados em
margens de mata e cerradão, em cerrado s.s., campo-cerrado, cerrado em regeneração, em
bancada laterítica (com solo extremamente raso), às margens de rodovias e de estradas
vicinais, junto a cultivos de cana-de-açúcar, milho, sorgo, aveia-preta e a plantio de eucalipto,
em pastagens cultivadas, em solos compactados, propriedades rurais e no perímetro urbano de
alguns municípios. Essa espécie tem grande potencialidade de ocupar diversas áreas do
Pantanal e região sudeste do Estado.
Pott & Pott (1986) citaram a ocorrência de M. repens na estrada “Transpantaneira” (da
Fazenda Leque ao Retiro Chatelodo) na Nhecolândia. Allem & Valls (1987) mencionaram
que a espécie tende a se desenvolver em solos arenosos e locais não inundáveis do Pantanal,
observação confirmada pelo presente estudo. Foi constatada nas subregiões do Paraguai,
Paiaguás e Porto Murtinho. Indivíduos da espécie foram coletados na Estrada Parque e Morro
do Urucum (Corumbá).
5. Conclusões e Sugestões
As espécies estudadas ocorrem preferencialmente em ambientes antropizados, e os modelos
de distribuição geográfica obtidos sugerem a possibilidade das mesmas, em condições
ambientais climáticas favoráveis ao seu estabelecimento, expandir-se consideravelmente e
invadir áreas nativas adjascentes. Em geral, gramíneas exóticas invasoras são pouco coletadas
e, por esta razão, mal representadas nos herbários. Esta subamostragem pode produzir idéias
errôneas acerca de sua distribuição geográfica, ambientes preferenciais de ocorrência e efeitos
sobre a flora original, subestimando a dimensão do problema. Coletas intensivas e
sistematizadas, com cronogramas e roteiros específicos a regiões pouco amostradas de Mato
Grosso do Sul são soluções viáveis para o conhecimento da distribuição e o entendimento da
dinâmica destas espécies. Novos resultados poderiam ser obtidos a partir da análise de
coleções botânicas de herbários da Região Centro-Oeste como o do Cenargen (coleção do Dr.
José F.M. Valls). Entretanto, um dos objetivos do presente estudo foi analisar a
representatividade destas espécies nos herbários de Mato Grosso do Sul e possibilitar a
experiência da modelagem como ferramenta no auxílio da discussão sobre a probabilidade de
expansão das ocorrências pelo Estado, inclusive sugerindo áreas prioritárias para coletas.
Anais 2º Simpósio de Geotecnologias no Pantanal, Corumbá, 7-11 novembro 2009,
Embrapa Informática Agropecuária/INPE, p.834-843.
840
Anais 2º Simpósio de Geotecnologias no Pantanal, Corumbá, 7-11 novembro 2009,
Embrapa Informática Agropecuária/INPE, p.834-843.
841
Figura 1. Modelos de distribuição das espécies de Cynodon dactylon (capim-bermuda),
Hyparrhenia rufa (capim-jaraguá), Megathyrsus maximus (capim-colonião), Melinis
minutiflora (capim-gordura) e M. repens (capim-favorito) pelo Mato Grosso do Sul. Na escala
colorida os valores representam classes de 70% até 100% de probabilidade de ocorrência da
espécie.
6. Agradecimentos
O presente trabalho foi realizado com o apoio da CAPES, entidade do Governo Brasileiro
voltada para a formação de recursos humanos. A primeira e o terceiro autores agradecem a
CAPES pelas bolsas PRODOC e PROCAD concedidas. Os autores agradecem aos curadores
dos herbários consultados pela disponibilização dos seus acervos, ao Dr. Arnildo Pott pela
leitura crítica do artigo e valiosas sugestões e aos Drs. Ingrid Koch e José Salatiel Rodrigues
Pires pela orientação nos trabalhos de modelagem.
7. Referências
Allem, A.C.; Valls, J.F.M. Recursos forrageiros nativos do Pantanal Mato-Grossense. Brasília: Empresa
Brasileira de Pesquisa Agropecuária - Centro Nacional de Recursos Genéticos, 1987. 339 p.
Arce, D.; Sano, P. Melinis. In: H.M. Longhi-Wagner; V. Bittrich; M.G.L. Wanderley; G.J. Sheperd (Eds.). Flora
Fanerogâmica do Estado de São Paulo – Poaceae. V.1. São Paulo: Hucitec, 2001a. Pp. 165-166.
Arce, D.; Sano, P. Rhynchelytrum. In: H.M. Longhi-Wagner; V. Bittrich; M.G.L. Wanderley; G.J. Sheperd
(Eds.). Flora Fanerogâmica do Estado de São Paulo – Poaceae. V.1. São Paulo: Hucitec, 2001b. Pp. 232.
Batalha, M.A.P.L. Florística, espectro biológico e padrões fenológicos do cerrado sensu lato no Parque
Nacional das Emas (GO) e o componente herbáceo-subarbustivo da flora do cerrado sensu lato. 2001.
213p. Tese (Doutorado em Ecologia) – Universidade Estadual de Campinas, Campinas. 2001.
Anais 2º Simpósio de Geotecnologias no Pantanal, Corumbá, 7-11 novembro 2009,
Embrapa Informática Agropecuária/INPE, p.834-843.
842
Burkart, A. Flora Ilustrada de Entre Rios (Argentina). Tomo VI, Parte II – Gramineas. Buenos Aires:
INTA, 1969. 551p.
Dubs, B. The botany of Mato Grosso – Prodromus Florae Matogrossensis. Part I. Checklist of Angiosperms.
Betrona-Verlag, s. B, n.3, p. 1-139, 1998.
Embrapa Solos. Sistema Brasileiro de Classificação de solos. Rio de Janeiro: Embrapa Solos, 2008. Disponível
em: <www.cnps.embrapa.br/sibcs> Acesso em: 14 ago. 2008.
Faith, D. P. Systematics and conservation: on predicting the feature diversity of subsets of taxa. Cladistics v. 8,
p. 361–373, 1992.
Ferrier, S. Mapping Spatial Pattern in Biodiversity for Regional Conservation Planning: Where to from here?
Systematic Biology v. 51, n. 2, p. 331-363, 2002.
Filgueiras, T.S. Herbaceous plant communities. In: P.S. Oliveira; J.R. Marques (Eds.). The cerrados of Brazil:
Ecology and natural history of a neotropical savanna. New York: Columbia University Press, 2002. Pp. 121-
139.
Funk, V.A.; Richardson, K.S. Systematic Data in Biodiversity Studies: Use it or lose it. Systematic Biology v.
51, p. 303–316, 2002.
Funk, V.A.; Zermoglio, M.F.; Nasir, N. Testing the use of specimen collection data and GIS in biodiversity
exploration and conservation decision making in Guyana. Biodiversity and Conservation v. 8, p. 727–751,
1999.
Guisan, A. & Zimmermann, N. E. Predictive habitat distribution models in ecology. Ecological Modelling v.
135, p. 147-186, 2000.
Guglieri, A. Desenvolvimento das linhas de pesquisa do Curso de Mestrado em Biologia Vegetal da
Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, pela implantação de pesquisa na região do Pantanal e áreas
limítrofes. Relatório de Atividades de bolsa PRODOC/CAPES. 2009. 68p.
Hughes, J. B.; Daily, G. C.; Ehrlich, P. R. Population diversity: its extent and extinction. Science v. 278, p. 689-
692, 1997.
Kissmann, K.G. Plantas infestantes e nocivas. São Paulo: BASF, 1997. 824p.
Lombardo, A. Flora Montevidensis Tomo III – Monocotiledoneas. Montevideo: Intendencia Municipal de
Montevideo, 1984. 465p.
Longhi-Wagner, H.M.; Boldrini, I.I.; Boechat, S. de C. Morfologia e taxonomia de gramíneas sul-
riograndenses. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2005. 96p.
Lorenzi, H. Plantas daninhas do Brasil: terrestres, aquáticas, parasitas e tóxicas. Nova Odessa: Instituto
Plantarum, 2000. 608p.
Magalhães, C.; Santos, J.L.C.; Salem, J.I. Automação de coleções biológicas e informações sobre a
biodiversidade da Amazônia. Revista Parcerias Estratégicas, v. 12, p. 294-312, 2001.
Martins, C.R. Caracterização e manejo da gramínea Melinis minutiflora P. Beauv. (capim-gordura): uma
espécie invasora do Cerrado. 2006. 145 p. Tese (Doutorado em Ecologia) - Universidade de Brasília, Brasília.
2006.
Nascimento, M. do P.S.C.B. do; Renvoize, S.A. Gramíneas forrageiras naturais e cultivadas na Região
Meio-Norte. Teresina: Embrapa Meio-Norte, 2001. 196p.
Phillips, S. J.; Anderson, R. P.; Schapire, R. E. Maximum entropy modelling of species geographic distributions.
Ecological Modelling, v. 190, p. 231-259, 2006.
Pohl, R.W. Hyparrhenia Andersson ex Fourn. In: G. Davidse; M. Sousa; A.O. Chater (Eds.) Flora
Mesoamericana. México: Universidad Autónoma de México, 1994. Pp. 393-394.
Pott, A.; Pott, V.J., Souza, T.W. de. Plantas daninhas de pastagem na região dos Cerrados. Campo Grande:
Embrapa Gado de Corte, 2006. 336p.
Pott, V.; Pott, A. Plantas colonizadoras da estrada Transpantaneira (da Fazenda Leque ao Retiro Chatelodo), na
Nhecolândia, Pantanal. Comunicado Técnico da Embrapa n. 7, p. 1-9, 1986.
Anais 2º Simpósio de Geotecnologias no Pantanal, Corumbá, 7-11 novembro 2009,
Embrapa Informática Agropecuária/INPE, p.834-843.
843
Silva, J.S.V.; Abdon, M.M. Delimitação do Pantanal Brasileiro e suas subregiões. Pesquisa Agropecuária
Brasileira n. 33, p. 1703-1711, 1998.
Silva, T.S. da. Gramíneas do Complexo do Pantanal, estado de Mato Grosso do Sul. Zootecnia v. 19, n. 4, p.
281-293, 1981.
Smith, L.B.; Wasshausem, D.C.; Klein, R.M. Gramíneas. Gêneros: 1. Bambusa até 44. Chloris. In: R. Reitz
(Ed.). Flora Ilustrada Catarinense. Itajaí: Herbário Barbosa Rodrigues, 1981. Pp. 1-435.
Smith, L.B.; Wasshausem, D.C.; Klein, R.M. Gramíneas. Gêneros: 85. Paspalum até 115. Zea. In: R. Reitz
(Ed.). Flora Ilustrada Catarinense. Itajaí: Herbário Barbosa Rodrigues, 1982. Pp. 910-1407.
Steege, H.M., Jansen-Jacobs, J.; Datadin, V. K. Can botanical collections assist in National Protected Area
strategy in Guyana? Biodiversity and Conservation v. 9, p. 215-240, 2000.
Zuloaga, F.O.; Guglieri, A.; Longhi-Wagner, H.M. Panicum. In: H.M. Longhi-Wagner; V. Bittrich; M.G.L.
Wanderley; G.J. Sheperd (Eds.). Flora Fanerogâmica do Estado de São Paulo – Poaceae. V.1. São Paulo:
Hucitec, 2001. Pp. 168-190.